Meu estranho amor

Parente é serpente!


Um final de semana com desconhecidos é algo desconfortável, mas ao lado de pessoas com certo grau de parentesco, beira o desejo de suicídio. Ou homicídio.

— Quero que conheça meus pais: Cora e George. Aquela é minha irmã mais velha: Zelena.

Killian sorri e cumprimenta a todos mantendo seu sorriso largo.

— Este é Killian Jones, o meu novo namorado.

Sim. É tudo mentira! Mas por favor, não me desmintam para não acabar com meu fim de semana.

— Vamos entrar! – Cora segura o braço do jovem. – Então, Killian, o que você faz da vida?

— Sou consultor policial!

Não! Não foi esse o texto ensaiado!

— Trabalho auxiliando a policia, em trabalhos infiltrados.

Lá dentro da casa, Regina se encontra com uma jovem de cabelos curtinhos e rosto redondo, sorridente e saltitante. Abraçam-se e olham-se por alguns segundos.

— Agora é prá valer, Regina! Eu me apaixonei e mesmo em pouco tempo, tenho certeza de que seremos felizes! Ele é o meu príncipe!

Claro que sim! Como foram todos os anteriores! Muitos príncipes para nenhum castelo.

Mary aponta para um corredor e todos fixam seus olhos num homem loiro, de cabelos curtos e olhos puxadinhos. O homem vê Regina e fica em choque.

— Esta é minha irmã Regina! E aquele é meu namorado David!

Hã? Agora vai ficar difícil!

Regina sorri com os olhos e estende a mão para cumprimentar o homem, ainda estático. Killian percebe o constrangimento e toma a iniciativa.

— Eu sou o namorado de Regina! Como você está, campeão?

O homem mostra um sorriso amarelo e de poucos dentes. Bem que o chão poderia abrir-se naquele momento, não é? Felizmente, o gelo é derretido.

Algum tempo depois, Regina se esconde próximo ao bar da sala e vasculha o lugar em busca de uma bebida mais forte. David se aproxima acabrunhado.

— Você é a irmã de Mary?? Como pode ser isso?

— Como pode ser, seu mentiroso? Minha irmã me disse que vocês estão juntos há nove meses e dentro desse período, aconteceu o verão!

— Sim! E eu estava a trabalho! Foi um deslize!

— Deslize, seu desgraçado? Você me conheceu na praia e ficamos juntos por semanas! E nestas semanas você já estava namorando minha irmã! Como se chama isso?? Deslize ou traição?

— Não conte a ela, por favor!!

Mary surge sorridente e saltitante. Abraça o namorado por trás e encara a irmã.

— O que estão tramando? O que não posso ficar sabendo?

Nada! Tudo! Não diga nada! Ah, vou dizer sim!

— Discussões de cunhados, Mary. Ele queria beber comigo e eu não autorizei. – Regina expira profundamente e enche um copo com uísque. Sente-se aliviada quando Killian se aproxima. - Conseguiu libertar-se da minha mãe?

— Sua mãe é divertida. – ele apanha o copo da mão de Regina e bebe um gole. Observa David se afastar levando Mary com ele. – Hummm! Que cheiro de confusão!

— Eu conheci aquele cafajeste no último verão! Ficamos juntos, enquanto eu estava em férias numa praia! Fomos amantes por quase três semanas!

— Uau! Que eternidade! Vai falar para sua irmã?

— Como? Mary está radiante! Ela me disse que o cara é perfeito!

— Mas o cara traiu sua irmã e vai continuar traindo. Com o tempo, ele irá reverter a situação e jogar você contra sua família. Precisa cortar a erva daninha pela raiz.

— De erva você entende?

O homem gargalha, abraça Regina e afasta-se, indo sentar-se do outro lado do balcão.

— Por que não pede para que Amintas investigue o namorado de sua irmã?

— Porque estou apaixonada por David!

Opa! Contradição à vista!

— Você nos disse que namorava um cara há meses e ele terminou tudo por celular. O verão foi há pouco tempo. – ele aponta o polegar por cima do ombro. – Então, quando você estava na praia, também estava traindo alguém! Ele traía sua irmã e você traía seu namorado do cachorrinho!

E daí? Que observação estúpida! Onde já se viu uma observação como esta?

Sem se conter, Killian começa a rir. Bate palmas várias vezes e acha divertida a expressão de Regina.

— Chifre trocado não magoa, querida!

— Sim, concordo! Mas não foi minha irmã quem o traiu!

O riso cessa. Ele amua e fica pensativo. Era uma verdade e um momento delicado para que as verdades fossem expostas.

— O que faço, Killian?

— Livre-se da culpa e confesse seu crime para sua irmã. Depois saia com dignidade da festa e espere que Mary decida o que é melhor para a vida dela. Mas faça isso depois da festa, porque eu quero aproveitar tudo o que será oferecido! Quero dançar, quero comer, quero pular naquele lago, quero tirar fotos e beijar muito!

No quarto de Mary, horas antes do jantar, Regina é recebida com mais um abraço. Humm! Aí tem coisa!

— Mary, querida, precisamos conversar sobre David...

— Ele é tão lindo! Tão doce! Tão forte!

— Mary, há quanto tempo você o conhece?

— Eu o conheci em uma feira da primavera, quando estava com minha stand de vendas.

Caramba! Por onde começar?

— Não é muito cedo para um noivado?

— Regina! – Mary rodopia e vai sentar-se na cama. – Não posso deixar escapar essa chance!

— Você já teve oito namorados! Por que esse desespero para casar-se? Conhece a família dele? E o passado dele? Já puxou o atestado de antecedentes criminais? Já conversou com as ex-namoradas dele? E com os amigos dele? Os pais dele já vieram para o evento?

— Credo, Regina! O que você quer me dizer?

Vamos lá! O golpe precisa ser exato no coração!

— Lembra-se de minhas últimas férias na praia de Marinas? Lembra-se de que lhe contei sobre um namorico que vivi?

O rosto de Mary é coberto por um ponto de interrogação.

— Você associou David a alguém de suas férias?

— Na verdade...aquele verão foi intenso porque...o meu rápido...flerte com o cara que conheci...bem, eu ainda estou apaixonada por este cara... e esse cara é o David...

— E eu estou grávida, Regina. – o sorriso de Mary se desfaz.

Pronto! Cagada homérica! Sair correndo! Imigrar para a Groelândia! Mergulhar num vulcão?

— Grávida? E grávida de David?

— Não. O pai é outro e não posso dizer a ninguém a verdade.

Pergunto? Não pergunto? Ah! Devo perguntar sim!

— Quem é o pai do bebê?

— Aquele período em que fiquei em seu apartamento, Regina, conheci um homem e acabei vivendo momentos incríveis...estou grávida e não posso expor a verdade. Nossa mãe adora David por ser um homem que preenche todos os requisitos para ser meu marido...por ser um empresário...por ser lindo...e por amar-me...

Ainda bem que ela não ouviu! Ou ouviu e está fingindo inocência? Quer que eu me afaste?

— Você me ouviu? Eu tive um romance com David, enquanto vocês já estavam namorando. Nós a traímos!

— Dentro do meu namoro, eu me envolvi com um homem lindo em sua cidade. – Mary aponta a barriga. – Não sei como reencontrar esse homem e nem como confessar o que fiz. Não posso perder David, porque sinto que ele me ama e porque acredita que o filho é dele.

— Em poucos meses você descobre que ama David, vai para a cama com outro homem, enquanto ele vive semanas de férias com sua irmã. Como conseguirá prosseguir com esse casamento?

Mary movimenta negativamente a cabeça. Precisava responder aquelas perguntas? Como explicar o inexplicável?

Entrando no quarto de forma intempestiva, David surge para interromper qualquer coisa que tivesse sido iniciada. Ele olha assustado para as duas mulheres.

— Minha mãe acabou de chegar! Quer conhecer a minha namorada...

— Mary e eu já conversamos.

— O que você disse a ela??

— Mary sabe que você é o cara com quem vivi um affair durante minhas férias.

Correr? Gritar? Mentir? Negar até a morte?

Mary se senta na cama e derruba os ombros como se estivesse derrotada.

— Regina sabe que estou grávida e acabei de dizer a ela que...

— Está grávida?? – Cora entra no quarto e não controla o tom agudo da voz. Ela se volta para David. – É por isso que querem apressar o noivado? Precisam disso em pleno século vinte e um?

— David e eu não falamos sobre isso. Queremos nos casar por sentimos amor um pelo outro. Mas...

Cora estreita os olhos e encara as filhas. Olha para o futuro genro e percebe o pânico nos olhos dele.

— Eu contei para Mary que tive um caso com David, em minhas últimas férias. – diz Regina.

— Estava namorando uma de minhas filhas e teve um caso com a outra?! Que espécie de homem é você, rapaz?? Trair uma mulher grávida!!

Vamos colocar todos os panos sujos para o lado de fora do armário!

— O filho que espero não é do David, mãe.

— Não?? – pergunta Cora e David ao mesmo tempo. – E de quem é??

— Não sei nada sobre ele.

David se mostra ultrajado e indignado.

— Quer casar-se comigo, mas está grávida de outro homem, Mary??

— Você transou comigo enquanto era namorado de Mary e quer ter moral para chamar a atenção dela??

— Mas o meu erro foi de menos peso!

— E em qual balança você pesou o seu julgamento? – Cora vai sentar-se na cama, largando-se ali. – Meu futuro genro trai minha caçula com a irmã dela, mas é traído pela minha caçula com outro homem! Conteúdo de novela?

A porta do quarto é aberta e George, marido de Cora, enfia a cabeça lá dentro.

— Minha mãe acabou de chegar e quer ver as netas. Não se demorem, queridas.

— Faça a recepção porque estamos conversando! Saia, por favor! – Cora gesticula. – Sugiro que façamos o jantar, deixemos os convidados aproveitarem o bufê e depois David e Mary avisam que não acontecerá o casamento.

— Mas eu quero me casar com Mary!

— E assumir o filho de um desconhecido?? Vamos adiar esse casamento ou mesmo cancelar, procuraremos o homem...o pai da criança...ele assume a paternidade e poderemos fazer um acordo!

— Mas eu não sei onde encontrá-lo... – Mary espreme os lábios.