Mentiras no Jornal

Festival de Lembranças - Parte I


Premiação Music’s Tune - 20:34 hrs

Era um lugar ermo e reservado, porém, faraônico e cheio de paparazzis. Luna, por já ter acompanhado Prince outras vezes, já estava acostumada com toda aquela agitação. Para além disso, seu trabalho como modelo também lhe proporcionava alguns desses passeios.

Ambos estavam na limusine, observando o rio de pessoas do lado de fora.

— Será melhor quando estivermos dentro.

— Pode apostar…

Comentou a garota. Luna estava usando um lindo vestido azul metálico, como fora solicitado por Prince, além de lindos brincos de cor prata e um batom cheio de presença. Seus olhos azuis pareciam duas safiras brilhantes junto com todo o look, Prince sabia muito bem como realçar a beleza de uma mulher.

Assim que chegaram, precisavam passar pela multidão. Entre gritos e flashes, enfim, adentraram ao prédio. Em contraste com a loucura do lado de fora, tudo estava silencioso e aconchegante. As mesas aguardavam seus convidados, um palco fantástico ainda encontrava-se vazio, as luzes estavam baixas e uma música agradável tocava ao fundo. Entre as pessoas, algumas celebridades e alguns magnatas anônimos.

— Seu faz-tudo vai estar aqui?

— Por quê? Quer ficar com ele?

Luna riu baixinho.

— Não, credo! Ele é muito chato e claramente tá tentando se promover…

Prince sorriu de canto.

— Qualquer funcionário faz isso, querida. Mas eu não posso ignorar que foi ele quem nos salvou do elevador, se lembra?

— Bem… é verdade. Tá, ele é um pouco legal…

— É… ele mereceu a promoção que eu dei. Mas enfim, sim, ele vem. Ele é um bom quebra-galho e um bom comunicador.

Luna assentiu. Chegaram em seus lugares e ela se acomodou ao seu lado.

— Por que você não chamou uma das suas 562 namoradas?

Ele riu.

— Porque eu queria você, é pedir muito? Eu já passei três dias com elas, quero a companhia de uma antiga amiga agora…

A garota sorriu com o comentário do homem e, em resposta, lentamente se aproximou, apertou sua mão carinhosamente e disfarçou para que outras pessoas não vissem. Prince ficou observando os dedos dela entrelaçados nos seus, suas lindas unhas azuis e um anel lindo de prata no anelar. Ele não podia negar que aquela mulher ainda mexia com os seus sentimentos, mas sentia que mantê-los adormecidos ainda era a melhor opção.

— Entendi, entendi, eu também te amo, Prince.

Riu baixinho. Prince a acompanhou, mas ficou um pouco contrariado, se perguntou se ela estava falando sério.

Bom ou não, sua atenção foi completamente arrebatada para outro ponto quando viu, atrás da garota, um pouco ao longe, a presença de Jones Jr.. Sabia que onde estaria o homem, Michael estaria também.

Ele suspirou.

— Olha… lembra que eu tinha uma coisa pra te falar pessoalmente?

— Ah, sim…

— Essa coisa acabou de entrar…

Prince levou uma mão discretamente ao rosto e disfarçou um olhar para o horizonte. Luna entendeu que precisava disfarçar, mas sua curiosidade era maior que a obediência, então virou-se e deu de cara apenas com um homem conversando com outra penca de homens.

— Quem? Tá disfarçando por causa de quem?

— Jones Jr.. Ele me apresentou ao Michael. Eu tenho quase certeza que o seu ex está por aqui hoje.

Aquilo fez o coração da mulher estranhamente palpitar mais forte. Ela parecia um pouco mais nervosa agora.

— V-você jura?

— Ei… calma. É o seu ex, qual o problema disso?

— Bom… é que da última vez que a gente se viu, eu gritei bêbada com ele, na sua frente, na frente do seu amigo e na frente dos amigos dele. Hoje eu morro de vergonha…

Prince se esforçou para conter uma risada.

— Isso é verdade. Bom, mas não é sobre o Jones Jr. que eu quero falar. É sobre o seu ex.

Ele discretamente olhou em volta, como se quisesse manter algum segredo.

— Ele veio me propor…

— Meu astro! Meu astro!

Ted chegou e cortou a conversa. Luna suspirou, aborrecida, e apoiou o rosto em uma das mãos, enquanto observava o homem se aproximar.

— Tô atrapalhando?

— Magina…

Murmurou a mulher. Ted deu-lhe uma piscadela.

— Ótimo! Jones Jr. está ali, vocês não estavam negociando um feat?

— Não deu certo, a outra parte não quis.

Respondeu Prince, servindo-se de um champanhe suave. Ted o encarou, meio desconfiado.

— Certeza que foi a outra parte?

— Acho que nós chegamos em um consenso de que é uma péssima ideia.

Luna tentou esconder um risinho, adorava as respostas do cantor seguidas de um olhar cúmplice. Ted ainda parecia relutante em aceitar a decisão, concordava com Jones que o feat poderia alavancar ainda mais a autopromoção do cantor, e sua insistência já estava a irritando.

Impaciente, ela suspirou e se levantou.

— Prince, querido, eu vou retocar a maquiagem, está bem?

Ele entendeu imediatamente, em seguida aquiesceu.

— Vá…

A garota logo levantou e saiu. Caminhou um pouco pelo lugar, sequer sabia onde ficava o banheiro, apenas precisava de uma desculpa para deixá-los a sós. Ted era extrovertido demais, o que o tornava um pouco inconveniente às vezes, e, agora que saía com Prince com frequência, ela conseguiu observar isso com mais clareza.

Enquanto caminhava, uma garotinha esbarrou em sua perna.

— D-desculpa, tia!

— Claro, não tem prob… pera aí, tia??

A menina fugiu e continuou correndo por entre as pernas dos adultos até chegar em um deles.

Um em específico.

Luna não pensou em ir atrás da garota, provavelmente era filha de um daqueles magnatas, mas o adulto que estava com ela lhe chamou muita atenção.

Era um homem de porte médio. Estava de costas, tinha cabelos de tamanho médio, negros, e estava vestido de preto com uma linda braçadeira branca e luvas escuras. Luna ficou o observando por um tempo. Mesmo que não tivesse acesso ao seu rosto, algo nele lhe era muito familiar, e ela desconfiava se tratar daquela braçadeira. Ele não parecia realmente pertencer ao militarismo e havia apenas uma pessoa, que ela conhecia no íntimo, que adorava usar aquele tipo de adorno sem obrigatoriedade.

A garotinha deu dois tapinhas na perna do homem e chamou sua atenção. Ele se inclinou para ouvi-la e, ao fazê-lo, Luna teve acesso ao seu perfil.

Ela suspirou com um pouco de dificuldade.

— Michael…

Ele, por outro lado, a encarou quando a garotinha apontou, parecia ter a entregado. Naquele momento, o coração da mulher disparou e os olhos negros de seu ex amado espantaram-se ao vê-la após tanto tempo.

— Luna…?

Enquanto isso, um pouco longe dali, Prince pegou seu casaco mais uma vez e foi em busca de Luna, enquanto Ted insistia em tentar convencê-lo.

— E se não for ele então? E se for outra pessoa?

— Ted, você espantou a minha companhia com essa conversa, não percebeu? Agradeça que, hoje, estou bastante paciente.

— Ah, eu posso buscá-la! Assim, o senhor não se estressa!

Ele acabou recebendo um grande e felpudo casaco de pelos no rosto. Prince lançou-lhe a peça, com muito charme, e ajeitou o belo cajado de ouro na outra mão, em seguida tornou a caminhar.

— Eu já estou estressado. Leve isso para a minha mesa e me espere lá. Agora, Ted.

O homem engoliu seco e não questionou mais, apenas se retirou apressadamente. Prince tornou a caminhar entre os convidados, ora ou outra parando para cumprimentar alguns deles, embora estivesse com outros assuntos em mente.

Luna era uma moça muito singular e não foi difícil distingui-la dos demais. Quando seus olhos percorreram o salão, encontraram a moça adentrando a um corredor e virando à esquerda. Ele arqueou a sobrancelha e a seguiu, sem entender muito o que ela estava fazendo ali.

Era uma área proibida.

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(3 anos atrás) - 09:32 hrs

A campainha tocou.

Michael estava acordado desde às 08 da manhã, adorava acordar cedo para aproveitar plenamente todo o seu dia. Vestiu seu casaco de couro e estava pronto para caminhar um pouco, quando ouviu o tilintar da campainha. Ele não estava esperando ninguém, mas não achou estranho.

— Eu atendo!

Disse a um dos funcionários que já ia fazer o seu trabalho. Michael era doce e gentil, o oposto de como era nas ruas, quieto e incisivo. Ele também era pró-ativo e adorava se ocupar, por isso os empregados não achavam sua atitude incomum.

O rapaz desceu as escadas, no pique, com uma energia radiante. Segurou a maçaneta e puxou. Naquele exato momento, o seu belo sorriso se desfez.

Sentiu um forte tapa no rosto.

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17:12 hrs

Aquela havia sido a tarde mais difícil de sua vida desde o acidente.

Ele não tinha escolha. Começou a organizar suas malas. As fez sem ajuda, não queria ninguém no seu quarto.

As janelas estavam trancadas, havia alguns seguranças do lado de fora. Novamente, sentia-se encarcerado.

Afinal de contas, era para isso que ele havia sido feito. Para produzir dinheiro. Ele era um produto, e que produto. Ele era o melhor produto e jamais seria diferente disso.

Seu rosto ainda ardia, seu lábio estava cortado. Ele ainda sentia dores do tapa que levou, porém eram mais suportáveis que a sensação de amargor em seu coração.

Assim que fechou a última mala, pegou o celular e conferiu os seus contatos. Ele suspirou e escreveu uma mensagem programada para todos. Quando estava prestes a enviar, teve seu quarto invadido pelos homens do seu pai.

— Esqueça isso…

Um deles tomou o celular do rapaz, que não reagiu. Ele acariciou a própria mão.

— Você me machucou.

— Que pena…

Debochado. Pelo jeito que o fazia sem medo, o seu pai havia permitido aquilo. Ele suspirou.

— Não posso falar com eles?

Era tarde. O homem abriu o celular e removeu o chip, em seguida o destruiu. Michael se segurava para não se permitir chorar. Agora, mais do que nunca, ele precisava que o Daryl tomasse as rédeas.

— Seus amigos são outros agora. Venha, você tem uma coletiva daqui a algumas semanas.

Michael não conseguia entender o que ia acontecer a partir de agora, mas sabia que precisava ser forte. Jogou uma mochila nas costas e deixou que os outros homens pegassem o resto das malas.

Ele havia perdido.

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(Atual) - 21:03 hrs

Luna seguiu o rapaz misterioso pelos corredores escuros daquele lugar. O viu de longe, sentiu que ele havia a reconhecido, mas, ao invés de tentar contato, preferiu se esconder. Ela não entendeu sua reação, porém não ficaria corroendo-se em dúvidas, iria até a fonte.

Michael, ou aquele quem ela acreditava ser ele, segurou na mão da garotinha e a pegou no colo, em seguida apressou o passo e pareceu ter segurado um riso. A mulher bufou, ele estava claramente tirando uma com sua cara. Seguiram por corredores escuros até que, enfim, o rapaz e a garotinha pararam em uma sacada. Ele colocou-a no chão, acariciou-lhe os cabelos e a menina abraçou sua perna. Luna olhou tudo aquilo, muito confusa.

Por fim, se virou.

— Você perdeu alguma coisa?

Indagou, sorrindo. Luna lentamente se aproximou e o olhou mais de perto. Os ossos da face, o queixo, o nariz, as maçãs do rosto e, principalmente, os olhos escuros eram do seu ex namorado, ela não tinha dúvidas. Ele estava bem diferente, mas algumas coisas eram imutáveis.

— Michael…

Ele suspirou.

— “Michael Jackson”. Olá, Luna…

Ela mordeu os lábios discretamente, sem saber que palavras usar. Queria cumprimentá-lo com vigor, mas sentia que ele não estava muito bem. Ela não sabia como agir.

— Esse é seu nome verdadeiro, não é? Ou é mais um nome artístico…?

Lentamente ele negou com um balançar de cabeça.

— Esse sou eu de verdade… quem devo ser de verdade.

— Mike…

Murmurou a garotinha, que usava uma linda boina cinza e um vestidinho cheio, junto com meias brancas e sapatinhos pretos. Morena, cheia de cachinhos… parecia uma boneca. Luna sorriu ao olhar para a menina, e esta se despediu do cantor com um abraço apertado.

— Eu vou voltar pro papai…

— Já já você vai, okay? Não vou te deixar voltar sozinha.

— Por quê? Eu sei me cuidar!

Ela parecia emburrada. Michael deixou uma risada escapar e cruzou os braços.

— Exatamente! Se eu te deixar ir sozinha, é capaz de você colocar essa festa de cabeça pra baixo.

Luna sorriu, observando aquela interação. Ela nunca conseguiu imaginar Michael como pai, ele sempre pareceu ser impaciente, frio, distante para aquele tipo de responsabilidade. Aquele homem, na sua frente, era o completo oposto.

— Ela é o quê sua, Michael?

— Filha de um amigo.

Michael acariciou os cabelos da criança mais uma vez, em seguida suspirou e encarou os olhos azuis da mulher.

— Eu só não enlouqueci, ainda, porque tenho a possibilidade de conversar com essas crianças…

Luna não compreendeu o peso daquela frase, mas aquiesceu, confusa com o que havia acontecido com o rapaz.

— O que houve…? Tipo… o que tá acontecendo? Você está diferente…

Ele assentiu, não podia abrir seu coração para qualquer pessoa, mas Luna era especial, ela fez parte de sua vida de alguma forma. Ele acreditava nela.

— Eu…

— Luna.

A voz grave, quente e suave de Prince pôde ser ouvida pela dupla. O homem chegou logo em seguida e, enfim, se deparou com Michael. O encarou com um pouco de espanto, esperava o encontrar por ali, mas não dialogando com a mulher. Surpreendeu-se ainda mais ao ver como, especificamente àquela noite, ele parecia um pouco mais produzido, um pouco mais andrógino. Se não fosse seu corpo, sua altura e seu maxilar, certamente seria confundido.

— Uau, Michael… não sabia que você gostava de batom.

O provocou, Prince era terrível. Michael apenas revirou os olhos.

— Depois conversamos.

Disse à Luna. Quando estava prestes a sair, Prince tocou em seu peitoral e discretamente o impediu de prosseguir.

— Por que não conta a ela o pedido que fez a mim?

— Eu pedi a você, não a ela. O meu melhor amigo era você.

Disse, parecia decepcionado. Se retirou em seguida, segurando na mão da menininha sem nome, que começou a cantarolar à medida que se afastavam. Luna encarou o cantor.

— Mas o que diabos tá acontecendo aqui, Prince?

Ele suspirou. Quando seus olhos recaíram sobre ela, Luna percebeu como aquela situação estava o incomodando.

— Vamos voltar. Lá, eu te conto.