Talvez Anna estivesse apaixonada. Mas Christine era o anjo do Fantasma, e o Fantasma era seu anjo. Anna só estava no caminho, por mais que doesse para Christine admitir isso. Ela tinha se afeiçoado à menina.


–Lui esteve te procurando o dia todo, Anna. - disse Christine, sorrindo.


Anna retribuiu o sorriso, o que espantou Christine um pouco. Ela nunca vira Anna sorrir... A menor se virou, e continuou pelos corredores, procurando por Lui.


"Preciso achar o meu anjo." , Christine pensou, e fez seu caminho até o seu antigo quarto, que agora era de Anna. A menina ficaria ocupada por um bom tempo.

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–Lui! - o menino mascarado ouviu chamarem. "Será Anna?" A voz era a dela, com certeza.


–Anna! - ele exclamou. Ela vinha correndo em sua direção.


Eles se cumprimentaram em um abraço.


–Já estava com saudades. Onde esteve?


–Não posso falar muito sobre isso, Lui. Vamos só dizer que o conde é um tarado.


Lui riu, nervoso.

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Christine entrou devagar no seu antigo quarto e camarim, que agora servia a Anna. Ela deu uma olhada ao redor, e se dirigiu ao espelho. Christine deslizou o espelho para o lado, entrando nos túneis escuros escondidos do Ópera Populaire.


-Anjo? Anjo? - ela perguntou, sem saber direito para onde ia.


-O que está fazendo aqui? - ela escutou a voz de seu anjo vinda de todos os lugares e de lugar nenhum.


-Eu... Eu estava com saudades, Anjo. Então eu vim te ver.


-Está mentindo.


-Não, não estou. Não posso mais mentir para você, Anjo.


-Onde está seu marido?


-Raoul? - Christine soltou uma risadinha, pensando que seu Anjo estava com ciúmes. -Não me casei com ele. Não sinto mais nada por ele. Só tenho sentimentos por você.


De repente, Christine pode ver a máscara branca e, é claro, o dono dela, bem a sua frente; o rosto a centímetros do seu.


-Vá embora, Christine. Eu não te quero mais. -ele sussurrou.


-Vou fazer você me querer. - ela respondeu, e ficando nas pontas dos pés, beijou os lábios de seu anjo, segurando o rosto dele com ambas as mãos. Ele não correspondeu por algum tempo, então ela sentiu os lábios dele movendo-se junto aos seus enquanto um par de braços fortes enlaçava-lhe a cintura.


Erik não queria se dar por vencido, mas ele havia amado Christine desde que ela era pequena. Não era o mesmo que sentia por Anna. O toque de Christine não fazia com que seu corpo se arrepiasse, nem as palavras dela tinham a capacidade de fazer com que o coração duro do anjo caído se acelerasse, e amolecesse. Era um amor fraternal. Ele praticamente a tinha criado. Erik queria ter certeza de que Christine estava segura, e o único jeito de fazer isso era protegendo-a ele mesmo... Não era? Mas ela o tinha traído...


Christine afastou os lábios dos de seu Anjo, recuperando o fôlego, encostando a testa na dele.


-Estava sentindo muito a sua falta. - ela sussurrou, e os olhos dele se abaixaram para examinar sua protegida. Ela continuava muito bonita. Não chegava ainda nem aos pés de Anna. Ninguém chegava. Mas não era possível tampouco dizer que Christine era feia. Então ele viu marcas escuras na pele alva do pescoço de Christine. Marcas na forma de mãos.


-Christine. - ele balbuciou, irritado. Seus dedos pousaram levemente nos machucados, acariciando-os como se pudesse fazê-los sumir se fosse bem gentil. -Quem fez isso?


A menina já não tão inocente, não como Anna, ficou visivelmente embaraçada.


-Raoul. - sua voz saiu num sussurro.


-Como assim? Por quê? Eu vou matar aquele idiota...


-Não, Erik, não. Ele estava irritado, só perdeu o controle por um momento. Estou perfeitamente bem. Por favor, acalme-se.


E ela beijou-o novamente. Mais uma vez, Erik não sentiu nada, se comparado com o que Anna o fazia sentir.


-Christine. Não posso mais fazer isso. Não te quero mais.


A menina o observou curiosa, tentando achar algo em seus olhos. Angústia. Remorso. Amor? Mas não por ela... Não, não por ela.


-Você... Tem outra, não é? Já encontrou outra pessoa para me substituir. - ela murmurou. -Anna? - Christine perguntou, para a surpresa do Fantasma. Ele arregalou os olhos. - Madame Giry disse qualquer coisa sobre isso. - explicou-se.


-Eu ainda amo você, Christine. Amo você. Só não do jeito que amo Anna. Eu te amo quase como uma filha. A Anna, amo como mulher.


Lágrimas começaram a brotar dos olhos de Christine.


-Ora, não fique assim. Eu amo você. - ele sussurrou. Secou uma de suas lágrimas.


Então Christine viu de relance uma sombra se aproximando. Pensou ser apenas impressão sua num primeiro momento. Não olhou, apenas sorriu para Erik e inclinou-se para selar seus lábios novamente. Quando se separaram, os olhos de Erik tinham um ar pensativo.


-Erik? - uma terceira voz perguntou.


-Anna. - ele sussurrou, visivelmente angustiado, e surpreso


Lágrimas brilhavam nos olhos da menina embora ela não as deixasse escapar.


-Não é o que parece!- Erik voltou a falar com sua voz aveludada, em tom de súplica. -Juro que não. - ele largou uma sorridente Christine de forma rude, se aproximando do seu único anjo.


Mas seu anjo tinha saído correndo. Ela não era rápida, e Erik sabia que devia segui-la, pois Anna nunca sabia como voltar pelos túneis. Não queria que ela caísse em uma armadilha. Sem se dar mais tempo para pensar, Erik saiu em disparada pelos corredores escuros, deixando Christine só.


-Anna, por favor, pare! Podemos conversar! - ele disse, vendo ao longe a figura pequena e frágil da menina.


Anna já tinha corrido muito e ainda faltava para conseguir chegar a saída dos túneis. Ela sentia seus joelhos tremerem demasiadamente. Iria desmaiar se continuasse correndo, aquela sensação lhe era conhecida. Continuou o percurso mesmo assim. Não prestava mais atenção à onde ia, só não queria ter que ver Erik novamente. De repente ela sentiu o chão sob seus pés desaparecer. Seus olhos se fecharam, e sua consciência foi levada embora junto com a sua visão. Ela estava certa, afinal. Desmaiou.


Erik pode ouvir o barulho a sua frente. Sabia que tinha uma armadilha muito perto. Ele continuou correndo, até chegar até a enorme fenda no chão. Anna estava lá, ele conseguia ver, em meio as águas escuras. Ele pulou, caindo na água com um baque. Procurou Anna. Ela estava sendo empurrada para o fundo. Não estava consciente, Erik constatou, enquanto ia ao encontro do corpo frágil da menina, prendendo o fôlego. Ele a segurou firme nos braços e tentou chegar a superfície o mais rápido possível. Ele queria salvar Anna. Ele precisava salvar Anna. Não existia mais vida sem ela.

Chegou a uma das margens da lagoa onde estava. Era a única passagem por onde eles poderiam escapar. Erik deitou uma Anna inconsciente no chão de pedras, e tentou reanimá-la, tentando fazer a água sair de dentro de si, pressionando suas mãos contra o abdômen dela. Então passou a fazer respiração boca a boca, e só parou quando teve resultado. Anna começou a respirar, lentamente. De repente ela abriu os olhos, arregalando-os e tossindo, deixando toda a água que tinha engolido sair de seu corpo. Erik pôs uma mão nas costas da menina, tentando incentivá-la a continuar.

Então, Anna parou de tossir. Começou a chorar, soluçar... Estava em prantos. Seus soluços faziam Erik morrer por dentro. "É tudo culpa minha... Ela quase morreu, e é por minha culpa.", ele pensava.

-Foi tão... tão h-horrível. - ela murmurou, entre um soluço e outro.
Embora não se sentisse mais digno de tal ato, Erik envolveu a menina em seus braços, acalmando-a, enquanto sentia o desespero molhado dela lhe ensopar a camisa.

-Eu sei, Anna, eu sei. Mas vai ficar tudo bem, eu prometo.
Ela se afastou um pouco e encarou o rosto do homem mascarado, as sobrancelhas erguidas.

-Anna, eu sinto muito pelo que você viu, mas foi tudo inesperado. Eu disse a Christine não a quero,disse que amo você. E eu amo você, Anna, e só você. Por favor, entenda isso. Eu vou te proteger e cuidar de você, está bem?

Anna assentiu e voltou a enterrar o rosto no peito de Erik. Os braços dele a seguravam firmemente, e ele tinha uma mão nas costas dela, enquanto a outra afagava os cabelos da menina. Os soluços dela começaram a cessar depois de alguns minutos. Ela ergueu os olhos encharcados mais uma vez para olhar para Erik.

-Obrigada. - Anna sussurrou, sem jeito.

Ele apenas sorriu, de um jeito muito tristonho, e secou com o polegar uma lágrima que escorria pela bochecha da morena, enquanto o outro braço ainda a segurava firme pela cintura.

-Vamos, acho melhor eu te levar para casa e cuidar de você.

Anna arqueou uma sobrancelha.

-Só quero ter certeza de que vai ficar bem. Depois, se não quiser mais a minha companhia, eu entenderei perfeitamente e te levarei para o seu dormitório, certo? - Erik voltou a falar.

A menina assentiu lentamente. Fez menção de se levantar, mas o Fantasma foi mais rápido e a pegou nos braços, carregando-a com cuidado por todo o caminho. Ele resolveria o que fazer a respeito de Christine depois. Erik sentiu as mãos de Anna em seu pescoço, procurando algum apoio. Ela fechou os olhos. Apesar do corpo do Fantasma estar tão ensopado quanto o dela, ele conseguia emanar um tipo totalmente diferente de calor. Era tão bom... Ela poderia ficar ali para sempre. Começou a se sentir sonolenta, mas prometeu a si mesma que não ia dormir. Então Anna abriu os olhos e viu que Erik a observava com olhos calmos. Sorriram um pro outro.

-Já estamos chegando. Aqui, vou precisar soltar você um pouco. Vamos atravessar o Lago. - ele disse, e então sentou Anna no pequeno barco, pegando os remos logo em seguida, remando tão rápido quanto podia.

Ele voltou a pegar seu pequeno anjo nos braços quando chegaram a outra margem, sem permitir que ela fizesse esforço algum.

-Precisamos colocar roupas secas. - Erik falou.

-Precisamos tomar banho, isso sim. O que tinha naquela água de tão fedorento, afinal? - ela perguntou, e o Fantasma soltou uma risada.

-Boa pergunta. - ele murmurou. -Você vai precisar de ajuda.
Ele a levou até o banheiro, onde começou a encher a banheira, deixando-a de pé. Ele tinha desenvolvido sistemas muito avançados de encanamentos, e conseguia até tomar banho com água morna.

-Está cheia. - o Fantasma anunciou depois de um tempo, e se virou para olhar Anna. Ela se apoiava num pé só e tinha uma expressão de dor absoluta no rosto. -O que foi, Anna? - Erik logo se pôs de pé, para ajudar sua pequena.

-Er... Minha perna. Ela dói muito, não consigo encostá-la no chão.

Erik levantou a barra do vestido da menina, apenas o suficiente para conseguir ver o que tinha acontecido. O tornozelo dela estava muito inchado e tomando uma coloração arroxeada. Ela também tinha um corte na batata da perna, mas provavelmente era só o tornozelo que a estava impedindo de ficar de pé direito.

-Ah, Anna... - ele sussurrou, sem saber direito o que fazer. -Assim fica complicado.