Introdução

Era tarde quando o pronunciamento começou, quando finalmente o barulho inquieto de homens e passo cessasse, e o silêncio se fizesse presente na Floresta de Pedra, a voz que a conduzia forte o bastante para pertencer a um dos algozes das Torres, e suave o bastante para um aristocrata da Ilha Capital.

Talvez fosse ambos.

- Me chamo Morpheu, eu serei o comandante agora que Strauss foi afastado.

Morpheu era muito diferente do que se esperaria de um militar mandado pela Armen Noir, apesar dos olhos gelados, claros, quase brancos, dos longos cabelos loiros e repicados, com um brinco na orelha direita e uma pequena cicatriz mais clara do lado esquerdo do rosto.

Olhava para os homens que agora comandaria, com o discurso burocrático decorado na cabeça, a boca se movia sem a supervisão da mente, que inspecionava cada rosto que agora cabia sob sua guarda, as mãos nos bolsos, uma no maço de cigarros e a outra no isqueiro.

Sua mente estala quando de repente uma forte saudação geral de continências o faz perceber que já havia terminado de falar. Olhou pra cima, para o teto.

Memorizava os rostos sem memorizar nenhum.

Murmurava para si mesmo “Acho que estou alto...” e fechava os olhos por um segundo antes de respirar fundo e descer do palco para onde havia subido.

A névoa de seus pensamentos estava trêmula, turbulenta... Há quantos dias não dormia? Dois? Três? Quatro? Talvez mais... Talvez tivesse dormido, talvez estivesse dormindo. Não sabia dizer.

- Virá a festa senhor? – perguntaram-lhe enquanto descia o pequeno lance de escadas que o erguia um pouco mais do chão que já parecia distante.

- Não. Vou me retirar. – respondeu, descendo os corredores brancos, impecáveis, cheirando com o imaculado perfume vago de lavanda.

A ele apenas cheiravam como álcool etílico e morte.

Se afundou em sua cama como se estivesse se afogando, dormindo o quanto lhe fosse permitido, já que não sabia quando poderia de novo.