Mentiras no Jornal

Let’s Go Crazy - Parte II


Eram umas 09 hrs quando acordaram e iniciaram os preparativos para aquele dia. Haviam feito compras na noite anterior, então o guarda-roupa estava cheio. Luna se vestiu no banheiro, Prince no closet fechado e Michael no biombo do quarto.

O dia estava primaveril e o verão estava chegando, então Luna optou por roupas confortáveis e leves, como shorts, tênis, top e casaquinho com algumas joias sutis e douradas e um óculos de sol.

Michael estava usando suas roupas do tempo de bad boy. Calças pretas com tachas cravos prata, botas de cano curto, uma camisa branca e casaco de couro preto ataviado com algumas marcas de clubes internacionais.

Prince, por sua vez, estava usando uma blusa preta sem mangas, de gola alta, calças brancas justas com saltos prata e joias prateadas. Estava passando o rímel quando Luna se jogou na cama e pegou o controle remoto.

— Nem pensar, querida. Já vamos sair, não ligue a TV.

Ela bufou, como se fosse filha do cantor.

— Então vamos logo, “querido”! Você é o único que falta, até o Michael tá pronto.

Michael franziu o cenho.

— Ei! Não fale como se eu demorasse, eu terminei primeiro que você.

— Ahm… de nós três, você é o segundo que mais usa maquiagem, você demora também, viu?

— Correção: ele é o primeiro, porém eu demorei mais por outros motivos…

Prince deu um sorriso provocativo e foi acertado por um travesseiro pela garota logo em seguida.

— Seu pervertido!

Michael deixou um riso curso escapar e revirou os olhos.

— Que diálogo, hein? Vamos embora logo, quanto mais cedo vocês resolverem esse caso do aluguel de carros, melhor…

Comentou o moreno, já abrindo a porta do quarto. Assim que saiu, deu de cara com um grupo de engravatados no fim do corredor dialogando com uma funcionária. Pelas vestes, parecia a gerente do lugar.

Michael começou a suar frio. Voltou ao quarto rapidamente, em silêncio, e trancou a porta.

— O que foi? Desistiu de ir sozinho?

Brincou Luna, mas ele não a respondeu. Tomou o controle de sua mão e ligou a TV. Prince revirou os olhos.

— Michael, eu já disse…

— Prince, olha!

Disse a garota. As fotos do moreno já estavam por todos os noticiários de Rochester, dessa vez, fotos atualizadas de sua última conferência. Pior que isso… agora as imagens do Prince também apareciam.

Abaixo, um letreiro intrigante: “Michael Jackson quer deixar os palcos de vez! Astro pop fugiu de sua mansão e foi visto em St. Peter. Denúncia anônima disse que o viu recentemente em Rochester com o também super astro Prince, estrela de Purple Rain.”

Todos ficaram em silêncio por um tempo considerável. Dessa vez haviam os encontrado e em uma velocidade absurda.

— Eles não estão brincando…

Murmurou Prince. Luna comentou em seguida.

— Michael… a Brooke não estaria envolvida nisso… estaria?

— Não, eu confio nela.

— Grande coisa…

— É sério.

Michael desligou a TV e os encarou.

— Brooke não ganharia nada me denunciando. Além do mais, ela nos ajudou, ela foi cúmplice. Ela jamais envolveria o nome dela e do abrigo nessa confusão.

Luna suspirou.

— Então, se não foi ela… como acharam a gente?

— Isso é o de menos. Temos que sair daqui agora.

Prince pegou uma mochila, a encheu com algumas coisas e jogou para a garota.

— Vamos levar só o básico. Vamos atrás de um carro, te deixo em outra cidade e volto com a Luna para Chanhassen.

— Okay…

Logo se retiraram e tomaram o caminho oposto ao do pequeno aglomerado. Prince foi na frente, começou a buscar as escadas de emergência, iriam por uma saída extra, estratégia típica de celebridades.

Todavia, não esperavam que aqueles homens já estivessem cientes daquele esquema.

Prince parou de caminhar imediatamente quando viu aquela penca de engravatados do lado de fora.

— Volta, volta…!

Sussurrou, mas já era tarde. Ao retornarem, foram barrados no meio da escadaria.

— Michael!

De repente uma voz o chamou, o que fez o rapaz congelar. Aquela voz, aquele tom grave, aquela influência… logo, lembranças perturbadoras invadiram sua mente. Prince o puxou junto com Luna para perto de si, porém o moreno simplesmente não saiu do lugar.

— Michael, o que deu em você?!

Imediatamente viram outros homens se aproximarem, junto com alguns funcionários e curiosos mais ao longe. Entre esses homens, estavam os assessores do moreno, Jones Jr. e quem ele mais temia: Joe Jackson.

— Já chega dessa palhaçada, vá para o carro…

Disse-lhe, o tom de voz firme e brando. Michael ficou ali, em silêncio, não tirava os olhos dos dele, como uma presa que sabe que, se desviar o olhar do seu predador, poderá ser apunhalada a qualquer momento.

— Michael…

Murmurou a garota, porém foi puxada carinhosamente por Prince para longe do rapaz.

— Luna, eles não nos querem…

Foi então que ela percebeu que os homens só olhavam para ele. Prince e Luna eram meros espectadores ali, poderiam sair quando quisessem, a briga no fim das contas não era deles.

— Olhe o que você está fazendo, está constrangendo essas pessoas. Volte para o carro que eu darei um jeito nessa bagunça.

Disse o velho mais uma vez. Michael discretamente desviou o olhar à sua volta e então percebeu que não haviam só os homens do seu pai, havia também alguns curiosos, alguns funcionários e ainda pior: alguns paparazzi. Já imaginava o tipo de manchete que escreveriam, a mais absurda possível. Sabia que se entrasse naquele carro, teria feito todo aquele estardalhaço à toa, teria arriscado a vida e carreira dos seus amigos à toa e, sobretudo, ainda teria dado de brinde mais uma notícia para essas pragas distorcerem.

Ele já estava encurralado, não havia mais o que fazer. Se iria se dar mal, ao menos seria do seu jeito.

— Vem levar…

Todos ficaram em silêncio.

— O quê?

— Vem me levar.

Prince arqueou a sobrancelha e encarou Luna de canto, que parecia estar se perguntando se havia ouvido aquilo mesmo. O velho Joe juntou lentamente as mãos no cajado de madeira e ouro que estava segurando e encarou o filho mais uma vez.

— Michael, vá pro carro ago…

— Vem me levar para a droga do carro.

Nesse momento, cerrou os punhos. Ninguém disse uma palavra, ainda estavam confusos com as respostas do rapaz, uma vez que Michael não era de afrontar o seu pai influente. Luna notou a sua mudança de semblante, lentamente puxou Prince para mais perto de si.

— Daryl…

— Não dificulte as coisas agora…

— E o que é “dificultar as coisas” pra você, papai?! Não seguir as suas regras? Me comportar como eu sou e não como você quer que eu seja?

— Cale essa boca e vá para o carro agora!

— Agora vai começar a gritar? Já deu esse seu teatro de fala mansa, não é? Por que não bate em mim também?! Por que não mostra pra essas pessoas a sua cara de verdade?!

— Já chega!

— Não!! “Já chega” você!! Você nunca mais vai tocar em mim!! Eu vou sair por aquela porta e eu espero que não me siga!

Ele exclamou, com o sangue fervendo. Caminhou em passos duros até as portas de vidro do hotel, porém foi barrado por dois funcionários do seu pai.

— Peguem esse menino e levem para o carro, ele está louco!

— NÃO!!

Michael tentou se desvencilhar, porém os homens usaram de força bruta, seguraram seus braços com força e até o agrediram. Joe detestava perder, então, para ele, qualquer meio era lícito, desde que o seu desejo fosse atendido. Luna cerrou os punhos e tentou correr em direção ao rapaz, mas foi impedida por Prince.

— A gente não pode ficar olhando sem fazer nada!

— Luna, isso é imprudente! Você percebeu que estamos em desvantagem aqui?

A garota bufou, queria contra-argumentar, mas, para sua infelicidade, ele tinha razão. Michael quase foi levado para o carro do velho Joe, porém a bagunça que generalizou no hotel acabou se tornando motivo de incômodo para muitos funcionários e hóspedes, que chamaram a polícia local. Algumas viaturas chegaram, o que fez com que o homem ficasse alerta.

— O que está acontecendo aqui?

Indagou um policial, já adentrando ao recinto. Joe fez um sinal para que soltassem Michael, mas o moreno não quis ficar para dialogar com a autoridade. Assim que foi solto, passou pelas portas de vidro e sumiu pelas ruas de Rochester. Luna não esperou mais, se retirou logo após.

— Michael!

Exclamou a garota. Prince suspirou e silenciosamente os seguiu.

Ao longe, um jornalista tirou uma foto.

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Praça de Minneapolis (4 anos atrás) - 14:30 hrs

— Cara, um artista precisa de uma identidade visual e eu não quero ser igual a esses que já lançaram.

Prince comentou, acomodado no banco da mesma praça que esteve quando precisou espairecer do fora que levou da Luna. Michael estava ao seu lado e parecia um pouco mais silencioso, até agora não havia entrado no diálogo.

— Isso vai me deixar sem personalidade. Esses marketeiros não entendem nada, eles querem me limitar. Você não acha que essa minha foto é mais ousada do que a escolhida por eles, não?

Michael olhava para a grama verde da paisagem, completamente disperso. Prince revirou os olhos e estalou os dedos duas vezes perto do seu rosto.

— Ei!

— Ah… eu… eu gosto da sua foto.

— O que foi? Que bicho mordeu você?

Michael suspirou.

— Nada demais…

— Eu te conheço. Conta logo, você tá estranho…

— Eu só…

Michael mordeu os lábios, parecia apreensivo quando pensava naquele assunto.

— Eu acho que tiraram uma foto minha quando eu estava saindo de casa, só isso.

Prince arqueou a sobrancelha.

— Só isso?

— É… eu acho que vi alguém rondando minha casa, sei lá… só sei que tiraram uma foto.

— Tenho duas perguntas. Primeira: por que tirariam uma foto sua? Segunda: e daí? O que você acha que podem fazer com a sua foto? Que eu saiba, você não é nenhum criminoso de verdade, não é?

Prince sorriu, levando aquele assunto com bastante leveza.

— Você mesmo me disse que tudo isso aí era só pose.

— Ah, digamos que… olha, eu nunca matei ninguém, é verdade, mas eu tenho problemas reais com a polícia e não é legal ter minha foto circulando por aí.

Blefou, não podia lhe contar a verdade, ao menos não ainda. Prince suspirou e aquiesceu.

— Entendi. Que merda… o que você vai fazer?

O moreno deu ombros.

— E o que eu posso fazer? Nada… Vou torcer para que isso não dê em nada.

Prince assentiu. Depois de um pequeno silêncio desconfortável, ele voltou a mostrar as fotos para seu amigo.

— Se tiver algum problema, liga pra mim, okay? Agora seja sincero… a minha foto não é melhor que a deles?

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Orla de Rochester (atual) - 11:20 hrs

O temporal parecia se conectar com os sentimentos do moreno, que correu por ruas aleatórias até cansar em uma calçada próxima da orla. Mesmo a maresia, a areia quente e o vento suave não foram suficientes para acalmar o seu aflito coração, e o tempo parecia sentir a mesma coisa, pois em poucos instantes uma leve chuva passageira os alcançou.

“S-sorria… e-embora seu coração… S-sorria… mesmo que ele… m-mesmo que ele esteja partido...”

— Michael!

Ouviu a voz da garota, ao longe. Michael não virou para contemplá-la, apenas levou as mãos ao rosto e chorou em silêncio. Tentou cantar a sua música preferida, mas a sua voz simplesmente embargava, suas mãos tremiam. Ele nunca havia gritado com o pai daquele jeito, nunca havia deixado seus sentimentos tomarem conta do seu coração na frente dele. Aquela situação havia o abalado por completo.

— Michael…

— Luna, volta aqui!

Prince conseguiu alcançá-la antes que ela chegasse no rapaz. A garota logo puxou o seu braço com força.

— Me solta! Ele é meu ex, eu sei como lidar com ele!

— Não, você sabe como lidar com o Daryl! Nesse momento, aquele não é o Daryl, Luna! É o Michael!

Exclamou o cantor, impaciente. Luna ficou em silêncio, o encarando com um olhar surpreso, não se lembrava se ele já havia gritado consigo alguma vez, mas Prince, naquele momento, parecia estar tentando se conter ao máximo. Ele suspirou pesadamente e passou uma das mãos nos cabelos.

— Escute… me deixe resolver isso.

Fitou o seu olhar.

— Você pode ter sido a namorada do Daryl… mas eu fui amigo do Michael.

Luna pensou sobre aquelas palavras e, já vencida, deixou que ele tomasse as rédeas. Prince lentamente se afastou dela e foi ao encontro do moreno. Assim que se aproximou, ficou de frente para ele, tentou olhar em seus olhos.

Michael estava abatido. O encarou por alguns segundos, mas logo desviou o olhar para o chão. Tentou limpar as lágrimas que se misturavam à chuva, porém Prince não deixou. Levou uma mão ao seu rosto e impediu que ele prosseguisse, o fez olhar para si mais uma vez e, então, o abraçou.

Ficou em silêncio, deixou que Michael largasse o fardo em seu ombro. O rapaz o abraçou, chorou com um pouco mais de vontade e ficou assim por um tempo. De longe, Luna assistia a tudo.

— Se lembra… quando fomos ao bar, perto da nossa praça preferida em Minneapolis? Que você me pagou um vinho porque eu estava mal pela Luna…

Sussurrou o cantor.

— Eu estava tendo um dia ruim… Eu estava atrás da Luna há três anos, aquele fora foi difícil… mas você melhorou o meu dia quando me chamou pra conversar, porque eu não tinha mais ninguém naquele momento.

Lentamente desfez o abraço e voltou a fitar o olhar do seu amigo.

— E teve uma vez que nós saímos pra beber… Eu tinha feito um show ruim e fiquei muito mal, mas você elevou a minha autoestima. Depois da nossa conversa, eu aprendi que não posso deixar ninguém me colocar pra baixo… e eu levo isso comigo até hoje.

Michael ficou ouvindo em silêncio. Prince suspirou.

— O que eu quero dizer é que você esteve lá para mim nos momentos que eu mais precisei. Não em todos… mas em momentos importantes na minha vida. No tempo que você ficou em Minne, você nunca me negou apoio. Acha que eu vou desistir de você porque o seu pai tem todos aqueles seguranças parrudos? Você é meu amigo… você não está sozinho. Ele vai ter que passar pelos meus seguranças parrudos se quiser tocar em você novamente.

Com aquelas palavras, Prince conseguiu arrancar um genuíno sorriso discreto do rosto do rapaz. Michael suspirou e assentiu, em seguida tentou limpar suas lágrimas novamente, desta vez conseguindo.

— Obrigado…

Prince sorriu.

— Não agradeça. É a nossa amizade, vale a pena lutar por tudo que é bonito.

Michael fez uma leve expressão de surpresa.

— Uau, isso foi… profundo… Onde você ouviu isso?

— De uma pessoa sábia.

— Quem?

Prince lhe deu um olhar cúmplice antes de responder sua pergunta.

— Eu.

Ficaram em silêncio. Aos poucos o sorriso do moreno se tornava mais evidente e Prince, enfim, sentiu que havia conseguido acalmar o seu coração aflito.

— Prince!

Michael parecia querer continuar a conversa, mas a voz de Luna chamando por um dos rapazes cortou aquele diálogo. De repente, quando desviaram o olhar, perceberam uma limusine branca os cercando na orla. Luna se aproximou dos meninos, que prontamente ficaram em estado de alerta.

— Seu velho vagabundo! Subornou os policiais, por acaso? Era pra você ter ido pra cadeia!

Exclamou a garota, furiosa. Quando um dos vidros do veículo lentamente desceu, Luna cerrou os punhos e não recuou, estava pronta para pagar pelas suas palavras, porém o rosto e a voz que viram e ouviram acabou com todas as suas expectativas.

— “Musa queer”, acho melhor segurar a língua da sua musa…

Aquela voz… aquele apelido… Prince encarou aquela pessoa com um olhar chocado. Depois de tantos anos, ele finalmente o havia reencontrado.

— André…

— Cymone. André Cymone.