Killian

Milah arrastou-me até o meu escritório, bufando por todo caminho. Quando fiz o pedido para que Emma ficasse, eu já tinha uma breve noção de que aquela situação poderia acontecer. Que minha mãe não controlaria e demonstraria todo amor que sente por Swan com todo entusiasmo que podia. No entanto eu não podia negar que aquele encontro acontecesse o mais rápido possível. Por anos dona Jenna reclamara da falta que sentia de Emma e eu estava desesperado para deixar as duas mulheres contentes.

E a forma que Swan retribuíra minha mãe, abraçando-a de volta bem forte e com olhos fechados, aconchegando-se ali nos braços da Jones mais velha, fez meu coração ficar alegre com o carinho que as duas ainda mantinham.

O carinho e amor que sempre desejei que tivessem desde o inicio.

-Filha, Killian Jones? Ela chamou a criada de filha?– Milah bradou assim que fechou a porta. Adiantei-me para as cristaleiras, servindo licor em um copo. – Eu venho tentando fazer sua mãe me chamar de filha desde que ficamos noivos e nada! – ela gritou a última palavra.

Olhei para seu rosto vermelho enfurecido, os olhos injetados de raiva e ressentimento. Ergui as sobrancelhas e levei o copo até a boca.

-Minha mãe viu Emma praticamente crescer. Sem falar que ela sempre estava em casa, ajudando nas datas festivas a arrumar a paroquia. – falei lentamente e com cuidado. – É compreensível que sinta um carinho materno por ela.

Vi minha noiva abrir um sorriso enviesado para mim.

-É incrível como eu continuo a descobrir coisas que ligam o seu passado com o da criada. – comentou. Fixei meus olhos nela; atento com o que deixaria sua boca. – Primeiro descubro que trabalhou nos trigais e que eram amigos, tanto que jantou várias vezes na casa dela... Então agora, que sua mãe a viu praticamente crescer... Você também a viu praticamente crescer, Jones? – inquiriu com maldade.

Balancei a cabeça, pousando o copo na mesa. Forcei-me a continuar olhando para Milah. Se eu desviasse o olhar, ela iria desconfiar.

-Eu estudava, Milah. Raramente estava aqui. Apenas nos verões quando não ia para casa de amigos. Conheci Emma, no verão que terminei o colégio, antes de ir para a faculdade.

-Você a observa demais. –murmurou, rodeando-me, batendo o dedo indicador no queixo com se pensasse. – Não ficarei surpresa se daqui uns dias, descobrir que eram; um casal. – provocou. Prendi a respiração, sem tirar os olhos de seu rosto, concentrado. – Onde esteve quando passou a noite fora? – indagou.

-Na taverna bebendo, já disse.

-Na taverna onde ela trabalha?

-Emma não trabalha mais lá. – retorqui pela enésima vez. – A onde quer chegar?

Milah balançou a cabeça e parou ao lado do decanter, servindo-se de conhaque. Estudou o liquido âmbar, antes de virá-lo de uma vez na boca, colocando mais em seguida.

-Eu não serei trocada por uma criada. – declarou por fim, virando-se para mim. – Não deixarei que uma criada inútil receba mais afeto de sua mãe do que eu.

-E o que irá fazer, Milah? Não pode forçar minha mãe a nada... Ela não vem gostando nem de mim nos últimos tempos.

-Eu não irei fazer nada. Você irá. – informou. Arregalei os olhos ao ouvir suas palavras. Meu coração parou por um segundo, sentindo temor com o que aconteceria a seguir. Minhas mãos começaram a suar e tive que segurar a vontade que sentia de secá-las na calça. – Você irá gentilmente convencer sua mãe a me chamar de filha, assim como irá pedir para que ela me dê permissão para chamá-la de Jenna... Caso contrário, sua criada preferida irá perder muito mais do quê os cabelos... Farei questão de eu mesma arrancar os dentes dela.

-Você não faria isso. – sussurrei perplexo com o que acabara de ouvir. Sem acreditar como ela iria longe, apenas por causa de uma palavra.

-Ah, sem dúvidas eu faria. Não duvide de mim, querido. Se, tem uma coisa que não me agrada, é que as coisas não saiam do meu jeito. – Milah abriu um sorriso calmo. – Eu apenas não sabia o que usar para conseguir o que queria... Que sorte a minha ter a princesa dos trigais trabalhando aqui em casa. E que sorte sua mãe amá-la... Voltarei para a sala. Espero que já esteja pensando em como irá conseguir o meu posto como filha amada. – cantarolou, dirigindo-se para a porta, uma expressão de contentamento estampado no rosto.

Fiquei observando a porta, sentindo meus pelos todos eriçados com a raiva que borbulhava dentro de mim. Minhas têmporas latejavam e sentia as veias pulsando rápido demais. Passei a mão pelo rosto, em um gesto de completo desespero.

Se eu contasse para minha mãe o motivo pelo qual deveria chamar Milah de filha, ela pegaria suas coisas e iria embora, com Emma a tiracolo, sem nem relancear um último olhar em minha direção. Ceder a uma chantagem iria fazer tudo desandar ainda mais em nossa relação familiar.

No entanto, se eu não dissesse nada, eu sabia que Milah não iria hesitar em machucar, Emma. E se eu mandasse Swan embora, iria chamar muita atenção, o que deixaria a situação ainda pior. Com Emma ali, eu poderia cuidar dela, porém se eu a demitisse, ela voltaria para a taverna, porque precisaria do dinheiro e eu sabia que ela não aceitaria o meu de graça.

Peguei o decanter de conhaque e virei de uma vez na boca, sem me preocupar em servir no copo. Observei os contornos das árvores do lado de fora, sem saber o que fazer, quando algo estalou em minha mente.

-Belle. – balbuciei, abandonando a bebida e sentando-me, procurando por papeis em branco e os ajeitando com afobação em minha frente, enquanto molhava a ponta da pena na tinta, tentando conter o tremor nervoso em minha mão.

Belle, minha prima, filha do irmão do meio de minha mãe. Era sempre a ela que eu recorria em uma situação difícil. Ela sempre sabia o que fazer. E morava não muito longe dali, junto com marido, então era o meio mais fácil de resolver uma situação delicada.

Tinha certeza que Belle não recusaria o pedido que estava mandando na carta. Ela apareceria o mais rápido possível e com seu jeitinho paciente e meigo, iria convencer Emma a ir embora com ela, tirando-a do alcance de Milah antes que minha noiva pudesse fazer algo mais para machucá-la.

Recostei-me na cadeira ao terminar de lacrar a breve carta, quando uma batida tímida soou e logo a porta se abriu, revelando Emma com os lábios pressionados e olhos arregalados, até que me encontrou sentado. Sorri para ela, meu peito se aquecendo de ternura de apenas visualizá-la.

-Posso? – quis saber com hesitação. – Na verdade, não se preocupe. Apenas vim dizer que já estou indo e gostaria de saber se precisa de alguma coisa?

Soltei um suspiro, endireitando-me.

Preciso sim, Emma. De você. Como eu pude firmar um compromisso com uma mulher como Milah, sendo que eu tinha você?

Sua testa se crispou e, seu semblante ficou preocupado. Ela olhou o corredor com atenção, antes de entrar e fechar a porta as suas costas, aproximando-se sem medo da mesa.

-Está tudo bem, Killian? Milah está muito brava?

Assenti, levantando-me e andando até ela. Desde que me perdoara, com a graça Divina, porque eu achei que estava tudo perdido quando fui estupido de pedir para que se tornasse minha amante, eu queria viver recebendo seus abraços, que era a única coisa que eu poderia receber dela, sendo que só havia sido; abraçado uma única vez e foi quando Emma me perdoara.

Claro que não comentei com Swan, que sua declaração de que tinha me amado, no passado, seguia-me todo o tempo, pulando bem na minha frente, flutuando em todos os lugares como se zombasse de mim e sempre terminava grudando de modo permanente em minha mente no fim da noite, para que não tivesse perigo de eu me esquecer do “Eu o amei”.

Tinha curiosidade de perguntar se era realmente verdade o que me dissera. Nos dias que se seguiram a nossa reconciliação, toda vez que conseguíamos conversar, eu fazia questão de lembrá-la que ainda a amava, na esperança que Emma dissesse “Eu o amo também”; como costumava ser, em que eu dizia e ela respondia, fazendo meu coração bater ensandecido, tamanha a felicidade de ser amado de volta. No entanto, Swan parecia ficar sem graça e desconversava, nunca proferindo as palavras que eu esperava.

-Está furiosa... Só, por favor, tente ficar o mais longe possível dela. – pedi.

Emma me estudou. Olhos espertos, captando o que eu havia deixado nas entrelinhas, então abriu um sorriso malicioso, arqueando uma sobrancelha.

-Onde aprendeu a fazer isso?

-Isso o que? – perguntou confusa.

-A sobrancelha arqueada. – indiquei o fino risco louro que agora estavam franzidas.

Emma riu divertida, voltando a arqueá-la.

-Com você, oras. – respondeu simplesmente. – Eu achava fascinante o modo que você a erguia sempre que eu dizia algo que você considerava um desafio. Você sempre a ergue... – ela se inclinou em minha direção como se estivesse prestes a contar um segredo. – Esse truque é muito bom para flertar com as pessoas, não acha? – indagou, abrindo um sorriso misterioso ao me encarar com a sobrancelha arqueada.

-Acho que não é justo usá-lo comigo, quando sabe meus sentimentos por você. – comentei despretensiosamente. Aqueles poucos minutos de conversa com Emma, quase fizera com que as palavras de Milah se dissipassem de minha mente.

Quase.

—Desculpe, Killian. – Swan falou sem jeito, voltando a ficar séria. – Não foi minha intenção de modo algum. Não quero...

-Eu sei. – a tranquilizei, respirando fundo. – Eu sei, Emma.

-Acho melhor eu ir. Não se preocupe que ficarei o mais longe que puder de Milah. – garantiu. – É minha missão de vida manter distância dela, achei que soubesse. Tenha uma boa noite e principalmente sorte. – desejou, andando de costas até a porta. Ela parou por um segundo, colando sua orelha nela e fechando os olhos, depois de um segundo afastou-se e abriu a porta, acenando para mim antes de sair.

Voltei a olhar a carta lacrada em cima da mesa, pensando no seu conteúdo e esperando que ela fosse o suficiente para resolver todos os problemas.

Se Emma fosse embora, eu poderia ficar tranquilo em relação a tantas coisas. Saberia que ela estava sendo bem tratada e instruída, porque Belle se encarregaria disso. Minha prima acreditava piamente que todos deveriam receber estudos, por conta disso sempre tirava uma hora de seu dia e abria o salão de festas de sua casa para aqueles que tivessem interesse em aprender. Seu marido não gostava, mas preferia que sua esposa gastasse sua energia em algo para os outros, do que seu dinheiro, mesmo que fosse podre de rico, afinal, ela havia se casado com o conde de Berkshire e com toda certeza o homem possuía dinheiro para bancar todos os luxos que minha prima viesse a querer.

Fora isso, minha consciência estaria sossegada, de que ao estar com Belle, Swan não iria mais trabalhar na taverna se voltasse a passar aperto e em uma tacada só, eu a afastaria do oficial... Não que eu fosse decidir com que Emma iria se casar ou não, mas se era para ela se envolver com alguém, que ao menos o homem estivesse interessado em desposá-la.

O único problema seria convencer Emma a deixar os pais, todavia, eu pensaria nisso mais tarde. Primeiro eu precisava enviar a carta e esperar que minha prima concordasse em me ajudar.

Enfiei o envelope dentro do bolso da casaca, indo para o quarto dos meus pais no andar superior.

Tinha certeza que eles queriam conversar.

[...]

Entrei sem bater, encontrando os dois sentados na cama, conversando. Minha mãe estava com os cabelos soltos e usava o peito de meu pai como apoio, que por sua vez já tinha se livrado do casaco e da calça. Mesmo que já fosse um homem e soubesse que meus pais agiam como um casal, eu era a prova viva disso, senti meu rosto esquentando com a cena.

Eles olharam para mim e sorriram.

-Venha aqui conosco. – minha mãe bateu no colchão.

Pigarreie encabulado.

-Não. Eu não sou mais um menino. Seria estranho.

Vi meu pai dar de ombros e o sorriso no rosto de minha mãe se fechar.

-Mas age como um ao entrar sem bater. – ela retrucou, endireitando-se. – O que quer?

-Preciso querer alguma coisa para falar com vocês agora? – inquiri com mais acidez do que pretendia, me arrependendo logo em seguida com o tom que usei. – Imaginei que gostariam de conversar um pouco... Como foi a viagem?

-Um pouco desconfortável, afinal faz tempo que não viajávamos. – Brennan respondeu. – O pior foi o frio.

-Eu não sabia que Emma estava passando por uma situação tão complicada. – minha mãe proferiu de repente. – Quando fomos embora sabíamos que ela estava trabalhando na taverna... Ela nos pediu permissão.

-E vocês deram? Eu não acredito que deixaram que ela trabalhasse naquele lugar!

-Abaixe esse tom comigo, Killian Jones! – ela bradou com a voz firme. – Quando ela pediu, garantiu que era durante o dia, para ajudar a limpar e na cozinha. Nunca deixaria que ela ficasse no meio de homens bêbados.

-Por que não me avisaram disso antes?

-Faria alguma diferença? – minha mãe retorquiu, as sobrancelhas arqueadas em desafio.

-E tentamos ajudá-la, porém Emma recusou qualquer dinheiro vindo de nós. – meu pai acrescentou, massageando os ombros de minha mãe.

Assenti com a cabeça, sabendo bem como Swan podia ser teimosa quando o assunto era aceitar dinheiro.

-Eu deveria tê-la levado conosco para Londres. – minha mãe murmurou com a voz embargada. – Como pôde deixar que ela vendesse os cabelos, filho? Emma gostava tanto deles... E a menina parece tão infeliz. Deve estar sendo difícil para ela ter que trabalhar aqui. Você irá amanhã mesmo oferecer ajuda aos pais de Emma. – decretou, apontando o dedo em minha direção. – Nada disso estaria acontecendo se não tivesse entrado na vida dela.

-Em primeiro lugar: eu teria impedido se soubesse que Swan iria vender os cabelos. Acha mesmo que não me importo com ela? Desde que eu cheguei aqui venho tentado me aproximar querendo ajudá-la e Emma apenas me afastava... – com todos os motivos do mundo, mas eles não precisavam saber de todos os acontecimentos que precederam até o momento que Emma me perdoara. – Vocês sabem que meus sentimentos por ela nunca mudaram.

-E ainda assim aqui estamos. – meu pai retorquiu, indicando o quarto luxuoso.

-É tão difícil se colocarem em meu lugar? Emma se colocou e foi capaz de perdoar.

Minha mãe sorriu com pesar.

-O problema, é que você tenta se convencer que, foi por esse motivo nobre que abriu mão do amor, quando na verdade , nós três sabemos que sua ganância foi mais forte que qualquer sentimento. – afirmou calmamente. – Meu irmão não é tão influente a ponto de fazer com que não conseguisse arrumar um emprego, filho.

-Eu a ajudei. Ofereci dinheiro para ela e quando recusou fui até seus pais. Fiz com que prometessem para mim que Emma não trabalharia mais na taverna. Prometi que ajudaria a pagar o casamento dela. – engoli em seco, respirando fundo, fechando as mãos em punhos. – Eu pedi perdão e ela me perdoou. E ainda me deu a amizade dela quando sei que não merecia nem isso por tudo o que causei. Eu ainda a amo e vocês não sabem nem a metade que sofri nesse tempo por querer me aproximar dela e ser afastado com rispidez por uma mulher que...

-Você é adulto, filho. E sabe as decisões que toma. – meu pai me cortou. – Não precisa ficar se justificando. Se sente que é certo o que está fazendo, quem somos nós para mandar na sua vida? Não temos direito de opinar nela desde que foi embora para a universidade. Contudo podemos mostrar que não estamos satisfeitos. – deu de ombros, como se não fosse insistir no naquilo. – Amanhã quero visitar antigos conhecidos. –ele mudou de assunto, o tom de sua voz se suavizando. – Gostaria de ir comigo?

Aquiesci, de repente sentindo falta do colo que os dois me davam. Agora eles me tratavam mais como um conhecido deles, do que filho. Olhei para minha mãe e perguntei-me quanto tempo fazia; que não conversávamos sem nos desentender de alguma forma.

-Claro, pai... – concordei, achando que seria bom passar um tempo com ele. – E mãe, por favor, evite mostrar tanto carinho por Emma perto de Milah. Ela ficará brava.

-E eu lá me importo com a sua noiva? – retrucou.

-Acontece que Milah já não gosta muito de Emma, talvez piore a situação se tratar Swan melhor.

-Ela que não se atreva a fazer mal a Emma perto de mim. Eu sou muito boa e paciente, contudo não sou mais esposa de um pároco e posso muito bem revidar a altura. Está avisado, Killian. Não mudarei o jeito que trato Emma para agradar a desagradável de sua noiva.

-Só tentem facilitar as coisas, por favor. É só isso que estou pedindo. – supliquei cansado, esperando que a mulher garantisse para mim que iria se controlar.

Seus olhos azuis tão parecidos com os meus, estudaram-me atentamente e seu corpo relaxou, quando a mão de meu pai acariciou seu braço. Sua boca retorceu um pouco e um suspirou deixou seu nariz.

-Venha cá, filho. – chamou, indicando o espaço livre ao lado dela. Adiantei-me e sentei, fitando o seu rosto, sentindo-me uma criança novamente. – Não vim aqui para discutir com você e nem tornar sua vida mais complicada. Eu só estou feliz de ver a Emma, apenas isso. Eu gosto da garota.

-Sei disso, mãe. Sei que gosta dela.

-Era ela que eu esperava que fosse minha nora... Não gosto de Milah, mas estou tentando respeitar sua decisão. – Jenna olhou brevemente para meu pai, como se buscasse as palavras. – Eu ainda o amo, filho. É isso que tem que saber. Sei que não somos mais a família de antes e que não demonstro mais como foi um dia, contudo eu ainda o amo e se mesmo depois de conviver com Emma não mudou sua cabeça sobre seu casamento com Milah, tenho certeza que está bem certo quanto a sua decisão... Acredito que esteja na hora de nós dois a aceitarmos como uma Jones. – declarou por fim, soando melancólica.

Observei seu rosto, perplexo com o que tinha ouvido e olhei para o meu pai, esperando que ele dissesse alguma coisa para contradizê-la, afirmando que não aceitava Milah de forma alguma usando seu sobrenome.

Com a permissão dos meus pais, a aceitação dela como parte da família, mesmo que fosse contra a vontade deles, agora eu não teria mais desculpas para adiar o casamento. Se minha noiva ficasse sabendo que já era vista como uma Jones, o casório seria marcado no inicio do verão e eu não poderia fazer nada para que ele não acontecesse.

-Podemos não avisar para os outros ainda? – pedi com a voz inaudível.

-Por que quer esperar, filho? – Brennan quis saber. – É melhor acabar com isso de uma vez e cumprir com a palavra que fez.

Balancei a cabeça em uma negativa, segurando nas mãos de minha mãe como um menino com medo por causa de um palhaço.

-Eu não estou pronto. Não quero me casar tão já. – respondi. – Eu não a amo... Eu não a suporto... Para ser sincero, eu não sei mais de nada. – confessei assustado. – Eu achei que soubesse, mas desde que voltei para cá... Está tudo tão confuso.

A cabeça de minha mãe tombou levemente para o lado, para poder olhar em meus olhos e então me puxou para os seus braços, apertando-me forte e garantindo que estaria ali para o que eu precisasse. Que ficaria do meu lado, independente de qual fosse minha escolha.

[...]

Sai do quarto deles já era meia- noite passada e, a casa estava escura. Deixei os dois dormindo, depois de conversamos de verdade, coisa que não fazíamos desde que fomos morar na cidade. Eles perguntaram como eu estava me sentindo, o que estava me incomodando, querendo saber como podiam me ajudar.

Asseguraram-me que se o meu desejo fosse romper o compromisso com Milah, eu poderia fazê-lo, que os dois dariam um jeito de quebrar o contrato que meu tio fizera com o Sr. Odom.

E só Deus sabia que tudo o que eu mais queria era ver aquele contrato cancelado, deixando-me livre. Mas eu me colocara nele, eu teria que achar um jeito de sair sozinho.

Entrei em meu quarto, sentindo-me exausto do dia e tirei a casaca, ouvindo a carta que eu deveria ter enviado no bolso. Tinha que me lembrar de fazer aquilo pela manhã bem cedo, para que chegasse o mais rápido possível nas mãos de Belle.

-O que tanto vocês conversaram que o fez perder o jantar? – a voz de Milah soou as minhas costas e eu me virei, encontrando-a sentada na cama, já em suas vestes de dormir.

-Assunto dos Jones, Milah... O que está fazendo aqui? – indaguei sem paciência e irritado pela invasão.

Ela se levantou calmamente e caminhou devagar até mim. Deslizou a costa de sua mão esquerda por meu pescoço e seu toque fez com que eu me retraísse. Seus olhos me fitaram com curiosidade e rápida como uma gata, suas mãos já estavam em meu rosto, sua boca pressionada contra a minha, exigindo um beijo.

Mantive os lábios pressionados, recusando-me a retribuir, o corpo todo recuado, querendo se livrar de seu toque e o estômago se revirando de agonia para que aquilo parasse.

Uma de suas mãos soltou meu rosto e buscou a minha com determinação, levando-a para debaixo de sua camisola.

-Você pode me tornar uma Jones agora mesmo. – balbuciou. – E me contar esse assunto.

Fechei a mão em punho, ficando imóvel tamanho o choque que estava sentindo naquele momento. Quando Milah percebeu meu estado, soltou-me, escrutinando com atenção todo meu corpo.

-Achei que você quisesse isso. – declarou com a voz fria.

-E o que a fez pensar isso? Acha mesmo que eu a levaria para a cama antes do casamento?

Um sorriso vagaroso surgiu em seus lábios.

Um sorriso de puro escárnio.

-Se não sou eu que, quer levar para a cama, pergunto-me quem deve ser a mulher que povoa seus sonhos durante as madrugadas, que o faz se levantar para ir tomar um ar... Ou se aliviar sozinho. – Milah pegou em meu pênis e o apertou. Olhei-a assombrado com seu gesto atrevido. – Ah eu escuto, meu querido. E vejo... É a criada? – inquiriu levemente.

-Ninguém que você conheça. – atalhei sem convicção.

Milah balançou a cabeça, rodeando-me.

-Eu sei mais de você, do que imagina, Killian querido... Como sei de suas escapadas noturnas para deixar flores em algum lugar... Ou a encomenda de um vestido que fez na loja da vila... – mussitou ao pé de minha orelha. – Nem pense, por um mísero segundo em seguir os passos de meu pai. Eu não sou a patética da minha mãe que irá aceitar uma traição. Está me ouvindo?

Engoli em seco e assenti; a voz perdida em algum lugar.

-Ótimo... Foi à segunda conversa com ameaças só no dia de hoje... Espero que se comporte, ou verá que não faço somente ameaças. – ela parou a minha frente, o semblante triste. – Eu o amo, Killian... E não deixarei que nenhuma mulher fique no meu caminho para tê-lo. Não importa quem seja. – concluiu, saindo do quarto sem dizer mais nada.

Continuei no mesmo lugar, sem ousar me mexer assimilando as palavras de Milah. Era um fato que nos últimos dias, desde o episódio do baile para ser preciso, que os sonhos com Emma haviam ficado mais intensos. Tão intensos, que eu acordava sentindo dor e precisava voltar o normal de alguma forma. Tinha vez que o ar frio ajudava; outras não e eu necessitava dar um jeito, porém Milah só ficaria sabendo disso se invadisse meu quarto no meio na noite...

Olhei para a porta e constatei que eu nunca a trancava. Não achava que seria necessário. Sabia que minha noiva era desagradável, mas a informação de que era uma louca era completamente nova para mim.

Meu coração batia alto em meus ouvidos e eu sabia que estava respirando com dificuldade. A vontade de pegar meus pais e sair dali era grande. Sair dali e levar Emma junto. Poderíamos começar em outro lugar... Um outro país, talvez.

Balancei a cabeça, repreendendo-me. Fugir seria covardia. O que eu precisava fazer era tirar Emma do alcance de Milah e continuar pensando em modo de romper com o compromisso que havia firmado.

Se eu já não me sentia nem um pouco disposto a concretizar aquele casamento, depois do ocorrido no quarto, a última coisa que desejava era passar o resto dos meus dias preso a Milah.

Vesti a casaca, apalpando o bolso para garantir que a carta estava lá e tranquei a porta, indo para a janela. Observei a distância até o chão e rapidamente tracei qual seria a melhor rota para tomar e chegar em segurança. Para a minha sorte, as paredes da casa eram cheias trepadeiras, o que facilitava a descida, eu só precisava ser cuidadoso e torcer para que ainda conseguisse fazer aquilo. Quando moleque, era comum escapar a noite junto com os outros garotos dos dormitórios do colégio e nossos quartos sempre ficavam nos andares superiores. Eu havia aprendido onde colocar os pés e segurar.

Tinha que conseguir.

Apalpei a parede até sentir o ferro que ajudava as plantas subirem e o segurei com força, prendendo o pé direito ali, antes de ir com o corpo. Relanceei os olhos para o chão e de volta para o quarto, com medo de encontrar Milah me observando de alguma forma. Olhei rapidamente as janelas próximas, encontrando-as escuras e comecei a descer vagarosamente, para não ter perigo de acabar soltando o suporte da parede com o meu peso e assim me derrubar, entregando a minha escapada.

Quando meus pés tocaram o chão, limpei minhas mãos na calça e sorri satisfeito por não ter perdido o jeito. Dei uma olhada ao redor, soltando o ar, que criou uma nuvem branca bem diante dos meus olhos. Eu sabia que estava frio, porém meu corpo suava, do esforço que fiz para descer ou do medo que começava a sentir de Milah ser alguma espécie de doente.

Comecei a correr em direção à vila, determinado, que a carta saísse na primeira diligência. Estava até disposto a pagar se fosse necessário para que algum mensageiro a levasse pessoalmente se isso significasse que ela chegaria mais rápida as mãos de Belle.

Depois de um pouco mais de meia hora de caminhada, diminuí o passo ao visualizar as lanternas acesas da rua. Eu não sentia a ponta de meu nariz, gelado e congestionado, por mais que meu corpo estivesse quente da caminhada.

-Veja se não é o riquinho! – Graham exclamou da porta da delegacia onde estava escorado. – Veio arrumar confusão?

-Para sua infelicidade, não.

Ele estalou a língua, antes de cuspir o fumo que mastigava.

-Então... Ao que deve a sua visita até aqui? Está tarde para uma caminhada.

Revirei os olhos.

-Com todo respeito oficial...

-Ah! Agora é com todo respeito. O que aconteceu com seu respeito àquela noite que decidiu socar a minha cara por nenhum motivo? – permaneci em silêncio, não querendo arrumar briga com o homem uma vez mais. – Não tinha direito algum de fazer aquilo, Jones. Você sabe que ela te esperou. Durante nove malditos anos eu a vi te esperar em silêncio. Ela nunca soube que eu tinha conhecimento do relacionamento de vocês. – atalhou, vindo em minha direção.

Humbert sabia. Em uma das noites que havia saído para me encontrar com ela, eu o vi, nos observando ao longe, contudo com os anos eu tinha completamente me esquecido que a figura parada na escuridão era ele.

-Tudo o que eu quero é que pare de brincar com Emma. – pedi em um tom apaziguador, mostrando que não queria brigar.

-Não se preocupe. Não me chamo Killian Jones. – falou com cinismo. – Somos amigos e nada além disso. Emma deixou bem claro. – contou.

-Bem... Então evite beijá-la. – aconselhei. – Agora, se me dá licença, eu preciso ir. – indiquei o caminho para o correio.

-Você é um idiota, sabia? – gritou as minhas costas. – Quando decidir que quer ficar com ela, será tarde demais. Emma será sua escolha definitiva, mas você não será mais a escolha dela.

Parei, absorvendo o que Humbert havia acabado de dizer. Voltei-me para ele, vendo-o colocar fumo na boca e começando a mascar novamente. O homem ergueu o pacote, oferecendo-me e rejeitei com um balançar de cabeça.

-Como pode dizer com tanta certeza isso?

Graham sorriu; seus olhos se fechando de leve.

-Apesar de não estar gostando muito de você no momento, eu o conheço o suficiente para dizer com tanta certeza que o homem que seu tio tentou te transformar não durará muito tempo. Está ruindo a cada dia, enquanto o rapaz que saiu daqui luta para voltar à tona. Essa carta aí... – ele indicou o envelope em minha mão. – É provavelmente um modo de afastar Emma de tudo isso... Da taverna... Da pobreza... De mim... E principalmente de sua noiva. – concluiu com um dar de ombros. – Acertei?

O escrutinei com atenção, perguntando-me como ele sabia tanto. Por fim, aquiesci, dando as costas para ele e voltando a caminhar, com suas palavras ainda rondando a minha mente.

[...]

Assim que deixei a carta na mão do homem, com súplicas para que a não fosse extraviada de forma alguma, voltei andando sem pressa e sem a mínima vontade de entrar na casa da família Odom.

Quando concordei com a exigência de meu tio, achei que não seria tão difícil. Eu ainda amava Emma, porém achei que poderia dar um jeito. Milah parecia uma moça adorável e era bonita, não como Swan, mas mesmo assim, na minha cabeça era a melhor solução. Não queria voltar com as mãos abanando depois de anos afastado para ter uma vida melhor e, mesmo que me envergonhasse agora de tal pensamento, não queria perder o dinheiro. Eu havia me acostumado muito com o luxo que adquirira.

Gostando de admitir ou não, eu havia me tornando um homem superficial e meus pais estavam certos. Eu afirmava ter escolhido o dinheiro por uma boa causa, quando fora unicamente para que eu mantivesse meus luxos.

Antes que eu pudesse perceber, já estava batendo na janela de Emma, como um dia costumava fazer. Espiei o interior, encontrando-a dormindo encolhida, quase se transformando em uma bola.

Seria maldade demais tirá-la de casa naquele horário para que eu pudesse conversar com ela e contar o que acontecera. Informar que Milah era louca e que deveria ser ainda mais cuidadosa, já que eu tinha certeza que minha noiva sabia.

Bati mais uma vez e ela se remexeu, parecendo incomodada. Eu tentaria mais uma vez e se não acordasse, iria embora, de volta para a casa e daria um jeito de conversar com Emma no dia seguinte.

Dei três toques decididos e esperei um momento. Swan piscou com preguiça, encolhendo-se debaixo do cobertor puído que usava. Acenei para ela e vi seus olhos se arregalarem de surpresa.

—Killian! – Emma exclamou baixinho de alegria ao abrir a janela rapidamente e jogar seus braços ao meu redor, antes de me dar um beijo rápido. – Senti sua falta. – murmurou.

-Eu também, minha menina. – murmurei, beijando sua bochecha, enquanto a pescava para fora e a colocava no chão. – Vestido novo? – indaguei, estudando a peça verde que estava usando.

-Não exatamente. Foi doação para a igreja. Sua mãe separou alguns para mim. – contou, parecendo sem graça.

-Está deslumbrante, Emma. – elogiei, vendo um sorriso surgir em seus lábios.

-Obrigada, Killy. – agradeceu enrubescendo levemente. – Vamos antes que meus pais acordem.

-Hoje nós iremos para outro lugar. – informei.

Ela me estudou com curiosidade e me senti nervoso. Enquanto seus olhos verdes passeavam pelo meu rosto, em busca de respostas, perguntei-me pela enésima vez se aquilo seria uma boa ideia.

-Encontrei um celeiro abandonado... – falei pausadamente, cuidando sua reação. – Achei que poderíamos ficar mais a vontade lá, sem correr o risco de ninguém nos ver.

O peito de Emma começou a descer e subir lentamente, sua respiração estava audível e podia dizer pela forma que seu corpo se empertigou que estava nervosa.

-Ou não. Vamos para nosso lugar de sempre.

-Não. – Swan segurou com firmeza em minha mão. – Vamos até lá. Eu quero. – murmurou. – Quero mesmo.

-Tem certeza? – inquiri, procurando em seus olhos alguma pontada de dúvida que viesse estar sentindo.

Emma assentiu, entrelaçando nossos dedos.

-Eu o amo, Killy. – falou com a voz rouca.

Soltei uma risada leve.

-Não é nada disso que essa cabecinha está pensando.

-Como sabe o que essa cabecinha está pensando?

Afaguei seu rosto, beijando o canto de sua boca e afastando-me rapidamente.

-Apenas depois do casamento, minha menina... Mas será algo; que irá satisfazer nós dois. – prometi.

Emma bufou, revirando os olhos.

-Não pensei nisso, Killian. – retrucou, aproximando-se de mim, a boca próxima a minha. – Não posso mais dizer-te eu o amo, que já pensa que quero outra coisa que tire as roupas?

-Claro que pode dizer. Quantas vezes quiser.

-Bom... –murmurou, sapecando um selinho em meus lábios.

—Também a amo, Emma. – afirmei com toda a certeza do mundo, enquanto a puxava em direção ao celeiro.

Swan se ajoelhou na cama e abriu a janela.

-Killian? – indagou, coçando o olho. – O que está... – Emma reprimiu um bocejo. – Fazendo aqui?

Meu nariz começou a arder ao observá-la. Os olhos pequenos de sono, a voz mole e os lábios que um dia me receberam com beijos quando aparecia em sua janela.

-Preciso conversar com você.

-Agora? Não pode esperar até amanhecer? Logo iremos nos ver novamente... Eu estou cansada. – balbuciou, fechando os olhos.

-Será rápido, prometo. – ofereci minha mão para ela. Emma a fitou; sem parecer disposta a aceitar e, por um momento achei que iria fechar a janela e voltar a dormir, todavia, ela pulou da cama e prendeu uma capa em seu pescoço, calçando sapatos. Então retornou, aceitando minha ajuda para sair.

-Você está abusando do meu bom coração. – murmurou, deixando que eu a guiasse. – E eu o odeio por isso.

-Odeia nada. – retorqui levemente, olhando para seu rosto que tinha um pequeno sorriso nos lábios. – Você sabe que eu não estaria aqui nesta noite fria se não fosse importante.

-Está fria mesmo. – murmurou. – Ainda bem que não começou a nevar sem parar. Meu pai sofre muito quando neva. – contou.

Ficamos andando em silêncio, a fumaça branca que saía de nossos narizes ao expirar dançavam bem a nossa frente. Emma ficava soprando para que elas aparecessem e parecia se divertir ao observá-las.

Paramos em frente ao antigo celeiro abandonado, que estava em uma situação pior do que eu me lembrava. Agora estava quase todo destelhado e uma parte dele já havia cedido. Emma parou de supetão, estudando-o.

-Por que me trouxe aqui?

-Imaginei que seria um pouco mais quente para conversarmos. – respondi com cautela.

Swan se afastou um passo, parecendo desconfiada.

-Você quer apenas conversar, certo?

Fiz que sim, deixando que ela visse meus olhos. Swan indicou que eu fosse em frente e eu me adiantei para a construção precária, encontrando-a mais suja que o normal.

Emma se abraçou e olhou tudo ao redor, como se fosse à primeira vez. Procurei a lamparina que havia escondido anos atrás e para meu alivio ainda estava ali. Tive um pouco de dificuldade para acendê-la, no entanto logo uma luz alaranjada mesmo que pequena, iluminava o ambiente.

Aproximei-me dela, vendo seu rosto retorcido, até que me fitou; os olhos vermelhos.

-Boas lembranças aqui. – sussurrou. – E dolorosas. – acrescentou com a voz embargada. – Ainda bem que tivemos a decência de não prosseguir... Estaria provavelmente ferrada.

-Você se arrepende? – quis saber com medo da resposta.

Emma balançou a cabeça em uma negativa.

-Não. Eu o amava. – e ali estava a palavra no passado de novo. – Não me arrependo de nada que fiz quando eu o amava. Não me arrependo de tê-lo deixado me conhecer... Teria me arrependido se tivesse arrancado o vestido e você suas calças. – brincou. – Mas permanecemos vestidos e apenas mãos estavam envolvidas. Como você prometeu aquela noite. – lembrou. –Está tudo certo... O que tinha de tão importante para falar comigo? – indagou.

Engoli em seco, forçando minha mente a focar nos assuntos que eu queria tratar com Emma e não no fato que ela afirmava não me amar mais.

-Ahn... Milah. – soltei.

—O que aconteceu? - quis saber, preocupada.

—Eu estava errado. Milah é uma quenga pelo prazer de ser, a mulher é louca.

— Tirou-me da cama só para dizer algo que eu já sabia?

—Ela ameaçou machucá-la de novo, Emma. E acho que ela está desconfiando de nós.

—Nós? Que nós, Killian?

—Do que nós costumávamos ser. - expliquei e respirei fundo. - Amigos contam tudo um para o outro, certo?

—Sim. Pelo menos eu conto tudo para Tinker e vice- versa. – confirmou, aproximando-se, os ombros encolhidos.

— Ótimo. Milah invadiu meu quarto mais cedo, apenas com as vestes de dormir...

—Wow, wow, wow! – ela gritou erguendo as mãos. – Poupe-me dos detalhes sórdidos, Killian.

Olhei irritado para Swan.

—Emma… Eu não consigo!

—Me poupar dos detalhes sórdidos? - indagou, com a testa franzida de confusão e hesitação.

—Sentir nenhuma pontadinha de prazer por Milah. Ela entrou exigindo um beijo e… Pediu que eu a levasse para a cama. Já não é a primeira vez que isso acontece. – contei sem jeito, vendo a mulher a minha frente fazer uma careta de nojo, como se estivesse prestes a vomitar. - Mas eu não consigo. Meu corpo se retrai de asco. – falei frustrado e fungando ao sentir meu nariz escorrendo ao começar descongelar.

—E o que você espera que eu faça? Vá pra cama com ela no seu lugar? Desculpa, mas ela não faz meu tipo… E sabe; eu acho que nem eu faço o dela. Eu tenho as bolas aqui em cima... – Swan indicou os seios cobertos. – E não lá embaixo. E tenho certeza, que assim como eu, ela prefere as lá de baixo. Talvez seja a única coisa que tenhamos em comum. – falou pensativa.

Emma proferia as palavras com a expressão séria, como se o que estava falando fosse normal e não algo baixo, que você esperava ouvir em uma roda de homens.

—Quando foi que você se tornou tão desbocada? - inquiri embasbacado com ela e sua naturalidade.

—Desculpe. Estava tentando te deixar relaxado... – explicou e, percebi o tom dela mudar. – E os anos em uma taverna fizeram isso... Sei falar coisas mais grosseiras e sujas se quiser ouvir. – ofereceu.

Balancei a cabeça, declinando a oferta e sentindo falta da garota meiga que ela costumava ser.

—Certo… O que tem a ver o que éramos com o fato de não sentir desejo por Milah?

—Essa não foi a primeira vez que ela invadiu o meu quarto e bem… Milah sabe que ando tendo certos sonhos… - pigarrei, o rosto pegando fogo. - Quentes. - completei em um sussurro, erguendo os olhos para ver seu rosto.

Suas sobrancelhas estavam arqueadas e a cabeça levemente inclinada. Os lábios pressionados em uma linha fina, a testa crispada, enquanto pensava sobre o que eu tinha falado.

-Ah meu Deus, Killian! - ela gritou de repente, fazendo-me sobressair de susto. - Você vem tendo sonhos quentes comigo? - Emma questionou incrédula, apontando para o próprio peito; seu rosto adquiriu uma cor arroxeada. Aquiesci constrangido. - E chamou meu nome?

—Eu não sei. Geralmente estou dormindo, sabe?

—Isso definitivamente não é algo que deva compartilhar com uma amiga. Ainda mais se os sonhos forem com essa amiga… - murmurou, abanando o rosto. - Céus, Killian. Você não pode ter esses tipos de sonho comigo. – censurou-me.

—Talvez eu não os teria se você não tivesse tirado a roupa na minha frente. Eu estava muito bem obrigado, sem saber como era o corpo por baixo desses panos. - apontei para sua camisola.

—Eu não teria tirado a roupa se você não tivesse sido um imbecil controlador… - retorquiu plantando as mãos no quadril. – Tá. Vamos voltar ao nosso problema: A possível descoberta de Milah que… Tivemos um caso.

—Foi um noivado. - corrigi.

—Um caso. Você não chegou a pedir minha mão para meu pai. – rebateu com indiferença. – Tudo bem... Eu preciso me afastar para que Milah pare de pegar no seu pé e desse modo sua mãe dê atenção para ela. – falou para si mesma, mordendo a ponta do indicador. – Se eu pedir demissão vai dar muito na cara?

—Um pouco talvez... Mas o que você faria se não trabalhar lá? – instiguei e ela olhou para mim sugestivamente. – De modo algum. Não a quero na taverna novamente.

Emma bufou, revirando os olhos.

-Se eu ficar na casa, Milah irá criar situações para nos pegar no flagra... – Swan parou. – Não que tenha algo para ser descoberto... Posso tentar mudar meus afazeres... Ir buscar comida! Com o frio, sempre é preciso ir atrás de alimentos nas cidades vizinhas, já que as plantações das estufas das fazendas daqui não são muitas.

—Não seria perigoso? Você ficar pegando estrada?

—Você tem uma ideia melhor? – questionou com petulância. – A noiva maluca é a sua e quem tem que dar um jeito sou eu?

Assenti, sem achar as palavras certas para retrucar. Mesmo sem estudo, Emma tinha um espirito para liderar que dava inveja. Ela pensava nos modos de sair das situações e tentava enxergar como seria cada uma delas. Reparava em seus olhos e como se mexiam rapidamente de um lado para o outro, enquanto seu cérebro trabalhava.

—Peça para o Sr. Odom mudar meus afazeres. – declarou. – Elas não ousarão contradizê-lo. Será mais fácil desse modo e não levantará suspeita.

—Tudo bem... Irei conversar com ele antes de descer para o café da manhã. – afirmei. – Acho que irá funcionar... Desculpe por tirá-la da cama.

Emma fez um sinal de descaso.

—Foi bom você ter avisado logo, porque assim fico preparada para o pior. E não quero que sua mãe nem seu pai, se machuquem por minha causa... Me acompanha até em casa?

-Claro. – segurei sua mão, colocando-a no interior de meu cotovelo. – Irei pensar em um modo para afastá-la de Milah sem que você tenha que se sacrificar tanto.

Emma estalou a língua como se desaprovasse o que eu tinha dito, olhei para o seu rosto, para incitá-la a falar o que passava em sua mente.

-Se você a despreza tanto... Por que continua noivo dela? – inquiriu com curiosidade. – Não faz sentido para mim. Tudo bem, que você terá como dar uma boa vida aos seus pais, porém duvido que eles, ficariam felizes de saber como está infeliz e sendo atormentado por essa escolha.

-É um pouco mais complicado do que pensa, Emma. Existe um contrato real que meu tio assinou em meu nome. Se eu quiser romper o noivado, o Sr. Odom tem que aceitar que o contrato seja quebrado. Caso contrário, eu posso ficar evitando o casamento, mas continuo preso a Milah, já que não posso pedir a mão de outra mulher.

-O que aconteceria se você pedisse?

-Eu seria preso. – respondi, soltando uma risada sem humor. – Não seria extraditado, porém estaria manchado para o resto da vida.

Swan ficou pensativa, a cabeça baixa.

-Sinto muito por ter insistido para que fosse. Eu achei que seria o melhor para você. Nunca quis que se tornasse infeliz. –murmurou; os olhos marejados. – Desculpe-me.

Parei, fitando seu rosto marcado pela culpa. Apesar das palavras não adequadas que vivia proferindo, ela ainda estava ali. Minha menina. Aquela que prezava a felicidade de todo mundo antes da dela.

-Eu fui tão injusta com você, Killy. – falou, jogando os braços ao meu redor e apertando-me. – Perdoe-me. Eu estava tão perdida em minha dor, que não olhei para sua. Não prestei atenção. Eu sou uma pessoa horrível. – fungou, afastando-se.

-Não peça desculpas por nada, Emma. Nada disso foi culpa sua... Você não é horrível. Não há problema nenhum em só olhar para os próprios problemas. E sua dor era tão maior do que a minha, que estava a consumindo, então eu cheguei e a tornei pior. Se for assim, eu sou uma pessoa horrível também. Bem mais horrível do que você... Porque apesar de pensar nos meus pais, eu pensei em mim primeiro. Fui egoísta. Tornei-me um homem ganancioso... – confessei para ela. – E ao me transformar nesse homem, trouxe junto a minha infelicidade. Tudo isso é culpa minha. Minhas escolhas desencadearam toda essa confusão de agora... Mas eu vou consertar; minha menina. – levei minha mão ao seu rosto, afagando com cuidado e vendo-a fechar os olhos, uma lágrima solitária descendo rápida por sua bochecha. – Prometo para você que vou.

-Não faça promessas que talvez não poderá cumprir. – sussurrou, abrindo os olhos esmeraldas brilhantes para mim, enquanto apertava minha mão contra o seu rosto.

-Eu a amo, Emma. Sempre, sempre a amei. – declarei de novo, aproximando-me dela, vendo-a erguer o rosto em minha direção, os olhos grandes demais e ansiosos, exatamente como eu me lembrava da primeira vez que a beijei...

Então ela piscou e sorriu matreira, separando-se de mim, uma vez mais e balançou a cabeça em uma negativa.

-Continuar tentando me beijar não é um bom jeito de lidar com sua falta de desejo por Milah...

-Nem pensei em Milah agora nesse momento, para ser sincero. – resmunguei; frustrado por ela ter se afastado de novo, quando eu estava tão próximo de beijá-la. – Isso que você faz é tortura.

-O que? Afastar-me de você por ser comprometido? – Swan estalou a língua. – Puxa! Que monstro que eu sou. Você está aqui porque sua noiva descobriu sobre nós e seus sonhos e, ainda quer colocar mais lenha na fogueira?... Por sinal... Conte-me como são esses sonhos. – pediu provocativa e soltando uma gargalhada quando engasguei com saliva ao ouvir seu pedido.

-Realmente, muito engraçado rir de um homem nestas situações embaraçosas.

Emma deu de ombros, adiantando-se para sua janela.

-São sonhos normais, Killy, todos os homens têm. Sei disso, porque ouvia bastante sobre eles na taverna. Não deveria se sentir acanhado por isso.

-Posso dizer que geralmente estou sem roupas, assim como você... E ah! Tem uma cama envolvida. – contei, tentando usar o mesmo tom natural que ela ao falar sobre aquele assunto, enquanto eu sentia o pescoço esquentar. Eu olhava para qualquer lugar, menos para o seu rosto ao falar.

-Chocante! – zombou rindo. – Você é...

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-O que? O que eu sou?

-Geralmente os homens não se sentem envergonhados de dizer coisas do gênero; mas você sempre foi assim. Fica vermelho, olha para o céu, coça a nuca, demonstrando o quanto não fica à vontade com o assunto, enquanto tenta manter a voz natural. Eu gosto disso.

-Não me sinto à vontade mesmo, tratando desse assunto com uma mulher.

-Eu sou sua amiga e não sou tão santa, Killian... – retrucou. – Boa noite. Espero que consiga dormir bem.

-Obrigado, Emma. – aproximei-me da janela quando Swan estava para fechá-la. – Você melhorou minha noite e meus ânimos de uma forma que não faz ideia.

-Minha presença tem disso. Eu sou uma pessoa maravilhosa. - retorquiu exibida. – Fico feliz de ter ajudado. Agora, por favor, pode me deixar dormir?

Anuí dando um passo para trás e observei-a fechar a janela, acenando para mim e pulando da cama, livrando-se da capa.

Caminhei de volta para casa, sentindo-me menos preocupado e com um sorriso que recusava a deixar meu rosto.

[...]

-Onde está Emma? – Milah indagou assim que entrou na sala de jantar para tomar o café e passou os olhos claros pelo ambiente, procurando-a.

Curiosamente, aquela havia sido a mesma pergunta que minha mãe, agora muito emburrada enquanto comia, fizera.

-Mandei-a trocar com Anny. – Sr. Odom respondeu, sem erguer os olhos de seu prato. – Ela agora vai buscar comida.

-E quem irá acender as lareiras? – perguntou indignada.

-Qualquer outra criada sabe fazer isso... Talvez você possa aprender também. – o visconde largou os talheres olhando para a filha, que tinha um bico formado no rosto. – O que você quer com Emma?

-Nada. – cuspiu, sentando-se ao lado de meu pai, que ergueu a cabeça e sorriu para ela com a boca cheia. Minha mãe reprimiu a risada ao meu lado, ao ver a expressão de nojo na cara de minha noiva ao fixar os olhos na boca do velho Jones. – Bom dia, Sr. Jones. Vejo que está aproveitando a comida.

-Ah tim. – concordou, cuspindo nela ao falar. Jenna ergueu a mão, segurando os lábios, para evitar que o som da risada saísse. – Está ótima!

-E quanto à senhora? Teve uma boa noite? – Milah se virou cordialmente para minha mãe que imediatamente assumiu um ar indiferente.

-Tive sim, obrigada, Srta. Odom.

-Sabe que pode me chamar de Milah. Seremos da mesma família em breve.

-Eu evito pensar muito nisso, para ser honesta.

-Mãe! – exclamei imediatamente. – Desculpe por isso, querida.

Milah deu de ombros, começando a fazer seu prato.

-Deve ser difícil para uma mãe dividir o único filho e aceitar que terá outra mulher na vida dele que será mais importante.

-Acha mesmo isso? – a mulher ao meu lado retrucou com um sorriso plácido preso as feições.

Respirei fundo, começando a sentir dor de cabeça. Meu primeiro instinto foi o de querer levantar e ir reclamar para Swan sobre as duas. Emma iria tirar sarro da situação, dizendo algo inapropriado que me deixaria horrorizado e logo eu já teria esquecido o aborrecimento causado na mesa. Tirei o prato de perto de mim, considerando-me satisfeito.

Um grito cortou o ar e olhamos espantados para cima, com exceção de Milah que continuou comendo calmamente.

-Deve ser o presente que deixei para Emma em meu quarto. – comentou olhando para mim de modo desafiador. – Uma pena para ela que outra criada tenha encontrado... Espero que não seja Tinker. – suspirou dramaticamente e voltou a comer.

Sr. Odom trocou um olhar comigo e indicou para uma criada que estava na sala que fosse olhar o que tinha acontecido.

Enquanto Milah continuou a comer, mal conseguindo conter o sorriso de triunfo que nascia em seus lábios, ao olhar para o rosto de cada um na mesa.