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Seria bom demais se aquela noite terminasse em sorrisos e doces lágrimas, porém não foi assim.



Passado-se tão poucos minutos que aquela criaturazinha viera ao mundo, a donzela sentia fortes dores em seu abdômen e sem que o moço notasse, levantou os lençóis deparando-se com uma enorme mancha vermelha que aumentava a cada minuto. O pânico era visível em seus olhos e lhe roubara a fala, estava tão debilitada que mal podia se mexer, sua cabeça doía, assim como todo o seu corpo.



A garota começou a tossir, o que chamou a atenção do homem ao seu lado, ao retirar a mão de sua boca quando a tosse cessou, havia sangue em seus dedos, ela olhou assustada para o jovem, que entrara em desespero, levantando-se imediatamente da cama com a criança em seus braços ele seguiu até a porta para pedir ajuda, mas antes que a abrisse e descesse as escadas para chegar ao primeiro andar, ouviu um chamado rouco e fraco:

___ Por favor, não vá!

O rapaz deteve-se e voltou seu olhar para a moça.

___ Fique comigo...

Não podia negar tal qual pedido, porém o jovem levou alguns segundos para refletir, olhou para a mancha carmesim no pálido lençol, já havia aumentado de tamanho, depois buscou o semblante da garota, parecia estar decompondo-se como se há tempos não mais houvesse vida em seu corpo, sua pele estava ressecada, a qualquer momento trincaria como vidro, seus cabelos opacos e quebradiços, seus dedos tão finos quanto galhos de uma árvore estendidos para ele.

O moço aproximou-se calmamente, queria tanto poder chamar ajuda, mas quando sentou-se novamente ao lado dela, percebeu que não havia como ajudá-la, sua respiração estava tão tênue, ofegante, dar apenas um suspiro parecia difícil demais.

Em seus braços, ele segurava ambos os seres que mais amava naquele mundo, e enquanto a vida da mulher esvaía-se como a areia de uma ampulheta, ele pensava, a apertava e não deixava com que ela ouvisse seu choro, enquanto a nova vida tornava-se cada vez mais forte, embora ainda tão frágil.

Como era curioso e confuso aquele momento, o rapaz devia sentir-se como uma balança vital, de um lado uma tênue vida que aos poucos se perdia enquanto no lado oposto, uma tênue vida que aos poucos se fortalecia, uma estranha transição, uma troca de forças e apenas ele como intermediário. Estava entre a vida e a morte, entre o início e o fim, entre a alegria e a tristeza, o tudo e o nada em seus trêmulos braços.

Apenas cinco minutos, nada mais nada menos e então ele ouvira... O silêncio. Aquele quarto antes abafando frenéticos gritos agora abrigava o pérfido silêncio sufocante, então não mais temeu e pôs-se a chorar, tendo em seus braços o amor que lhe deixara para lhe presentear com um novo amor.

Olhou para a pequena criatura em seus braços, como podia ser tão bela e frágil ao mesmo tempo? Como podia matar e continuar tão inocente? Que maneira cruel de se fazer presente, tirando a vida de quem lhe deu uma, como pode brincar assim com a alma e o coração de alguém? Pensamentos confusos e estranhos que habitavam a mente daquele jovem viúvo... Aquele jovem pai...

O enterro da amada fora depois de dois dias. O jovem estava diante de um caixão fechado e ao lado uma sepultura aberta, a criança dormia nos braços da fiel criada da família, não tinha forças para segurá-la, não sabia como manter-se em pé, não havia palavras para descrever a sua dor, porém podia ser facilmente entendida através das reconfortantes orações do bondoso padre Cosmin.

Sua mente vagava enquanto as palavras entravam por seus ouvidos produzindo um som abafado e quase distante, a voz daquele cristão era tão grave e profunda, porém naquele momento era mais leve que uma pena seguindo na direção do vento.

Os primeiros flocos de neve caíam sobre o caixão e o rapaz deixava sua imaginação tomar qualquer rumo, imaginando como a morta beleza daquela exuberante garota através do tempo resistiria, assim como um anjo... Naquele mesmo instante estaria ascendendo aos céus, sem dor, sem lágrimas, sem gritos, apenas um justo e infindo sono.

Tranquilamente ela dormiria, não estava sozinha naquele cemitério, parentes e amigos lhe fariam companhia, cantariam e dançariam com ela quando a lua surgisse e lhe protegeriam de qualquer mal que lhe afligisse, estava segura nos braços da morte, não havia com o que se preocupar.

Ao lado estava um senhor, tão semelhante ao jovem, envolvia-o com um de seus braços enquanto o moço encontrava-se cabisbaixo olhando fixamente para o caixão, até baixar e ser totalmente ocultado pela terra tão morta quanto a própria donzela.

A vida lhe deu um presente, a morte lhe roubou outro e assim teria de conviver até o fim de seus dias.

Fora o último a deixar o cemitério, e antes que começasse a andar, olhou novamente para a lápide do mais frio e duro mármore tão delicadamente trabalhado para que nunca fosse quebrado ou esquecido. Leu atentamente o nome em letras grandes, apenas palavras e nada mais, o rosto daquela linda garota ficaria apenas na memória de quem a conheceu e a amou.


KATRINA PETRESCU



1822-1840



Amada esposa