No Rugido Do Leão

Cair Andüd, o reino escondido


O velhinho se levantou, com a ajuda de seu sobrinho, e começou a caminhar para dentro da torre. Lá, as escadas subiam em espiral para cima, construídas nas paredes. Com a ajuda de PL, ele fez rolar uma pedra que estava na base das escadas. Havia ali uma passagem, uma continuação das escadas, que desciam da mesma forma que subiam. Sam manteve-se junto de Caspian o tempo todo que estiveram descendo, pois ela sempre teve uma relação de queda com escadas. Belle também se mantinha próxima, mas era por causa da escuridão assustadora que aumentava a cada passo.

No fim das escadas que pareceram eternas, havia um lugar que parecia uma espécie de caverna, com uma tocha bruxuleante iluminando o local. As paredes eram muito diferentes das casas da superfície: eram marrons, úmidas, e tinham muitas raízes de plantas formando vergões nas paredes. Mas aquilo era apenas a entrada.

– Bem vindos ao reino escondido de Cair Andrüd. - PL sorriu.

Era de fato o lugar mais surpreendente que eles já haviam visto. Era uma grande vila, onde todas as casas eram escavadas dentro das raízes das árvores, mas ainda assim, tudo era muito iluminado, e tinha um cheiro fresco de terra molhada. Jardineiros trabalhavam em escadas gigantes ou acomodados em cima das casas, colhendo nabos, cenouras cebolas e batatas do teto, que era de terra e firme pelas raízes grandes e pequenas. As casas eram iluminadas com pedras brancas ou tochas de fogo, e cogumelos coloridos enfeitavam os jardins. No meio da vila, havia um grande lago, com uma fonte natural de rochas, onde a água corria como uma cascata.

Eliza guiou-os até a grande casa, construída sob as maiores raízes de toda a vila. Lá dentro, havia uma grande sala, onde estava uma cama de raízes. A cabeceira era alta, e tinha muitas flores nos ramos que a formavam, porém, eram flores tristes, quase sem vida. Na cama, havia um homem sentado, coberto até a cintura. Ele tinha o rosto triste e doente, e os olhos nublados. Sua pele tinha manchas e uma cor pálida, e seus cabelos eram ralos e alvos. Tudo nele indicava doença.

Uma moça estava do lado dele. Ela era ruiva, e parecia ser apenas vinte anos mais nova que o homem, embora fosse bem mais bela e saudável. Ao vê-los, espantou-se.

– Gildarion? - ela falou - Que faz aqui?

– Oi, mãe. Também senti sua falta. - PL debochou.

– Pensei ter dito para que não voltasse enquanto não tivesse respostas! - ela retrucou - Em vez disso, traz mais bocas para alimentarmos!

– Não pretendemos incomondá-la, senhora. - Belle segurou o braço da irmã - Venha, mana, vamos sair daqui!

– Eu voltei com respostas, como a senhora disse! - PL respondeu.

Samantha ignorou completamente a discussão que acontecia ali. Ela dirigiu-se para a cama, olhando o semblante daquele senhor. Ele parecia tão velho, cansado da vida. Parecia também tão amado por ela, uma daquelas pessoas que conhecemos em sonhos.

– Eldarion? - ela chamou suavemente.

Ele direcionou seus olhos nublados na direção dela. Seus lábios se abriam em um sorriso, e ele ergueu sua mão trêmula para tocar-lhe o rosto.

– Celebrian? - ele sussurrou, com sua voz rouca - É você?

– Ah, Eldarion, o que a vida fez com você? - ela sentou-se na cama do lado dele, segurando sua mão. - Você era um guerreiro tão forte... filho de guerreiros....

– Eu falhei, minha senhora.... - ele sussurrou - Sinto-me muito envergonhado por isso...

– Não, meu irmão, não sinta... - ela sorriu - Estamos aqui para ajudar...

– Estamos? - ele se assustou - Trouxe os prometidos da profecia?

– Seu neto nos trouxe para cá. - ela respondeu - Ele é um grande guerreiro.

– Aproximem-se, filhos da profecia. - o senhor pediu.

Belle e Caspian se aproximaram da cama, hipnotizados. O homem tornou a olhar para Samantha.

– Eu vejo a luz de Elendil brilhando em vocês, portadores da Estrela Vespertina. - ele continuou - Já era a hora dessa tormenta terminar. Eu sinto agora que posso me unir aos meus antepassados nos salões eternos, pois eu vi os filhos da profecia.

– Não, Eldarion, não diga isso... - Sam se comoveu. Ele olhou nos olhos dela.

– Você me lembra muito minha irmã Celebrian, jovem portadora do Undómiel. - ele sorriu - Faz jus à beleza de sua ancestral.

Samantha sorriu. Era bom ouvir que se parecia com Celebrian. Era como ouvir que se parecia com sua querida avó. O que acontecia frequentemente.

– Já chega. - a mulher os cortou - Gildarion, leve-os até a casa de Kuller. E não volte aqui até que eu o chame.

Passo Largo guiou os primos até a única casa de tamanho igual a de Eldarion, porém, esta ficava muito mais distante que a outra. E, diferentemente das outras, esta estava de portas fechadas.

– Esta é uma casinha encantadora! - Belle sorriu - Vou construir uma assim para mim naquela árvore do quintal de casa!

– Eu ajudo! - Sam riu, e se tocou que era a primeira vez que se lembravam de casa.

– Bom, conhecendo a Sammy como conheço... - Passo Largo sorriu, maroto - Aposto que vão adorar essa aqui.

Samantha estava pronta para retrucar, dizendo que era "Lady Samantha" para ele, mas a curiosidade falou mais alto, e ela se calou. Ele tinha sido gentil com ela denovo.

– Então surpreenda-me! - ela sorriu, cruzando os braços.

Ele bateu na porta exatamente quatro vezes. Esperou um tempo, e bateu mais seis. Então, a porta se abriu, mas só uma frestinha. Uma garotinha, de uns sete anos, olhava para eles curiosamente. Seus cabelos loiros estavam presos em duas trancinhas, e seus olhinhos, um verde e outro azul, piscavam curiosos.

– Posso ajudar? - ela perguntou.

– Oi Medalyne! - Passo Largo sorriu.

– Tio Gil! - ela correspondeu, pulando no colo dele.

Ele a pegou no colo, e entrou na casa, fazendo com que os outros o seguissem. Samantha quase desmaiou ao olhar ao redor: todas as paredes, do chão até o teto, estavam abarrotadas de livros. Cada cavidade, cada fresta, cada canto, tudo estava cheio de exemplares, volumes, tudo guardado entre as raízes.

– Sentiu saudade? - Passo Largo perguntou.

– Claro que sim! - a menininha respondeu - Semana passada, quando o pote de mel caiu da minha mão e quebrou, eu não tinha ninguém pra colocar a culpa!

Passo Largo riu. Era a mesma menininha de sempre.

– Que bagunça é essa na sala, Meddy? - uma voz masculina se fez audível.

– Tio Kuller, Tio Gil voltou! - Medalyne gritou, contente.

Um homem entrou na sala, de maneira soturna. Ele parecia ser mais novo que Passo Largo, porém, muito mais esperto. Tinha cabelos negros, meio azulados, presos por um ramo de flores pequeninas como um pequeno rabo de cavalo, e a pele morena. Seus trajes e seu porte lembravam os de Sherlock Holmes da Terra Média, era um homem bem culto.

Ele lançou um olhar para PL, que fez a todos na sala tremerem. PL colocou a pequena Medalyne no chão, e assumiu a mesma postura fria do anfitrião.

– Ora, parece que o peregrino resolveu voltar para casa, afinal. - o anfitrião disse.

– Não precisa dizer que sentiu saudade. - PL fez Meddy rir.

– E quem seriam essas pessoas? - o rapaz perguntou.

– São hóspedes para você. - PL respondeu. - Bom, eu vou voltar e conversar com tio Eliza. Meddy, gostaria de vir comigo?

– Eba! - a garotinha comemorou.

PL colocou a garota em suas costas e caminhou em direção a saída.

– Volte antes do chá! - o rapaz gritou, mas PL já havia saído da sala. Então, seu olhar se voltou a seus hóspedes. - Então... hóspedes de Gildarion?

– Somos peregrinos, milorde. - Belle achou sensato se pronunciar - Chamo-me Abelle Brown, e esses são minha irmã Samantha e nosso primo, Caspian X. Nós estamos apenas de partida, queremos ir para....

– Eu sei para onde vão. - ele os cortou.

Todos sentiram um calafrio na espinha.

– Eu nem acredito que vejo as sombras da profecia.... - ele sussurrou, feliz - Esperamos por tanto tempo!.... Eu já tinha até perdido a esperança!....

Os três se entreolharam. O anfitrião frio, agora parecia feliz. Bom? Talvez. Sinceramente, tudo o que eles queriam mesmo era descansar. Kuller providenciou quartos para cada um deles, mas Belle pediu para ficar junto de Sam, afinal aquelas casas eram muito estranhas, e não é de se espantar que alguém ficasse receoso de dormir sozinho em uma delas.

Samantha e Abelle dormiram por cerca de três horas, porém Caspian não conseguiu. Não se sentia muito confortável. Ele retornou até a sala, e surpreendeu-se a ver o rapaz sentado em uma poltrona, lendo um livro.

– Sem sono? - ele perguntou.

– Nunca dormi numa raiz de carvalho, se quer saber. - Caspian comentou.

– Venha, sente-se. - o rapaz indicou-lhe um lugar em um sofá de madeira, com assento de palha trançada. E era surpreendentemente confortável.

– Será que eu posso perguntar, por que chamam PL por esse nome estranho? - Caspian começou.

– De Gildarion? - o rapaz perguntou, vendo Caspian confirmar com a cabeça - Porque é o nome dele! Gildarion II, filho de Kaern, filho de Eldarion, filho de Aragorn.

Caspian arregalou os olhos. Estiveram todo esse tempo com um filho de Aragorn, e nem sabiam.

– Espera, está falando de Aragorn, filho de Aratorn, rei de Gondor? - ele questionou - AQUELE Aragorn?

– Ele não te contou? - o rapaz riu.

– Ele não conta muita coisa...

O rapaz riu com a resposta de Caspian. Típico dele. A porta se abriu, assustando-os. Medalyne entrou toda saltitante, cheia de flores na cabeça.

– Meddy, querida! - Kuller sorriu - Que alegria toda é essa?

– A tia Milifrey e um monte de gente tá arrumando a vila! - ela riu, sentando-se no colo do rapaz - Eles vão dar uma festa pros visitantes! Eu achei estranho, eles geralmente não gostam de visitantes....

– Eu não acho estranho, Meddy... nem um pouquinho. - Kuller sorriu - Vai acordar as irmãs, vai! Veja roupas bem bonitas da Kathy para elas usarem na festa hoje!

A menininha, toda serelepe, saiu correndo em direção aos quartos. Kuller olhou para Caspian, e sorriu.

– Venha, meu caro. Precisa de trajes adequados. - ele disse, e Caspian respirou fundo. Lá ia ele se arrumar para uma festa, aquilo que ele mais odiava fazer.