nota cinco:

cornalina

As idas a Hogsmeade nunca foram de muita valia.

Costumava dizer que Merlim não gostava tanto assim de mim quando comparado às outras pessoas. Sempre chovia copiosamente ou nevava a ponto dos pés afundarem até os tornozelos naqueles tapetes incrivelmente fofos e brancos que cobriam os telhados das casas, mas acima de qualquer coisa, as ruas também. Daquela vez não foi diferente: chovia, chovia tanto que várias goteiras se abriram no teto da Dedos de Mel e foi preciso dois ou três bruxos com varinhas a postos para impedir que todos os clientes saíssem com as roupas parcial ou completamente encharcadas. Lembro dessa cena, trago esse como um dos melhores dias da minha vida, porque acho difícil que qualquer outro tenha sido tão bom quanto.

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Vi Rose Weasley pela janela embaçada da loja em que estava, e como sempre, parecia impecável: com o mesmo sobretudo da primeira vez; os cabelos que terminavam pouca coisa acima dos ombros eram bagunçados pelo vento descomunal que soprava do lado de fora e que fazia as janelas da Dedos de Mel estalarem perigosamente; calçava botas de couraça por cima de uma calça justa jeans e o cachecol verde esmeralda só realçava ainda mais o brilho peculiar que os olhos emitiam toda vez que a luz fraca do poste rebatia de um ângulo diferente em qualquer parte, por minúscula que fosse, do seu rosto. Rose Weasley tinha aquela estranha mania de ser bonita só por ser, uma coisa própria e que eu jamais tinha visto alguém emitir em toda a minha vida. Nunca existiram holofotes voltados para ela em momento nenhum da vida, mas ainda assim, por onde quer que passasse, as pessoas olhavam, elas sabiam quem era Rose e isso me fascinava.

Alvo Severo Potter gostava de ser inconveniente e tinha se provado um verdadeiro expert na arte de atormentar pessoas. Logo nos primeiros anos de Hogwarts as reclamações sobre ter sido posto na Sonserina foram muitas e bem gritantes, mas hoje vejo que o Chapéu Seletor não erra nem quando parece que a decisão foi equivocada: Alvo era o mais sonserino de todos, com uma ambição descomunal, competitividade aflorada e um desejo de vingança incontrolável. Ainda assim, era uma boa pessoa, de coração grande e indomável, características que por mais nobres que fossem, não pareceram suficientes a ponto de colocá-lo na Grifinória com todos os outros Potter-Weasley. Demorou uns anos, mas Alvo finalmente entendeu o seu lugar.

Cara, vem logo. O que diabos você tanto olha por essa janela? Tá ficando tarde e a gente precisa voltar. Anda, Malfoy.

Okay. Talvez a responsabilidade se somasse as poucas qualidades de Alvo tanto quanto lealdade e coração indômito. Mas a questão é que eu não queria ir, não queria desgrudar os olhos daquela janela porque precisava passar mais tempo com Rose, ainda que a metros de distância era como se fosse capaz de tocá-la nas bochechas mesmo que muita coisa nos separasse além de uma distância possível de ser quebrada e uma vidraça grossa e embaçada.

Alvo me venceu àquela noite, me puxou com tudo para fora da loja com um guarda chuva minúsculo que molhou metade das minhas roupas, mas não liguei, não liguei porque o estardalhaço na entrada da Dedos de Mel foi alto o suficiente para despertar a atenção de Rose e fazer aqueles incríveis olhos se voltarem diretamente para mim uma única vez.

Já sentiu como se o mundo parasse bem debaixo dos seus pés ou que o ar do planeta Terra todo foi sugado por qualquer outra pessoa, menos você? A sensação era parecida com isso. Meu pulmão tentou, tentou a todo custo puxar o máximo de ar que precisava para sobreviver, mas respirar tinha se tornado uma das maiores dificuldades da minha vida: era pesado, incômodo e arranhava os pulmões todas às vezes que tentava. Passados o que deveriam ser horas, mas que Alvo me disse depois que não tinham sido mais que alguns milésimos de segundos, consegui puxar os cantos da boca numa tentativa inútil — e desconfio que bem feia também — de sorriso. Ergui a mão não tão alto, mas o suficiente para um tchau desconcertado em meio a chuva que batia vez ou outra no meu ombro insistindo em me trazer de volta a uma realidade que eu não queria encarar.

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Estava bom ali, estava incrivelmente bom.