Meu amado é um lobisomem

Capítulo 27: Superando - Shouya e Hanabi - Parte I


Todas as tardes após o colégio, Hanabi corria pela trilha da floresta. Decidiu se ocupar mais um pouco entre o colégio e o trabalho no mercado. Havia se passado mais de seis meses desde o término do namoro entre ela e Shouya e as aulas logo voltariam após o verão.

Seu cabelo, preso em rabo de cavalo, balançava enquanto ela corria e escutava música nos fones de ouvido. Todos os dias ela o fazia, no mesmo horário. Corria por toda a trilha e enquanto observava o caminho, em nenhuma hora via Shouya. Há um tempo os dois não se viam, desde o aniversário de Haru em abril. Porém ele estava sempre a olhá-la de longe. Em sua forma de lobo, Shouya tomava conta de Hanabi. Ela nunca estava sozinha. E ele pensava se fora realmente certo tê-la deixado ir.

— Ela corre todos os dias. – seu pai comentou ao chegar como lobo, sentando-se.

— Eu sei.

— Por isso sempre está aqui?

— Está me vigiando? – Shouya o olhou.

— Sente falta dela, não é? Por que não...?

— Não.

Yuzo suspirou enquanto o olhava.

— Nós sabemos que você a ama, Shouya. É escolha dela ficar com você, ela sabe as consequências.

— Não, ela não sabe. – disse ele, olhando-o – Minha mãe sabia o que você era quando decidiu ficar com você, pai. Mas Hanabi não sabe. Ela acha que sou uma pessoa comum.

— Sua mãe já me amava muito antes de eu contar. Não é como se estivesse contando para um estranho.

— Não importa. Não tem mais razão de eu contar... – Shouya levantou, caminhando para o lado oposto – Até mais.

— Hum. – Yuzo deitou-se no chão, ponto uma pata sobre a outra e pensando.

Shouya dirigiu-se para o caminho de volta à sua caverna, porém, passando pela trilha, avistou Hanabi, que também o viu. Ela arregalou os olhos, há meses não via o lobo e pensara até que havia morrido. Porém ao descobrir que não, tracejou um sorriso feliz.

— Shou!

O lobo correu para longe dela. Hanabi correu atrás dele, sem compreender sua reação. Ela correu o mais rápido que pôde, porém o perdeu de vista e parou, recuperando o fôlego.

— Shou! – o chamou ao endireitar-se – Shou!

Hanabi o procurava pela floresta, porém ao longe, Shouya a observava atrás de uma árvore. Sem que ela o visse, ele se foi enquanto a ouvia chamá-lo.

Ao anoitecer, Hanabi saía do mercado após seu expediente terminar. Ela ainda pensava sobre o lobo e na razão de ele ter fugido dela. Será que era outro? Era o mesmo. A pelagem, os olhos. Por que ele fugira dela?

Ao parar para atravessar a rua, avistou Mai saindo do parque. Ela esperou, vendo-a atravessar a rua.

— Hanabi.

— Mai. – sorriu – O que está fazendo?

— Pensei em comprar algo pra comer. – ela sorriu – Quer ir à lanchonete comigo?

— Ok.

Após fazerem o pedido e o lanche chegar, as duas conversavam. Num instante, Hosokawa-san passou pela mesa das duas, cumprimentando-as rapidamente com um sorriso e indo embora. Mai abaixou o olhar, bebendo seu refrigerante pelo canudo.

— Hayato não gosta dele. – comentou.

— Por quê?

— Ele diz que Hosokawa-san olha diferente para as meninas.

— Nunca notei isso. Na verdade sou um pouco indiferente à ele, não o conheço.

— Hum. E como você está? Vai ao festival de verão?

— Sim.

— Ótimo. – Mai sorriu – Então vamos todos juntos.

— Só não sei se vou de Yukata.

— Hum. – concordou – Como você acha que vai ser o resto do ano letivo? Espero que a matemática melhore, mas duvido que isso aconteça.

— Não faço ideia. Espero que seja melhor que o começo.

Hanabi abaixou o olhar. Mai franziu a testa, há muito tempo não via Hanabi desse jeito.

— Sabe, você vai encontrar alguém. E mesmo se não encontrar, eu sei que você vai ser feliz.

Hanabi a olhou.

— Espero que sim.

Após o encontro, os dias passaram rápido. As manhãs eram vazias no momento em que Hanabi se arrumava. Seu ritual matinal era acordar e olhar rapidamente – e sem querer – para a o copo redondo onde seu nome e o de Shouya estavam escritos. Desde o natal a vela não era acesa. Desde aquela noite em que os dois disfrutavam daquele momento, juntos. Após se autoflagelar emocionalmente, ela levantava para tomar banho e escovar os dentes. Após se vestir, ela amarrava o cabelo em um rabo de cavalo alto e tomava o café da manhã para em seguida ir trabalhar.

Enquanto o tilintar dos garfos ocorria na cozinha, sua mãe lhe olhava, analisando-a.

— Tudo bem, chega.

Hanabi a olhou, esperando.

— Faz quanto tempo? Seis meses?

— Do que está falando? – ela perguntou.

— A primeira vez que te vi completamente feliz, foi no natal. Com Shouya, filho de Tsuki.

Hanabi abaixou o olhar. Não estava com vontade de falar nada, e nem saberia se teria palavras para isso.

— Está na hora de parar com essa tristeza. Chega disso!

Ela não dizia nada.

— Você trabalha mais do que eu, e até hoje não sei pra que. Pra que?

Hanabi desviou o olhar. Repentinamente sua mãe irritou-se e bateu com a mão sobre a mesa.

— Hanabi, responda!

Ela se assustou, olhando-a. Após olhares e a encarada de sua mãe, Hanabi suspirou.

— Era uma coisa que eu queria fazer, mas agora apenas trabalho pra me ocupar.

Sua mãe suspirou.

— Acabe com essa cara. – encerrou sua mãe, levantando – Ele só era um garoto.

Hanabi levantou, pegando sua bolsa e saiu, batendo a porta. A vivência das duas não era próxima e nem distante. Porém Hanabi gostaria que sua mãe a compreendesse melhor. O marido tê-la deixado não era motivo para descontar nela quando a visse triste por causa de um rapaz.

Após duas horas, Hanabi fazia a reposição das latas, sentada em um banco. Ela não parava de pensar na discussão – se é que pode se chamar disso. Suspirou, passando a mão na testa após pôr uma lata no lugar.

— Minagashi-san?

Hanabi olhou para cima e viu Hosokawa com uma cesta na mão.

— Oi, Hosokawa-san. – disse ela, abaixando o olhar por um momento.

— Você não parece bem.

— Na verdade não estou, mas tudo bem.

— É uma pena. Você parece ser uma ótima garota. Trabalhadora, inteligente.

— Obrigada. – ela sorriu educadamente.

— Bem, vou indo.

— Até mais.

Hanabi voltou à pôr as latas no lugar. Pelo menos por um momento ela se esqueceu de tudo.

No dia do festival, Hanabi decidiu vestir sua Yukata. Ichiro e Ame encontraram-na na trilha e os três foram juntos em direção à cidade. Shouya sabia do festival e que Hanabi iria, pois Ame deixou escapar. Então, por mais que negasse, ele foi observá-la andando pela trilha. Viu como ela estava linda com sua Yukata e o cabelo loiro preso num coque baixo. Ele desejou estar mais uma vez naquele dia, no natal. E com Hanabi.

O festival, como todos os outros, ocorreu na praça central. Estava cheio, quase todos na cidade participavam. Os três se encontraram com Hayato e Mai numa das barracas e em muito tempo, Hanabi sorria. Eles comeram, brincaram nas barracas de jogos, Ichiro e Hayato ganharam um animal de pelúcia para Ame e Mai, e Hanabi ganhou um animal de pelúcia para ela mesma. Um pouco antes dos fogos de artifício, Hanabi foi até uma barraca para comprar peixe frito.

— Obrigada. – disse ela ao pegar o palito.

— Ah, Minagashi-san.

Ela olhou para o lado e viu Hosokawa.

— Hosokawa-san. – cumprimentou-o.

— Está bonita.

— Ahm, obrigada. – ela sorriu sem jeito – O festival está legal, não é?

— Muito. Ainda não havia ido a um festival da cidade, mas esse não me desapontou.

Hanabi sorriu educadamente até que Ame se aproximou.

— Hanabi, vamos.

— Ah, tá bom. Até mais Hosokawa-san.

— Até mais. – ele sorriu.

Enquanto as duas andavam até onde os outros estavam, Hanabi perguntou:

— Por que me chamou do nada? Eu já estava voltando.

— A gente não confia muito no Hosokawa-san.

— Por que não?

— Ele olha de um jeito estranho para as garotas.

— Todo homem olha. Não é normal?

— Ele é bem mais velho que a gente, não deveria fazer isso.

— Tá bom então.

Hanabi achou graça pela preocupação, e a noite terminou com eles assistindo aos fogos de artifício. Na volta para casa, Hanabi percebeu como havia se divertido. Não muito, mas se divertiu. Ao chegar em casa e ver sua mãe assistindo à TV – ela não fora ao festival –, lembrou-se da discussão que tiveram dias atrás. Direcionou-se até a mãe, pondo-se entre ela e a TV.

— Não pode me obrigar a deixar de ficar triste. – lançou ferozmente.

Sua mãe a olhou, surpresa enquanto ela falava.

— Durante aqueles meses eu fui mais feliz do que durante toda minha vida. E o fato do meu pai ter te deixado não a faz ter o direito de me dizer quando a minha dor tem que passar. Eu o amava demais... Então é claro que estou arrasada.

A mãe de Hanabi permaneceu a olhando ao passo que ela se virou e subiu as escadas para seu quarto. Após fechar sua porta, Hanabi soltou o cabelo e viu o copo redondo pelo espelho. Virou-se para seu criado-mudo e foi em direção ao copo, pegando-o. Observou com detalhes de seu nome e o nome de Shouya. Suspirou, mas sabia o que fazer para seguir em frente. Abriu a gaveta do criado-mudo e guardou o copo. Engoliu em seco, porém tinha esperança de que ficaria bem.