Mentiras no Jornal
À Procura
Estrada de St. Peter - 15:42 hrs
Estavam chocados o suficiente. Ninguém ousou iniciar um assunto. Michael torceu para que continuasse assim, porque sabia, no fim, que a culpa cairia nele.
Suspirou. Luna era a mais próxima dele, Prince parecia estar tentando se conter, pois estava a uns passos à frente da dupla. Ele não queria sequer olhar nos olhos do moreno.
— Luna… me perdoe.
Sussurrou. A garota o encarou de canto, mordeu os lábios para segurar um palavrão, estava muito enfurecida, mas ao mesmo tempo estava feliz por vê-lo.
— Você tem sorte que o Prince não quer conversa contigo, senão eu ia ter que conter vocês dois.
— Você acha que conseguiria?
Provocou em uma brincadeira. Luna revirou os olhos e deixou um sorriso de canto escapar.
— Você é um idiota mesmo… Quando a gente conseguir parar pra descansar, você vai ter que se explicar, hein? Foi muita loucura o que você fez, Michael, a gente podia ter morrido.
— Eu sei, eu sei… eu vou contar tudo a vocês, eu prometo. Eu só preciso que me compreendam…
— Compreender…?
Ouvir aquelas palavras, mesmo que em uma distância considerável, fez o sangue do jovem cantor ferver. Michael não sabia se havia sido seu sexto sentido, mas desviou com maestria de um sapato que sobrevoou sua cabeça. Luna percebeu que precisaria fazer o que havia dito minutos atrás, ela teria que conter os dois marmanjos de se atracar.
Prontamente ficou entre os dois.
— Tudo isso é CULPA SUA!!! SEU… Ah, Luna, agora não!
— Prince, para!! A classe, esqueceu??? A classe, postura…
— QUE SE FODA!! Seu filho da puta, eu não devia ter voltado pra você! Você vem falar de compreensão quando QUASE TENTOU NOS MATAR NO LAGO!! Se a Luna morresse, eu juro que o próximo seria você!!
— Ela não ia morrer! Eu…
Desviou de outro sapato antes mesmo de terminar a frase. Prince avançou sobre o rapaz, mas foi contido por Luna. Ele tinha mais força que a garota, porém não se perdoaria se a machucasse naquela brincadeira, estava tentando manter o mínimo de sanidade e consciência consigo.
— Eu podia estar trabalhando no meu estúdio agora! Puta merda, MALDITO DIA que eu resolvi ajudar você!
— Então por que não ficou lá?? Eu não pedi a sua ajuda!
— Porque eu tentei te compreender, caralho!! Você fala como se nós não estivéssemos te dando apoio o suficiente, isso me deixa puto!! Eu tô encharcado! Minha roupa é cara e você fodeu ela toda! Você fodeu minha roupa, meus sapatos, meu cabelo, MEU CARRO, meu dinheiro, meus cartões…!
De repente, ele congelou. Michael estava esperando mais uma salva de gritos e Luna simplesmente havia desistido, achou que seria melhor que Prince desabafasse mesmo, querendo ou não, ele não estava errado, porém o cantor pareceu recobrar a consciência nesse curto período de tempo em silêncio.
— Meus… cartões…
Logo, passou a revistar os próprios bolsos. O cartão que usou para pagar o almoço mais cedo naquele dia ainda estava lá, lindo e intacto. Prince, em um gesto de desespero e euforia, deu vários beijinhos no objeto de plástico antes de comemorar mentalmente.
— Prince…
— Não perdemos tudo! Não perdemos…
Passou a mão nos cabelos e, num instante, aquele Prince mais são e elegante parecia ter retornado.
— Graças ao bad boy aí, poderíamos ter ido dormir na rua! Mas isso não vai acontecer… não enquanto eu estiver aqui.
Balançou o objeto de plástico, e então Luna sorriu e correu até o homem, pulando em seus braços e o abraçando com força.
— Isso! Nós vamos pra casa!!
Michael não podia negar que estava feliz por eles, mas quando ouviu a palavra “casa”, o receio tomou conta de seus pensamentos.
Lentamente deu alguns passos para trás, o que fez a dupla perceber.
— O que foi, Michael?
Indagou Luna. Ele suspirou.
— Eu estou feliz por vocês, de verdade. E eu sinto muito que tudo isso terminou dessa forma, eu não queria ter diretamente envolvido vocês nisso, essa era a minha maior preocupação. Bom… vocês podem ir pra casa se quiserem, eu não posso, eu não tenho casa.
Aquelas palavras fizeram a garota, preocupada, encarar Prince como se esperasse alguma resposta dele. O rapaz apenas a encarou de volta e voltou a contemplar Michael.
— E você vai pra onde?
Ele deu ombros.
— Eu não sei… mas pra longe. Eu vou sair de Minnesota e, depois, eu vejo o que eu faço. Vocês podem pelo menos me deixar naqueles ônibus de viagem?
Silêncio. Prince sabia que não podia deixá-lo naquela situação, e Luna sabia que o cantor tomaria a melhor decisão, eles não eram amigos por qualquer motivo, ela confiava plenamente nas decisões dele. O encarou mais uma vez, apenas para ter certeza do que ele falaria.
Suspirou.
— Você vem conosco.
Michael arqueou a sobrancelha.
— O quê…? Não, eu não…
— Se tentar se explicar, vai ser pior. Vem… vamos embora daqui.
Calçou seus sapatos mais uma vez antes de dar as costas e balançar o cartão novamente. Luna sorriu, encarou Michael por alguns segundos e, radiante, seguiu em direção ao seu amigo, esperando que o ex bad boy os acompanhasse. Michael acariciou os próprios braços por alguns segundos, parecia relutante, ele ainda temia pela vida deles, mas discretamente sorriu ao ver o que estavam tentando fazer para ajudá-lo. Queria compensar de alguma forma.
Sem dizer mais uma palavra, os seguiu.
x ----- x
(3 anos atrás) - 17:10 hrs
Michael afastou um pouco os braços do corpo e permitiu que o estilista e sua assistente dessem os toques finais em seu traje. Estava usando uma jaqueta vermelha com brilhantes, braçadeira preta de cetim, calças escuras, sapatos lustrosos, os cabelos presos e um Fedora acompanhado. Ele gostava daquelas roupas, mas não quando estava usando para aquele tipo de compromisso, não quando o seu pai o forçava a usar.
Mexeu de propósito, apenas para atrasar a coletiva que teria daqui a pouco. O feitiço acabou virando contra o feiticeiro e a agulha que a assistente estava manipulando acabou por furar sua pele.
— Ei!
— D-desculpe, senhor…
— O senhor fez de propósito.
Disse o estilista, já um pouco mais acostumado com as pirraças do rapaz. Michael suspirou e ficou em silêncio, errado ele não estava.
— Meu pai falou alguma coisa pra vocês? Alguma coisa tipo “podem torturar o Michael com uma agulha, eu deixo”.
O mais velho deixou uma risada discreta escapar, enquanto trabalhava. Lentamente balançou a cabeça em negação.
— O seu pai não é um carrasco. Ele está fazendo isso pro seu bem.
— É, eu gosto de sentir que não tenho controle sobre minha vida. Agora sei como um Tamagotchi se sente.
— Michael, você é um jovem talentoso. Ele só está querendo se certificar de que você não precise passar por todas as dificuldades que ele passou na juventude. Ser uma pessoa comum não é fácil.
Michael suspirou.
— Ser uma pessoa famosa também não é.
— Pessoal, cinco minutos!
Um outro funcionário chegou para avisá-los. O estilista passou a se apressar um pouco mais, dando menos atenção às palavras do jovem.
— Mariela, termine isso aqui. Eu só vou pegar o desenho do projeto e fazer a revisão final.
A assistente assentiu e continuou trabalhando no traje enquanto o homem se retirava. Assim que a porta bateu, alguns instantes depois, ela encarou Michael discretamente.
— Senhor…?
Sussurrou. Ele a encarou de volta.
— O seu pai… ele…
Ela suspirou.
— Cuidado quando for envolver outras pessoas nessas fugas. Ele está furioso.
Michael a encarou com um pouco mais de seriedade. Logo, lhe deu o dobro de atenção.
— O que ele te disse…?
Ela mordeu os lábios, como se perguntasse a si mesma se devia contar. Era novata, tinha medo de Joe Jackson, mas a sua empatia era maior do que o conformismo dos demais funcionários já acostumados com aquele jeito sujo de trabalhar.
— Ele não pode te machucar, o senhor dá dinheiro pra ele… mas ele pode machucar as pessoas à sua volta. Só… tome cuidado.
Murmurou. A porta se abriu, os dois tremeram em silêncio. Michael percebeu que ela estava falando a verdade quando viu o pavor em seu olhar, mesmo que fosse só o estilista retornando com os projetos.
Ele jamais esqueceria aquelas palavras.
x ----- x
(Atual) - 16:35 hrs
Após alguns instantes de caminhada, Prince, Michael e Luna estavam diante de uma pequena e confortável ruazinha pouco movimentada e ensolarada. Aquela era a cidade de St. Peter. Encararam todo aquele lugar por alguns momentos, buscando hotéis de luxo, lojas ou restaurantes badalados, mas não encontraram muito além de casas históricas, igrejinhas, parques e florestas.
Já morrendo de frio, os três tentavam cada um abraçar a si próprio a fim de manter o calor do corpo. Prince suspirou bem fundo e passou a mão nos cabelos mais uma vez, em seguida puxou os outros dois para um canto.
— Okay, ouçam o plano…
— É melhor mesmo, porque não tô vendo nada que pareça com a vida de luxo de vocês nesse lugar.
— Nós podíamos nos hospedar em qualquer hotel 3 estrelas, não vamos ficar por muito tempo.
Prince suspirou.
— Crianças, calem a boca! Michael, vamos lembrar que nós dois somos mundialmente famosos, correto? Então se começarmos a andar por aí, vão nos reconhecer e você vai ser mandado pra casa. Por isso, vamos fazer o seguinte… Vamos procurar um lugar decente para passar a noite. Amanhã, eu vou alugar um carro, te deixar em Rochester e seguir com Luna de volta pra Chanhassen, okay? Tá bom pra você?
Michael revirou os olhos e assentiu.
— Okay.
— Por que eu sinto que só estamos varrendo os problemas pra debaixo do tapete?
Indagou Luna, cruzando os braços.
— Não vamos dificultar mais esse plano, okay? Michael concordou, eu concordei, estamos de acordo. Agora vamos, estou ficando com frio. Se dermos sorte, esse pessoal é simples e não vai nos reconhecer, mas, só para prevenirmos, Michael, levanta esse capuz.
— Ah, você fala demais…
— Não mostra as garras agora, Daryl…
Brincou Luna, o que fez o rapaz deixar uma risada muito discreta escapar. Ele fez um movimento negativo com a cabeça e levantou o capuz, também tentou manter a cabeça baixa.
Sem mais delongas, seguiram em frente.
x ----- x
Paisley Park, Chanhassen - 19:09 hrs
Já era noite, porém toda a Paisley Park estava acesa. Nenhum funcionário conseguia dormir sem notícias de seu patrão, que havia saído àquela tarde, não disse para onde foi e ainda não havia retornado. Dentre eles, Ted era o mais apreensivo, perambulava de um lado para o outro, completamente nervoso, ligando para todos os amigos do cantor que tinha conhecimento.
Antes de chegar à mídia, essa notícia se espalhou como uma doença. Era muita coincidência um desaparecimento atrás do outro, e isso era algo que havia passado despercebido pela atenção falha do Ted.
Todavia, não poderia-se dizer o mesmo de Jones Jr.
Ainda naquela noite, completamente transtornado, Ted recebeu a visita do empresário. Ele teve sua entrada permitida antes mesmo que o homem pudesse tomar alguma atitude.
— Ted, meu caro! Alguma notícia do Prince?
Indagou, a voz na tonalidade certa. Se estava mesmo preocupado, ele não sabia, porém toda ajuda era bem-vinda àquela altura do campeonato.
— Ele deixou tudo, tudo! Levou o celular, mas ninguém atende!
— Isso não parece normal, mas ele não é uma criança, Ted. Se eu fosse você, esperaria o dia clarear. Ele deve ter ido dormir na casa de alguma namorada, nada fora do comum. Você sabe como Prince é “passeador”...
— Jones, ele não é inconsequente assim! Ele não sai sem avisar, principalmente porque ele está cheio de trabalhos…!!
— Shh…!
Fez o empresário, em seguida suspirou.
— Escute, se ligar para a polícia agora, eles irão rir da sua cara. Prince é um homem adulto, vamos tratá-lo como tal! Por que não dá uma olhada nas contas bancárias dele? Se Prince estiver dando uma volta, com certeza está pagando as coisas, ele é muito orgulhoso para deixar que paguem pra ele.
O olhar de Ted pareceu se iluminar com as palavras do mais velho. Ele viu uma esperança naquele momento, logo estalou os dedos e aquiesceu.
— Isso, isso! Mas é claro!! Nanda, verifique as contas bancárias do senhor Nelson agora!!! Todas elas!! Verifique os últimos movimentos…
Exclamou, já alertando a secretária particular do cantor. Jones suspirou, pelo menos esse detalhe estava sob controle. Ele não tinha problemas com Prince, mas sabia que o seu sumiço era muito suspeito e sentia que, se conseguisse encontrá-lo, consequentemente também encontraria o seu alvo.
Bastava agora esperar no que isso ia dar e torcer para que suas suspeitas estivessem corretas.
Fale com o autor