Menina Delivery

Capítulo 1 – Um segundo de distração e um choque


Cancún – México

12:30

Era um início de tarde ensolarado em Cancún, quando o telefone do Foodger Wheels começou a tocar

— Luna! Simón! Alguém atenda o telefone – gritou Soraia, a dona do lugar, com a voz nada gentil. Como sempre.

— Já vai! – Luna Valente se prontificou.

"Uau, que excêntrica" pensou Luna depois de ouvir o pedido. De certo se tratava de alguém da "alta".

—O que foi Luna? Por que fez aquela cara? – Simón perguntou se referindo a careta que sua amiga havia feito.

Simón, o mexicano, era o melhor amigo de Luna desde a infância. Eram extremamente unidos e ninguém conhecia Luna como Simón e nem ninguém conhecia os segredos de Símon além de Luna. Inseparáveis, cumplices. Uma amizade invejável. Se sentiam bem um com o outro e sabiam exatamente o que fazer para o outro se sentir melhor.

Antes que Luna pudesse responder a pergunta de seu melhor amigo, sua chefe Soraia chegou. Nada amigável.

— Trabalhando ou conversando?

— Desculpe Soraia... – Antes que a mexicana de 16 anos pudesse terminar, foi interrompida.

— Não tem desculpas. Atendeu o telefone? – Assentiu. – Então o que está esperando para preparar o pedido?

— Já vou – respondeu quase num sussurro. Soraia se afastou.

Ela era uma mulher de uns 37 anos e que tinha total vocação para o exército. Não era uma pessoa fácil. Exigente, impaciente e grossa. Talvez por isso continuava sendo uma solteirona e uma forte candidata ao papel de futura dona de uma ninhada de gatos.

Ao ver o olhar baixo e triste de Luna – tão diferente do alegre, cheio de vida e habitual da mesma – foi logo animar a amiga

— Não fica assim, Luna. Você sabe que a "general" – como eles a chamavam secretamente – é assim. Vamos! Você não quer que ela volte aqui para gritar com a gente, né? – Perguntou finalmente conseguindo arrancar um sorriso de sua melhor amiga.

—Tem razão, eu definitivamente não quero – afirmou rindo.

Então era isso. Mais uma vez Simón havia conseguido resgatar o bom humor de Luna. Um amigo realmente imprescindível.

Em quinze minutos o pedido considerado excêntrico por Luna estava pronto.

Com seus patins, ela seguia pelo calçadão da praia de Cancún, que era linda, ainda mais com o belo e forte sol que fazia por lá.

Para contemplar podia ser belo, mas sobre patins e com uma mochila um tanto pesada se tornava cansativo para Luna, que teve de tirar uma mecha de cabelo que estava grudada em seu rosto por conta do suor. Um segundo de distração e um choque.

— Ei! Vê se olha por onde anda! – Falou o cara que ela nunca vira antes na vida sem a menor gentileza.

Luna já havia se desculpado. Não que ele tivesse ouvido, mas ela já estava voltando ao ritmo, porém ao ouvir sua resposta, seu corpo – automaticamente – se virou para o menino. Fora a primeira vez que olhara em seus olhos, e logo constatou que expressavam raiva.

— Por onde patina, na verdade – tentou melhorar o clima com uma referência.

Luna as vezes era dramática e preocupada, mas antes disso, sempre tentava usar o bom humor.

— Como seja... – observou-a e pôde constatar que estava rumo a uma entrega à domicílio - menina delivery – ela escutou sua voz arrogante e autoritária. – Suponho que se deva tomar mais cuidado, não?

Luna revirou os olhos com um meio sorriso. "Mais um desses mauricinhos", pensou. Não era o primeiro que ela via desse tipo.

— Bom mauricinho, aproveita que está na praia e dá um mergulho para esfriar a cabeça – deu de ombros e seguiu rumo à sua entrega, enquanto ele se questionou em meio a uma careta: "Mauricinho? ".

Ele tinha um compromisso. Devia ir para a casa da madrinha de sua namorada, mas decidiu seguir o conselho da "menina delivery", tirou os patins e foi dar um mergulho.

***

Mansão Benson

Cancún – México

"Matteo? Matteo se estiver ouvindo essa mensagem, por favor me liga. Um beijo" era provavelmente a décima mensagem que Ámbar deixava para seu namorado, que estava uns 30 minutos atrasado.

— Entrega do Foodger Wheels! – Luna anunciou alegremente sobre seus patins, tirando a bolsa térmica das costas.

— Por fim! – Ámbar suspirou de maneira pesada. Dois minutos é muito tempo de atraso?

— O Foodger Wheels tarda, mas não falha – brincou sorrindo para amenizar o clima. Recebendo uma cara não muito agradável em troca (semelhante à do "Mauricinho") seu sorriso desapareceu. – Bom, me desculpe. Aqui está seu pedido – entregou à loira um tanto mais alta que ela, que estava em sua frente.

Antes de entregar o dinheiro, Ámbar checou o pedido. Mas teve certa dificuldade em abrir uma das tampas já que em sua mão esquerda estava seu Milk-shake. Luna riu e quando percebeu que o olhar maléfico de Ámbar estava sobre ela, a ajudou.

Ou não.

— Garota, olha o que você fez! – Exclamou Ámbar olhando com lástima sua blusa que de branca, se transformara em marrom.

— Me desculpa, me desculpa mesmo. Deixe-me te ajudar! – Pediu Luna desesperada. Seu dia não estava sendo dos melhores. Mas ela havia derrubado o Milk-shake sem querer.

Ámbar ficou estática por um segundo ao sentir as mãos de Luna sobre sua blusa cara que vira de Paris especialmente para ela. Modelo exclusivo.

— Tira... essas mãos sujas de cima de mim! – Disse quase gritando. Seu pedido mais parecia uma ordem pelo tom. Luna obedeceu. Ela mirava a loira com certo medo e culpa. Era óbvio que Ámbar não ia deixar passar. Por mais que tenha sido sem querer, e ela no fundo sabia disso, não hesitou em jogar a entregadora do Foodger Wheels na piscina enorme que estava em suas frentes.

O fato de estar de patins não facilitou que Luna conseguisse sair de lá. Ela podia ter morrido. Não que essa tivesse sido a intenção de Ámbar, mas ela não media as consequências de seus atos e tampouco se sentiria mal se tal catástrofe acontecesse. Ela observava o esforço da garota com certo divertimento no olhar, como se estivesse vendo um desenho animado.

Luna estava – por fim – conseguindo sair da piscina quando o homem alto e de terno preto e óculos escuros preto, chegara após ouvir os gritos de Ámbar.

— O que está acontecendo aqui? Precisa de ajuda? – Perguntou à garota que não conhecia, já se preparando para saltar, mas por sorte, ela já havia saído.

— Não, não. Obrigado – respondeu assustada.

— Mas quem é essa garota?

— É a "menina delivery" do Foodger Wheels – explicou a afilhada da patroa do homem que estava em sua frente. – Olha o que ela fez com a minha blusa! Era peça única Rey! Feita exclusivamente para mim!

Ignorando toda a dramatização de Ámbar, perguntou:

– E por que ela estava na piscina?

Antes que Luna pudesse explicar que fora empurrada, a loira mais uma vez tomou as rédeas:

— Ela caiu – olhou para Luna. – Por acidente – completou.

— Foi isso mesmo o que aconteceu? – Perguntou olhando para a menina encharcada.

— Rey, está desconfiando de mim? – Perguntou como se fosse uma santa. Mas ele a conhecia.

— Foi, foi isso mesmo – falou sem olhar para nenhum dos dois, incrédula pela mentira da garota um pouco mais alta que ela e após receber o pagamento das mãos de Rey, voltou para seu estabelecimento de trabalho.

— Estou de olho em você – afirmou Rey tirando os óculos e então voltou a entrevistar os futuros empregados da mansão de Buenos Aires.