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No dia do batizado da jovem criaturazinha, familiares e amigos estavam presentes, ali perante à pequenina igreja da tranquila vila, as pessoas iam entrando calmamente e sentando-se nos bancos de madeira de modo silencioso e educado. Uma mulher de meia idade cumprimentava e recebia todos gentilmente ao lado da porta de entrada enquanto o rapaz estava no altar conversando com os padrinhos da criança.

Era uma pequena e singela igreja, a única do vilarejo, porém muito bela, não havia muitos detalhes que a enfeitavam, todavia a chave de sua beleza estava na humildade da decoração, algumas estátuas de santos espalhadas pelo lugar, pequeninas para não roubar a atenção da enorme imagem de Jesus Cristo bem no centro do recinto sagrado e logo atrás um maravilhoso vitral colorido, uma imagem de tamanho médio de Ștefan cel Mare¹ ou Estevão o Grande brilhando através das luzes do vitral e encantando os olhos dos fieis, parentes e amigos que lá estavam presentes, o grande guerreiro canonizado! Havia também duas fileiras de bancos, uma de cada lado, eram estreitos e simples, davam apenas para cinco pessoas no máximo, as fileiras eram separadas por um fino tapete vermelho feito de veludo que partia da porta de entrada até o altar.

Todos que entravam, iam andando vagarosamente, pois seus olhares partiam para diversas direções admirando os toques pouco requintados, mas de muito prestígio que buscavam captar a mais fiel imagem das construções de mais de 30 igrejas nos principais condados romenos a mando do guerreiro moldavo. Quando parentes e amigos pararam de chegar, a mulher com a ajuda de um homem de idade um pouco mais avançada que ela caminharam até perto do altar, já poderiam dar início à cerimônia de batismo.

Os convidados ali presentes estavam espalhados pelos bancos, pois não eram muitos, entretanto era o essencial. Pelos traços no rosto da mulher que os recebera comparados à bela dama que não estava mais entre eles, podia se dizer que era sua mãe e o cavalheiro ao lado dela seria seu marido, formavam um bonito casal e apesar da dor da perda em seus corações, o presente abençoado que viera os confortava.

Ao lado do rapaz, estava um casal mais velho, notava-se uma certa semelhança entre o moço e o homem ao lado de uma senhora muito bem vestida com um vestido azul escuro, estes eram os avós paternos, sorridentes e com os olhos marejados ao fitarem aquela coisinha frágil e indefesa que naquele dia seria conhecido por todos ali presentes.

O padre chegara até perto do viúvo e inexperiente pai, estava trajando uma batina branca decorada com finos fios dourados nas mangas e na gola, ele tinha um ar calmo e adorável, os olhos rodeados por rugas, porém ainda com um brilho terno, os cabelos grisalhos e as pequenas e fofas mãos enrugadas. Disse algumas palavras diante das pessoas que acompanhavam a cerimônia, pegara o tênue ser em seus braços e direcionando-se ao moço, perguntou:

___ Qual é o nome da criança?

O rapaz, apesar do ar entristecido, respondera com um sorriso:

___ Damian Petrescu.

___ Damian Petrescu ___ falou o padre levantando a criança para que todos ali presentes pudessem vê-lo ___, filho de Katrina e Ionel Petrescu, eu te batizo em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo.

Cuidadosamente o padre ia jogando poucas quantidades de água benta sobre o jovem Damian enquanto pronunciava palavras santificadas e depois, mergulhara-o brevemente sobre a bacia feita de ouro.

Com um lívido e seco manto, a avó materna envolvera-o ternamente em seus braços e o padre fazendo o sinal da cruz diante do recém-nascido disse:

___ Eu o abençoo em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo e rezo para que esta família seja extremamente feliz até o fim de suas vidas, amém.

Todos estavam felizes, algumas mulheres até choraram de emoção e discretamente com seus finos lenços de seda enxugavam suas lágrimas, podia-se ouvir alguns agudos soluços, porém não havia uma alma ali presente que não estava saudando a nova vida que chegava a este confuso mundo.

Algumas orações foram feitas celebrando o novo cidadão daquela pacata comuna, ouvia-se burburinhos confusos ecoando pelas paredes, batendo e voltando, encontrando-se com outros sons desnorteados e misturando-se tudo, porém a criaturazinha parecia não se importar com a tempestade quase silenciosa de vozes ao seu redor.

Após o batizado, todos seguiram até a moradia do jovem Ionel para uma bela festa em homenagem ao pequeno herdeiro Petrescu, havia muita comida e bebida e o festejo durara várias horas, todos queriam segurar, nem que fosse por pouquíssimos minutos o jovem garoto de pele pálida e cabelos negros como os de sua mãe.

As moças e rapazes dançavam em círculos segurando no ombro do parceiro ou parceira que estivesse ao seu lado, o círculo ia e vinha como um moinho de vento acompanhando o som alegórico que a cobza² fazia acompanhada pelo cimpoi² e a ocarina². As roupas eram brancas ou pintadas com pequenos tons de amarelo, rosa, azul e outras cores alegres e vibrantes que contagiavam o lugar.

Para os jovens era uma diversão comum e nunca cansativa, para os mais velhos, um terno momento de nostalgia de quando os anos lhe eram parceiros e não lhe traíam desenhando rugas e banhando seus corpos com o cansaço de uma vida de trabalho duro, porém de intensa felicidade. Os casais de idade mais avançada também arriscavam alguns passos dessa animada coreografia conhecida como sirba³.

O rapaz sorria para todos os convidados tendo em seu peito a triste dor da perda, bebia um vinho sem sabor, não sentia o aroma da comida e as risadas ecoavam dentro de sua mente como ruídos estranhos e nunca ouvidos antes.

De madrugada, os pais do jovem foram os últimos a deixar a moradia. Ionel fechou a porta e desmanchando-se no sofá, parecia abatido, os poucos dias que se seguiram depois do enterro da esposa até o presente momento foram fúnebres e vazios, dias que se transformaram em poeira que voara ao vento para longe.

O moço olhou para o cesto onde o pequeno Damian dormia e deixou com que a ternura banhasse seu coração e aquecesse sua alma na esperança de não tornar-se um ser feito de mármore como a lápide de sua amada Katrina.

Não seria fácil esquecê-la, um pedaço de seu corpo estava docemente adormecido diante de seus olhos cansados, não poderia afogar-se em um sombrio devaneio de que um dia ela poderia voltar sabendo que havia uma vida indefesa pedindo inconscientemente por ele, chamando-o e querendo-o por perto, não podia desistir de tudo, não podia parar de lutar, pois ainda havia motivos para continuar.

Parecia enfeitiçado por aquela criança, apesar da aparência exaurida, estava feliz, uma felicidade tão grande que mal cabia em seu peito, não se cansava de observar os detalhes daquele pequeno e indefeso ser que tranquilamente dormia, com seus dedos ele o acariciava amorosamente tentando fazer o máximo de silêncio para não acordá-lo.

Era realmente um lindo bebê, sua pele tão lúrida e lisa como a neve que viera visitá-los, seus poucos cabelos tão negros quanto a noite sem luar e seus lábios eram tão vermelhos quanto sangue, estavam entreabertos e ao fitá-los, Ionel percebeu algo incomum. Com a ajuda do polegar, o rapaz movera delicadamente o lábio inferior do menino para baixo para verificar.

Seus olhos arregalaram-se ao notar que já haviam quatro dentes em crescimento na boca do pequeno Damian, “como isto era possível?”, perguntou-se ele, pois o jovenzinho tinha apenas alguns dias de vida, apenas alguns dias e nada mais. Encarou aqueles dentes, enfiou o dedo indicador dentro da boca do garoto para ver melhor e assustara-se quando o bebê mordera-o causando um pequeno corte.

O viúvo retirara rapidamente o dedo e vira que saía um pouco de sangue do ferimento, levou-o até os lábios e percebera que havia uma gota de seu sangue na boca da criança, com um lenço, o moço enxugou a pequena mancha, notara que suas mãos estavam trêmulas e pálidas, procurou se controlar e pensar que aquilo poderia ser normal em alguns bebês recém-nascidos.