Mistérios de Frost Ville - II

Os hits da semana, com Sean Cruz


Merida estendeu a planta do prédio escolar no gramado e prendeu as bordas com pedras para que não escapasse. O sol estava quase a pino e Wilbur chupava uma casquinha de sorvete de chocolate. Estava quente na cidade e o sol fritava os cabelos de todo mundo com o ardor e manchava as camisas de suor. Os sete amigos estavam sentados embaixo de uma árvore ao lado do colégio. Warren Dickson e Juliet Scafandro passaram fofocando sobre Sammy Scott ter passado mal em uma festa que Timmy Tuner havia dado na noite passada. No mesmo momento, Jack e Soluço viram Kaleel Everdeen e Roy Lawrence encostados no carro de Mika enquanto dividiam um cigarro. Os quatro trocaram olhares e logo Kaleel jogou a bituca no chão e pisou em cima, saindo de lá com o boca-de-bosta Lawrence.

— Eu pensei em duas coisas – Merida começou a dizer – Nós vamos pegar comida estragada e colocar nas entradas dos dutos de ventilação que ficam aqui, aqui e aqui. Eu pensei na possibilidade de também colocarmos ração de bicho. Voce tem, não tem, Soluço? Aquele negócio fede. Não sei como o Banguela come aquilo.

Soluço revirou os olhos e ajeitou os óculos. Wilbur riu fazendo barulho de porco.

— O objetivo é afastarmos as pessoas do prédio para que possamos entrar na sala do sr. Brown sem nos verem ou nos impedirem – completou Jack, apontando para o desenho do cômodo de seu antigo professor.

Uma bola de futebol americano caiu entre Violeta e Soluço, espalhando terra por seus sapatos. Quando ergueram os olhos, encontraram Bobb Hunter, um dos gostosões do time de futebol americano, acenando para que jogassem a bola de volta.

— Vai logo, gracinha – gritou Bobb – Não vai me machucar.

Mas machucou. Sem nem esperar, Bobb recebeu uma bolada no olho e caiu gritando como um bebe chorão. Todos, inclusive Jude Wapasha, Mika Marsh, Eddie Coleman e o zelador Brayden olharam para Violeta, que encolheu e abaixou os olhos. Seus amigos não disseram nada, e em segundos todos voltaram a fazer o que estavam fazendo, menos Bobb, que passou quase quinze minutos na enfermaria antes do plano dos sete ser posto em prática.

Wilbur passou um dos braços em torno do pescoço de Violeta e puxou para perto, lhe entregando a casquinha de chocolate.

— Minha menina – riu ele.

O sol já estava a pino e então Jack continuou a falar.

— Mike não está mais com as chaves. Elas voltaram para a nossa pirada professora Odete, de acordo com o Soluço.

— Eu chequei – ele completou, interrompendo Jack – Vim mais cedo.

O sinal tocou e aglomeração de alunos fedendo sovaco e perfumes caros começou a se formar no portão principal do colégio.

— O plano é o seguinte – completou Merida – Nós vamos para nossas aulas agora para marcar presença para ninguém suspeitar. Assim que o professor de vocês marcar seus nomes cada um vai ter uma missão. Violeta e Wilbur põem comida de gato na entrada do duto do corredor leste. Rapunzel, você e Soluço põem no do corredor Oeste. Eu vou começar a por do duto do corredor Norte enquanto o Jack tenta distrair a professora Odete, que não vai ter aula agora no primeiro turno. Assim que ele terminar, vai me encontrar no duto Sul e me ajudar com ele. Como vamos estar lá embaixo, nós já ligamos o duto e nos encontramos na entrada.

Wilbur sorriu, levantando e limpando as folhas secas da calça.

— Pode deixar, chefinha. Ocê vai ficar super orgulhosinha de todos nós.

Todos levantaram também. Primeiro foi Soluço, depois Violeta e Rapunzel, dizendo que iriam no banheiro antes de entrarem na sala. Logo Wilbur deu no pé e Jack deu uma piscadela e saiu com seu gingado. Quando terminou de dobrar o mapa, Merida deu um suspiro e também seguiu seu caminho, não contando com que Kaleel Everdeen estivesse fumando tabaco a apenas alguns metros a distancia.

***

Colégio Frost Ville - corredor dois, lado norte (12h30)

Quando Jack espiou de novo o corredor, viu Odete com alguns livros e um molho de chaves na mão. Parecia inquieta. Andava de um lado para o outro fazendo a saia longa e marrom ir e vir sem parar. O hino da turma de rúgbi começou a tocar novamente no alto falante, anunciando o jogo que teria na próxima quarta-feira. Jack abaixou para desamarrar um dos cadarços de seu tênis e quando olhou para frente novamente viu sua professora de artes conversando com Mike Butcher, Jude Wapasha, Roy Lawrence e Mika Marsh. Ele enrugou o cenho e tentou ouvir o que diziam, mas não estava perto o suficiente. Odete gesticulava com as mãos, ainda segurando seus livros. Jude parecia entediada, Mike, impaciente e Mika, como sempre, querendo ver o circo pegar fogo. A conversa durou mais um hino do time de rúgbi, um pouco da previsão do tempo de Sean Cruz e depois os três adolescentes foram embora.

Foi quando Jack pegou seus materiais do chão e começou a sua brilhante atuação que aprendeu na aula de teatro do primeiro ano. O auto falante começou a tocar The Boys are Back in Town de Thin Lizzy e Jack começou a correr em direção a professora, que estava de costas. Ele esbarrou dela com o ombro, fazendo com que Odete se desequilibrasse para frente e derrubasse seus pertences. Jack caiu, espalhando seus pertences, que também incluía um molho de chaves, junto com os dela.

— Sua peste desatenta olha o que vo... – começou ela, aos rugidos, até seus olhos encontrarem os de Jack Frost – Sr. Frost?

— Se-senhorita. Senhora. Pro-Professora – gaguejou ele, assustado – Me desculpe. Eu estava... Meu deus, a senhora se machucou?

Odete balançou a cabeça em desaprovação, reclamando sobre seus papéis espalhados e questionando Jack por estar fora da sala de aula. Odete dizia que

— É um absurdo vocês jovens de hoje em dia! Não respeitam mais os mais velhos! Isso é um absurdo!

Jack começou a espalhar mais os papéis do que juntá-los enquanto ouvia sua professora reclamar do quão desatento ele era. O auto falante então começou a tocar Don’t stop me now e ele levantou, juntando seus papéis e entregando os livros da professora junto com o molho de chaves falso. Jack abraçou seus papéis no peito e colocou o molho de chaves de Odete no bolso.

– Desculpa mais uma vez, professora – sorriu ele, colocando seus papéis no chão, logo amarrando o tênis. Quando terminou, levantou e abraçou os papéis novamente – Tenha um bom dia.

Jack deu meia volta e saiu correndo. Odete balançou a cabeça, colocou o molho de chaves no bolso e foi tomar café na sala dos professores, aonde o professor de Educação física, Joshua Aiden, jogava xadrez com Lucy Vegas. Charlie, o professor de literatura, lia A letra escarlate para sua aula de quinta-feira e Georgie Wright, professor de química, discutia com a mulher no telefone sobre a sua irmã, Michelle, ser uma piranha.

***

Colégio Frost Ville – corredor um, lado leste (12h43)

Sean Cruz, que estava na sala de áudio do colégio, gravava ao vivo na rádio que a previsão para aquela tarde seria de um calorzão desgraçado e que a noite teria uma baita chuva para a madrugada. Soltou um “que se cuide!” para quem iria sair naquela noite para beber na festa que Oliver Sanders daria na sua casa e anunciou que o time de rúgbi do colégio jogaria na quarta-feira que vem. Comunicou que no refeitório seria servido hambúrguer de lentilha para os vegetarianos de plantão e terminou dizendo “até a próxima, baby. Fiquem com as músicas mais adoradas da semana e não se esqueçam de lavar a mão depois de enfiar o dedo no nariz”.

Quando alto falante começou a tocar The boys are back in Town, Wilbur estava fazendo pezinho para que Violeta conseguisse alcançar a entrada do duto de ventilação da área leste. Com cuidado, ela desparafusou as grades e abriu as três latinhas de ração de gato vencidas que Soluço a entregou no jardim um pouco mais cedo.

— Esse negócio realmente fede muito, Wil. É capaz de alguém vomitar.

— Que por favor esse alguém não seja voce – arfou ele – Porque senão vai cair tudo em mim e eu realmente não quero vomito de sorvete de chocolate e ovos mexidos com bacon no meu cabelo.

Violeta riu e jogou as três latinhas de ração felina dentro do duto, bem lá no fundo. Colocou as grades no lugar e apertou seus parafusos novamente, descendo dos ombros de Wilbur com cuidado em seguida. Neste momento começou a tocar Don’t stop me Now e Violeta começou a cantarolar junto com Freddie Mercury e a banda Queen.

***

Colégio Frost Ville – corredor 3, lado oeste (12h51)

Freddie Mercury estava terminando de cantar Don’t stop me now e David Bowie estava começando a cantar Starman quando Soluço e Rapunzel se encontraram no corredor da ala oeste. Soluço tirou as últimas três latinhas de ração de gato vencidas da mochila e entregou para Rapunzel, que subiu nos seus ombros e abriu a grade do tudo de ventilação para jogar as latinhas apertas lá dentro. Por alguns minutos, Soluço cogitou de olhar para cima já que Rapunzel estava de vestido, mas se aguentou firme, mordendo os lábios enquanto olhava para os próprios pés, afinal, ele não queria dar uma de Mike babaca Butcher.

— Terminei!

Soluço ajudou Rapunzel a descer e pegou novamente a mochila. Eles sorriram um para o outro e logo saíram correndo quando ouviram o som de tênis se arrastando no piso. Jude Wapasha e Kyara Pilaff passaram por lá com seus uniformes de líderes de torcida, mexendo seus pompons ao som de Mr. Blue Sky.

***

Colégio Frost Ville – corredor 5, lado sul (12h52)

Merida cantarolava e batia o pé. Apesar de no lado sul do colégio a acústica não ser tão boa, ainda conseguia ouvir David Bowie dizer que havia um homem das estrelas esperando lá no céu. Para poupar tempo, começou a tirar a sacola de comidas estragadas que estava duplamente embalada dentro de sua mochila quando Jack chegou num salto, provocando nela um breve susto.

— Voce conseguiu? – arfou.

Jack sorriu, pegou as chaves do bolso e ergueu perto do rosto de Merida.

— Eu nunca vou desapontar você, my cherie.

Esta foi a vez de Merida sorrir e subir nos ombros de Jack, depositando todo aquele lixo fedorento no último duto de ventilação que faltava. Quando terminou, Merida limpou as mãos na calça jeans e guardou o molho de chaves que Jack lhe entregou no bolso. Fechou a mochila, ligou a ventilação de todos os dutos e saiu correndo de mãos dadas com Jack para o corredor principal.

***

Colégio Frost Ville – entrada (13h02)

Quando os sete se encontraram na entrada, The outfield tocava Your Love nos altos falantes, mas antes que o vocalista pudesse dizer que apenas queria usar o seu amor esta noite (porque a Josie está passando as férias bem longe) as pessoas começaram a sair de suas salas, tossindo e fazendo caretas absurdas. Professores guiavam os alunos para a saída do colégio e Sean Cruz interrompeu os seus hits da semana para comunicar que o colégio estava cheirando mais mal do que o sovaco de Bobb Hunter.

O cheiro era realmente insuportável e alguns alunos ameaçavam a vomitar, fazendo com que o diretor e os professores tomassem providencias de manter os alunos no gramado até resolverem o que diabos estava acontecendo. Quase mil alunos saíam de dentro do colégio, como animais, enquanto os sete corriam para dentro. Num momento, conseguiram ouvir Eddie Coleman gritar que aquilo parecia uma bomba de fedor feita em alguma aula de química.

Conforme adentravam o colégio estava cada vez mais vazio e fedorento. Merida pegou o molho de chaves do bolso e quando eles chegaram na porta da sala de seu professor, ela a destrancou. Enquanto ela pegava o mapa e sua lanterna de dentro da bolsa, Soluço empurrava a mesa de madeira do lugar de onde estava e, enquanto Violeta fechava a porta, Merida depois de tanto estudar o mapa e todas as escritas de seu professor, puxava uma alavanca escondida dentro do pé de uma estátua de Tutankamon. Impressionantemente, o chão começou a se abrir, revelando uma passagem secreta inimaginável. Merida acendeu a lanterna, que continua sua lamparina por luz negra, e entrou primeiro. Jack foi em segundo e Wilbur em último. Violeta acendeu a lanterna de seu celular, Wilbur vestiu o casaco alegando que ali era mais frio e Mike Butcher, Mika Marsh e Roy Everdeen empurravam a porta da sala do professor Brown enquanto a música Psycho Killer tamborilava na cabeça de Mike.