My Sky Angel

Capítulo 17 - Merida


Uma lágrima escorreu-me da face quando soltei a flecha. Falhei o alvo. Algo que nos últimos dias fazia com frequência. Hans tinha razão. Anna poderia ter-se aleijado ou magoado. E, se isso acontecesse? Eu numa me perdoaria. Deixei cair o arco e sentei-me encostada a uma árvore com a cabeça entre as pernas. Mal tinha comido mas isso não fazia diferença. Não tinha fome de qualquer jeito.

Angus trazia sempre um peixe ou dois para mim mas eu sempre recusava. Só não recusava quando ele começava a puxar-me a roupa com os dentes e a saltar para cima de mim. Os hiddicks eram animais de corpo e alma e não só de espírito. Não necessitavam de comer, dormir, beber, não tinham frio nem calor mas sentiam todas as emoções da nossa parte. Tinham emoções próprias também como estar alerta, com medo ou até mesmo alegres. E nós sentíamo-las como eles também sentiam as nossas. Era um género de laço invisível que nos ligava. Eu via e sentia que ele se sentia triste porque eu estava triste. As suas orelhas arrebitadas estavam sempre baixas agora e a sua cauda bastante mais descaída. Mas isso não o impedia de me encorajar a continuar em frente.

Será que Anna estaria bem? Será que ela me perdoaria? E Hans? Ele também me perdoaria? Solto um pequeno suspiro e limpo a cara com as costas da mão. Sentia-me sem forças. Estaria aqui há quanto tempo? Um, dois, três dias? Não fazia a menor ideia.

Tinha que me levantar. Eu era forte, as palavras de Hans não me poderiam atingir da forma que me atingiram. Ele não tinha razão. A parte que se tentava manter forte e racional acreditava mas também havia a outra parte. A parte em que Hans tinha razão e eu não tivera desculpa para ter omitido. Estava totalmente deprimida.

Hans era considerado o meu irmão mais velho e eu desapontara o meu irmão mais velho. Apesar de todos termos a mesma idade e nascido no mesmo dia, nós agrupávamo-nos com Hans de irmão mais velho, eu irmã do meio e Anna, a irmã caçula. Muitas vezes eu e Hans discutíamos e era por causa dos nossos feitios que nos tínhamos agrupado assim. Hans sempre agira como se fosse mais velho, até as suas feições o faziam parecer mais velho. O seu passado, algo que ele nunca falara, era a causa disso, eu sabia-o mas não sabia o porquê. Anna, já com o seu jeito mais amigável e desprotegido, fora assemelhada à irmã mais nova, à garota mais inocente.

Peguei no meu arco e armei-o com uma flecha. Desta vez ia conseguir. Eu ultrapassei a dor. Ia voltar para casa, neste caso uma gruta provisória, e engoliria o meu orgulho. Inspirei e expirei profundamente três vezes, fechei os olhos e, quando os abri, mirei rapidamente o alvo.

Acertara, mesmo no centro. Olhei para Angus que me olhou de volta com os seus pequenos olhos pretos.

– Vamos embora, Angus – anunciei.

Voei com Angus às costas de cabeça encolhida devido ao seu pequeno medo de alturas. Estávamos um bocado longe mas eu era capaz de me guiar até lá por isso voei à maior velocidade. Se não estivesse com a cabeça cheia de pensamentos diria que aquela adrenalina toda daria imenso prazer pois era uma sensação espetacular. Contudo neste momento eu não estava a pensar nisso. Reconheci ao longe a árvore gigante que habitava ao lado do nosso esconderijo. Reparei mais em baixo que havia um lago, algo que eu não tinha reparado.

Sobrevoava agora mais baixo e pousei perto da gruta. Apareci no pátio, era onde costumávamos estar a voar e afins, mesmo em frente à pequena cavidade que servia de abrigo.

– Merida? – ouvi uma voz de rapaz. Olhei, era Hiccup e estava bastante surpreso

– Até enfim que regressaste – fui surpreendida pelo abraço de Hans – desculpa tudo aquilo que te disse.

Hans estava a engolir o orgulho, eu notava pois tanto a mim como a ele o nosso orgulho era muito alto e deixá-lo de lado era bastante difícil. Abracei-o de volta. Os seus braços retesaram um pouco mas logo voltaram a relaxar.

– Desculpa-me a mim também – eu disse, com a voz embargada – eu devia ter mais cuidado.

Nenhum de nós parou de se abraçar ou disse mais uma palavra. Ouvi um pigarrear e soltei-me de Hans.

– Não queria estragar o abraço de irmãos – Elsa parecia um pouco preocupada – mas por falar em irmãos. A Anna veio contigo?

– A Anna? – perguntei confusa.

– Ela foi procurar-te e… – Hans olhava-me com um olhar triste e eu logo abati. Rapunzel, que estava ao meu lado, tentou amparar-me e foi ajudada por Hans senão eu cairia ao chão.

– Temos de ir procura-la! – grito e pego no meu arco que caíra entretanto ao chão.

– Ela está com Kristoff – Punzie interveio – tens que descansar. Ele tratará bem dela, não te preocupes.

Suspirei. Como pude deixar isto acontecer? Claro que Anna viria atrás de mim. Ela sabia que seria a única que eu ouviria para fazer as pazes com Hans. A minha maninha, o que estaria a acontecer com ela agora?

Comemos peixe desta vez cozido pois como Angus não sabia acender uma lareira ia enfiando na minha boca algum peixe cru. Estava uma delícia e pelos vistos eles já tinham conhecimento daquele lago pois contaram-me como encontraram o peixe. Disseram-me também que agora faziam vigias, tanto noturnas como diurnas para afugentar tanto animais como para ver se alguém nos vigiava. Não ouvia muito mais pois naquele momento os meus olhos recusavam-se a querer continuar abertos. Eles perceberam isso e logo me convidaram para me ir deitar pois eu estava a precisar de dormir. Ainda tentei contestar mas sem sucesso.

Quando me deitei já tinha os olhos mais fechados que abertos e bocejava sem parar. Enrosquei-me e adormeci de imediato num sono profundo.

Estava numa casa, não me lembrava dela. Tentei lembrar-me da última coisa que tinha acontecido. Eu tinha-me deitado e adormecido. Ou estava a sonhar ou tinham-me levado para algum lado durante o sono. Observei o local. Era uma casa branca com um terreno e uma árvore onde estava pendurado um alvo. A casa tinha algo de familiar mas eu não me lembrava dela. Ouço passos.

– Papá! Papá! – ouço a voz de uma criança chamar.

– Já vou Merida! – uma voz grande ecoa e dou instantaneamente um passo para trás. Era-me familiar mas eu não sabia de onde. Mas assustou-me ouvir o meu nome por isso inspirei fundo e procurei a origem das vozes.

Encontro uma criança pequena de cabelos ruivos encaracolados e de cara redonda. Tinha um pequeno arco na mão e parecia estar muito contente com ele. Era desajeitada mas lá conseguia enganchar a seta no fio e apontar para o alvo. Disparou três flechas na qual uma acertou o alvo.

– Eu consegui! – ela levantou as pequenas mãos para o ar a festejar a vitória.

– Merida – ouço uma voz suave de senhora a chamar. Familiar mas sem me lembrar de onde, como todas as outras – hora do jantar.

– Já vou, mamã – a pequena exclama entrando na casa e comigo a segui-la.

Quando já todos estavam sentados na mesa a tal Merida exclama.

– Eu acertei no alvo, eu acertei! – ela fala totalmente contente e orgulhosa.

– Eu sabias que ias conseguir. – Um homem de barba e cabelo ruivo exclama, obviamente orgulhoso da filha.

Ouço alguém a bater na porta. O homem levanta-se e vai ver. Na porta está uma mulher jovem mas com uma expressão séria. Não consigo ouvir o que dizem mas quando a porta se fechou ele virou-se para a mulher de cabelos castanhos que assentiu e apertou a mão da criança.

– Não a podemos ter. Eles já sabem. – ele olhou infeliz para a pequena criança a quem tinham tanto amor.

Ambos desfraldam as asas. Ambas amarelas na capa embora as da mulher fossem sarapintadas com pintinhas pequenas pretas.

– Vamos – ela anunciou e puxou a criança para o seu colo.

Acordei sobressaltada. Passado algum tempo vi que ainda era escuro e estavam todos a dormir. Havia três camas vazias. Saí para apanhar ar e Elsa olhou para mim desprevenida.

– Está tudo bem? – ela pergunta.

– Pesadelo – eu digo e ela assente sem dizer mais nenhuma palavra. O sonho ainda me estava gravado na memória.