1 de setembro de 2047, Cidadela de Chronos. Localização atual: planeta Anteros. Cinco anos antes da queda do Milenar.

A cidadela de Chronos era conhecida pela sua enorme capacidade para abrigar prédios históricos, e mesmo que não fosse habitada, ainda era belíssima, o ponto turístico de muitos andarilhos. A cidadela recebeu esse nome em homenagem ao deus grego Chronos, que representava o tempo, e o motivo da homenagem é simplesmente porque naquele lugar, tudo parecia diferente, tudo parecia terrivelmente errado, e seus antigos habitantes pareciam viver em um eterno looping, incapazes de acompanharem o resto do mundo. Por isso, nunca se deveria passar mais do que um dia naquele confim, pois era extremamente perigoso para qualquer um.

Em Chronos ainda havia um monumento bem curioso, um castelo, este que era o maior prédio ali, aquela cidadela parecia ainda viver na era média, e o local mais bonito, também era o mais curioso, pois estava sempre trancado. Os boatos diziam que dentro dele há um ser monstruoso que se alimenta do tempo. Mas esse boato não surgiu do nada, longe disso, ele começou com a existência daqueles que deveriam proteger todo o universo, e que sempre vagavam por aquele lugar, como se fosse sua própria casa. Aqueles que supostamente vieram antes dos arcanjos existirem, aqueles que eram responsáveis por lutar contra qualquer ser poderoso que pudesse interferir no destino. Com tudo a história diz, que os Milenares acabaram ficando ambiciosos, eles queriam provar das coisas que o universo podia lhes oferecer, então aprisionaram o Titã e o obrigaram a servi-los. Mas supostamente Chronos não fora o único obrigado a servir alguém, eles também foram obrigados a servir ao tempo eternamente, mas isso estaria prestes a mudar e tudo começaria com o tão doce Milenar da Proteção.

A luz piscava sem parar, deixando aquela pequena esquina muito mal iluminada. A noite estava fria e todo aquele clima trazia para aquele belo lugar com enormes prédios e ruas muito bem indicadas, um ar assustador. A garota caminhava pela rua clicando seus saltos sonoramente barulhentos, enquanto sua mente rodava milhões e milhões de vezes pensando naquele único mistério, o mistério da sua vida, não fazia ideia, mas estava sendo observada, e talvez fora seu sexto sentido ou fora a sombra logo à frente que lhe indicara que de alguma maneira, corria perigo.

Ela parou de baixo do poste que piscava freneticamente, deixando a cena ali digna de um filme de terror, mas ela não tinha medo, pois ela não o compreendia como as outras pessoas, por isso quando o corpo se materializou em sua frente, ela não se moveu um milímetro, e muito menos esboçou qualquer tipo de reação, ela na verdade pouco se importava, já que conhecia muito bem aquele rosto angelical, de sorriso quadrado.

— Você foi uma menina má Asterin – falara o moreno com um sorriso debochado estampando seus lábios tão bonitos.

— Não me venha com seus jogos ridículos, acabe de uma vez com isso – ela resmunga, sabia muito bem quem era ele e o porquê estava ali – vocês não irão parar.

— Quem sabe um dia – ele dá de ombros movendo um pouco as suas asas negras, ela nunca tinha reparado muito bem, mas a asa dele era lindíssima, tinha quase o formato das asas de um cupido.

— Você as pegou de volta – ela indica as costas do garoto e ele nem precisou olhar para saber do que se tratava.

— Achou mesmo que eu deixaria você e seus malditos nômades tomarem o que é meu? – ele sorri estalando a língua – é uma pena que para tê-las de volta eu...

Ele não precisava completar, ela compreendia muito bem, e se pudesse rasgar a garganta dele com suas adagas, o faria, mas sabia que não podia, pois aquele maldito em sua frente tinha o dom da telepatia assim como ela, e por isso o sorriso dele se alargou no rosto, como quem adora uma piada que ainda nem fora contada.

— Onde estão os outros? – ele pergunta.

— Eu não sei – ela dá um sorriso convencido, sabia que de alguma forma não poderia esconder dele, por isso, os fizeram prometer que se salvariam e ninguém diria a ela para onde iriam.

Ele rosnou para ela, pela primeira vez transtornado por não estar conseguindo justamente o que desejava.

— A maleta Asterin – ele fala esticando a mão.

— Você quer? – ela levanta a maleta na altura do rosto dele – então vai buscar – então ela joga a maleta para o lado, fazendo-a cair a metros dali.

Aquilo lhe daria tempo para correr, mas sabia que ainda morreria se não agisse com inteligência, uma inteligência que era praticamente impossível de superar a do maldito anjo em sua frente.

Ele mal deu dois passos e ela saiu correndo, mas ele estava achando aquilo muito divertido, afinal, ele tinha certeza de que ela não poderia escapar dele, aliás, ela própria sabia daquilo, mesmo assim ela bolou um plano.

O anjo de asas negras desapareceu, e apareceu na frente da garota que já estava completamente suada e cansada da corrida que ela havia dado. Ele mantinha um sorriso travesso nos lábios e em suas mãos o conteúdo de dentro da maleta brilhava.

— Eu não preciso daquele metal ridículo, eu só queria a pedra – o anjo mostra a maleta na outra mão e arremessa contra ela, fazendo a garota se abaixar e desaparecer no mesmo instante, reaparecendo atrás dele.

— Errou babaca – ela fala e o chute nas costas dele foi certeiro para impulsiona-lo para a frente.

Ele bateu suas asas com um pouco de dificuldade e pousou à frente, se virando completamente furioso para a garota.

— Hasta la vista Kim – ela mostra o dedo do meio e aperta um botão que injeta um soro azul nele, próprio para fazê-lo adormecer.

— Desgraçada – ele resmunga antes de cair no chão totalmente apagado.

Então sem nenhuma pressa, ela caminha até ele, o cutuca com a ponta do seu salto e sorri.

— Isso é meu – ela pega a pedra de volta e guarda na jaqueta – adeus.

Então em um passe de mágica, ela some daquele lugar, indo para outro onde jamais poderia ser encontrada, ou pelo menos achava assim.

A quilômetros dali, a névoa brilhava no céu escuro, fazendo o loiro de asas negras cair no lugar que fora clamado, de todos da sua raça, ele era o único que sempre se absteve de qualquer opinião ou decisão, ele sempre pensava nos outros acima de si, talvez fosse pela sua devoção aos seus poderes de proteção, ou talvez fosse pelo simples fato dele ser tão amoroso e cuidado em sua personalidade.

Mas naquele momento, eles se aproveitaram daquela beleza que provinha da sua bondade e o prenderam em uma armadilha.

No início ele não entendeu muito bem, mas passou a compreender tudo aquilo no momento em que suas asas foram arrancadas e queimadas sobre a brasa do sangue de um nômade, nômade essa que estava quase morta. Ele chorou, implorou, clamou para que eles não fizessem aquilo, suas asas eram tudo para ele, a sua espécie necessitava daquilo, pois sem elas ele não era nada.

Naquele momento não só ele sentiu a dor de ter as asas arrancadas, mas sua metade também sentiu, ele agonizou no chão, enquanto as costas ardiam em brasa, como se ele mesmo tivesse suas asas arrancadas, longe dali sua âncora também o sentiu, mas diferente da metade, era seu coração que doía, como se aquilo nunca pudesse ser reparado.

Mas tudo aquilo cessou, pois o anjo de asas arrancadas havia sido mandado para longe, e aqueles que ainda eram ligados a ele, sentiram nada mais do que o vazio, um grande buraco de nada, feito somente para a mais bruta das solidões.