Emma Swan estava deslumbrante.

Soube que ficaria no momento em que coloquei os olhos no desenho do vestido. Porém vê-lo nela, moldando suas delicadas curvas e com suas ondas douradas soltas, batendo na base das costas, tinha certeza que seria impossível desviar os olhar, mesmo que eu quisesse.

Minha menina olhava para tudo com curiosidade, absorvendo cada detalhe. Vi ela endireitando sua postura, antes de relaxá-la com uma careta várias vezes. Estava atento a seus lábios rosados que se movimentavam ao conversar com aquele homem, o oficial, que conhecera naquela semana, e que ela voltara a apresentar poucos minutos atrás.

Eu não estava gostando de vê-los trocando tantos sorrisos cúmplices e olhares, como se estivessem tendo uma conversa verbal e outra que só eles entendiam ao fitar um ao outro.

—Quando você ia me contar que conhecia a criada? – a voz de Milah fez-me desviar minha atenção de Emma para observá-la. Ela não olhava para mim e seu rosto estava impassível e isso me assustou. Eu preferia quando Milah estourava, porque quando se mantinha tão calma daquela forma, significava que algo muito pior estava por vir.

—Não ia. Eu sabia que se contasse você iria implicar ainda mais com Emma, começando a criar suposições absurdas sobre nós dois. Conheço Swan da época que morei aqui, da mesma forma que conheço as outras pessoas. Meu pai era reverendo, todo mundo estava indo na paroquia sempre.

Milah ergueu as sobrancelhas escuras lentamente como se fizesse sentido o que eu falara, seu semblante de suavizando.

—Ainda não entendo por que esse velho convidou-a. – murmurou, erguendo o rosto para o meu, os lábios mal se movimentando. – E ainda tem a ousadia de me ofender! – exclamou ultrajada.

Fitei-a confuso.

—Quando exatamente o fazendeiro Webber a ofendeu? – quis saber.

—Quando disse que ela é a mulher mais bonita da região.

Mas Emma é a mulher mais bonita da região.

—Você não mora aqui, querida. Logo não é da região. Relaxe que ele não estava a ofendendo. - tranquilizei-a, abrindo um sorriso forçado e voltando a olhar o salão procurando Swan.

—Pergunto-me onde ela conseguiu aquele vestido… Digo; a criada não tem onde cair morta, não teria dinheiro para um vestido desses. - gesticulou mesmo que Emma não estivesse em seu campo de visão.

—Deve ter conseguido fazendo serviços por fora na cama do oficial. - a mãe de Milah se intrometeu, murmurando com maldade. - Vocês têm dúvidas disso? Pelo amor de tudo, ela trabalha em uma taverna, claro que serve muito mais que bebidas.

Respirei fundo, tentando controlar a raiva que começou a borbulhar dentro do peito ao ouvir sua insinuação de que Emma estava se deitando com homens para conseguir presentes. Que era uma prostituta barata.

Estava quase abrindo a boca para dizer que eu havia dado o vestido para ela. Que minha menina não era uma mulher da vida e sim uma dama que batalhava de forma honesta para conseguir o que precisava, mesmo que o mundo não a ajudasse no processo.

Eu queria tanto dizer que Emma Swan era bem mais nobre que as duas, apesar da nossa recente última conversa em meu quarto.

—A senhora percebeu as costas, mãe? Está toda exposta… Totalmente vulgar.

Observei o vestido que Milah estava usando com os seios quase saltando para fora e precisei morder a língua para não comentar sobre quem estava vulgar de verdade.

—E os cabelos soltos? - a mais velha acrescentou. - Um claro sinal de mulher de vida barata, uma selvagem que não sabe seguir as regras.

—Sem falar que ele é totalmente horroroso... Ela está caminhando por esse salão, achando-se de fato uma princesa com esse vestido horrível, quando na verdade é uma sirigaita ridícula!

Sr. Odom se virou para a filha, estudando-a de cima a baixo lentamente.

—Jesus, tudo isso é inveja da menina por que ela está com um vestido mil vezes mais bonito que o seu? – ele perguntou levando a taça de vinho à boca. Milah e a mãe olharam para o homem, estupefatas. – Ora, por favor! Admitir que, gostaria de estar usando aquele vestido não irá matá-la. A garota está de fato muito linda nele.

Milah balançou a cabeça, os lábios pressionados e esticados, o peito subindo e descendo lentamente ao matar o pai com o olhar.

—Milah não precisa ter inveja da criada, Jeremy... O vestido dela é maravilhoso e foi feito pelo melhor estilista de Londres e não comprado em uma lojinha de vila do campo.

—Desculpe, mas não é nossa criada que está parecendo um tabuleiro ambulante de dama... Falando em jogo... – ele se virou para mim. – O que acha de irmos até a sala de jogos e apostar umas moedas, Killian?

Olhei para o rosto de minha noiva que estava vermelho, os olhos brilhantes tanto de raiva, quanto das lágrimas que segurava. Senti pena de Milah de certa forma depois do que o pai falara. Sabia que ele apenas havia verbalizado o que estava se passando na cabeça de todos os presentes que colocavam os olhos no vestido dela. Ele era horrível de fato, contudo Sr. Odom não precisava ter dito daquela maneira.

—Eu o encontro lá, senhor. Ficarei um pouco mais com Milah. – falei, apertando a mão dela, que desviou o rosto para o meu braço e fui capaz de ouvir uma leve fungada. – Você está magnifica, querida. – sussurrei da forma mais sincera que pude. – Se você gostou do vestido que está usando é isso que importa, não ligue para o seu pai.

—Este não é vestido para bailes do campo, não é? – murmurou a voz tão baixa que tive certa dificuldade para ouvi-la.

—Não muito, mas te garanto que se estivéssemos na cidade, todos estariam invejando-o... As pessoas do campo são mais ligadas ao conforto e diversão, por isso os vestidos são simples assim. São costumes um pouco diferentes.

Milah olhou para mim e sorriu. Um sorriso verdadeiro. Eu não via muito daqueles, mas quando ela decidia sorrir de verdade, transformava-se em uma mulher muito bonita.

—Obrigada, Killian... Por não ser como meu pai. – agradeceu e então revirou os olhos. – Ainda não acredito que estamos tendo que dividir o ambiente com a criada como se ela fosse uma de nós. – reclamou e eu reprimi uma bufada de impaciência ao ver Milah detestável de volta. Então olhou para mim, com os olhos frios. – Vá ficar com meu pai um pouco. – ordenou, dispensando-me com um aceno de mão, indo entrelaçar o braço ao da mãe.

Aquiesci, afastando-me delas o mais rápido possível e me sentindo arrependido por ter confortado Milah. Deveria tê-la deixado se sentir humilhada, para ver se assim aprendia que não era melhor que ninguém naquele salão.

Sr. Odom estava assistindo um jogo de cartas, com um charuto já aceso. Observei o ambiente com atenção e encontrei Emma com Graham conversando animadamente com umas pessoas. Swan havia jogado os cabelos por cima do ombro, deixando aqueles fios longos pendendo em frente ao seu corpo. Eu podia ver as costas alvas dela, e eu sabia a disposição de cada pintinha rosada sem precisar olhar. O oficial ergueu a mão, que estava sem luva, e a pousou sobre a pele desnuda de Emma, que ficou tensa por um momento, antes de relaxar.

Ela não deveria se sentir relaxada com um homem tocando-a daquela forma.

—Sua garota está esplêndida, Killian. – Sr. Odom surgiu ao meu lado. – Fez bem de dar o vestido para ela... Pense quantas coisas poderá dar à Emma... – começou.

O visconde havia me levado para conhecer Loreta, a amante dele, na tentativa de tentar me convencer que não era uma ideia abominável sugerir o mesmo para Emma.

—Como o senhor pode estar tão relaxado assim depois do que disse para sua filha? – indaguei.

O homem deu de ombros, expelindo a fumaça do charuto.

—Eu passei quatro dias maravilhosos com a mulher que amo e com meus filhos. Eu estou me sentindo feliz e totalmente sem paciência para Milah... Se eu tivesse deixado que continuasse a falar, com toda certeza iria fazer com que a presença de Loreta se esvaísse... Pense em como seria ter sua garota para animá-lo e enchê-lo de amor após tantos dias tendo que aturar Milah... Nos filhos que terão e como poderá dar uma vida boa para eles...

—Jer me contou sua situação. – a mulher se aproximara sorrateiramente. Eu estava tendo dificuldade de dormir naquela casa, depois de tudo que havia visto. Como Sr. Odom era um homem totalmente diferente na presença da amante: os olhos brilhavam de uma forma que nunca tinha presenciado. Sem falar que vivia exibindo um sorriso no rosto e até o jeito que falava era transformado. Manso e não seco, como de costume. E como adorava as filhas que morava com Loreta! Sentava-se e conversava por um longo tempo, com um verdadeiro deleite. Nunca o vira papear com Milah daquela forma. – Ele me disse que por isso o trouxe aqui... Contudo vejo que não é igual ao Jeremy.

Observei a mulher de idade avançada, mas que de alguma forma parecia ser tão jovial. Talvez por causa de seu semblante sereno, e como parecia carregar consigo toda a calma do mundo. Os cabelos negros e grossos que começavam a ficar grisalhos estavam presos por uma fita e jogados por cima do ombro. Loreta já estava com a camisola e se apoiou do meu lado, estudando o céu.

—Não foi fácil, quando aceitei a proposta dele. – contou. – Não parecia justo eu não tê-lo por completo, mas Deus, como eu sentia falta de estar com Jeremy... No começo, ele também se sentia culpado por trair Lena... A consciência dos dois pesava.

—Quando deixou de pesar?

Ela sorriu.

—Quando nosso primeiro filho nasceu. Ficamos tão felizes... E percebemos que a felicidade é uma coisa muito boa para ser considerada ruim, mesmo na circunstância que nos encontrávamos... Porém essa vida, não é uma vida que desejo para outra mulher. Eu queria ser esposa dele e tê-lo o tempo todo e não só por alguns dias. Sei que o tenho por completo porque Jer despreza a esposa mais que tudo, contudo ele precisa manter a fachada. Jeremy é cavalheiro o suficiente para não destruí-la ao pedir divorcio... Você sabe como isso a destruiria, não sabe?

—Sei. Se Sr. Odom decidir se separar dela, a viscondessa seria colocada a margem da sociedade.

—Esse é o único motivo pelo qual Jer não a dispensou. Não quer destrui-la... Ele o trouxe aqui para convencê-lo a tornar essa garota sua amante. A intenção dele é boa, Killian, e como pode ver somos felizes, todavia eu não tinha nada a perder... Sou órfã, não possuía ninguém. Essa mulher tem pais... Não a destrua com esse pedido. Se eu tivesse meus pais, nunca que teria aceitado essa vida. Pedir para ela se tornar sua amante é pedir para que vire as costas para eles.

—Emma nunca faria isso.

—Eu sei, por isso estou dizendo para nem cogitar essa ideia depois do que viu aqui. Você a ama, e ela também. Vocês tem um passado lindo, recordações maravilhosas, não estrague isso pedindo para que Emma se torne uma mulher que terá que viver reclusa para não ser ofendida na rua. Que terá que abandonar os pais para ter que se dedicar a você sendo que nunca poderá retribuir essa dedicação toda. Se sugerir, tenha certeza que ela irá odiá-lo, Killian. Mantenha guardado com carinho o que restou daquele amor do passado e se contente com isso. Viva o destino que escolheu e a deixe fazer o mesmo. Se não pode se dar por inteiro para ela, então nem pense em oferecer um pedaço.

—... antes que seja tarde. – a voz do Sr.Odom tirou-me da varanda da casa de Lyme, fazendo-me voltar para aquela sala de jogos abarrotada e com várias conversas aleatórias se misturando em uma só. Segui seu olhar tentando entender sobre o que ele estava se referindo, encontrando Swan e Graham conversando, o homem se abaixando para sussurrar no ouvido dela, que sorria ou revirava os olhos, antes de respondê-lo. – Ela está começando a se encantar pelo oficial.

Eu queria responder que não me importava. Que desejava que Emma fosse feliz com quem ela escolhesse, porque merecia isso. Queria poder falar que desde que o homem desse uma boa vida para Swan e a tratasse bem, era o homem certo para desposá-la.

Porém eu não consegui desgrudar os lábios e proferir uma única palavra. Fiquei apenas observando, a respiração saindo mais pesada que o normal, a forma como os dois interagiam e muito tentado a levá-la para a casa dela com ordens restritas que nunca mais saísse de lá.

—Dói, não é mesmo? – o visconde voltou a interromper meus pensamentos. – Converse com ela, Killian. Você já a perdeu uma vez, não cometa o mesmo erro de novo. – aconselhou, dando-me as costas e voltando sua atenção para o jogo.

[...]

Aquela dança que parecia interminável finalmente chegara ao fim e Milah saiu me puxando quando as cordas dos banjos começaram a soar, mesmo que tímidas pelo ambiente, indicando que uma lumps of pudding estava para se iniciar. Eu gostava bem mais dessa dança que a valsa e sentia falta do tempo em que morava ali que ia para os bailes públicos e dançava à noite toda com as moças e bebia das bebidas mais baratas para ficar mais alegre.

Emma e o oficial passaram por nós rindo alto, ele levando-a pela mão em direção ao meio do salão. Milah soltou um comentário maldoso sobre a vivacidade que preencheu o lugar, com as pessoas mais simples se juntando para a dança e mal conseguindo ficar paradas enquanto esperavam os músicos se aprontarem. Graham a ouviu e imitou um cavalo, tirando uma gargalhada de Swan que tampou a boca e um grunhindo de minha noiva que ignorei, parando a margem para observar a dança.

-Você não pode estar falando sério que irá ficar para assistir isso? – indagou descrente ao parar do meu lado.

-Vou sim. Gosto dessa dança... Cresci participando delas. Se eu tivesse alguém para me acompanhar agora, pode ter certeza que eu estaria ali no meio. – indiquei com o queixo os vários corpos se ajeitando em círculos de quatro pessoas.

-E não pensou em chamar a criada? – inquiriu com a voz afetada.

-Se ela não estivesse acompanhada tenha certeza que eu teria chamado, Milah. – retorqui, voltando a prestar atenção à movimentação que começava e fitando Emma, não querendo perder nenhum detalhe de como seria vê-la dançar.

Apesar de frequentar os bailes públicos, no verão que passei com Emma, nós não chegamos a ir, por mais que ela quisesse. Mesmo que ela andasse para todos os lados e praticamente cada pessoa a conhecesse, Swan não tinha idade para ser apresentada à sociedade noturna. Minha menina ainda não podia ir dançar sem os pais a acompanharem até atingir a idade dos dezoito e isso, deixava-a doida, porque David e Branca não gostavam de ir, já que estavam sempre cansados do dia de trabalho.

Então aquele era um momento que eu esperava já tinha alguns anos, e ainda que eu desejasse estar no lugar do oficial, estava feliz de estar presenciando aquela dança. A forma que Emma sorria, que chegava a fechar os olhos, fazia-me ter certeza que ela estava se divertindo.

E vê-la parecendo tão descontraída na presença dele, o rosto afogueado e brilhante por causa do suor, os cabelos grudando em seu pescoço, os sorrisos, aqueles que faziam ruguinhas surgirem na ponte de seu nariz, que só apareciam quando ela estava extremamente alegre, que me pertenceram durante as noites de verão, presenteavam Graham sempre que voltavam a se encontrarem depois de uma troca de parceiros.

-Você está bem? – Milah questionou com uma careta. – Está apertando meu braço demais, Killian. – reclamou, puxando-o lentamente. Balancei a cabeça, soltando-a e vendo-a massagear o lugar que estava vermelho. Abri minha outra mão que estava fechada em punho, esticando os dedos lentamente.

-Desculpe-me, querida. Fiquei distraído.

-Tem certeza que é só isso? Está ofegante e vermelho. – observou parecendo preocupada. – Talvez esteja precisando de um pouco de ar. O salão está muito abafado...

Relanceei os olhos para a dança que se encerrava e vi os dois se dirigindo para o lado de fora do salão, muito próximos um do outro.

-Sim. Acho que preciso de um pouco de ar... Volto logo. – garanti me afastando dela antes que Milah decidisse me acompanhar, empertigando-me ao tentar enxergar Emma com Graham que pelo visto já haviam escapado pela porta.

Sr. Odom estava certo ao dizer que Emma estava se sentindo encantada pelo oficial. E, pelos céus! Ela tinha todo o direito de fazer isso, de seguir com a vida dela com alguém que a fizesse sorrir daquele jeito que a deixava parecida com uma criança. E estava claro que Graham fazia bem para Swan. Desde que eu voltara Emma estava tensa e arredia, parecendo preocupada, cansada e repetindo sem parar que precisava do emprego. Eu sabia que ela estava passando por dificuldades e isso devia deixá-la no modo alerta sempre, o que a desgastava. Aquela noite era a primeira vez que eu a via mais perto da antiga Emma, apenas se divertindo, rindo, como se estivesse se sentindo leve. E Graham a fazia se sentir assim.

Ele com toda a certeza a merecia. E Swan deveria seguir com a vida dela, mas eu não poderia suportar que isso acontecesse bem debaixo do meu nariz. Eu não podia vê-la se apaixonando por outro homem.

Era demais ver isso acontecer quando estava claro que eu ainda a amava.

Sabia que Emma havia parado nove anos da vida dela por minha causa. Para me esperar e que eu a abandonara sem uma justificativa.

Todavia ela não podia esperar eu ir embora para seguir em frente?

Do lado de fora da casa estava frio, e o vento gelado cortou meu rosto sem delicadeza alguma enquanto eu descia as escadas, procurando pelos dois atrás das sebes, até que os encontrei conversando. Emma estendeu a mão e Graham pegou uma pedrinha branca, estudando-a e guardando no bolso.

Toquei a minha pedrinha branca, recordando-me que Emma a deu para mim porque me amava e agradecia pela minha existência. Lembrando-me daquela noite e respirei fundo, encontrando minha garganta obstruída, não deixando o ar nem entrar, muito menos sair.

Observei Swan se sentar ao lado dele e seu sorriso se fechou de repente quando descaradamente fitou os lábios do homem, sua cabeça tombando um pouco para o lado ao levantar os olhos para os do oficial. Ambos ficaram se encarando por segundos, que para mim pareceram milésimos, enquanto o sangue bombeava rápido demais em meus ouvidos, dando-me a sensação de que estava sendo suspenso, até que juntaram as bocas em um beijo calmo e que no mesmo instante fez Emma amolecer nos braços dele, os olhos fechados e uma das mãos indo afagar os cabelos de Graham, que a puxou para mais perto pelo quadril, enquanto acariciava o maxilar dela com carinho.

Meu nariz começou a arder, antes dos olhos ficarem embaçados e meu coração gritava dentro do peito exigindo uma explicação da cena que se desenrolava a nossa frente.

Quem eu estava querendo enganar? Eu era egoísta demais para desejar genuinamente que Emma seguisse com sua vida ao lado de outro homem. Ela era minha. Swan havia me esperado todos aqueles anos porque me pertencia e não seria agora que iria perder seu coração.

Eles se se separaram ofegantes, e vi Emma beijar o canto de seus lábios. Eu era capaz de sentir aquele beijo, pois o havia recebido incontáveis vezes antes de ouvir um “eu o amo” vindo dela.

Então Swan puxou o oficial pela gola, exigindo os lábios dele, com uma aflição que me deixou sem reação por um minuto, antes de eu entender, ao ver as mãos dele espalmadas naquelas costas alvas que eram tão cálidas, que Emma estava demonstrando que precisava dele.

E eu sabia muito bem qual seria o próximo passo. Emma não era mais uma menina de quinze anos que precisava esperar a idade certa, chegar para ir adiante. Ela agora era uma mulher e que tinha seus desejos e um homem que aparentava estar determinado a saciá-los.

Senti minhas pernas me guiando até o casal, a respiração que saía e entrava era puramente superficial, porque eu tinha noção que algo além da raiva e inveja daquele homem guiava os meus passos e fazia meu coração bater com tanta fúria como se ele mesmo fosse sair de dentro da caixa torácica para separá-los. Ele estava tocando, beijando e pegando para si algo que sempre fora meu. Estava seduzindo uma mulher que eu havia escolhido.

Puxei-o com violência pela gola da camisa, jogando-o no chão. Graham abriu os olhos e olhou-me aturdido, antes de desviar para Emma como se buscasse explicação. Coloquei-o em pé, mal acreditando que ele ainda a procurasse naquele momento e o soquei, com toda a minha força, sentindo dor nos nós dos dedos e ao mesmo tempo estava estranhamento satisfeito de ter feito aquilo e louco para repetir a sensação. Ansiando para deixar aquele rosto de bom moço destruído. Graham não rebateu, parecendo ainda não saber o que estava acontecendo.

Minha mão já estava formigando para sentir o atrito dos nós dos meus dedos na face do oficial, quando o grito agudo de Emma cortou o ar, tirando-me daquela névoa ensandecida de ciúmes que me rodeava.

-Pare! O que pensa que está fazendo? – ela guinchou, empurrando-me sem nem me olhar, puxando com cuidado o rosto de Graham em sua direção. As sobrancelhas douradas se arquearam de preocupação, enquanto passava o polegar debaixo do nariz do homem para limpar o sangue que escorria.

—Estou bem, Emma. – garantiu em um tom baixo, colocando a mão dele sobre a dela, que afagava sua bochecha.

Swan se virou para mim, o rosto retorcido e os olhos verdes frios, a respiração alta deixava clara a raiva que sentia.

—Qual o seu problema? – perguntou com incredulidade.

Ignorei sua pergunta, focando os olhos no oficial que estava atrás dela, segurando-a pela cintura como que para detê-la.

—Saía daqui. – ordenei com o tom neutro, deixando claro que estava falando bem sério.

—Você não manda em mim, riquinho. – retorquiu com um sorriso zombeteiro. – E posso muito bem levá-lo preso por agredir um oficial.

Abri um sorriso debochado para ele, não acreditando no que eu estava ouvindo.

—Eu sou o patrão dela. Se não sair daqui agora eu irei demiti-la. – ameacei, olhando rapidamente para Emma que estava boquiaberta ao me encarar.

Ele olhou para Swan, sem saber o que fazer.

—Emma... – chamou.

Minha menina abaixou a cabeça e passou as mãos pelo rosto antes de se virar para ele.

—Vá. Eu o encontro lá dentro. – sussurrou, vendo-o assentir e ponderar, antes de sair em direção a casa.

Fiquei em silêncio, observando seus ombros rígidos, as mãos pequenas fechadas em punhos, o peito que descia e subia rápido demais, que ela parecia estar tentando controlar com muita dificuldade.

—O que estava fazendo, Emma? – questionei por fim, tendo a noção que eu a deixara naquele estado dessa vez.

Que eu me excedera ao deixar o ciúme me controlar. Que deixei os sentimentos do rapaz de dezenove anos, retornar com força total e o deixara no comando.

—O que parecia que eu estava fazendo? – instigou com ironia.

—Emma... Sua reputação. Você poderia ter acabado com ela se alguém tivesse visto. Será que não pensa? Imagine se eu não tivesse aparecido para impedir o que estava fazendo.

Ela começou a rir. Uma gargalhada alta e forçada. Encarei-a incrédulo de sua reação quando eu estava falando sério.

—Você é um cretino mesmo. – cuspiu.

— O que quer dizer?

—Você sabe bem o que quero dizer. Não se preocupava com a minha reputação quando eu tinha quinze anos e insistiu para que o encontrasse no meio da noite, não é mesmo seu desgraçado? – perguntou enraivecida. – Que se danasse a minha reputação...

—Não é bem assim e você sabe Emma Swan. – eu a cortei, aumentando a voz para cobrir a dela, repreendendo-a por dizer aquilo.

—O que eu sei é que você está sempre atrapalhando a minha vida. –grunhiu.

Fingi não sentir como meu coração doeu ao ouvir o que ela tinha acabado de dizer.

—Eu estava salvando você agora, maldição! Salvando sua reputação.

—Me salvando? Eu queria beijá-lo, caramba! Eu autorizei. Eu estava gostando de ser beijada por Graham até você estragar tudo! – gritou, vindo para cima de mim e socando seu peito.

Segurei seus punhos, enquanto respirava fundo tentando colocar os pensamentos e sentimentos em ordem.

Eu precisava deixá-la ir. Tinha que deixá-la seguir com a vida dela, já que como Loreta havia dito eu escolhi o meu destino quando optei pelo dinheiro.

—Você gosta dele de verdade? – quis saber.

—Do que isso o interessa?

—Eu vi você dando uma pedrinha branca para ele.

—Você estava me vigiando? – indagou descrente.

—Por que você beijou-o Emma? Por que deu uma pedrinha branca para aquele homem? – insisti. Se ela pronunciasse as três palavras que um dia, foram para mim, eu... A deixaria ir, mesmo que doesse e ainda ajudaria a se casar o mais rápido possível.

—Porque eu gosto dele. Porque eu quis beijá-lo. Dei uma pedrinha branca porque ele é importante para mim. – respondeu e soltei a respiração, aliviado.

—E quanto a mim? – questionei, libertando-a de meu aperto. – Eu ainda sou importante para você?

—Quanto a você? – inquiriu com frieza. –Não. Já não é uma pessoa que consigo pensar com carinho. – confessou. – Eu achei que... Talvez não estivesse tão mudado, mas só de ver que não suporta me ver feliz; percebi que estava enganada.

—Dei o vestido para você porque quero vê-la feliz, minha menina.

—Não é desse tipo de felicidade que estou falando, Killian. Se você acha que preciso de coisas materiais para ser feliz, então claramente não me conhece. – ela tirou a casaca de Graham que vestia e levou às mãos as costas, fazendo uma careta, antes de se virar.

Percebi alarmado qual era sua intenção e olhei ao redor para ver se estávamos sozinhos mesmo, voltando a observar os botões invisíveis sendo tirado das casas e deixando suas costas ainda mais expostas.

—O que está fazendo, Swan? – indaguei, aproximando-me dela ao vê-la tirando os braços das mangas. Eu respirava mais devagar vendo sua pele totalmente desnuda aos meus olhos, descobrindo novas sardas que a ornava, enquanto ela lutava para tirar a saia do vestido. Ela não usava nada por baixo do corpete, e logo vi a calçola branca, a única peça que restava no corpo dela.

Minha boca ficou seca e minha barriga se contraiu com o desejo que começava a despertar todo meu corpo. Eu queria tocá-la. Pelas sebes que estavam ao nosso redor! Se eu não me controlasse a levaria para trás delas naquele instante, livrando-me daquela peça encardida que não a deixava completamente nua aos meus olhos.

Emma tampou os seios e voltou a pegar a casaca do oficial, vestindo-a e segurando-a firmemente para esconder o corpo.

Pisquei, voltando a fitar seu rosto austero.

—Eu não quero seu presente. – decretou jogando o vestido aos meus pés. – Eu não deveria tê-lo aceitado em primeiro lugar, porque isso o fez pensar que é meu dono... E eu não admito que você pense que eu pertenço a você. Eu posso não saber ler palavras, mas sei ler pessoas, Killian. Você não me quer, mas também não quer que ninguém me queira. Quer me manter apenas para você, talvez seja esse motivo pelo qual não avisou que estava noivo. Se eu não soubesse, continuaria o esperando, porque fui burra de deixá-lo saber que eu não quebraria a promessa. – sua expressão estava desolada, enquanto ela me olhava. – E aqui está querendo saber se ainda tem meu coração quando escolheu outra... Agredindo um homem por me beijar, por mostrar interesse em alguém como eu. – Emma fungou, passando o dorso da mão no nariz, antes de olhar para cima. Seus dentes batiam de frio e ela se encolhia cada vez mais sempre que o vento passava por ela. – Se o ver, diga que me mandou embora para casa. – pediu, dando-me as costas e saindo andando apressada.

—Não! Emma Swan volte aqui agora mesmo! – gritei pegando o vestido e indo atrás dela, quando me dei conta que a louca havia realmente ido embora, do jeito que estava. Nua. – Swan! – berrei não conseguindo encontrá-la na escuridão. Sabia que ela havia se embrenhado pelas árvores da propriedade para que dificultasse a situação, entretanto, logo ela deveria voltar para a estrada e se eu fosse rápido poderia encontrá-la. Dei uns passos para dentro da mata. – Emma, volte aqui e vista e esse vestido, por favor. Não me faça ficar mais preocupado com você. – pedi, não ouvindo nada. – Perdoe-me por ter sido um ogro mais uma vez. Eu não sei o que está acontecendo...

—Killian? – a voz do visconde, fez-me virar. Ele olhou para o vestido em minha mão com a testa franzida. – O que aconteceu?

Olhei para a escuridão por onde Emma desaparecera e voltei a fitar meu futuro sogro.

—Nós discutimos. Ela devolveu o presente e saiu correndo sumindo pelas árvores. – resumi.

Sr. Odom assentiu.

—Pedirei para o cocheiro ver se a encontra no meio do caminho e a leve para casa dela. Fique tranquilo que pedirei discrição. Largue esse vestido e volte para dentro. Milah já está começando a ficar impaciente com sua demora. – informou, virando-se para retornar para dentro.

Olhei mais uma vez para as árvores e levei o vestido até o nariz, sentindo o cheiro que sentia falta e deixei as lágrimas caírem ao ter certeza que tudo estava acabado por definitivo.

[...]

Eu não a vira no dia seguinte e nem no outro.

Sabia que estava lá, porque a viscondessa e Milah estavam fazendo questão de infernizá-la o máximo possível, com ordens inúteis e humilhantes, como se quisessem mostrar onde ela pertencia.

Sr. Odom não tocou mais no assunto de tornar Emma minha amante e nem sobre o episódio do baile. Uma carta de meus pais havia chego informando que eles se juntariam a nós para o natal e que chegariam, na próxima semana.

A noite passada havia sido mais fria que as anteriores, o que anunciava que o outono estava se despedindo, para o inverno se instalar. Aquele ano parecia que seria mais rigoroso que os outros.

Naquela manhã, minha noiva estava andando de um lado para o outro, reclamando sobre o clima frio, o tempo chuvoso, e a lareira que havia se apagado durante a noite da sala. Meu pensamento estava no vestido amarelo que havia buscado na tarde anterior e escondido em uma das malas, tentando não deixar meu corpo, agir como de um homem ao recordar do de Emma e olhar o de Milah que era tão voluptuoso em comparação de minha menina.

—Onde você estava? – Milah instigou com desprezo quando Emma adentrou apressada na sala, agachando-se perto da lareira para acendê-la. Empertiguei-me antes de ficar de pé, querendo vê-la, afinal fazia dois dias. – Quase congelamos de frio com sua falta de comprometimento. – vi os olhos da mulher; ao meu lado brilharem de raiva ao ser ignorada. – Talvez não esteja precisando tanto desse trabalho. – soltou com maldade e percebi os ombros ossudos de Swan ficarem tensos.

—Não seja dramática, Milah. Não estávamos congelando. – intervi.

—Diga por você... Não estou mais sentindo as pontas dos meus dedos.

Emma continuou concentrada em seu serviço até que um clarão alaranjado e quente preencheu a sala, o barulho do fogo crepitando. Swan colocou-se de pé, a cabeça baixa e eu abri a boca, perplexo.

Seus cabelos longos não estavam ali, presos como de costume. Aquele amontoado de fios dourados e macios que emolduravam seu rosto de traços delicados haviam ido.

Desaparecido.

—Peço desculpas, senhorita. Precisei resolver um assunto familiar. – explicou piscando sem parar, enquanto tocava a cabeça de modo sub-repticiamente o que sobrara de seu cabelo, cortado de qualquer jeito. – Pode descontar do meu salário o atraso.

—Claro que irei descontar de seu salário! – Milah bradou, indo para perto do fogo. – Agora saía daqui sua inútil. – ordenou.

Observei Emma assentir e sair rapidamente, sem dirigir qualquer olhar em minha direção.

Reparei que minha respiração saía pesada, fazendo meu peito subir e descer muito lentamente, enquanto olhava fixamente para porta por onde minha menina havia saído, imaginando qual seria o problema.

O que havia acontecido com seus cabelos?

—Não deveria ser tão dura com a moça. – censurei Milah, servindo-me de conhaque.

Ela estalou a língua.

—É uma criada.

—Criados também tem sentimentos.

—E eu não me importo com eles... Escute querido... Sei que um dia você já foi dessa classe, que a conheceu e trabalharam juntos, mas é passado. Agora você é rico, importante... Não deve esquentar a cabeça com essa gente. – caminhou até meu lado, tocando meus braços. – Ela é paga para nos servir.

—Se não fosse essa gente, você não teria o conforto que tem, Milah.

—Assim é a vida, querido. Uns nascem com condição de ter uma vida como a que temos, outros nasceram com o grande prazer de nos servir.

Reprimi a vontade de revirar os olhos ou bufar de irritação.

—Se precisar de mim, estarei na biblioteca. – informei, deixando-a sozinha e pegando o rumo contrário, indo para cozinha.

Emma Swan estava a todo custo evitando contato comigo. E eu merecia depois da cena que havia feito no baile. Eu merecia qualquer indiferença, vindo dela, mas ela iria me contar o que estava acontecendo. Algo não estava bem e se tinha uma coisa que eu não suportava era vê-la naquele estado tão abatido, fingindo-se de forte quando estava quebrando por dentro sem conseguir conter os cacos de escaparem.

Era hora de tentar novamente ajudá-la. Tentar ajudá-la de verdade. Fazê-la sentar e me contar todos os apertos que estava passando e toda necessidade que precisava ser saciada.

—Quanto você conseguiu? – pude ouvir assim que me aproximei da porta da cozinha.

—20 libras, o barbeiro disse que não valia mais que isso. – Emma respondeu em um sussurro embargado, fungando na tentativa de respirar. – O que acha dos meus dentes, Tinker?

—O que tem seus dentes?

Esgueirei-me ainda mais, vendo parcialmente o rosto de Swan, vermelho por conta das lágrimas.

—Ofereceram-me vinte libras por cada um, Tink. Esses daqui da frente. – murmurou, olhando para a mulher ao seu lado que a encarava apreensiva. – Você acha que vale mais que isso?

—Você não pode estar considerando vender seus dentes, Em... Não faça isso, seus pais não... Eles irão ficar devastados se fizer isso.

—E terão um teto. – rebateu, erguendo as mãos como se para prender nos cabelos, antes de abaixá-las. – Eu não sei mais o que faço Tinker. Não sei de onde irei tirar dinheiro para pagar o aluguel. Já vendi tudo de valor que tenho... Estou trabalhando aqui e na taverna de Robin, tendo que aturar aqueles homens nojentos tocando-me sem permissão... – o maxilar dela tremeu e seu corpo se retesou. – Eu não estaria nessa situação se tivesse aceitado o pedido de casamento do fazendeiro Webber... Meu Deus como eu sou uma idiota! – guinchou se estapeando e a criada, Tinker, segurou suas mãos com delicadeza.

—Não diga isso, Emma. Nós vamos dar um jeito... Eu irei ajudá-la. Você não é idiota porque cumpriu com sua parte da promessa. Idiota é o homem que a quebrou e não voltou para você. – atalhou, envolvendo-a em seus braços.

Senti as lágrimas quentes acumuladas em meus olhos, recuando um passo, ainda assimilando à conversa que eu ouvira.

—Se eu não pagar, iremos ser expulsos de casa, Tinker. Meu pai está doente, ele não pode...

—Eu sei.

Engoli em seco e bati na porta, anunciando que estava entrando. Emma colocou-se de pé rapidamente, ficando de costas para mim, as mãos nos quadris, respirando fundo.

—No que posso ajudá-lo, senhor? – Tinker se adiantou pronta para receber qualquer ordem.

Eu queria ser capaz de abraçar Swan como a mulher estava fazendo. Confortá-la como fiz várias e várias vezes quando nos encontrávamos no campo de trigo.

Eu quebrara a promessa. Ela havia ficado me esperando. Havia declinado um pedido de casamento que lhe daria uma vida boa, para me esperar, porque Emma acreditou que eu voltaria para ela. Confiou em minha palavra.

E agora, ela estava vendendo um pouco de si a cada dia para garantir que sua família ainda tivesse onde viver. Tendo que suportar situações que nunca deveria ser obrigada a passar, por culpa minha.

Provavelmente havia estragado outra oportunidade que Emma teria de sair daquela situação ao bater no oficial.

—Senhor?

Swan virou-se e encarou-me, abaixando o rosto como se estivesse envergonhada.

—Não... Não preciso de nada. – falei, querendo que Emma olhasse para mim novamente. – Na verdade... Eu... A senhorita poderia acender a lareira da biblioteca? – indaguei diretamente para ela.

—Claro... Irei buscar lenha, senhor. – avisou, saindo sem me olhar novamente.

Troquei um olhar com a outra criada que me encarava com uma expressão não muito amigável.

—Estarei esperando na biblioteca. – avisei.

—Isto é uma promessa, seu sacripanta? – ouvi-a instigando com sarcasmo as minhas costas.

[...]

Emma entrou silenciosamente, deixando a madeira no chão, tirando a proteção de ferro da lareira, agindo como se eu não estivesse no ambiente.

—O que está acontecendo? – questionei fechando a porta da biblioteca.

—Não está acontecendo nada, senhor. – retorquiu.

—Olhe para mim quando falo com você, Emma! – ordenei com irritação. Ela ficou imóvel, antes de se virar para mim, ainda de joelhos a frente da lareira.

—Vejo que realmente gosta de dar ordens. – atacou.

—Você não me dá outra escolha quando não olha para mim... Minha menina, o que aconteceu com seus cabelos? – perguntei, aproximando-me dela. – Conte-me pelo o que está passando.

Swan pressionou os lábios, soltando uma risada melancólica.

—Nada com que possa me ajudar senhor.

—Killy... Eu ainda sou seu Killy, Emma. – falei, usando o apelido que ela me dera, querendo mostrar que ali era o rapaz que conhecera, conversando e querendo ajudá-la.

Swan levantou os olhos verdes acusatórios para mim.

—Meu Killy foi embora e nunca mais retornou senhor. Não tive mais noticias dele, desde que foi estudar na cidade. Mas tenho certeza que deve estar feliz uma hora dessas. Tornando-se uma pessoa melhor do que era. – sorriu com tristeza.

Ouvir aquilo foi como enfiar um punhal em meu peito, bem lentamente, fazendo meu coração se contorcer de agonia ao escutar suas palavras tão machucadas.

“Tornando-se uma pessoa melhor do que era”.

—Como posso ajudá-la, Emma? De quanto você precisa? – instiguei desesperado, querendo provar que eu ainda era bom, que apesar de tudo, eu não havia mudado tanto quanto ela pensava. – Não quero que, venda mais nada seu. Não quero que se, venda aos poucos, está me ouvindo? – decretei. Um arrepio de pavor passou pelo meu corpo, ao imaginar minha menina vendendo-se para homens que só queriam usá-la como um lugar para se aliviar, para conseguir meros trocados. - Eu estou aqui, tenho dinheiro, posso dar a você o quanto precisar... Deveria ter vindo até a mim antes de vender seus cabelos, explicado a situação. Não iria negar nem um centavo a você, Swan. – ajoelhei-me a sua frente, tocando seu rosto, sentindo as lágrimas da culpa descendo pelo meu sem controle. – Deixe-me ajudá-la. – implorei, engasgando. – Se estou aqui hoje... É porque você me incentivou.

—Não preciso de sua ajuda, senhor. Estou bem. – garantiu com a voz firme, mesmo que estivesse chorando. – Sempre dei meu jeito.

—Emma... Eu sei que está sentindo raiva de mim e com todo motivo... Queria ser capaz de explicar para você meu comportamento de sábado... Eu senti ciúmes, sim, não suportei vê-la feliz nos braços de outro. – confessei, trombando nas palavras. – Assim como sei que não deveria sentir, porque eu escolhi abrir mão de você... Todavia entenda que não tive controle sobre nada. Precisava desse compromisso com Milah para que meu tio deixasse a herança para mim... Entretanto eu nunca quis prejudicá-la, minha menina.

—Preciso acender a lareira, senhor, tenho outros afazeres.

Um som de frustração saiu de minha boca, enquanto eu a puxava para os meus braços, como naquela noite em que nos despedimos. Emma parecia ainda menor e mais frágil que daquela vez. Queria dizer para ela que me matava a escolha que fiz. Que não queria ter quebrado a promessa. Era com ela que eu queria ficar. Como eu sentia falta dela. Que pesava em meus ombros ter que vê-la naquele estado, e ter consciência que eu a colocara lá.

—Abrace-me, Emma. Por favor, abrace-me. Preciso senti-la me abraçando. – supliquei em seu ouvido. – Abrace-me como quando nos despedimos. Você me apertou tão forte e com tanto carinho. Com tanto amor. Sei que não mereço, mas abrace-me.

Contudo seus braços permaneceram no mesmo lugar, sem dar qualquer, indício de que iriam me envolver como um dia fizeram.

—Senhor... Eu irei sujá-lo. Solte-me, por favor.

Fechei os olhos com força, chorando ainda mais, segurando Emma mais forte, o que restara de seu cabelo, pinicando-me o rosto. A respiração contida dela acariciava minha orelha.

Acatei o seu pedido contra vontade, secando os olhos.

—Irei preparar uma promissória para você. – informei, retirando o papel do meu bolso e indo para a mesa. – Quero que pare de trabalhar na taverna. Pagarei para você a quantia que recebe lá.

—Eu não quero seu dinheiro, senhor Jones. – atalhou. – Sou perfeitamente capaz de me virar. Eu não sou sua obrigação.

Estudei seu estado deplorável. O brilho que um dia irradiara, apagado pelo tempo sendo maltratada com serviços tão pesados.

Recordei da garota de quinze anos que deixei para trás. Que me incentivou a ir tornar-me uma pessoa melhor. Para que eu tivesse um futuro. A garota que se encontrava comigo no meio da noite para conversar e nos amarmos dentro dos limites. A garota com riso fácil e contagiante. Aquela que planejou um futuro ao meu lado, sem se importar com nada. Se eu teria dinheiro ou não. Que só queria amar e ser amada de volta.

Que aguardou todo aquele tempo por esse futuro.

Indiquei a porta para que Emma entrasse e ela me lançou um olhar ansioso, antes de passar à minha frente claramente nervosa, os olhos analisaram o pequeno vestíbulo simples da minha casa.

—Relaxe, criança. – murmurei, depositando um beijo em sua cabeça. – Você já conhece meus pais, não precisa ficar apreensiva desse jeito.

—Eu sei, Killy... É só que... – Swan respirou fundo apertando as mãos. – Dessa vez é diferente. Muito diferente.

Sorri para ela, tentando tranquilizá-la e peguei sua mão pequena que estava úmida de suor. Puxei-a em direção à cozinha, apontando onde ficava o que da casa para situá-la. Meus pais estavam terminando de colocar a mesa, ambos parecendo satisfeito com o trabalho que fizeram.

—Olá. – cumprimentei chamando a atenção deles para nós dois parados no umbral.

—Filho! – minha mãe exclamou, endireitando-se. – Está tudo pronto.

—Ótimo... Acho que já conhecem Emma Swan Charming.

—Claro que sim! Conheço essa menina desde quando nasceu. Seja bem-vinda Emma Charming. – meu pai a saudou, daquele seu modo alegre e acolhedor.

—Muito obrigada por me convidarem para o almoço. – Emma falou com a voz tensa. – E, por favor, Emma Swan. Não gosto do Charming... Contudo prefiro apenas Emma.

—É um prazer finalmente recebê-la aqui, venho pedindo para Killian trazê-la tem um tempo já. – minha mãe caminhou até ela. – Estou contente que seja você. – alegou e vi as bochechas de Swan adquirir um delicioso tom vermelho que senti vontade de mordiscar.

Troquei um olhar com meu pai que assistia as duas mulheres interagindo com um semblante contente. Eu tinha plena noção do sorriso que exibia em meu rosto ao vê-las em um inicio de relação familiar, acostumando-se uma à outra de forma mais intima. Meu coração parecia nem ter força para completar uma batida de tanta felicidade que eu sentia.

—A senhora é sempre gentil comigo, senhora Jones.

—Ora! -a matrona estalou a língua. – Seremos todos da mesma família, sendo assim quero que me chame de Jenna, até que eu me torne sua segunda mãe, entendido? – Emma olhou para mim com uma expressão indagadora, e eu me limitei a dar de ombros, satisfeito que a mulher deixasse claro que estava aceitando-a como parte da família. Por fim ela assentiu timidamente. – Agora vamos almoçar.

Vi os ombros de Swan relaxar quando ela soltou o ar em uma única lufada baixa, mexendo-os para retirar a tensão. Toquei a base de suas costas guiando-a para a mesa. Ela passava os dentes sem parar pelos lábios enquanto se ajeitava na cadeira e olhava para os pratos de comida.

Emma esperou que meus pais se servissem antes de pegar um prato e parecer não saber o que fazer em seguida. Ela estava meio perdida e recordei que havia me dito que nunca tinha sido convidada para almoçar na casa de alguém antes.

Minha mãe indicou discretamente com os olhos o prato que Swan segurava.

—Deixe que eu a sirvo, tudo bem? – questionei tirando o utensilio de suas mãos que o apertava com força.

Emma sorriu sem graça, agradecendo-me com o olhar ao ver-me fazendo seu prato e o colocá-lo em sua frente.

—Eu peço desculpas... Se... Se eu não, saber como comer. – falou baixinho atraindo a atenção dos meus pais. – Nunca comi na presença de outras pessoas e nunca provei isso antes. – confessou apontando para a carne de porco, o rosto vermelho. Emma voltou a passar os dentes, pelo lábio inferior diversas vezes. Seus olhos se apertaram e ela balançou a cabeça como se estivesse se repreendendo.

Escutei o barulho de talher sendo pousado na mesa e olhei para o meu pai, Swan ergueu o rosto, os olhos arregalados ao fitá-lo com o rosto impassível, quase como se estivesse irritado.

E então sorriu para Emma.

—Eu prefiro comer com as mãos. – declarou levando o pedaço de carne a boca e tirando um pedaço, mastigando sem pressa. Minha mãe logo seguiu seu exemplo, comendo com o auxilio das mãos.

Cutuquei suas costelas, incentivando-a começar a comer e vendo-a atacar a comida sem hesitação, soltando um gemido baixo ao provar a carne.

—Seus cabelos são muito lindos, Emma. – minha mãe elogiou de repente, dando-me uma piscadela ao perceber Swan se endireitar, balançando os fios louros como que para exibi-los.

—Muito obrigada senhora... Jenna. – corrigiu-se sorrindo. – Sei que deve ser bobo, mas adoro meus cabelos claros. Acho que é o que tenho de mais bonito...

—Eu discordo. – retruquei para provocá-la. – Gosto dos seus olhos. Acho-os mais bonitos que seus cabelos.

—Você não iria me querer se eu fosse careca. Como é que me contou várias vezes?... Que foram meus cabelos que o fizeram me ver.

—Na verdade foi seu riso... Depois os cabelos, mas se tivesse visto seus olhos de onde eu estava pode ter certeza que seriam por eles que eu teria me apaixonado. – assegurei inclinando a cabeça em sua direção. Ela levantou o olhar, acanhada para os meus pais que nos observavam com lábios pressionados e um ar de divertimento.

—Seus cabelos louros vieram da parte de seu pai, certo? Porque sua mãe tem cabelos negros e sua vó também.

Swan assentiu, limpando a boca engordurada da carne.

—Todos da parte da minha mãe têm cabelos escuros. E do meu pai nem todos... Minha avó paiterna tinha cabelos escuros.

—Paterna, minha menina. – eu a corrigi baixinho. – Avó paterna.

Emma aquiesceu, seu semblante ficando sério enquanto ela murmurava a palavra para si.

-Então é materna e não mãeterna? – indagou com curiosidade, olhando para mim. Fiz que sim, procurando sua mão para apertar. – Tenho que contar para os meus pais isso, eles falam desse modo. – refletiu para si mesma, antes de voltar a fitar meus pais. – Considero-me sortuda de ter nascido com o tom de cabelo claro do meu pai, eu acho mais bonito... Não que eu não ache a cor dos cabelos de vocês bonita. Gosto muito de cabelos pretos assim... Mas acho muito comum.

-E são mesmo. – meu pai concordou. – Contudo infelizmente provavelmente será a cor de cabelos que os filhos de vocês terão, porque Killian tem cabelos escuros.

Emma piscou, sua testa se vincando profundamente, enquanto pesava as palavras de meu pai. Eu sabia que ele estava brincando com ela, entretanto Swan levou o comentário bem a sério.

-Faz sentido isso, porque o homem engravida a mulher, então são as características do pai que serão mais presentes, não?

Brennan sorriu para ela, voltando a comer e indicando o prato dela para que fizesse o mesmo.

-Não temos certeza de como é, mas existe um homem fazendo experiências com ervilhas para tentar descobrir como funciona isso das características... Posso tentar explicar como eu acho que seja. – ofereceu.

-Ah, ela vai querer. O senhor arrumou para sua cabeça, pai. Se Emma se interessar no assunto não o deixará mais em paz com tantas perguntas. – fingi estar enfadado e revirei os olhos. Senti o pé pequeno de Swan chutando minha canela.

-Eu adoraria reverendo... Digo, Brennan.

Emma voltou sua atenção para a lareira, acendendo-a sem dificuldade.

—Pegue. – estendi o pedaço de papel para ela. – Pegue Emma Swan. Deixe-me cuidar de você da forma que posso. Está errada ao dizer que não é minha obrigação. Eu me importo com você. Sempre me importei. E quero vê-la feliz. Se Graham for sua escolha, deixe-me saber que irei ajudá-la com o casamento... Contudo, por favor, por ora, aceite essa promissória. – supliquei.

Emma hesitou, olhando para minha mão com desconfiança, antes de aceitar.

Soltei um suspiro aliviado ao ver a promissória em sua mão, sabendo que eu estava ajudando-a. Que Emma finalmente estava aceitando minha ajuda.

Que talvez pudéssemos resolver tudo que eu havia estragado.

Então ela amassou e jogou-a nas chamas crepitantes.

—Não preciso de sua caridade ou de sua pena. Eu não quero nada vindo de você. Sou perfeitamente capaz de conseguir manter minha família. – falou entredentes, se retirando.

Deixando-me mais arrasado do que antes.

[...]

—Onde você está indo? – Milah seguia-me pelo saguão.

—Preciso resolver um assunto urgente. – respondi sem olhá-la.

Eu estava com raiva dela por ser tão insuportável e egoísta. Com raiva de mim por ter me tornado uma pessoa como ela.

Foi pensando em ficar com a fortuna e terras do meu tio que havia aceitado casar-me com Milah.

—Quero saber que assunto urgente é esse, Killian! – exigiu.

—Um assunto meu e que não tenho a mínima intenção de compartilhar. Volto para o jantar. – falei, batendo a porta e saindo para a tarde fria e cinzenta.

O cavalo que eu pedira já me esperava em frente da casa, junto com o tratador que o trouxe pacientemente até mim.

—Muito obrigado. – agradeci ao homem, antes de disparar em direção à estrada, o caminho ainda nítido em minha mente de onde eu queria chegar.

O vento que passava zunindo por meu ouvidos pareciam abrir pequenos retalhos em minha pele. Meus olhos lacrimejavam e ardiam com o ar que o atingia de modo pouco cortês.

Passei pelos campos que no verão eram destinados ao trigo, recordando cada momento que passei ali.

A primeira vez que vi Emma. Ela estava ajudando os pais com a colheita e mesmo debaixo do sol, sorria feliz, fazendo sua tarefa. Rodopiando juntamente com a mãe quando paravam por alguns minutos para descansar e seu pai observava as mulheres com o sorriso mais largo que já vira em toda minha vida.

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Como me apaixonei por aqueles lábios repuxados, deixando os dentes à mostra, de Swan.

Agora eu não tinha mais certeza se havia imaginado tudo aquilo, porque a mulher que eu conhecia, não parecia, aquela garota. Não possuía a mesma vivacidade que a menina que eu vira no campo.

Parei em frente a simples casa de madeira, que mais parecia um barracão, deixando meu cavalo preso.

Precisei respirar fundo algumas vezes antes de ter coragem para bater.

Duas batidas rápidas e o silêncio no lado de dentro.

Mais três batidas nervosas.

Uma batida e meia quando a porta finalmente se abriu.

—Killian! – a mulher de pele, branca e cabelos negros, exclamou pasma.

—Olá senhora Charming. – cumprimentei-a sem jeito. – Será que poderia entrar para conversar?

A mulher pareceu hesitar, olhando para dentro da casa, seus lábios franzindos enquanto ela ponderava sobre meu pedido.

—Não sei se é uma boa ideia... David não quer nem ouvir falar de você, senhor Jones. Pediu inclusive para Emma pedir demissão para que não tivesse que conviver em sua companhia. E depois do acontecimento de sábado, ele só falta trancar Emma em casa.

—Por favor, Branca. Sem formalidades comigo... Estou aqui nas melhores das intenções.

Ela pressionou os lábios, e por fim abriu mais a porta, indicando que eu entrasse.

—Sinto muito pela bagunça... É difícil organizar uma casa quando não se tem espaço. – pediu parecendo acanhada. – E todos seus moveis são quinquilharias. – murmurou. – David está em nosso quarto. Siga-me, apenas tenha cuidado para não se perder. – brincou.

Observei a casa escura e com moveis pareciam podres, e perguntei-me se sempre fora assim. Eu havia estado ali tantas vezes, no entanto nunca tinha reparado naquilo.

O único cômodo arrumado era o quarto de Swan, que continha apenas uma cama e uma cômoda minúscula.

—É o quarto de Emma. – Branca sussurrou como se eu não soubesse. – Ela vendeu tudo o que tinha de melhor... As poucas joias que havia ganhado da avó, minha mãe, antes que ela morresse. O espelho foi essa manhã. – contou com um sorriso de pesar no rosto. – Machuca-me ver minha filha tendo que fazer isso, sabe? Desfazendo-se das coisas que mais gosta para cuidar de mim e de David. Nós deveríamos fazer sacrifícios por ela, não o contrário.

Aquiesci, desviando os olhos do rosto da mãe de Emma, caso contrário começaria a chorar novamente.

—Acho que entendo como se sente. – murmurei.

Eu sentia-me machucado, sangrando todos os dias desde que voltara para lá. E naquele dia, os ferimentos estavam piores por descobrir a dificuldade Swan estava passando bem diante dos meus olhos.

—Quem era à porta, Branca? – David indagou, saindo do quarto, escorando na parede e usando uma bengala para auxiliar. Ele parecia menor e mais magro. Antes o homem parecia distribuir saúde, e agora a cor de sua pele plácida, demonstrava como não estava nada bem. Sua expressão tornou-se carrancuda ao ver-me. – O que esse riquinho está fazendo aqui?

—Ele disse que tem algo importante para nos dizer.

—Não estou interessado em ouvir as palavras de um mentiroso. – retrucou. – Quero que saia de minha casa, por favor. – pediu indicando a porta.

—Senhor... Vamos nos sentar. Escute-me antes de mandar-me embora.

—Veio até aqui para dizer que irá cumprir a promessa que fez a minha filha? – questionou.

—Não senhor...

—Então, por favor. A porta da rua é serventia da casa.

—David! – Branca o repreendeu.

—Eu não quero esse miserável que iludiu nossa filha aqui. Olhe o que ela está passando. Era para estar casada...

—Emma o amava David... Não podíamos tê-la forçado. Iria matá-la de desgosto.

—E agora eu estou morrendo de desgosto por não poder dar uma boa vida a minha filha! – gritou. – Eu sou um inútil que não consegue mais trabalhar. Emma teria casado se não fosse sua promessa senhor Jones, de que voltaria para ela. E ainda a ofendeu, chamando-a de burra.

—Nunca fiz isso, senhor! – defendi-me estupefato.

David abriu um sorriso de escárnio para mim.

—Emma contou-me, senhor Jones. Do que adiantaria escrever se ela não sabe ler? Não foi isso que disse para ela quando questionado do por que não havia sido avisada que seus planos de voltar para casar-se com ela haviam mudado?

—Foi senhor. – afirmei sem jeito, sentindo-me o pior dos homens. – Não estava pensando direito quando soltei tamanha besteira.

—Bom... Emma se culpa por isso. “Ele está certo, eu não sou mulher para ele. Não sei nem escrever meu nome”. Você tirou a vida da minha filha e eu espero que seja muito infeliz com esse monte de dinheiro que receberá. Que seja infeliz com a mulher que irá se casar. Que a infelicidade caía sobre a sua casa como caiu sobre a minha quando fez a maldita promessa para Emma e pediu para que ela o esperasse.

—Melhor você ir, senhor Jones. – Branca segurou em meu braço, tentando arrastar-me para fora. – Foi uma péssima ideia.

—Sei que mereço o desprezo de vocês e da sua filha, que garanto já não morre mais de amores por mim. Contudo estou aqui na melhor das intenções. Quero ajudá-los. Ouvi uma conversa de Emma com uma criada e ela estava desolada... Vendeu os cabelos dela para conseguir dinheiro...

—O que? – Branca gritou ao meu lado, tampando a boca horrorizada, olhando para o marido que piscou repetidamente, como se ainda assimilasse o que tinha ouvido.

—Vocês ainda não sabiam... Bem, foi uma surpresa para mim também... Por isso fui atrás de explicação. Sei que Emma adora os cabelos, então ouvi a conversa... Eu posso ajudá-los se permitirem. Pagarei tudo o que devem. – falei. – Swan não aceita minha ajuda, ela mal olha em minha cara... Imaginei que vocês... Não seriam tão orgulhosos assim. Eu tenho o dinheiro e estou disposto a ajudá-los em todas suas dificuldades... Posso conseguir uma moradia melhor. Comprarei um chalé para vocês e terá o seu nome para ninguém tentar tirar do senhor. – ofereci olhando para David, que me encarava com desconfiança. - Não precisará mais se preocupar com aluguel. Contratarei tutoras para Emma, para que aprenda. Irei apresentá-la para a sociedade. Swan irá conseguir pretendentes, se o oficial desistiu dela depois do meu comportamento no sábado.

—E por que faria isso? O que quer em troca? - inquiriu

—Nada, senhor. Apenas que não passem por mais nenhuma dificuldade... Dar uma oportunidade para sua filha. Oportunidades que eu tirei.

David ficou em silêncio, como se estivesse em uma batalha interna consigo mesmo. Olhei para Branca que me fitava com um misto de gratidão e um reconhecimento que me deixou sem graça.

—Não. – o homem falou por fim. – Não queremos seu dinheiro.

—Por que vivem falando isso? Tem algo de errado com o meu dinheiro? Se fosse dinheiro de outro, vocês aceitariam? – explodi um sentimento de incapacidade invadindo-me. – Eu quero e posso ajudá-los. Estou garantindo para o senhor uma vida de conforto. Prometendo que darei uma oportunidade a Emma de se tornar a dama que nasceu para ser. Ela encontrará alguém...

—Emma já está velha, Killian. – Branca interrompeu-me. – Até ela se tornar essa mulher, nenhum homem irá querê-la... Escute, sabemos que está tentando se redimir, que a culpa está o perseguindo, mas o dinheiro não compra tudo.

Fechei os olhos, suspirando alto de frustração.

—Então vocês preferem que Emma venda-se um pouco a cada dia? Hoje foram os cabelos... Amanhã pode ser os dentes... E no outro a dignidade dela por trocados.

Percebi que minha fala os atingiu, já que Branca deu um passo cambaleante e David voltou a prestar atenção em mim.

—Porque é isso que irá acontecer... Que já está quase acontecendo.

A mulher caminhou até uma cadeira velha, sentando-se e segurando a cabeça nas mãos, como se apenas agora pensasse que isso poderia acontecer com sua menina, no desespero de conseguir ajudá-los.

—Seiscentas libras. – David falou com a voz sufocada. – Para quitar nossa dívida, dos atrasos dos alugueis e de outras coisas que precisamos comprar que são necessários e não conseguimos pagar. – ele olhou para mim, a ponta do nariz vermelha e indicou a mesa. – Sente-se riquinho. Irei citar a lista e o senhor, faça o favor de redigi-la. Não quero que pense que estou aproveitando-me.

—De modo algum, senhor. Sei que é um homem honesto. – declarei, auxiliando-o a chegar até a mesa, puxando a cadeira. – Costumávamos sermos amigos. – lembrei, tentando parar de chorar ao recordar das vezes que jantei ali e brinquei com David provocando as mulheres. - Quanto ao chalé...

—Apenas o dinheiro para as dívidas, riquinho.

Aquiesci, aceitando o papel que Branca estendeu para mim, junto com um pedaço de carvão.

—Antes de começar, gostaria de pedir um favor. Peçam para Emma parar de trabalhar na taverna. Não é lugar para ela.

David pressionou a ponte do nariz, entendo o que eu quis dizer.

—Garanto para o senhor que ela não irá.