Paisley Park, Chanhassen - 14:50 hrs

Haviam se passado algumas semanas desde o ocorrido.

Naquela bela tarde ensolarada, um Prince apático e um pouco distraído encontrava-se em seu estúdio de música particular. Voltou à sua rotina de sempre, trabalhando pela manhã, fazendo seus exercícios físicos, cuidando de sua aparência e trabalhando um pouco mais logo após o almoço. A música, no fim das contas, acabou por ajudá-lo a distrair seus pensamentos.

Deixou os jornais e a TV de lado, não queria saber da repercussão daquela aventura. Apenas seguiu o curso de sua vida e aceitou as coisas como deviam ser.

Estava compondo uma canção. Luna havia voltado a ser a musa das suas inspirações, tentava depositar todo o seu esforço nela, mas, naquele dia fatídico, por mais que tentasse evitar lembranças de sua viagem desastrosa, elas o encontravam de um jeito ou de outro.

Encontrou, nas suas coisas, uma fita cassete com o nome de Michael. Pensou se devia colocá-la para tocar, porém, no fim, resolveu ceder à sua curiosidade.

“Sorria…

Embora seu coração esteja doendo.

Sorria…

Mesmo que ele esteja partido.

Se há nuvens no céu

Você vai dar um jeito.

Se sorrir com seu medo e tristeza…

Sorria, e talvez amanhã…

Você descobrirá que a vida ainda vale a pena

Se você apenas...”

— Meu astro!

Prince imediatamente pausou a fita e soltou um suspiro pesado.

— O que é…?

— Jones Jr. ligou e perguntou se você vai para a apresentação do Jackson em Minneapolis.

— Mande-o tomar no cu, por favor.

— Excelente resposta, meu astro! Mas eu pensei que você iria, vai ser a última apresentação dele em Minnesota.

Prince ficou em silêncio, ainda sem encarar o homem perto da porta.

— Eu não vou…

Ted deu ombros.

— Está certo. Se mudar de ideia, me avise pra fazer as reservas.

O cantor continuou em seu canto, recluso e solitário, enquanto ouvia a porta bater e o homem se retirar. Observou o toca-fitas, pensou se devia apertar o botão e ouvir o resto da canção. Era a voz do seu amigo ali, pura, suave e enigmática, passando uma mensagem impossível de pôr em prática naquela situação. A última coisa que Prince queria naquele momento era sorrir, mas sabia que lamuriar por aí também não era do seu feitio.

Refletiu sobre as palavras do Ted, sobre o último show. Poderia não ir e se afogar em seu orgulho dentro de casa, ou ir e ter a chance de ver o seu amigo uma última vez antes de seu adeus definitivo. E, então, aceitaria de uma vez por todas que o destino deles é por caminhos separados.

Após se decidir, deixou a fita tocar e puxou o celular para fazer umas pesquisas sobre as músicas do Michael, estava pensando em lhe fazer uma surpresa. Quando já estava com tudo em mente, a sua última ação foi ligar para Luna.

— Prince… tá tudo bem?

— Estou, meu amor. Me perdoe por aquele dia…

— Não, não, tudo bem. Deixa isso pra lá… Por que você me ligou?

— Eu quero saber se quer sair comigo para uma apresentação… Sim ou não?

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Cidade de Minneapolis - 21:20 hrs

Antes de ir ao centro da cidade, a limusine do cantor passou por bairros e praças muito bem guardados em suas memórias. Olhava para cada paisagem daquela com um semblante disperso, como se sua alma viajasse para outro lugar e o seu corpo continuasse ali.

Alguns dias se passaram até enfim chegar o dia da apresentação. Seria o último show particular do astro pop Michael Jackson em Minnesota, e, por mais que Prince e Luna tentassem disfarçar um para o outro, aquela situação estava mexendo muito com o emocional de cada um.

Enquanto estavam no carro, a caminho, a garota levou a mão à do amado e percebeu que ele estava segurando um lindo pacote de cores neutras.

— Que bonito, amor… pra quem é?

Prince a encarou.

— Ah, isso… uma fita. É um medley… acho que ele vai gostar.

— Eu tenho certeza que vai.

Disse a garota, sorrindo. Prince estava mais silencioso naquela noite, mas esboçou um sorriso com o comentário da garota e só aquele detalhe já a havia deixado um pouco menos preocupada com ele. Seguiram em frente até chegarem em um grande espaço reservado, cheio de carros de luxo, novamente teriam que enfrentar uma horda de jornalistas até chegar no interior do lugar.

Por dentro, o ambiente era quieto e aconchegante. Prince nunca viu graça nos shows do Michael e imaginava que toda aquela organização vinha do pai dele, pois o rapaz era cheio de vida e aqueles ambientes eram sempre mortos, contrastavam com a sua personalidade energizante.

Espalhados por todo salão, haviam mesas já postas esperando pelos convidados de gala. Prince segurou na mão de sua amada e foi em direção à sua mesa, porém, de repente, avistou ao longe uma pessoa que não esperava encontrar ali.

— Aquela ali é a tal da Brooke?

Luna semicerrou os olhos para ver melhor. Brooke logo os reconheceu e foi até eles. Ela estava linda: os cabelos pintados em um leve tom de ruivo, o batom vermelho combinando com os seus olhos azuis, o vestido preto de veludo, os saltos de bico fino, as joias de prata… o casal ficou impressionado.

— Quem diria… você por aqui.

— Também estou feliz em ver vocês.

Ela cruzou os braços e sorriu, um sorriso fraco que logo sumiu de seu rosto. Não podia esconder, estava mais preocupada do que feliz.

— Vocês conversaram com o Michael? Eu queria falar com ele…

— Acho que só poderemos encontrá-lo no fim do show e olhe lá… Também quero falar com ele.

Comentou o cantor. Brooke suspirou e assentiu.

— As últimas notícias me preocuparam…

— Eu sinto muito, mas não viemos falar sobre isso.

Ele cortou, rápido, ríspido e incisivo. Brooke concordou.

— É verdade, eu não devia estar falando sobre essas bobagens… eu só… bom, você é influente aqui. Se conseguir um jeito de falar com ele antes do show, me avisa, por favor?

Ele assentiu em silêncio.

— Eu vou caminhar um pouco por aí… até mais tarde.

— Até.

Respondeu Luna, com um sorriso no rosto. Se despediram e foram para seus assentos, enquanto Brooke continuou caminhando, ainda um pouco dispersa. Pelo visto o casal não era o único com a cabeça nas nuvens, aquela apresentação ainda daria muito o que falar pelo resto da noite.

Ainda faltava 1 hora para a primeira performance. Prince estava saboreando um champanhe, tentando tratar aquele momento como uma noite comum, porém os seus esforços não estavam sendo compensados por Luna, que estava discreta e incisivamente encarando uma mesa um pouco ao longe. Suas unhas prateadas batiam compulsivamente na mesa, fazendo um “toc toc” irritante. Ele a encarou e, intrigado, fitou o lugar para onde ela estava olhando.

— Luna… o que foi?

— Olha ali…

Sussurrou, o olhar dela era assassino. Prince enfim entendeu o porquê.

Joe Jackson. Estava na primeira fileira, em uma mesa junto com outros velhos de terno, todos aparentemente muito influentes naquele meio de caça-talentos. Ele sorria e socializava à sua maneira enquanto juntava alguns papéis à mesa. Jones Jr. estava ao seu lado e parecia estar assinando alguma coisa. Aquilo muito o intrigou.

— Está pensando o mesmo que eu…?

— Luna, eu não quero me meter nessas coisas. Vamos esquecer isso.

— Esses contratos… todos ilegítimos. Isso seria uma prova a favor do Michael.

— Já chega. Chega. Eu não te chamei aqui para falar sobre essas coisas.

Disse, já impaciente. Luna bufou, mas conteve a voz naquele ambiente assim como ele mesmo também estava tentando.

— Que seja… mas ele é seu amigo.

— Eu não queria desistir dele, mas você mesma concordou com isso, ou eu vou precisar te lembrar exatamente como foi naquele dia?

— Eu concordei porque naquela hora era o certo a se fazer, Prince! A gente não tinha pra onde correr, foi você que me ensinou a pensar duas vezes antes de fazer uma escolha!

— Exato! E é por isso que vamos desfrutar do show como pessoas normais. Eu não quero saber dos Jacksons, quero cuidar da minha vida.

Luna suspirou.

— Ele não desistiria de você.

— Okay, okay, você ganhou! O que você quer que eu faça, senhorita Gingerhood?

Luna estava tão aborrecida quanto ele, mas não podia perdê-lo agora. Sabia que aquele pesar no coração do amado não passaria enquanto continuassem varrendo os problemas para debaixo do tapete, precisava ser a sua faísca de esperança assim como ele foi para ela em muitos momentos.

— Eu não sei… mas, independentemente do plano que você pensar, eu vou estar aqui pra te apoiar.

Ela levou a mão à sua, à mesma mão que segurava o presentinho, e fez um carinho. Os olhos castanhos claros do cantor recaíram sobre aquele afago e o presentinho de cores neutras inundou seus pensamentos. Prince pensou por uns instantes, tentando elaborar algum plano rápido e pouco mirabolante, algo que dessa vez funcionasse.

Ele suspirou.

— Eu tive uma ideia. É simples, mas pode dar errado.

— Não vai dar errado, não vamos deixar isso acontecer. O que eu preciso fazer?

— Só… deixe o celular por perto.

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Embora os bastidores estivessem uma bagunça, com funcionários correndo de um lado para o outro para agilizar a primeira performance, o interior do camarim de paredes brancas e acinzentadas contrastava com o seu silêncio e solidão. A estrela daquela noite estava lá, mergulhando em seus pensamentos mais melancólicos.

Michael se olhava no espelho, tinha uma expressão apática no rosto. A volta para o seu cárcere não foi nada fácil, as marcas em seu corpo estavam ocultas sob um traje belo, elegante e brilhante: um terno preto com braçadeira vermelha e detalhes com pequenas pedras de diamante.

— “Sorria...

Cantarolou, todavia, mesmo agora aquela canção já não possuía força. Ele estava cansado de nadar contra a correnteza.

Ouviu duas batidas na porta.

— Michael, 30 minutos!

Disse um dos funcionários. O cantor não respondeu, apenas retocou a maquiagem e se levantou para tomar um ar antes da sua apresentação.

Deixou os bastidores e se misturou entre os convidados. Não queria falar com ninguém, mas era inevitável. As pessoas o cumprimentavam e ele apenas acenava com a cabeça e dava uma desculpa para se retirar, até que, no meio de tantos engravatados, uma mulher conseguiu se aproximar.

— Michael!

Aquela voz… era Brooke.

Michael virou-se num instante, surpreendido. Ela o abraçou e prontamente foi retribuída.

— Ainda bem que eu te achei! Pensei que eu só ia conseguir te encontrar no fim do show…

— Eu não pensei que você viria. Eu queria ter ido ver o abrigo antes de ir embora. Eu sinto muito, Brooke…

— Não se preocupe. Eu posso te mandar fotos de lá sempre que você quiser! Se você precisar mesmo ir, eu vou entender…

Ela sorriu, mas o seu belo sorriso não escondeu os seus medos dos enigmáticos olhos negros de Michael. Ele carinhosamente a puxou para um canto mais reservado do salão, longe dos amigos do seu pai e dos demais convidados.

— Você veio com alguém?

— Eu, o prefeito e mais uns voluntários e funcionários públicos estão representando St. Peter. Eu vim com eles, não podia perder a oportunidade de falar com você, eu nem sabia se nós nos veríamos de novo…

Ele ficou em silêncio por uns instantes.

— Por que acha que não vamos nos ver de novo?

— Eu não sei, eu…

Ela suspirou. De repente, ficou em silêncio. Michael não entendeu aquela reação até ver uma lágrima descer pela bochecha dela. Brooke estava tentando se recompor.

Limpou o rosto rapidamente.

— … eu tive medo. Os jornais dizem coisas horríveis sobre você, o seu pai quer te levar pra longe… mas eu sei que você não é mau, eu te conheci. As crianças no abrigo não param de falar de você, elas te amam… o abrigo todo te ama. Isso não é justo…

Michael levou a mão à bochecha dela e passou o polegar pela maçã de seu rosto, limpando os resquícios de sua lágrima. Por mais triste que o rumo daquela conversa estava tomando, ele enfim conseguiu esboçar um sorriso, mesmo que muito fraco, naquela noite.

— Obrigado…

Seus olhos azuis cintilaram de curiosidade.

— P-por quê…?

— Por me lembrar do motivo da minha luta.

Por fim, desceu os dedos pelo seu queixo e a puxou para um beijo no canto de sua boca. Não era a intenção do cantor ir além daquilo, porém Brooke não pensava da mesma forma. Lentamente deslizou os lábios aos dele, iniciando um beijo discreto, mas apaixonante. Suas respirações aos poucos se cruzavam, suas mãos ansiavam por passear pelo peito dele, sua boca vermelha pintava os lábios rosados dele, contudo, no fim, ambos mantiveram seus desejos adormecidos e aos poucos desfizeram o carinho.

— Eu espero que você goste do show.

— E por que eu não gostaria? Tudo que você faz é bom.

Ela comentou, sorrindo. Michael retribuiu o sorriso, acariciou o seu rosto com as costas da mão, mas não ficou por muito tempo, logo teria que se apresentar.

— Até…

Ele se afastou e sumiu por aquelas pessoas. Brooke suspirou, guardaria aquele momento com carinho em seu coração.