Meu estranho amor

A festa é para todos


Killian se aproxima de uma jovem morena, parada na varanda da casa e a observa. Ela sorri para o homem de belos olhos perversos e cínicos.

— Fumar isso deixará cheiro em cabelos tão lindos.

— Infelizmente não fizeram um cigarro desses, sem cheiro.

Ele se aproxima rapidamente e sorri ainda mais.

— Aí que você se engana, moça! – ele retira um frasco com algumas pílulas verdes. – Isso é fabricado por mim e surte o mesmo efeito. Porém...não deixa cheiros nos dedos e nem na pele.

A morena alarga sua bocarra num sorriso guloso. Lambe os lábios vermelhos e arregala os olhos.

— Por duzentas pratas eu evito uma série de inconvenientes para você, nesta festa. Todos pensarão que você está animada. Então? – Killian morde o lábio inferior.

Alguns minutos depois, Killian entra na sala e cumprimenta as pessoas que passam por ele. Observa a senhora elegante sentada em uma cadeira estofada, parecida com um trono, visivelmente incomodada com um adolescente que tentava fazer-lhe companhia.

— Então, rapaz, não alguém procurando por você? – ele pergunta e senta-se numa cadeira ao lado da senhora. – Pode deixar que farei companhia a esta bela senhora. Temos mais algo em comum do que vocês dois.

— Ah, por favor! – o rapazinho sai dali e desaparece na multidão.

— Eu estava quase soltando uma dúzia de palavrões, para que ele me deixasse em paz. – a mulher sorri e estende a mão para Killian. – Sou Charlotte, sogra de Cora.

— Sou Killian Jones, acompanhante de Regina.

— E o que um acompanhante faz?

— Ele enfeita a festa com sua beleza incrível, conversa com as mulheres mais quentes da festa e ainda oferece subsídios para que essas mulheres fiquem ainda mais quentes.

Charlotte gosta da provocação do jovem.

— E que tipo de subsídios estamos falando?

Dinheiro, mais dinheiro, dinheirinho é sempre bom!

— Subsídios naturais, criados com o mais puro adubo: cocô de morcego, apenas. Deixa tudo viçoso e com mais potência. É mais eficiente que os remédios que os médicos a obrigam tomar.

— Do que estamos falando, mesmo?

Ele exibe um frasco e sorri.

— A bela Ruby já experimentou e veja com está começando a ficar animada. Posso apostar que está sentada aí, apenas por dores nas pernas, que podem ser aliviadas com os “meus subsídios. É apenas um complemento alimentar natural. Quer?

Dentro do quarto, a conversa sobre as revelações ainda precisavam de mais informações.

— Não precisamos continuar com essa farsa de casamento, apenas para encobrir a gravidez...

— Mas eu amo David, mãe.

— E precisa se casar com ele, por isso? Tenha seu filho e depois vocês decidem! Porém, casar-se para...- Cora para de falar e pensa. Continua. – David iria assumir o filho de outro sem saber?

Sim! Não! Caso ele quisesse!

— Eu iria falar, mãe...

— Quando? – David pergunta sem alterar a voz. – Quando eu me apegasse ao bebê.

— Como ele é respeitoso! Trai minha irmã e agora quer ser o pai honroso? Em cada discussão, iria relembrar isso para Mary!

Cora se inclina para o lado e encara Regina. Aponta para ela.

— Você transou com ele, quando tinha um namorado. Então, também traiu alguém. Era aquele cara irlandês indeciso que dublava o próprio cachorro?

David e Mary não contém a risada, mas se mostram educados para não provocarem fúria em Regina.

— Ele mesmo, mas ontem ele foi embora e não estamos mais namorando.

— E Killian? – Mary se interessa. – Você o apresentou como seu namorado!

Ele me fez refém numa invasão a uma agência bancária. Foi preso por vender drogas e tem por hobby, perseguir um policial. Só isso!

Regina ergue o queixo, pisca várias vezes não perde a altivez.

— Ele é apenas um acompanhante.

— Você trouxe um gigolô para a festa de noivado de sua irmã caçula??

— Não vai haver noivado, mesmo! Gigolô, traficante, macaco de circo, urso dançarino, qual diferença iria fazer? – Regina amua e não perde a elegância.

Novamente a porta do quarto é aberta e George surge preocupado.

— Cora, por favor, preciso de ajuda com minha mãe! Ela está exaltada demais e temo que faça um escândalo!

— Chame o resgate, os bombeiros, a Swat, mas cuide de sua mãe, sozinho! Estamos ocupados!

Voltando-se para as filhas e David, a mulher mais velha mostra sua indecisão sobre o problema.

— A minha sugestão é essa: deixemos a festa acontecer, anunciamos o fim do noivado e cada qual seguirá sua vida. David volta para o mundo dele, com a família dele, com as amantes... – ela olha Regina de soslaio. – E deixará nossa família de lado. Não faremos contratos, nem associações...

— Você está falando de minha vida, Cora! Quem você pensa que é? Eu cometi erros, Mary cometeu erros, todos cometeram erros, mas quem decidirá sobre nosso noivado, seremos Mary e eu!

O coração de Regina fica acelerado e o que todos enxergam em sua expressão não havia como ignorar: algo estava desmoronando ali dentro.

— Eu fiquei apaixonada por você, David. Para mim não foi apenas um caso de verão. Eu tinha esperanças de reencontrá-lo, mas quando o vi aqui...

— Que situação... – Mary abaixa a cabeça.

Ficando em pé e caminhando até a janela, Regina fica pensativa e calada por alguns minutos que pareciam uma eternidade. Mas David cala a boca do silêncio.

— Eu cometi um erro grave, mas tenho de reconhecer que meus sentimentos pertencem a Mary. Gostaria muito que ela me perdoasse e aceitasse casar-se comigo, Regina. Nosso relacionamento foi intenso, vigoroso, mas não foi forte a ponto de fazer-me desistir dos meus sonhos ao lado de Mary.

— Isso é muito bonito agora, mas depois que o bebê nascer com a fisionomia de outro, vamos ver onde fica todo o romantismo.

— Parem com isso...- Mary começa a chorar como se fosse uma criança.

Cora levanta os braços e revira os olhos, vendo a situação ficar mais complicada. Ela fica em pé e estende a mão para Regina.

— Venha, filha. Este assunto é deles e precisamos esperar a decisão que eles tomarão.

— E meus sentimentos?

— Duas semanas não é tempo suficiente para amar ninguém, a menos que este alguém seja seu filho recém-nascido.

Outra vez a porta se abre e o rosto aflito de George aparece.

— Não sei mais o que fazer, Cora! Não é somente minha mãe que está agitada! Há algo de errado lá no salão das mesas!

Alguns minutos depois, Regina e seus pais estão parados na entrada do salão, observando alguns convidados dançando como se estivessem fazendo parte de alguma festividade de Baco. Tudo bem que a animação era geral, mas um pouco de pudor nos movimentos das danças, seria apreciado.

— Alguém deu açúcar para sua mãe, George?

— Isso não é açúcar, mãe. Isso é droga! Todos estão movidos por algum estimulante que não é somente a música. – comenta Regina achando graça na situação.

— Sua avó irá arrepender-se disso nos próximos cem anos. Vou fazer questão de lembrá-la dessa visita ao Moulin Rouge em todas as vezes que tentar ser o símbolo da moralidade. – Cora aponta para as mulheres alegres no salão. – Isso teria um nome?

— Killian Jones. – responde Regina.

Noutro canto da cidade, na Central de Polícia, Amintas deixa a sala do seu superior e segue para sua mesa. Tinha alguns relatórios para serem preenchidos e depois iria ter seu descanso merecido naquela noite.

Lá pelas tantas, o celular dele avisa que alguma mensagem havia chegado. E mais uma, e mais uma e mais uma mensagem. O que é isso? Invasão de spam? Ou algum desocupado querendo diversão? Ah! Obviamente era Killian Jones se divertindo por ter saído ileso de mais uma aventura sob a proteção do papai secretário municipal.

Abre as mensagens e depara-se com uma enxurrada de fotografia de Killian sorridente ao lado de mulheres de meia idade e outras mais jovens, com expressões de que algo não estava em seus devidos lugares. Elas estavam visivelmente alteradas, enquanto que o malandro apenas sorria, divertindo-se com suas atitudes.

— O desgraçado do Jones está enviando fotografias de uma festa. E pelo visto, está regada a certos produtos naturais. – Amintas comenta com outro policial.

— O cara está passando dos limites. Ele quer enlouquecer você ou quer levar um tiro.

— Não. – Amintas salva o documento que estava digitando e desliga o computador. – Ele está apenas criando um incentivo para que eu peça minha transferência e depois minha aposentadoria.

— Como é? Um cara como você saindo de nosso departamento?

Amintas se levanta e veste seu casaco.

— Desde que utilizamos o Jones naquela operação, tenho sido prejudicado em meu trabalho. Perdi uma promoção, fui indicado para a Corregedoria e em seguida nomearam outro para a vaga. Nem cogitaram meu nome para substituir nosso Capitão quando ele se aposentar...está na hora de eu reconhecer que é tolice tentar brigar com peixes graúdos. O Jones é filho de um homem importante na política local e eu não tenho esse tipo de proteção. Então, antes que eu perca os poucos direitos que em restam, sairei do jogo.

Os outros policiais que estavam na sala não encontram diversão em nenhuma daquelas palavras. As brincadeiras, as piadas feitas ao longo dos meses da perseguição jocosa de Killian ao policial Amintas, não tinham a menor graça naquele momento. Todos haviam magoado um excelente profissional e ninguém havia percebido isso.