Mãos deslizaram seu tronco, quentes, fervendo a pele gelada e arrancando-o violentamente da inconsciência serena, atirando-o contra a realidade rápido demais, fazendo com que fincasse suas unhas no travesseiro macio não pela primeira vez nas últimas horas.

– Bom dia. – o comandante sussurra, quente, o hálito cheirando a menta contra sua orelha fazendo-o fechar os olhos novamente e encolher-se contra o lençol de linho barato.

Gemeu baixo, tentando afastar o rosto do comandante de perto de seus ouvidos num movimento desajeitado, mas antes que pudesse ter sucesso, ele já não estava mais lá, e os sons de passos recomeçaram contra o chão acarpetado.

– Não precisava fazer isso... – reclamou, mal humorado, levantando a cabeça do travesseiro e estreitando os olhos diante da luminosidade fulminante.

– Estou confuso, refere-se a sussurrar coisas ou tocar em você? Me esclareça qual para que eu possa elucida-lo sobre a ironia da sua reclamação e o quão tarde é para me dizer isso.

– Poupe-me do seu sarcasmo à essa hora, Morpheu. – ele se põe de pé, não muito certo de onde havia arrumado a camisa que usava agora, mas antes que pudesse se aprofundar nessa pergunta, as mãos de Morpheu cruzaram seu abdômen, chocando-se contra a pele sempre receptiva, escorrendo até se cruzarem num x que prendia os ombros de Klaus contra o peito do comandante atrás dele, o cabelo loiro pingando pequenas gotas abandonadas em seu pescoço exposto.

– Entenda que não sou um homem misericordioso, Klaus... – sussurra novamente, abaixando-se de modo que o doutor conseguisse sentir a vibração das palavras contra seus ouvidos.

– E que tipo de homem é você, Morpheu? – ele pergunta, virando a cabeça apenas o suficiente para encontrar os olhos do comandante.

– Poderia pedir que você me dissesse, mas acredito que seria do melhor interesse de todos se você não soubesse.

Dito isso ele se afasta do médico, em busca de suas botas.

Klaus suspira, caminhando em direção ao banheiro.

– Vou usar seu chuveiro.

– À vontade.

O doutor desaparece pela porta, e Morpheu abaixa para amarrar os sapatos, quando o som do chuveiro começa, pouco mais de um segundo se discorre antes que Klaus estremeça um pequeno som indignado de dentro do banheiro.

– Pelo amor de deus, Morpheu! Água quente existe!

– Obrigado pelo aviso, doutor. – ele sorri em silêncio, amarrando os cadarços da bota com calma.

Mais um som frustrado e então silêncio. Morpheu esfrega o cabelo preguiçosamente contra a toalha verde escura, procurando o pente pelo quarto.

Klaus não se prolonga muito no banho, preferindo evitar comentários do comandante sobre o quanto de água ele ainda pretendia jogar fora, saindo e se enrolando parcamente na toalha, deixando a camisa que usava antes sobre a cama, procurando sua calça, já que não tinha muita certeza de onde ela estava.

Morpheu pega a escova de cabelo, procurando a fita azul escura que usava sempre. Já o doutor, depois de se secar porcamente e colocar a calça que estava organizadamente dobrada sobre a cadeira junto de seus outros pertences -obra da organização pessoal do comandante- se aproxima do comandante, apoiando a testa em suas costas.

– Morpheu...

– Hm? – ele solta o cabelo, tentando se virar para encarar o doutor que molhava suas costas com o cabelo.

– Posso... escovar seu cabelo?

– O que? – o comandante inclina a cabeça para trás e para o lado, incapaz de suprimir totalmente sua surpresa.

– Eu... gosto do seu cabelo, só isso. – ele desenha pequenos padrões circulares nas costelas de Morpheu com os indicadores.

– Quantos anos você tem mesmo? – ele ri, o doutor se afasta instantaneamente.

– Deixe pra lá. – ele pega o resto das roupas, os sapatos, e procurava as luvas quando Morpheu deixa a escova de cabelo em sua mão livre, sorrindo com complacência conformada.

– Você precisa parar de se ofender tão fácil. – ele suspira, sentando na borda da cama, enrolando a fita nos dedos fazendo uma porção de laços, um sobre o outro.

Alguns segundos se passam antes de Klaus deixe suas coisas sobre a mesa novamente em um silêncio constrangido, sentando-se atrás do comandante e alcançando uma das mechas de cabelo claro com as pontas dos dedos, penteando com mais cuidado do que o realmente necessário.

– Tem um cabelo bonito, comandante. – ele disse, em silêncio.

– Hm... Já ouvi isso antes. – ele responde, numa constatação desprovida de orgulho ou interesse.

– Tem algo que você já não tenha ouvido antes? – ele pergunta, com uma espécie de receio velado.

– Eu não sei, não posso dizer o que não ouvi ainda. – ele ri, baixo, pensativo.

– Morpheu... Ontem...

– Hm? – ele pergunta, inclinando a cabeça para trás, a fim de ver o rosto do doutor.

– Pareceu irritado quando disse que precisava de você... A ideia... Ela te incomoda? – mantinha os olhos focados nas mechas que tinha entre os dedos.

– Irritado não é a palavra... Talvez apenas cansado de ouvir isso. – ele suspira, apenas ignorando a segunda pergunta de forma confortável.

– Cansado? – Klaus pega a fita com que Morpheu brincava esbarrando seus dedos no processo, juntando o cabelo a fim de amarrá-lo no rabo de cavalo alto, apoiado nos joelhos.

– Nem sempre fui comandante, doutor. E nem sempre tive meu trabalho para me focar em... Algo produtivo. A responsabilidade real me fez bem, é verdade... Ser soldado me deu uma direção.

– Comandante... – ele termina de amarrar o laço, congelando no lugar enquanto Morpheu inclinava para trás, apoiado o rosto em suas pernas, de olhos fechados, a expressão cansada.

– Faz muito tempo que não fazem isso por mim... Talvez eu só esteja nostálgico, será breve, eu garanto. – ele sorri, melancólico, ainda com os olhos fechados.

– O que eu... devo fazer? – ele pergunta, ignorante dos costumes dos homens.

Silêncio.

Klaus sabe que ele ouviu, então não refaz a pergunta, apenas deixando que o comandante fique apoiado nele por mais alguns instantes antes de se sentar novamente e espreguiçar, virando-se na direção do doutor e atando seus lábios juntos por apenas alguns segundos antes de levantar na direção da porta.

– Não se esqueça de arrumar suas coisas, doutor. Partiremos hoje.

– Sim, senhor...

Então ele sai, encostando a porta com cuidado.

O doutor permanece sentado, olhando o carpete.

No que você está pensando, Morpheu...?

– Quem é você, comandante? – ele fecha os olhos, suspirando, sentindo os lábios formigarem com a sensação fresca de contato.