Minha

Alguém com quem ela dividia algumas tristes similaridades


01:14 AM - Komansky Childen’s Hospital - NYC

Tony caminhava de um lado a outro do lobby de entrada do hospital, mergulhado em ligações e retornos de contatos com a polícia local, o serviço social do Hospital e com os advogados da Fundação Berry; em um esforço colossal de localizar alguma pista sobre o paradeiro de algum responsável legal do menininho.

Ele havia encerrado uma chamada de trinta minutos com o chefe do gabinete de polícia da cidade, quando avistou a pessoa que ele mais desejava encontrar naquele momento caminhando rapidamente em sua direção.

“Senhorita Nakamoto.” Tony, respirou aliviado. “Eu não podia estar mais feliz em revê-la.”

A belíssima mulher de traços orientais sorriu amigavelmente para o rapaz fazendo com seus olhos já naturalmente puxados, se repuxarem ainda mais. Ela e Tony já haviam se encontrado anteriormente para resolver alguns assuntos delicados envolvendo algumas crianças em situação de risco atendidas pelo Centro Cultural New Direction, mantido pela Fundação Berry, e durante o todo processo emergencial que viabilizou o transplante da pequena Carmem, onde a interferência da assistente social se fez extremamente necessária.

“Tony. Rachel continua aterrorizando você?” Ela perguntou em bom tom.

Tony passou a mão pelos cabelos, completamente sem jeito.

“Crianças geralmente me deixam ansioso. Elas são frágeis. Eu fico preocupado.” Ele confessa trocando o celular de uma mão para a outra. “E ele é tão pequeno, e estava sozinho... Não consigo encontrar nenhuma pista dos pais, ou parentes...A senhorita Fabray está muito angustiada, e por causa disso, Rachel está subindo pelas paredes querendo resolver a situação... Eu só queria que você chegasse logo. Desculpe, por ter que incomoda-la a essa hora, senhorita.”

A assistente social ouviu calmamente o desabafo do rapaz, algo que ela já tinha ouvido anteriormente de uma forma bem mais aflita quando ele a acordou há aproximadamente uma hora e meia. Vendo Tony finalmente tomar folego, ela colocou gentilmente a mão sobre o ombro dele.

“Estou aqui agora, e vamos resolver isso da melhor forma possível. Tudo bem? Que tal respirar um pouco, huh?”

O tom de voz dela sempre fazia Tony relaxar...

“Afinal de contas você precisa deixar um pouco desse folego para quando você tiver filhos, não é?”

...do mesmo jeito que seu senso de humor conseguia enlouquecer seu juízo em segundos.

“Oi? Como? O quê?” Tony gaguejou boquiaberto e a assistente social escondeu o riso com uma das mãos.

Tony estreitou os olhos.

“Eu avisei que vou continuar pegando no seu pé, até você aprender a me chamar por meu primeiro nome, Tony.” A senhorita Nakamoto continuou rindo, enquanto caminhava em direção ao acesso dos elevadores que os levaria a ala infantil.

“Yumiko.” Tony murmurou encabulado, seguindo logo atrás dela. “Eu disse. Viu?”

Mas ela já estava dentro do elevador, olhando para ele com um meio sorriso e aqueles olhinhos apertados. Tony parou por alguns segundos, simplesmente a observando, até perceber que as portas iam se fechar e então correu na direção dela.

“Senhorita Nakamoto! A porta! Segure a porta, por favor!”

...

Rachel estava atenta a cada gesto, feição, olhar, que sua Quinn direcionava ao pequeno menino deitado na maca de exame. A Dra Dodwell, com toda a paciência do mundo, continuava a atende-lo, mesmo ele se recusando a soltar-se totalmente da atriz. Se Quinn se afastasse um milímetro, o garotinho já abria o berreiro, chorando a todo volume, até que a loira estivesse novamente ao alcance de suas mãozinhas.

Pelo celular, a morena recebia atualizações sobre os contatos de Tony com os policiais, serviço social e advogados, mas foi a última mensagem que trouxe mais conforto ao seu coração: Yumiko havia finalmente chegado e já conversava com um dos oficiais que aguardava no posto de enfermagem.

Eles haviam documentado e entregue a polícia, toda a chegada e os primeiros socorros a criança.

Ele tinha um pouco mais de um ano de idade, tendo em vista seu desenvolvimento físico e pouco controle motor para coordenar os pezinhos na hora de caminhar. Estava visivelmente subnutrido e sua fralda encontrar-se em condições lastimáveis, parecendo não ser trocada há pelo menos um dia. A roupa imunda, a pele com resquícios de alergia, unhas sujas, ouvidos com feridas na parte externa e olhinhos vermelhos, provavelmente também por irritação alérgica. Por causa da falta de higiene, sua virilha estava tão assada que quando as enfermeiras realizaram o procedimento de asseio, ele gritou de dor. Rachel tentava controlar o máximo possível suas emoções, justamente porque Quinn sucumbia as lágrimas toda vez que a criança chorava. Principalmente depois que em meio a sua crise de choro, o pequeno gritou desesperado ‘Mã’ esticando os braços na direção da atriz. O que fez não somente Quinn, mas duas enfermeiras que ajudavam no atendimento soluçarem aos prantos.

Era uma situação mais que delicada. Rachel sabia o quanto aquele aborto durante a adolescência ainda torturava sua namorada. E durante a visita a casa de sua irmã mais velha, Quinn pareceu absorvida em pensamentos contemplando os objetos de bebê espalhados pela casa.

‘Vou lidar com isso quando for preciso. Já precisei me reconstruir inúmeras vezes... Rach... eu só preciso ter você ao meu lado para levantar de novo, ok?’ Foi o que Quinn sussurrou ao seu lado, ainda no carro a caminho do hospital.

“Doutora Dodwell, aqui estão os resultados dos exames dele.” Disse Erin, a primeira enfermeira que acompanhou o atendimento do pequeno, entrando no consultório com uma boa quantidade de papeis que incluíam, raio-X de tórax, tomografia, exames de sangue, urina, ultrassons de rins e outros tantos testes feitos no garoto nas últimas horas.

“Obrigada, Erin.” Então a doutora sentou-se em sua poltrona, deixando Erin a ajudar Quinn a enrolar o menininho em uma mantar com a marca do hospital, já que as roupas dele haviam sido descartadas.

Rachel sentou-se na cadeira diante da médica. Quinn continuou encostada na maca, com o garoto de novo, com o rosto escondido junto ao seu peito.

“E então, doutora?” Rachel quis saber.

A médica olhou para as duas jovens mulheres por cima de seus óculos.

“Bem, como suspeitei, anemia é um dos problemas. Ele também apresenta um quadro de pneumonia, mas tanto pelo exame de ausculta e pela tomografia, não há um comprometimento grave dos pulmões. Vamos precisar de mais tempo para os resultados dos exames congênitos para diagnostico de malformações neurológicas ou cardíacas e um histórico mais detalhado para outras patologias, mas em um primeiro exame não encontrei indícios preocupantes ou indicativos que denotassem exames mais urgentes. As marcas de cortes nas pernas e braços são provavelmente de arranhões ou quedas anteriores, porém o da coxa está inflamado, por isso inchou e criou pus. Felizmente ele não apresenta febre, mas será preciso monitorar. No mais vou indicar pomadas para as assaduras, uma alimentação rica em vitaminas, remédios para verme e para combater a pneumonia e anemia, alguns teste de alergia, doses das vacinas obrigatórias e reforços recomendadas para a idade dele, além de muito cuidado e carinho.”

Rachel assentiu devagar.

“Preciso que a senhora converse com a assistente social que estará à frente desse caso, a senhorita Yumiko Nakamoto, ela já está a par da situação e também já está em contato com as autoridades locais.”

“Yumiko?” A médica sorriu. “Ah, que rapazinho de sorte, ein?” Ela disse levantando da poltrona, ajustando seu estetoscópio. “Ela é a melhor pessoa para atender esse tipo de caso. Logo, logo vai estar tudo resolvido então!”

“É, eu sei. Ela é a melhor.” Rachel se esforçou para retribuir o sorriso, percebendo Quinn apertar o menino junto ao corpo.

Elas deixaram o consultório, com a doutora e a enfermeira Erin logo atrás delas. Tony e Yumiko se aproximaram logo em seguida.

Yumiko cumprimentou rapidamente Rachel, e ofereceu um sorriso gentil a Quinn, antes de ser se dirigir a doutora.

“Olá, sou Yumiko Nakamoto, assistente social-chefe do Estado de New York e diretora da ONG Novos Passos para resgate e adoção de crianças em situação de risco.” Disse a assistente social, se apresentando.

A médica estendeu a mão para cumprimentar Yumiko.

“Emily Dodwell, pediatra. Muito prazer.”

Rachel voltou-se para Quinn, apoiando gentilmente a mão na base das costas dela.

“Venha se sentar um pouco, há horas você anda para lá e para cá sem descanso.”

Quinn aceitou a sugestão, deixando-se guiar pela morena até um sofá de três lugares na saleta de espera próxima ao posto das enfermeiras.

“Rachel...” Quinn falou baixinho, quase como se estivesse com medo de expor ainda mais sua fragilidade. “Eu não sei se quero entregar ele outro alguém...”

Rachel suspirou. Ela já esperava por isso.

“Quinn, existem passos que precisam ser dados, e coisas que precisam ser averiguadas e descartadas.” E então a morena mordeu os lábios. “A polícia precisa localizar algum familiar ou responsável, ter certeza que ele não foi sequestrado, ou vítima de tráfico infantil. Descartando essas possibilidades, devesse confirmar os maus tratos, responsabilizar alguém por isso e retira-lo em definitivo da guarda da família. Somente depois de uma resolução do juiz ele seria liberado para adoção... Até lá, ele está sob a guarda do Estado de New York.”

A loira enxugou as novas lágrimas que brotaram em seus olhos.

“Eu sei. Entendo tudo isso, mas não quero que ele fique sozinho. Nós...nós não poderíamos oferecer um lar temporário?”

Sim, elas poderiam, pensou Rachel. Mas caso o Estado decidisse devolver a guarda do menino a família, por qualquer motivo que fosse, Quinn ficaria arrasada.

“Eu confio plenamente em Yumiko, meu amor. Ela me ajudou bastante quando encontrei Carmen. Se não fosse por ela, eu nunca teria conseguido que a avó dela aceitasse a ajuda para financiar o transplante.” Rachel puxou Quinn para junto de si, e a loira apoiou a cabeça no ombro dela.

“Eu sei que você está preocupada comigo. Parece que é a única coisa que faço ultimamente, não é? Trazer preocupações...”

Rachel acariciava as madeixas loiras, correndo os dedos pelos fios dourados.

“Não repita mais isso.” Ela pediu baixinho dando um beijo na testa de Quinn. “Vamos ficar bem se estivermos juntas, ok?”

Quinn levantou a cabeça e beijou a morena suavemente. Foi então que Rachel sentiu uma mãozinha puxando seus cabelos e desviou o olhar para o par de olhinhos curiosos que haviam decidido sair de seu esconderijo junto ao peito de Quinn e agora estavam explorando as redondezas, a começar pelos cabelos e jaqueta da morena.

“Olá, pequenino.” Rachel disse baixinho. “Resolveu investigar os arredores, huh?”

Quinn se divertiu ao ver o menininho esticar a mão para puxar a camisa de Rachel, ao mesmo tempo que esfregava o rosto no busto da loira.

“Ah, seu sortudo! Você realmente sabe o que é bom, ein?” A morena brincou, levando o indicador até a ponta do nariz dele. “Eu também queria poder fazer isso agora! É bom, nê?”

“Rachel!” Quinn repreendeu sua namorada, mas não conseguiu deixar de rir do biquinho que a morena fez.

Então elas ouviram uma risadinha e olharam ao mesmo tempo para o garotinho nos braços de Quinn que continuava dando risadinhas, balbuciando coisas sem sentido batendo as mãozinhas na blusa de Rachel para chamar a atenção da morena. Foi entre ‘bu’ e ‘Aou’ que Rachel finalmente notou as pequenas irises cor de avelã, bem semelhantes às da mulher que ela amava.

“Você deve lembrar a mãe dele...” Ela comentou absorvida pelos olhos que a fitavam com curiosidade.

Quinn mordeu o lábio.

“Você acha que aconteceu algo com ela?”

Rachel engoliu seco. Aquela não era uma pergunta que ela queria responder. Não quando suspeitava o pior.

“Senhorita Berry? Senhorita Fabray?” Um oficial da polícia se aproximou delas, acompanhado de Yumiko. Rachel prendeu a respiração apertando a mão de Quinn, era aquele momento que ela mais temia.

“Só Rachel, por favor.” Foi a resposta automática.

“Infelizmente não trago boas notícias.” O oficial continuou.

...

Brooklyn – 15:45 PM do dia seguinte

‘Esqueça a Torre Eiffel! Eu vi Elisa Scott no Montana!’ #elisascotteumadeusa #montana #vip

‘Você viu as fotos? Minha deusa está em Paris!’ #elisascott #ulala

‘Graças a Santa Cher! Finalmente fotos novas! Ela está linda!’ #elisascott #deusa

‘Eu preciso de mais!!!!!!’ #kroscott #elisascotteumadeusa

‘Gente, mas ela não estava em um relacionamento? Quem é essa aê com ela?’

(...)

Michele fechou o Twitter.

Elise estava em Paris. Na França. Do outro lado do Atlântico. No continente Europeu... Há quase nove horas de voo e seis horas à frente do fuso horário de NYC.

E pelo jeito, estava solta na farra.

Michele realmente não sabia se gritava de raiva ou respirava aliviada.

Vinte e quatro horas de preocupação; vinte e quatro horas sem dormir ou comer direito; vinte e quatro horas chorando, pensando no pior, e... E Elise estava na Europa, em uma boate VIP, circulando entre francesas peitudas que tomam banho de perfume antes de sair de casa!

Foi então que Michele decidiu. Ela decidiu ficar furiosa. Não, ela ficaria extremamente furiosa, ou melhor imensuravelmente furiosa.

Uma vontade descomunal de agarrar Elise pelos ombros e berrar todos os quinze palavrões que ela conhecia pareceu se espalhar como uma onda escaldante por suas veias, fazendo sua cabeça latejar e seu corpo tremer de ódio.

Abrindo o Twitter novamente, Michele foi estapeada por fotos e mais fotos da sua co-estrela, sorrindo para uma morena qualquer, segurando uma taça de vinho tinto, banhada pelas luzes cenográficas de uma boate (Montana, segundo as citações) que só ressaltavam aquele vestido vermelho tão justo que contornava até o abdômen suavemente definido da ruiva.

“Ridícula. Irritante. Insuportável!” Michele se estressava sacudindo o celular diante dos olhos, sentindo o rosto esquentar ainda mais.

De repente o aparelho mudou de tela, anunciando uma chamada. Ao ver o nome de quem ligava, Michele deslizou o dedo de uma vez para atender, colocando o aparelho no ouvido.

“Michele, nós...”

“VAMOS PARA PARIS!” Ela berrou, interrompendo Jesse St James, que chocado mal conseguiu organizar os pensamentos.

“Paris? O quê?”

“Você ouviu, Jesse! Eu e você vamos agora para o aeroporto pegar o primeiro voo para Paris! Não quero saber o quanto vai custar, ou ouvir qualquer insinuação de como isso é uma loucura! Eu vou para Paris e vou arrastar aquela mulher desagradável por toda Champs Elysee se for preciso, mas ela vai voltar para New York ou não me chamo Michele Bergman!”

...

19:20 – Dignity Memorial - NYC

“Você não precisava ter vindo, Rachel. Já basta passar praticamente a noite em claro, se desdobrando em mil para resolver isso tudo.” Yumiko chamou a atenção da morena. “Não é sua responsabilidade. Isso não aconteceu por culpa de nenhuma de vocês duas, pelo contrário, se não fossem por vocês, tanto a criança quanto a mãe poderiam estar na mesma situação...”

Rachel fechou os olhos com força antes de se afastar do caixão que guardaria o corpo da jovem de 17 anos, mãe do menino que ela e Quinn haviam recolhido da rua, encontrada dentro de um deposito de lixo, em um beco há alguns quarteirões de onde elas acharam o bebê durante a madrugada.

Mary Ann DeLucca, filha de pais extremamente religiosos, expulsa de casa por ter engravidado do namorado (que a largou quando soube do bebê) aos cinco meses de gravidez.Vivia nas ruas de NYC desde então, ganhando a vida como podia, dormindo em abrigos públicos, pedindo esmolas ou conseguindo dinheiro com pequenos furtos, até não encontrar uma saída e começar a se prostituir e a servir de mula para entrega de pequenos papelotes de drogas. Foi um dos gestores de uma comunidade para mães desabrigadas no Queen’s que foi a polícia para informar o desaparecimento dela. Aparentemente, há oito meses Mary havia tentado se desligar do vício, encontrando abrigo e apoio junto à comunidade da ONG. Infelizmente, há alguns dias, ela não resistiu e voltou aos maus hábitos, saindo do abrigo e levando o filho consigo. Ela faleceu devido a uma overdose há aproximadamente 48 horas. Aparentemente, a criança ficou junto com o corpo da mãe durante todo esse tempo, até decidir escalar o entulho de lixo, caindo para fora do depósito e correndo pelas calçadas até Quinn vê-lo no momento em que ele atravessava a rua.

Um milagre.

O pessoal da ONG reconheceu o corpo, eles ajudaram a contatar os pais da garota, que foram chamados para prestar esclarecimentos, juntamente com o rapaz, o pai da criança. Segundo o responsável da ONG, eles haviam tentado algumas vezes falar com o casal e com o rapaz, mas quando estes souberam que se o assunto era sobre a situação de Mary Ann e da criança não retornaram os contatos.

“O nome dele é Charlie.” Disse Yumiko e Rachel repetiu o nome baixinho, enquanto as duas saiam do salão onde ocorria o velório, entrando em uma das salas reservadas para o dia. “Vamos precisar fazer alguns exames para saber se em algum momento ele foi exposto a drogas, ou se é soro positivo...”

“Já fiz todas essas solicitações ontem quando demos entrada no hospital.” Rachel interrompeu, olhando outra vez para a jovem no caixão. Ela tinha cabelos loiros, pele alva e traços delicados. Alguns de seus conhecidos da ONG contaram que Mary Ann costumava dizer o quanto era popular em sua antiga escola. A invejada Líder de Torcida. A namorada do garoto mais popular do colégio. Eles também mostraram algumas fotos dela. Seus olhos tinham o tom castanho esverdeado... “A doutora Dodwell ligou mais cedo e disse que ele...Charlie, está limpo.”

A assistente social respirou fundo, sentando-se ao lado de Rachel quando a morena se sentou no sofá de três lugares da área privada da sala junto a um aparador de mogno com um jarro com um arranjo de flores campestres.

“Rachel. Se você e Quinn quiserem entrar com um pedido de adoção, eu posso levar a solicitação ao juiz ainda hoje. Ele já liberou a guarda temporária, e o processo não seria demorado depois disso, se o pai biológico abrir mão da guarda, como creio que ele vai fazer. Vocês vão precisar passar por todas as etapas como todos os candidatos, lógico, mas o Estado vai levar em consideração tudo o que vocês já fizeram pelo bem- estar do Charlie, e como ele já se afeiçoou a Quinn.”

Rachel cruzou os braços sobre o peito, em uma postura defensiva.

“Ele ainda tem os avós, Yumiko...”

“Os maternos? Que foram omissos por dois anos, nunca demonstraram interesse em procurar por ela ou pelo bebê, tendo inclusive negado entrar em contato. Por Deus, Rachel, quem está pagando pelo funeral da filha deles é você! O homem acabou de declarar em juízo que ‘ela deixou de ser sua filha no momento em que cometeu aquele ato libidinoso’...Ele vai ter sorte se escapar de um processo do Estado. Quanto aos pais do garoto, pelo que ouvi hoje, estão mais preocupados em apagar esse ‘deslize’ do passado do filho, eles não querer que ele perca seu futuro para cuidar de uma criança. Sinceramente, é uma questão de buscar uma caneta e os papeis para eles assinarem as autorizações de adoção.”

“Não quero ter tantas expectativas...Você sabe que já passei por isso com Carmem.”

“Eu lembro.” Yumiko interrompeu. “Com ela era diferente. O pai fugiu com o dinheiro da cirurgia, a mãe ausente e uma tia e avó que se viravam como podiam para oferecer tudo a menina. Você salvou a vida dela, Rachel. E ela ama a madrinha dela mais que tudo. Agora com o Charlie, você pode ser muito mais...você e a Quinn podem ser mães.” Yumiko respirou fundo. “Olha, não quero impor essa criança a nenhuma de vocês duas. Mas, pelo jeito que vi Quinn com ele... Ela quer, Rachel. A questão agora é, você quer?”

Rachel pousou a cabeça no ombro dela e começou a soluçar. A assistente social abraçou a jovem morena ternamente e passados alguns instantes começou a dar tapinhas carinhosos na cabeça dela, como se estivesse confortando um cachorrinho.

“Tony vai ficar com ciúmes.” Rachel murmurou, se afastando dela, e enxugando as lágrimas com as mãos.

“Ah, está tudo bem. Você também me lembra um filhotinho as vezes.” Yumiko brincou, dando mais tapinhas na cabeça de Rachel. “Um filhotinho de Pinsher. Daqueles pequenininhos e bem barulhentos.”

Isso fez a morena rir. As duas se levantaram, já se preparando para deixar o espaço.

“Ah tá, se eu sou um Pinsher, o Tony é o quê?” Quis saber a morena.

Yumiko parou para pensar por alguns instantes.

“Ele é meu pequeno Akita.” Concluiu Yumiko escondendo o riso com a mão.

Essa foi a hora que Tony resolveu aparecer. Confuso, o rapaz inclinou a cabeça para o lado. Yumiko ergueu a mão e deu algumas tapinhas suaves na cabeça dele.

“Viu? Dócil, dócil.”

Tony começou a corar, enquanto Rachel sacudia a cabeça, finalmente conseguindo tirar o peso terrível que tinha se apossado de seu coração.

“Yumiko, se...se tudo acontecer como você disse.” Rachel murmurou.

A assistente social sorriu.

“Eu ligarei para você imediatamente.” Ela respondeu, assanhando o cabelo de Tony com as duas mãos, em comemoração.

...

20:30 PM

Luc entrou no apartamento de Rachel e Quinn, equilibrando pelo menos cinquenta sacolas repletas de itens essenciais para o cuidado de um bebê. Mamadeiras, chupetas, lenços umedecidos, pacotes e mais pacotes de fraldas, travesseiros especiais, umidificador e purificador de ar, protetores de mesa, protetores de tomada e outros inúmeros produtos que se juntariam a outra pilha de sacolas na bancada da cozinha, repletas de mistura para leite, vitaminas, frutas, legumes e verduras e potes de papinhas orgânicas.

Como Quinn Fabray não podia simplesmente caminhar pela cidade comprando coisas de bebê, sem ter um batalhão de fotógrafos a perseguindo, Luc contou com a ajuda de Brittany S. Pierce para reunir alguns itens básicos para tornar a estadia (até então temporária) do pequeno baby mais confortável. O jovem assistente nunca imaginou que uma criança de um pouco mais de um ano precisasse de tanta coisa... E isso porque Quinn havia se encarregado de escolher e agendar a entrega de algumas peças de vestuário para o menino, que foram entregues no apartamento de Brittany mais cedo e que a dançarina trouxe consigo quando veio encontrar Luc para irem as compras.

A atriz havia explicado que Yumiko havia conseguido uma autorização de custódia temporária com o juiz de plantão na vara da infância no final da manhã, tendo em vista os novos rumos que o caso havia tomado. Obviamente, o inesperado apego do pequeno Charlie a Quinn, e evidentemente o fato dela ser uma pessoa pública e apresentar excelentes condições financeiras, além de estar custeando todo o tratamento médico do menino pesou bastante na decisão do juiz.

Por isso, no começo da tarde, Quinn e Rachel deixaram o hospital com a custodia temporária de Charlie. Rachel seguiu imediatamente para o departamento de polícia, e em seguida para a casa funerária, assumindo todas os gastos para oferecer ao menos uma despedida digna à jovem, enquanto Quinn retornou ao apartamento para cuidar do garotinho.

Quinn ficou muito abalada ao saber o que havia acontecido a mãe biológica do pequeno Charlie. As similaridades entre suas histórias a fizeram pensar que ela poderia ter tido um destino igual ao da jovem Mary Ann, e só fizeram a atriz refletir sobre quantas outras jovens adolescentes estariam tão perdidas quanto elas estiveram. Quantas conseguiriam renascer como Quinn, e quantas iriam perecer como Mary Ann?

“Luc?” Quinn chamou da sala.

“Sou eu! Eu e mil pacotes!” Ele respondeu eufórico. “Equilibrar mil pacotes, fazendo a pose de fada sensata! Realizei um sonho.”

“Imagino.” Quinn apareceu no lobby de entrada para ajudar o rapaz. Caminhando ainda de um jeito desajeitado logo atrás da loira, vinha um loirinho em miniatura.

“Iximaliakibabylindo!” Exclamou o assistente, entregando algumas sacolas para Quinn e seguindo para a cozinha. “Ele já desgrudou do seu colo! Ah, virou um rapazinho!”

Quinn sentiu mãozinhas agarrarem nas suas pernas, e logo depois Charlie começou a puxar seus joelhos, obviamente pedindo para ficar no braço.

“Falei cedo demais.” Brincou Luc. “Deixe isso comigo, okay?”

Habilidosamente, o assistente pegou as poucas sacolas que Quinn tinha em mãos e seguiu para a cozinha.

“Arrumo tudo em alguns instantes!” Luc cantarolou, já desempacotando tudo sobre a bancada.

“Obrigada, Luc.” Quinn pegou Charlie nos braços e resolveu tentar fazê-lo dormir um pouco.

“Então, mocinho, você precisa dormir para ficar bom logo e crescer forte e saudável.”

Sobre a mesinha de centro, seu celular começou a vibrar chamando a atenção da atriz. Ela sentou-se no sofá, aninhando o menino no seu colo antes de pegar o aparelho.

Estampado na tela no nome JESSE ST. JAMES brilhava incessantemente.

“Jesse? Tudo bem?”

“Ela é louca! As duas na verdade! E agora eu estou a caminho de Paris, Quinn! Paris!” Foi a mensagem desesperada que ressoou do outro lado da linha.

“Paris? Jesse? Do que você está falando?”

“Elise, literalmente escapou à francesa e agora eu estou sendo vítima da outrora doce Michele Bergman, que só sabe repetir as inúmeras maneiras como ela pode fuzilar aquela ruiva demente no momento que ela a encontrar em Paris. Quinn, preciso ser resgatado. Now.”

Elise em Paris? E Michele indo procura-la? Quinn revirou os olhos.

“Jesse, quer um conselho?” Ela ouviu o rapaz gemer choramingando que sim. “Quando essas duas se encontrarem, dê um jeito de deixa-las a sós. Se for preciso tranque as duas em um quarto de hotel, depois volte para New York.”

“Do que você está falando, Fabray! Não posso deixar as protagonistas do meu musical se digladiando na França!”

“Jesse, se elas não acertarem os ponteiros antes da estreia, eu duvido que você vai ter alguma protagonista para encenar a peça. Só faça o que eu disse... Au revoir!” Ela disse encerrando a chamada.

“Olha só quem diria...” Quinn falou baixinho para o bebê em seu colo. “A tia Michele finalmente resolveu tomar uma atitude, não é? Já estava ficando irritante olhar para cara de depressão daquela ruiva sem sal, não é? Você quer saber o quanto era insuportável? Tudo bem, vou contar para você como elas mais pareciam duas bobonas...”

Ela continuou a conversa com um sorridente Charlie subindo as escadas a caminho do quarto.

Quando Rachel chegou em casa naquela noite, encontrou Quinn e o pequeno Charlie adormecidos no meio da cama, com a sua namorada abraçando o menino, que dormia tranquilo segurando a mão dela.

A morena tirou o celular do bolso e capturou o momento com sua câmera.

“Acho que só vamos conseguir montar o berço amanhã, nê?” Ela sussurrou com um sorriso, sentindo seu coração palpitar mais forte. É...ela realmente queria aquilo.