Memento

Memento


Sob nuvens de cadeiras flutuantes, um exército de garotas mágicas acampava em pradarias de puro branco. Muitas delas pararam suas conversas e atividades, se levantando para quem havia chegado.

Em seu vultoso traje divino, Madoka flutuava lentamente entre elas, suas mechas de cabelo sem fim em direção ao céu.

Ela estava acompanhada de duas garotas experientes. Uma era loira de olhos cor de ferrugem, exibindo um uniforme vermelho com ricos adornos dourados, com um símbolo de um dragão gravado no tecido. Carregava com grande orgulho um rifle com baioneta que podia ser usada como um alabardo. “1260 bruxas ‘pacificadas’... Madoka, o que acha desse número?”

“1272 na verdade e por que usa essa palavra com ironia, Elisa?” A outra, fora a pele, era predominantemente cinza, o que dava o devido ar de maturidade e sabedoria que ela pudesse expressar, enquanto a forma diminuta de seu corpo se escondia sob a sua túnica. “Elas estão vivas e, de fato, receberam de Madoka alguma paz de espírito.”

“Pernelle...” Com um sorriso debochado, Elisa apontou o rifle. “Quando eu uso essa arma que você me deu contra as bruxas, é sempre uma caçada.”

Pernelle ajeitou os seus óculos. “Fala como se tivesse feito uma grande contribuição nessa campanha.”

“Eu derrotei duas bruxas.” Elisa desviou o olhar e brincou com seu pequeno rabo de cavalo. “Bem... Ao menos as acertei. Não é fácil com tantas garotas mágicas agindo juntas, são explosões coloridas para tudo quanto é lado.”

“Toda a contribuição vale,” Madoka manifestou, “inclusive para aquelas que não lutam.”

“Mas o resultado final é o mesmo, não é? Um monte de sementes da aflição...” Elisa fez um gesto extravagante para si mesma. “Então, deusa, eu estou certa de que enfrentamos bruxas que já havíamos encontrados em outras campanhas. Você está trazendo elas de volta à vida para nos entreter, hmmm?”

Pernelle não era uma pessoa que mostrava expressões, incluindo a de incômodo com o questionamento de sua conhecida.

Madoka cruzou as mãos abertas sobre as suas cinco gemas em seu peito. “Eu busco carregar as maldições delas comigo por um tempo para que as garotas possam ter a oportunidade de ver um futuro e se preencher de esperança. Infelizmente, algumas retornam a trilhar caminhos de vícios e destruição.”

Elisa deixou sua arma descansar sobre os seus ombros. “É assim mesmo. Certas pessoas têm coração e mente tão fracos, que jogariam fora a salvação delas mesmas.”

“Eu não sei qual delas se encaixaria com o que você afirma.” O semblante de Madoka ficou mais firme. “No entanto, a certeza que pode ajudá-las é de que eu nunca desistirei.”

“É por isso que você é uma deusa,” Pernelle complementou, com um olhar afiado em direção a Elisa.

“O que você está implicando?” Em uma postura mais defensiva, a loira ergueu o seu queixo, mas isso mudou quando viu quem estava chegando. “Ah! Lá está ela!”

Era outra loira, mas de olhos verdes e usava uma armadura rosa. Ela veio correndo e se ajoelhou diante de Madoka antes mesmo de parar, quase dando de cara com o ‘chão’. Isso não abalou a garota, que abaixou a cabeça e juntou as mãos. “Santa... peço desculpas. Eu não havia percebido que você ainda estava nos acompanhando.”

Uma sombra saiu por debaixo da garota ajoelhada e se ergueu, adquirindo a forma etérea de uma garota mágica de longos cabelos negros como sua capa e vestes. Ela estava séria. “Tart, quantas vezes devo lembrá-la que não precisa fazer tudo isso.”

“Oooh ho ho ho ho...” Elisa riu, cobrindo a boca. “Deixa ela Riz, é o sangue de plebéia que a compele.”

Pernelle não perdeu tempo para responder a afirmação da garota com o rifle, “Humildade e respeito são virtudes, princesa.”

Elisa teve um sobressalto e virou a cara. “P-Por favor... Você está me perseguindo hoje...”

“Quando vejo a Santa, eu sinto que preciso fazer isso. Meu peito queima por dentro.” Tart lentamente se levantou. “Eu sabia que Ele enviaria alguém para interceder pelas garotas mágicas.”

Diante daquela importante figura história, mas que era ainda uma garota com ar de inocência e cheia de esperança, Madoka olhou para as outras garotas no acampamento. “Eu estou tão acostumada... que ás vezes esqueço a escala e importância desse trabalho sem fim. Obrigada, Tart. Obrigada a todos vocês por estarem me ajudando.”

Sorrindo, Pernelle conjurou o seu cajado. “Eles merecem esse descanso.” Então uma aura com símbolos alquímicos a cobriu. “Enquanto isso eu aproveito esse tempo livre para experimentar alguns ingredientes que coletei nas barreiras. Au revoir!” E logo ela desapareceu.

Riz franziu o cenho. “Descanso?”

Elisa respondeu, “Depois de tantas lutas, não acha que devemos dar uma paradinha? Até eu sei que há outras coisas importantes para ocupar as nossas mentes além do próximo campo de batalha. Os demônios vão manter a paz durante a nossa ausência.”

“Demônios...” Riz cruzou os braços. “Podemos confiar nisso?”

“Eu confio na Madoka.” Elisa consultou ela.

O olhar dourado da deusa cintilou. “Fora de controle, bruxas são uma fonte de desequilíbrio que será combatida por eles.”

“Não devemos chamá-los mais de demônios!”

Todos redirecionaram as suas atenções para Tart.

A garota carregava um semblante determinado, com uma mão fechada sobre o seu peito. “Eles foram lançados ao inferno por terem sido contra o nosso Senhor, mas a piedade dEle não tem fim. Esse trabalho é a redenção deles e por isso devemos chamá-los novamente de anjos.”

Vendo a postura de Tart, Riz se sentiu compelida. “Você tem razão, afinal nós não tivemos incidentes com eles...”

“Está tudo sob controle,” Madoka disse.

“Hahaha!” Elisa se aproximou das suas duas companheiras, usando um braço para abraçar Tart e o outro para fingir que conseguia fazer o mesmo com Riz. “Chega de se preocupar, vamos à minha barreira! Eu preparo um bife de dragão para vocês.”

Madoka tomou a oportunidade para voar mais alto, se despedindo, “Divirtam-se. Alegrem-se. A Lei dos Ciclos existe para curar o espírito e ela vale para vocês todos. Obrigada novamente!”

Tart observou ela ascender fazendo o sinal da cruz, enquanto outras garotas do acampamento acenaram.

Tudo aquilo se desvaneceu no fundo branco. Madoka subiu mais, passando por algumas nuvens de cadeiras, então parou e olhou envolta para ver se havia alguém.

De fato havia, uma garota cinza sentada em uma das cadeiras.

“Pernelle?” Madoka ficou surpresa.

“Eu senti que era melhor conversar sobre isso a sós,” disse ela, “você estava escondendo bem sua ansiedade, mas normalmente você tomaria mais do seu tempo para conversar com as outras garotas.”

Sentindo-se exposta, Madoka deu um fraco sorriso e sentou em uma cadeira, enquanto suas longas mechas de cabelo descansaram em outras próximas.

“Como está Homura?” Pernelle perguntou.

Madoka suspirou. “Estamos em um momento delicado.”

A alquimista buscou saber mais. “Ela fez algo?”

Madoka balançou a cabeça. “Eu fiz coisas dolorosas, mas ela já estava em dor.”

“Entendo...” Pernelle ficou cutucando a bochecha, analisando a afirmação. “Um remédio não é nada além de um veneno na dose certa.”

“Eu preciso fazer isso,” Madoka disse, tanto para outra garota quanto para si mesma, “mas Homura não me deu ainda uma resposta.”

Pernelle ergueu uma sobrancelha. “E se ela não der...?”

“Ela vai tomar uma decisão.” Madoka assentiu. “E nós teremos uma conversa apropriada. Eu confio nisso.”

“Você espera isso...” Pernelle olhou para a parte interna da saia da deusa e sua escuridão opressora. “Você fez grandes sacrifícios para mudar a história de todas as garotas mágicas, mas mudar o destino de uma pessoa em específico está além do seu desejo.”

“Mas não está além de mim,” Madoka respondeu com convicção.

E tão ferozmente que Pernelle ficou impressionada.

Os tons dourados deram lugar ao rosa nos olhos da deusa, agora uma garota cabisbaixa na cadeira. “Quando Homura está confusa, ela sempre busca em mim um caminho para continuar. Eu tenho essa responsabilidade, eu que dei primeiro o passo para formar o relacionamento que temos hoje.”

Pernelle sorriu. “Eu sou uma conselheira, apenas isso. Eu só posso dizer coisas como ‘Não deixe ninguém vê-la assim’.”

Madoka ergueu a cabeça e brilho dourado em seus olhos retornou.

“Eu não duvido que você seja pessoa mais habilitada para cuidar dela.” Pernelle se levantou da cadeira, caminhando sobre uma plataforma mágica que ela havia conjurado. “Apenas tenha cuidado ao esperar resultados, eu já explodi a minha casa algumas vezes devido a isso.”

Madoka assentiu.

A garota cinza fez um gesto e plataforma começou a subir, atravessando o seu corpo e fazendo-a desaparecer. “Se eu conseguir destilar uma poção de felicidade verdadeira, você será a primeira a saber.”

Então o silêncio de estar sozinha e cercada por cadeiras vazias. Mesmo naquele mundo, onde qualquer um estava ao alcance de uma mera vontade, Madoka tinha esse sentimento humano. Ela o valorizava, aprendendo com quem ela queria ajudar, com quem ela queria ver logo.

Fechou os olhos e esqueceu aquele mundo, era fácil quando não havia interferência. Cores permearam sob suas pálpebras enquanto seu corpo flutuava em um suave abraço.

Até sentir um aperto gelado na sua canela direita.

A primeira coisa que viu foi o teto do quarto onde estava na mansão. Era ainda noite e a luz da lua invadia o ambiente pela janela. Madoka notou quem estava segurando sua canela, ajoelhado ao lado da sua cama. A luz refletia vibrante na superfície branca dura e lisa da face e nos olhos de vidro.

Madoka reconheceu a touca que aquela boneca usava. “Manuke? Por que não está com Homura? Por acaso quer dormir comigo?”

A boneca soltou a canela de susto e se abraçou, cabisbaixa, sem olhar para garota. “Não... Eu vim aqui para te chamar.”

Madoka congelou, ela não esperava a boneca falar, muito menos ouvir a voz inocente da Homura. “Onde estão os outros?”

“Lá fora...” Manuke ergueu os olhos para ver a janela. “Elas não queriam que eu participasse das execuções, eu pareço boba, alguém poderia achar engraçado.” Então consultou Madoka. “Execuções não são engraçadas, não é?” No entanto, não esperou uma resposta para continuar. “Aí elas me pediram para te chamar para eu não ser um peso morto, eu acho...”

A garota pulou da cama e se aproximou da boneca, oferecendo a mão para que ela se levantasse. “Mostre-me o caminho.”

Descalça e em uma camisola branca, Madoka caminhou pelos longos corredores de mãos dadas com Manuke. Havia uma pressão que podia se sentir nos ouvidos e estalos de madeira vinham de todos os lados. Sons mecânicos estavam amplificados, como os que vinham das articulações da boneca e outros, distantes, de velhos relógios que estavam espalhados pela casa. Elas desceram a escada e Madoka viu pela janela, nas árvores banhadas pela lua cheia, bandos de corujas com seus olhares fixados nela.

Elas continuaram até a entrada principal, onde estavam estacionados dois soldados de chumbo com aparência similar a Homura, mas com cabeças volumosas. Assim que viram Madoka, eles apontaram a suas lanças e correram em direção a ela.

A garota tomou a frente da boneca e estendeu o braço esquerdo enquanto puxou o direito. Como uma rosa desabrochando, surgiu em suas mãos um arco longo e uma flecha de energia, que foi disparada.

A flecha se dividiu em duas e serpentearam os soldados, os amarrando. Eles rolaram no chão, neutralizados.

Madoka continuou andando até a porta que se abriu para ela. As luzes do pátio estavam apagadas, seria um breu total se não fosse a lua, uma leve brisa quente acariciava a pele.

“Agora nossa mestra sabe que você está chegando.”

Madoka se virou, vendo que Manuke continuava dentro da casa.

“Eu fiz um bom trabalho.” A boneca estava sorridente. “Depois, você pode me contar tudo o que viu?”

Madoka também sorriu, enquanto o seu arco evaporava em pequenos pontos luminosos cor de rosa. “Eu trarei Homura e ela irá dizer.”

Com a sola de seus pés sentindo o cascalho e então a grama, ela deixou Manuke para trás. Seria tarde demais? Madoka ignorou as dúvidas, afinal de contas se queria uma resposta de Homura, agora tinha.

Ela chegou até um dos lados da mansão e notou uma cintilante luz quente projetando nas árvores na área atrás da construção. Ela continuou, certa de que encontraria Homura logo.

No quintal havia dezenas de soldados de chumbo carregando tochas. Eles cercavam uma grande plataforma de madeira com as bonecas e quatro guilhotinas alinhadas, as lâminas ainda penduradas no topo.

Entre as bonecas estava Homulilly, se aproximando do primeiro aparato onde uma pessoa estava com a cabeça presa. Com sua mão de couro costurado, ela esfregou o cabelo rosa do rapaz. “.ogol odiceuqse ajes oãn euq arap ,roiretni ues ed sazednuforp sa ehlitrapmoc sanepA .sodraf oãs oãn sedadrev sa e oditnes mezaf oãn saritnem sa ,són erbos evohc etrom a odnauQ

Com olhos revirados, mostrando apenas a esclera, e a marca de um beijo de bruxa no pescoço, Udo rangeu os dentes e exaltou em fúria, “!mu ret eved oãn êcov ,orutuf mu ohnet oãn ue ,sodaçortsed marof sohnos suem e uerrom eãm ahniM .adiv aus ad aid muhnen ecerem oãn êcoV !orutuf mu ecerem oãn êcoV

Homulilly foi até a próxima guilhotina.

Na mesma situação de seu irmão, mas com uma aparência mais melancólica, Ichiro começou a confessar quando a sombra da bruxa pairou sobre ele, “.odnum ues ed sniur sasioc sa sadot riurtsed arap atnorp ,arugrama ed aiehc ,uonroter êcov méroP .sodot arap rohlem aires missa euq iesnep uE .airatam es amsem êcov ,oriemirp essarap oãn oãçaroc ues o eS .aviv ratlov airi oãn euq iesnep ue ,arahikatiM arap adaivne iof êcov odnauQ

Ela continuou andando.

Hiroshi se debatia. Ele respirava pela boca e salivava muito, enquanto dizia frases desconexas, “...odnum etse a riv a adanitsed avatse oãn êcoV ...arumoH ...eplucseD ...eplucseD ...adicnevnoc res avasicerp alE ...siam res aireved uE ...otroba ...iA

Então Homulilly chegou até último dispositivo de execução, onde estava uma mulher.

...êcoV” Rangendo os dentes, Chiharu tentou erguer mais a cabeça, mas em vão. “.sotnemal ed odassap mu me êcov moc ol-ágofa e asopse aus ed rarbmel ol-êzaf avasicerp ,adiv a moc riuges ol-áxied aidop oãn êcoV .élab rezaf euq ahnit êcov ,oãn sam ,avasicerp ele euq rehlum a res aidop ue ,amas-ihsoriH ed sadiref sa raruc aidop uE .olucátsbo mu aires êcov euq aibas ue ,eãm aus a moc aicerap es êcov siam ,aicserc êcov siam otnauQ !odut uoniurra êcoV

Um cuspe da mulher atingiu os pés da bruxa.

.airésim asse a mif rôp edneterp arogA” Olhos de Chiharu rolaram e sua irises e pupilas apareceram. As pupilas pulsavam alternadamente e em um ritmo como se fosse um motor. “.megaroc met oãn êcov saM

Atrás da máscara Homulilly continuava vazio e escuro, enquanto seus punhos cerravam.

.sahniuqsem saçnagniv saus rezafsitas arap soigúfretbus ed eviv ossi roP .adiceuqse ogol áres uo airótsih ad amitív a res asicerp êcoV” A pele da face da mulher se esticou ao limite em um grande sorriso. “!aroga sa-etloS .sanimâl sa etlos oãtnE ?adarre uotse uE

“HOMURA!”

Os olhos de Chiharu voltaram a ser apenas a esclera e a tensão de sua face se foi, como se tivesse perdido a vida, enquanto bruxa olhava para quem havia gritado.

Ainda no gramado, Madoka tinha uma expressão severa.

Os soldados prepararam as suas lanças e as bonecas cercaram as guilhotinas para protegê-las. Enquanto isso, Homulilly flexionou as pernas e deu um grande salto para o céu.

Madoka tentou acompanhá-la com os olhos e viu uma sombra na lua.

De repente, Homulilly pousou na frente da garota.

O ar foi empurrado com o choque, fazendo a camisola e o cabelo solto de Madoka esvoaçar.

Contudo, Homulilly continuava estática como uma estátua. Nem mesmo suas tranças brancas respeitaram o princípio da causalidade.

Nada disso fez Madoka recuar. “Eu não tenho medo de você, pare com isso.”

Como se a frase fosse um gatilho, Homulilly abriu a mão e acertou o peito da garota.

“Uck!”

O som da carne rasgando e das costelas se quebrando pode ser ouvido quando uma grande agulha negra havia empalado Madoka.

Homulilly trouxe seu braço de volta e quando a agulha deixou o ferimento, uma linha vermelha rapidamente desceu pela camisola e sangue jorrou sobre os pés da garota.

De olhos arregalados e mãos trêmulas, Madoka não conseguiu segurar o sangue em sua boca.

Já a bruxa contemplava a sua agulha, que havia brotado de uma de suas costuras. O sangue vermelho vivo no metal negro reluzia sob o luar.

Passado esse momento, o semblante da garota voltou a ser como era antes.

Com o seu par de orifícios vazios, Homulilly olhou para ela.

A linha vermelha na camisola gradualmente escureceu até ficar completamente preto e os pés estavam cobertos de piche.

A bruxa rapidamente retornou sua atenção para a agulha. O sangue havia ficado preto como o metal e se contorciam como tentáculos. Ela estendeu o braço para o lado e disparou a agulha, acertando o gramado. O ‘sangue’ deixou a agulha e cobriu as folhas, as pretejando.

Os olhos de Madoka se tornaram dourados, enquanto o líquido viscoso negro que saía de sua boca sujava sua pele pálida.

Vendo isso, Homulilly, com a parte de trás de seu punho fechado, deu tapa na face da garota.

Madoka rodopiou no ar e caiu de bruços.

?aroga etnatropmi odnitnes es átsE

Ainda caída, Madoka passou mão no rosto e sentiu algumas rachaduras. Ela então começou a rastejar.

...egnol oãt odi ret arap ratse eved êcoV” Homulilly a seguiu, conjurando um alfinete preto. “.ragul esse a riv me adasseretni oãt ratse êcov rop ogla aivah euq aibas uE

As bonecas rodopiavam os seus alfinetes em uma coreografia, formando uma disciplinada torcida.

E Homulilly dançava e rodopiava e rodopiava seu alfinete com maestria. “?sol-ivuo me esseretni otnat euq rop oãtne ,met êcov euq ies ue ,saçnarbmel sahnim sa sadot met êcoV :oãtseuq amu oiev ossi moc sam ,odassap uem o erbos rasrevnoc arap saossep sasse moc uolosi es êcov odnauq saralc siam meracif a maraçemoc sasioc sA

Madoka parou de rastejar.

.ossi rop avarepse êcoV ...oãN .opmet esse odot sossap sues so odnaigiv avatse ue euq aibas êcoV .mim arap are ,êcov arap are oãn ,arvalap adac ,sele rop otid iof euq O .irbocsed uE

Lentamente, ela tentou ficar de pé. “Homura...” Logo foi atingida com violência pela cabeça do alfinete de Homulilly e voou por uma dezena de metros. Seu corpo retorcido capotou pela grama e terminou com a face quebrada virada para a bruxa.

.’sotnemidneperra‘ sues so odnivuo ,seled secod sarvalap sa moc esseceloma oãçaroc uem euq aireuq êcoV” Asas de energia escura cresceram atrás de Homulilly. “!aidróciresim ahnim rop edep êcov ,sederap sassen sona rop itnes ue euq o odnebas omseM

Madoka continuava seu olhar fixo nela, sem esboçar nenhuma reação, sem vida.

Contudo, o olhar dourado bastava para incomodar Homulilly. “?adan rezid iav oãN” As asas se tornaram mãos gigantescas e os braços de energia se alongaram até a garota.

Madoka foi agarrada e erguida por umas das mãos, somente sua cabeça estava para fora dos dedos.

?ogimoc ossi odnezaf átse êcov euq roP ?êcov euq roP

Imagens se formavam nas mãos e nos braços de energia de Homulilly, flashes onde aparecia Madoka em sua vida mundana. Acordando descabelada, desejando poder dormir um pouco mais; acordando a mãe, cumprimentando o irmãozinho e o pai; correndo para escola, atrasada; encontrando as amigas, sorrindo, brincando.

As imagens dançavam envolta da cabeça de Madoka, enquanto continuava com seu olhar dourado sem expressão, manchado pelo líquido preto.

Agora dentro da escola. A face de Madoka estava muito perto, como um brilho de sol que não machuca, nunca machucaria. Ela segurava a mão de uma pessoa enquanto apresentava para as suas amigas; quando aceitava o lenço dessa pessoa, pois havia tomado o copo de suco rápido demais; quando emprestava os exercícios, acanhada, pois estava quase certa que nem todas as respostas estavam corretas; todavia, até que o brilho de sol se fosse, não havia chuva.

!adnopser eM

Olhando para bruxa lá embaixo, Madoka sorriu. Com serenidade, respondeu, “Porque você me deu uma chance.”

Homulilly deixou seu alfinete cair. Ela não se deu conta, pois havia acabado de usar sua outra gigantesca mão para esmagar seu brilho do sol. Sem hesitação. Ela apertou ambas as mãos com toda a força.

O líquido negro escorria entre os dedos e desceu como uma torrente sobre grama, formando uma grande poça.

Vendo isso, Homulilly parou e abriu suas mãos. Não havia nada mais além daquele líquido.

A superfície da poça trepidou e uma grande bolha se ergueu. Ela se contorcia e se deformava, surgindo um par de olhos grandes e inumanos.

Homulilly cerrou novamente suas mãos.

A bolha foi se estabilizando, com os olhos e a forma de Madoka.

!HHHHHHHHAAA” Homulilly esmagou a bolha, espirrando o líquido da poça para longe.

Mais bolhas se ergueram, cada uma se tornando uma cópia de Madoka e de seu sorriso.

!HHHHAAAA !HHHHAAAA !HHA !HHIII !HHHHIII” Homulilly socava as bolhas sem parar.

A poça crescia mais e mais.

Apesar da fúria dos golpes, os ataques estavam perdendo ritmo e a bruxa não estava dando conta de tantas Madokas. A poça ameaçava alcançá-la quando ela caiu de joelhos e baixou a cabeça. “...aripsnoc ,anagne ,alupinam êcoV” Então uma sombra pairou sobre ela.

Madoka estava de pé na frente da bruxa, com a sua camisola branca, como se nada tivesse acontecido, não havia mais poça ou líquido negro. Seus olhos estavam bem abertos, sem piscar, o brilho dourado competindo com o luar.

“...meb oduT ...aires siamaj ue euq od rohlem é êcov ,missa omseM

Madoka estava entre os braços de energia e os viu retraírem até desaparecerem atrás da bruxa.

“.ossi raçarba oved e ue uos assE” Homulilly ergueu a cabeça diante da deusa. “.uecetnoca adan euq rignif e sele moc revivnoc uov oãn uE .ieraodrep so oãn uE

“Eu não quero perdão,” Madoka afirmou, “eu quero que você reconheça que sua família fez isso. Seu pai desejou que você tivesse sido abortada. Seus irmãos a acusavam de assassina. Eles se livraram de você sempre quando possível, como um estorvo.”

?êcov arap atropmi ossi euq roP

“Não é para mim...” A expressão de Madoka relaxou e ela se ajoelhou. “Homura, não fuja. Você está pronta para por um fim nisso, com dignidade, como filha e irmã.” Então suas mãos foram em direção à máscara da bruxa. “Traga paz para as dúvidas que você carrega.”

!oãN” Homulilly virou a face e recuou. “!eraP” Mas as mãos a alcançaram.

“Eu não tenho medo de você, eu lhe disse...” Gentilmente, sem esforço algum, Madoka pegou a máscara para si.

Sob a sombra do chapéu, um par de olhos de vidro, de círculos concêntricos azuis e branco, lisos como a pele de cera branca.

“Consegue enxergar agora, Homura?” Madoka estendeu novamente a mão. “Talvez isso ajude você a dar uma resposta clara.”

Homulilly sentiu o puxar e as costura se arrebentando. As tiras de couro se abriram, revelando sua boca de boneca.

Madoka aproveitou a oportunidade para remover o chapéu, pois aquela sombra que ele fazia escondia toda a beleza.

Longas mechas de cabelo negro, que estavam presas dentro do chapéu, desceram e cobriram as costas de Homulilly. Ela examinava as próprias mãos, vendo as costuras se desfazendo. Em um estouro, as tiras de couro voaram para longe, deixando para trás cera e juntas mecânicas.

Madoka estava satisfeita com o resultado. “Vá em frente, bruxa da progressão, agora você realmente está livre para decidir.”

/人 ‿‿ 人\

Andando como zumbis, os quatro condenados eram escoltados de volta para mansão pelos soldados de chumbo, enquanto as guilhotinas e a plataforma eram desmontadas pelas bonecas.

Supervisionando aquilo, Homura e Madoka estavam sentadas no gramado. Não haviam trocado mais palavras.

Madoka apreciava a boneca que estava sentada ao seu lado. As feições eram praticamente idênticas a da Homura, apesar da pele de cera não aparentar ser tão flexível e os olhos maiores, mais vivos. As pálpebras faziam um característico som de clique quando ela piscava.

Sob o olhar dourado da deusa, Homura se encolheu. “Madoka...”

“Sim?”

“O quanto você mudou?”

Madoka olhou para a lua, cutucando o queixo. “Hmmm... Eu me pergunto se há uma medida para isso...”

Homura olhou de relance para ela.

Percebendo, Madoka mostrou um sorriso e disse, “Minha mãe vai ser a primeira a morrer.”

Agora Homura estava olhando.

“Mais ou menos daqui a duas décadas e meia. Ela sempre brinca que o fígado dela não vai agüentar... Infelizmente será o pâncreas. Quando descobrir, será tarde demais.” Seu olhar se perdeu, mas continuou sorrindo assentindo para si mesma. “Mas ela vai ver Takkun jogar beisebol. Bem, será idéia do meu pai. Ele vai querer vender a dieta dele para atletas e vai usar meu irmão como garoto propaganda. Isso não vai dar muito certo, pois ele não tem talento para o esporte.”

Homura estava tão perplexa que agora realmente estava estática como uma boneca.

“Wehihi... mas as histórias de beisebol dele farão sucesso com as garotas. Ele vai ter filhos e se casar, nessa ordem. Menino levado... Ele vai viver bastante, mas não tanto quanto o nosso pai. A dieta realmente deu resultado e ele vai ficar famoso, principalmente entre as pessoas de idade, vai vender muitos livros. Eles irão notar quando ele se for...” Madoka suspirou e voltou a prestar atenção para a sua companheira, agora com um sorriso mais melancólico. “Uma filha não deveria saber dessas coisas sobre a família dela, não é? Desculpe, pelas coisas não poderem ser como era antes. Na primeira vez que eu testemunhei isso, eu chorei, mas ciente de que esse é o curso natural dos eventos.”

Os círculos dos olhos da Homura mudaram para os tons verde e vermelho e ela mostrou seus dentes afiados. “Considera natural o que nós nos tornamos?”

Madoka parou de sorrir e virou a face, mais pensativa. “Eu tenho medo.”

“Medo? Do quê?” Homura semicerrou o olhar. “De quem?”

“Não, é bom que eu tenha medo.” Madoka estendeu os braços, deixando palma de uma mão sobre a outra e então as afastou.

Homura notou veias negras surgindo na palma superior e logo uma linha de líquido negro fluiu continuamente, sendo absorvida pela palma inferior.

Madoka parecia mesmerizada com aquilo. “Foi ele que me fez pensar com calma e cuidado, assim eu tive coragem em fazer o meu desejo.”

Homura piscou quando a outra juntou as palmas em um tapa.

“Eu tenho medo de esquecer esse sentimento, assim como outros.” Madoka se virou para Homura e a segurou pelos ombros. “Por isso que preciso você para me lembrar!”

Os olhos voltaram a ser como era antes e dentes se foram. Homura desviou o olhar, sem saber o que dizer.

“Eu amo a minha família, mas agora você sabe que me sinto desconectada deles.” As mãos de Madoka deslizaram, subindo pelo pescoço e tocando os pômulos frios e lisos da boneca. “Vamos nos tornar adultas e ir para algum desse mundo, juntas.”

Homura segurou as mãos. “Você pretende ficar tanto tempo aqui?”

“Madoka Kaname ainda faz parte dessa linha do tempo. Eu não posso saber o que vai acontecer daqui em diante, apenas posso comparar com o que vi em outros universos.” Madoka encostou sua testa na da Homura. “Deve haver surpresas e eu não poderia perder a oportunidade de compartilhar elas contigo.”

O brilho dourado reluzia na pele de cera e os olhos de vidro de Homura corriam, sem saber para onde olhar. “S-Se eu concordar contigo, nem... nem os meus sonhos mais selvagens chegaram perto disso, não pode ser verdade...”

“Será verdade.” Madoka chegou perto do ouvido e sussurrou, “mas você ainda tem um passo a dar.”

Homura estremeceu em uma sutil cacofonia de sons mecânicos, quase não notou que Madoka havia se levantado e estendido a mão para ela.

“Venha.”

Homura não sabia para onde aquela a mão a levaria, mas ela não se importava mais com o que deixaria para trás.

Então a mão de cera se uniu com a de uma deusa em um aperto firme.

/人 ‿‿ 人\

O dia clareou com homens bem vestidos descendo a escada com mochilas de viagem, logo seguido pelas duas garotas.

“O carro já chegou, podem colocar lá.” Chiharu estava ali para dar as instruções.

Enquanto Ichiro, perto da entrada da casa, estava alongando o pescoço. “Ahh... Nós devíamos ter checado antes quando partiria o trem com conexão para Mitakihara. Nos feriados os horários sempre ficam complicados.”

“Não tem problema.” Madoka parou em frente a ele, seguida por Homura. “Nós compramos algo na estação para comer no trem.”

“Ei!” Udo apareceu correndo. “Vocês já estão indo?”

Ichiro respondeu, “Ninguém vai ficar esperando você terminar de pintar o seu cabelo.”

“Não enche! Eu fiz isso ontem à noite.” Udo passou mão em seu cabelo rosa. “Madoka, o que achou?”

“Ehhh...” A garota sorriu. “Ficou legal.”

Chiharu olhou para o garoto por um momento e voltou às tarefas balançando a cabeça.

Udo estava muito empolgado. “Vocês viram algo sinistro durante a noite?”

“Algo... sinistro?” Madoka trocou olhares com Homura.

A garota com tranças e óculos foi rápida na resposta, “Estávamos dormindo, não vimos nada.”

Ichiro ficou mais incomodado. “Elas não precisavam saber disso...”

Madoka ergueu as sobrancelhas. “Hmmm... O que vocês viram?”

“Nós não vimos nada,” Ichiro falou, “mas hoje encontramos o gramado amassado em certos pontos, formando um padrão. Devia haver uma estrutura instalada ali.”

Udo assentiu. “Como uma nave alienígena, eles podiam estar planejando em nos abduzir.”

O olhar de Madoka cresceu. “Alienígenas? Abduzir?”

“Você nunca viu notícias sobre estranhas marcações em plantações? Esse é um novo caso! Vem ver com os s-”

“Pare com essas sandices!” Ichiro cortou o irmão. “É apenas arruaceiros que resolveram acampar no nosso terreno. Esse lugar é isolado, mas não tem... segurança...”

Todos viram o homem olhar para uma direção.

Era Hiroshi que estava chegando em passos lentos, esfregando o pescoço enquanto não tirava os seus olhos de Homura.

A garota ficou com uma postura tensa, erguendo o queixo.

Ele pegou os óculos dele e limpou as lentes. Sua voz era fria, “Você vai voltar para Mitakihara, certo?”

“Sim...”

“Poderia tentar não desaparecer dessa vez?” Ele pôs os óculos de volta, esperando uma confirmação.

Homura engoliu seco e abaixou o olhar. “Pai...”

Hiroshi piscou e o silêncio na sala ficou ainda maior. Chiharu franziu o cenho, incapaz de conter a sua expressão.

“Nesse tempo que estive longe daqui, eu aprendi a amar... e aprendi a odiar também.”

Madoka não olhava, apenas ouvia ela, quase sorrindo.

“Meu irmão falou comigo...” Homura olhou de relance para Ichiro.

O jovem homem assentiu.

Ela então olhou para o seu pai. “E minha resposta é não, eu não vou trabalhar na empresa de nossa família. Eu não vou compartilhar o meu futuro com vocês. Nada, muito menos os nossos laços de sangue, me fará mudar de idéia.”

O silêncio retornou e todos viraram suas atenções para Hiroshi.

Ele permaneceu impassivo e falou com a mesma frieza, “Pois bem... Você é a minha filha, eu tenho responsabilidades, espero que entenda.”

Homura não disse nada.

Ele continuou, “Você vai continuar os seus estudos em Mitakihara, eu estarei arcando as suas despesas até você terminar o ensino médio. Depois disso, você pode ir para onde quiser sem dar satisfações com uma condição.”

Dessa vez Homura questionou com certa ansiedade, “Qual?”

“Não traga vergonha,” disse o pai, escalando o tom, “pois quando alguém perguntar sobre a sua família, por mais que odeie, você vai dizer que o seu pai é Hiroshi Akemi!”

Ela desviou o olhar e pressionou os lábios.

Hiroshi continuou a encarando sem mover um músculo.

Então Homura assentiu, rápida e exageradamente, e deixou a casa.

“Hmmm...” Madoka se curvou para os anfitriões. “Eu estou muito agradecida pela oportunidade de conhecê-los e pela estadia nesse ambiente maravilhoso.”

“Você é uma pessoa maravilhosa,” Ichiro respondeu, bastante amigável, buscando sepultar a tensão, “todos nós concordamos.”

Chiharu respirou profundamente.

“É!” Udo fez o sinal com polegar para cima. “Se você fizesse shows, você seria idolatrada!”

Madoka pôs mão no peito. “Eu?! Idolatrada? Wehihii... Eu acho isso um exagero.”

Hiroshi pronunciou, “se vier novamente, traga a sua família, todos serão bem recebidos.”

“Então...” Madoka acenou para eles, abrindo um sorriso. “Vejo vocês.”

“Tchau, se cuide!”

Saindo, ela notou Homura de pé ao lado do carro, encarando o próprio reflexo na janela da porta. Ele se aproximou e a tocou. “Você está bem?”

Homura se virou para ela e disse com calma, “Sim, estou ótima.”

“Homura-san!”

Elas viram Chiharu chegando.

A governanta perguntou a Homura, olhando para Madoka, “Você tem certeza disso?”

“Nós sempre tivemos, não é? Eu é que estava sendo covarde...”

A mulher abriu a boca para falar, mas ficou sem palavras.

Homura não esperou, ela foi abrir a porta do veículo. “Chiharu-san...”

Surpresa, ela então balbuciou, “S-Sim...”

Homura virou a cabeça para vê-la. “Ajude ele.” Depois entrou.

Madoka entrou por outra porta, mas não antes de assentir para a governanta.

Chiharu assistiu o carro mover-se pelo pátio e atravessar o portão, logo desaparecendo no primeiro sinuar.

Solitária, com o som da brisa misturado com as palavras que havia acabado de ouvir, ela retornou para dentro da mansão, onde viu Hiroshi conversando com o seu filho mais velho.

“Eu vou checar o helicóptero,” Ichiro disse, “quero ter certeza que ninguém mexeu nele.”

“Faça isso,” o pai concordou, “essa invasão foi algo grave, eu deveria ter instalado câmeras há muito tempo.”

Ichiro foi saindo sala quando o Udo o acompanhou.

“Droga... eu acho que eu devia ter pedido o número dela.”

“É melhor assim.”

Udo deu sorrisinho. “Ei, vocês conseguiram o endereço da família dela, não é?”

Ichiro semicerrou o olhar e respirou fundo. “Nem pense nisso.”

“Meh...” O outro deu de ombros. “Eu aposto que ela tem uma página pessoal na Internet.”

“Você vai esquecê-la em uma semana.”

“Nah, ela especial, você sentiu isso também.”

“Ah sim...” Dessa vez foi Ichiro que sorriu. “Então eu dou uma semana para você achar outra coisa especial e mais uma para esquecer.”

“Vai tomar no seu cu!”

Mesmo com os dois já distantes, Hiroshi ouviu aquilo. “Eu devo focar em Udo agora.”

“Ichiro tem sido uma boa influência para ele.”

Ele viu que Chiharu estava ao seu lado.

Ela prontamente se curvou. “Hiroshi-sama, quer que eu deixe o café da manhã na biblioteca?”

Ele continuou a encarando.

A mulher olhou de relance por um instante.

Finalmente ele comentou, “Você está usando batom hoje.”

Um novo e rápido olhar de relance, Chiharu respondeu, “Eu sempre uso.”

“Hmmm...” Hiroshi parou de olhar para ela, voltando sua atenção para onde queria ir. “Não, eu já fiquei tempo o bastante na biblioteca. Eu estarei na varanda, traga-o para mim.”

“Sim.” A governanta se curvou mais e o deixou.

Hiroshi não se moveu. As juntas doíam, as costas e o pescoço também. Ele examinou o topo manchado de suas mãos, detalhes que vinham com a sobriedade.

Porém havia algo novo.

“Ai... Eu me sinto vazio por dentro. Isso é uma coisa boa?”

/人 ‿‿ 人\

Pela janela do trem, os últimos prédios altos estavam ficando para trás. Homura esperava sentir saudade, mas não foi o caso, talvez porque logo estaria de volta a cidade onde passou a maior parte de sua vida.

“Missão de espionagem completa!”

Ela viu a sua companheira de banco usando o smartphone.

Madoka começou a mostrar as fotos. “A mãe vai adorar essas com nós e seus irmãos em Tóquio. Diga para ela que ninguém flertou comigo, ok?”

As fotos foram aparecendo, inclusive algumas dentro da mansão. Algumas eram das obras de arte, mas na maioria havia pessoas posando; Ichiro, Udo, Chiharu e funcionários; havia poucas de Hiroshi, quando ele não estava olhando.

O sorriso de Madoka esmaeceu um pouco. “Ahh... ficou faltando algumas fotos... Se você tivesse saído mais do seu quarto...”

Homura removeu os óculos e o esmagou em seu punho.

Madoka prestou atenção.

Ela abriu a mão e o objeto evaporou em uma nuvem amarelada de partículas luminosas em forma de flores que logo desapareceu. Homura então pegou suas tranças e desamarrou os laços roxos, deixando seu cabelo se desenredar lentamente. Ela deixou os laços em sua palma aberta e os contemplou.

“Uhum...” Madoka levou a mão até os seus laços vermelhos. Ela os desamarrou, deixando o seu cabelo cair.

Homura notou que o cabelo dela parecia mais longo que o usual.

Madoka deixou os seus laços na palma da outra garota, junto com outro par, e então cobriu com a sua própria mão. “Aqui está guardado os nossos passados...”

Homura fechou a palma, entrelaçando os dedos com ela. “... e é onde permanecerão.”

E o trem seguiu até a próxima estação.