Ouvindo o jazz de bom gosto preencher todo o ambiente, Caitlin caminhou por entre as mesas de convidados do casamento de Iris segurando uma taça de champanhe numa mão e a bolsa da outra. Na pista de dança, rostos conhecidos se misturavam a colegas da jornalista parecendo muito relaxados, apenas aproveitando a noite.

De longe, enquanto a mulher dançava com Tony, seu noivo, notou o quanto ela parecia feliz. Dessa vez, não era como se ela esperasse qualquer imprevisto ou interrupção na cerimônia e, por isso, podia aproveitar perfeitamente seu dia. O casamento de Barry e Iris terminou mais pelo desejo da mulher de normalidade e uma vida ligada à sua profissão do que pela falta de amor, sabia muito bem disso.

A mãe de Nora, a mulher a quem ele esteve destinado por toda a sua vida, desejava mais a tranquilidade e estabilidade do que o velocista tinha a intenção de deixar a velocidade. Ela sabia que deixar de ser o Flash não era uma opção para Barry, pois o manto fazia parte de quem ele era. Assim, Iris voluntariamente se retirou, pois não encarava como uma competição.

No início, acompanhara a relutância de Barry em aceitar o término. Se tratava do fim de uma vida de idealizações, de um futuro pelo qual sempre lutou e para o qual sempre correu. Contudo, ele sempre fora mais respeitoso do que determinado. Além disso, não havia como Nora continuar vivendo em meio às tensões matrimoniais deles. Por isso, decidira seguir em frente, se reconstruindo aos poucos e se abrindo a novas oportunidades quando passara a ter uma relação mais amigável com Iris.

Mesmo depois de acompanhar tanto de perto, ter de ouvir os dois lados do cabo de guerra que foi o fim do casamento entre eles, e conhecer tudo mesmo que não precisassem realmente dizer, ainda olhava para ele, sentado ao bar luxuoso com um drinque que não lhe fazia qualquer efeito, e se perguntava se o fato de ver Iris construir uma nova vida não o abalava de alguma forma.

Apesar de saber que não havia qualquer resquício de sentimento romântico que restasse por Iris, Barry podia ser atingido por uma batalha do próprio ego. Ele tivera muitas namoradas, mas nada que parecesse tão sólido quanto o relacionamento dos jornalistas que, apesar de estarem juntos há tempos, resolveram se casar apenas recentemente. Estreitando os olhos, terminou seu caminho até ele e se sentou na banqueta logo ao lado, colocando a taça sobre o balcão enquanto pedia outra dose ao barman.

Analisando de perto, pôde notar o pequeno e discreto repuxar apertado no canto esquerdo dos lábios e a postura um tanto tensa sob o terno escuro e bem cortado, ainda que estivesse sentado no canto mais tranquilo da festa. Barry não a encarou, apenas continuou a fitar um determinado ponto da festa e Caitlin o acompanhou com os olhos até entender o que se passava.

Do outro lado do salão, Nora estava sentada a uma mesa em sussurros com um garoto de cabelos pretos cacheados – provavelmente aquele que dissera ser um interesse. Não ficara sabendo se a coisa se tornara séria naqueles dias, mas compreendia um pouco o desgosto do pai dela, logo ao seu lado. Engoliu um sorriso e alcançou o copo de uísque que Barry tinha entre os dedos, apertando mais do que deveria, para tomar um gole.

— Algo está te incomodando, Barry? – Perguntou de maneira despretensiosa, no que ele engoliu um xingamento e lhe lançou um olhar contrariado. – Então, aquele é o garoto da escola de quem Nora está gostando?

Tomou um gole do uísque, devolvendo a ele com uma careta, pois nunca gostara da bebida. Barry apenas bufou e se virou para o bar, finalmente deixando de encarar a filha e provavelmente evitando uma síncope.

— Aquele é Jake. Sim.

Caitlin riu brevemente, agradecendo quando o barman terminou de lhe encher a taça e completou o serviço com um olhar sugestivo, do qual não se esquivou, antes de se voltar a ele, que apenas acompanhava a tudo com o cenho mal humorado.

— Barry, sua filha está crescendo. – Constatou o óbvio o ouvindo bufar. – Esse é só o primeiro garoto com quem terá de lidar.

— Provavelmente isso nunca deixará de ser complicado. – Ele tomou todo o uísque enquanto ela revirava os olhos vendo-o gesticular com as mãos, inconformado. – É cedo demais! Você já tinha algum namorado nessa idade?!

— Não. – Deu de ombros tranquilamente, no que o velocista a fitou como se estivesse dizendo ‘consegue ver o meu ponto?’. – Cada garota tem seu tempo. Não há uma regra, okay? Sei que é... Uma situação nova e indesejada, mas... Precisa estar presente para Nora agora e deixá-la segura de que confia nela.

— Argh, odeio ser pai.

Caitlin riu pela forma dramática que dizia e, apoiando o rosto em uma das mãos, estava para levantar para apertar os ombros dele em apoio moral quando a própria Nora praticamente se materializou às costas deles, praticamente se enfiando entre os dois no balcão.

— Olá, papai.

— Oi, querida! – O acompanhou se voltar à menina completamente rendido e puxá-la para um abraço. – O que está fazendo? Quer dançar?

— Não. – Nora respondeu em uma careta, como se fosse um absurdo, embora tivesse gravada em sua mente a imagem de um Barry e uma Nora ainda bebê cambaleando por uma pista de dança. – Minha mãe já quer ir para o aeroporto, então vim saber se Jake pode me levar para a casa assim que ela sair.

A menina de longos cachos escuros perguntou de maneira tão espontânea que Caitlin quase acreditou que estivesse realmente tão confiante quanto aparentava, mas por trás da pose pode captar os olhos idênticos aos de Barry, encarando-o em expectativa.

— Agora precisa de alguém para te acompanhar? – Ele reagiu de maneira cética inicialmente, no que Nora apenas respirou fundo e Caitlin apenas pôde imitá-la.

— Pai, eu estarei lá assim que chegar, quietinha, já deitada na minha cama. – Caitlin revirou os olhos quando ele encarou o garoto, um pouco distante, que ficara completamente sem graça pela avaliação crítica do outro.

— Tudo bem.

Disse ele em um muxoxo ganhando um sorriso grande de Nora, a qual o abraçou brevemente e deu um beijo na bochecha de Caitlin, se despedindo. Provavelmente, assim que Iris saísse pela porta do salão, o que aconteceria muito em breve devido a movimentação do cerimonial, não a veriam mais pelo resto da noite.

— Espero que se acostume logo com isso, porque está sendo um babaca. É só um namoradinho, Barry.

Comentou em tom baixo ganhando somente um franzir de lábios em resposta e, antes que ele pudesse se pronunciar, Cecile se aproximou em seu costumeiro andar rápido, parecendo um pouco urgente enquanto se dirigia a ele com altivez.

— Vanessa Hodgins, sua namorada da Promotoria, não para de me perguntar sobre você. – A mulher, com os cabelos escuros presos em um coque bonito e algumas linhas de expressão no rosto marcante, parecia irritada com Barry. – Já não tenho mais uma desculpa para justificar porquê sumiu.

— Vanessa não é e nunca foi minha namorada.

Ele informou a Cecile num tom de condescendência, o que só a fez dar um passo ameaçador em direção a ele, o qual se acomodou melhor contra o banco do bar.

— Então é melhor informar isso a ela. – A Promotora respirou fundo e percorreu Caitlin com os olhos de cima baixo, agora soltando um sorriso empolgado. – Cait, querida, está deslumbrante demais essa noite para não levar um padrinho para a casa. Ouvi dizer que Fitz está solteiro novamente.

— Obrigada, Cecile! – Sorriu realmente lisonjeada pelo elogio e se inclinou na direção dela, piscando. – Vou manter isso em mente.

A mulher, que adorava movimentar a vida de solteira de Caitlin, sorriu empolgada e disse que ia procurar Joe enquanto lançava um olhar de aviso a Barry para resolver as coisas com Vanessa. Sabia que, tecnicamente, não era namorada dele, mas realmente deveria esclarecer os dois mal sucedidos encontros para que não continuasse a fugir da mulher como um covarde.

A Assistente da Promotoria era linda e sexy, mas um tanto quanto... Mal educada, para dizer o mínimo. Todos já se conheciam há um tempo quando ela convidara Barry para sair e, por algum motivo, ele aceitara. Num devaneio, provavelmente o velocista acreditara que a mulher poderia ser um pouco mais do que sua personalidade forte, mas fora tudo um fracasso e ele apenas decidira não atender mais as ligações. Sabia que Cecile dissera a ela que o cientista estava ocupado com o trabalho na CCPD, assim como vinha tendo problemas com a filha devido ao casamento da mãe dela, o que era um absurdo.

— Ela está certa. – Caitlin meneou a cabeça em concordância, no que Barry a cutucou. – Quer dançar? Você não vai impressionar padrinho nenhum se continuar parada aqui.

Ela revirou os olhos e sorriu de maneira cética, ajeitando a bolsa ao redor de alças compridas em um dos ombros enquanto o acompanhava. Sem cerimônia, Barry entrelaçou seus dedos e rodeou sua cintura assim que chegaram à pista de dança, decorada com luzes douradas e de bom gosto em pontos estratégicos, as quais de repente o tornavam ainda mais charmoso do que o comum. Percebendo a direção de seus pensamentos, contudo, piscou um pouco surpresa.

Estava acostumada com a familiaridade que pressionava sua cintura de forma a deixá-la completamente junto dele enquanto seguiam o ritmo lento da mistura de blues e rock sem dificuldade, como se fizessem isso o tempo todo. Barry sabia a resposta do corpo dela a cada movimento e era verdadeiramente natural correr a mão pelo braço dele até apoiá-la no ombro num reflexo de como se acomodava facilmente ao velocista.

Observando-o rapidamente, notou que parecia um pouco perdido no local onde Iris e Tony conversavam e riam junto a alguns convidados. As feições não pareciam melancólicas nem tristes, mas pensativas, o que a intrigou. No entanto, não verbalizou nada até que ele voltasse a encará-la e percebesse que notara o pequeno o quase deslize, soltando um riso baixo e sem graça, a surpreendendo pela atipicidade, pois entre eles não era necessário disfarces.

— Eu estava me lembrando... Do dia em que nos casamos. – Caitlin apenas aguardou. – Iris e eu não parecíamos tranquilos assim.

— É compreensível, considerando tudo de errado que já havia acontecido até então. – O consolou em tom baixo meneando a cabeça. – Você se incomoda? Que Iris esteja vivendo isso novamente? Com outra pessoa?

O viu fazer menção de negar rapidamente, mas aparentemente desistiu enquanto os olhos esverdeados cravavam no rosto dela, ainda mais pensativamente, como que analisando o ponto em que ela queria chegar.

— Não, mas... É estranho. – Ele começou parecendo procurar as palavras corretas. – Porquê, quando você se casa, há essa... Expectativa de que seja para sempre, de que... Só é possível fazer isso uma vez porquê, do contrário se torna um gesto quase que banalizado.

— Eu sei, já me casei. – Lembrou a ele como se fosse segredo, fazendo-o sorrir brevemente, embora não tenha alcançado tão bem os olhos esverdeados.

— Não é um incômodo, é apenas... Decepcionante, eu acho, vê-la vestida de noiva para outro cara. Para o que nós fomos, quero dizer. Como se não houvesse significado muito, entende?

— Essa nunca será a verdade quanto a você e Iris, Barry. – Falou de maneira cética vendo-o fazer uma careta. – Mas compreendo o que quer dizer. Não sei se seria madura o suficiente para ver Ronnie se casando com alguém, depois de mim. É bom que ele esteja morto, nesse caso.

— Agora faz piadas sobre isso? – Ele riu do tom debochado, pois é claro que Caitlin não estava falando sério, mas tudo havia ocorrido tanto tempo antes, que não podiam se prender às feridas já curadas do que haviam sido e pelo o que haviam passado. Ela apenas deu de ombros, percebendo o clima mais leve se instalando aos poucos após a pequena descontração. – Não imaginei que pensasse assim. Você me vê com outras mulheres o tempo todo...

Então, Caitlin o encarou um tanto desarmada, pois não previra a direção do questionamento de Barry. Sentiu a própria boca secar no instante em que ele lhe levantou as sobrancelhas, esperando uma resposta.

— Er... – Respirou fundo para retomar a postura, o que ele claramente estranhou. – São situações diferentes.

— Diferentes como?

Caitlin não se impediu de mordiscar o lábio inferior, ansiosa sob os olhos claros e tranquilos ao perceber que Barry insistia no assunto, como se não soubesse que a estivesse pressionando. Em sua mente, conseguia distinguir perfeitamente as duas relações. Ronnie e ela pareciam feitos um para o outro, principalmente porque havia essa impressão de certeza. Sobre eles, sobre o que sentiam um pelo outro e isso estaria para sempre guardado em um canto seguro de seu coração, como se uma parte dela houvesse sido moldada apenas para isso.

De outro lado, Barry ocupava todo o resto sem que sequer soubesse. Diferente de Ronnie, não havia tanta segurança, mas um tipo de estabilidade que funcionava para eles, pois não se limitavam apenas ao romance. Eram esse “algo” em constante expansão, se tornando maior e mais certo com o passar dos anos e, por não enxergar um desejado controle, alimentava certa sensação de inevitabilidade sobre o nível de intimidade criado ao longo do tempo.

Caitlin nunca achara que foram feitos um para o outro, mas se compreendiam de maneira inigualável, não apenas na cama, mas, principalmente, em todos os outros momentos. Sabia que, independentemente de qualquer adversidade, sempre estariam ali um pelo outro e, além disso, também tinha a egoística certeza de que Barry sempre voltaria para ela.

Não se tratava de uma constatação soberba, apenas a realidade de anos remendando-o e conhecendo-o como a mais ninguém. Por isso, nunca se preocupara realmente com nenhuma namorada que ele viera a ter ao longo daqueles anos em que frequentavam a cama um do outro ou se sentira ameaçada, afinal tinha consciência do lugar que ocupava na vida dele.

— Acredite, é diferente. – Afirmou convictamente, obviamente desejando mudar de assunto, mas Barry estreitou o braço em sua cintura e Caitlin levantou os olhos para fitá-lo novamente em resignação. – Não posso contar, você se sentiria especial demais.

— Sério?!

Caitlin riu pelo tom indignado e evitou revirar os olhos quando ele resmungou algo, mas sua atenção repentinamente ficou presa na figura de Joe, estacado ao lado da pista de dança, encarando-os de maneira analisadora demais.

Quase pôde sentir as próprias bochechas corarem, mal ouvindo o que Barry dizia sobre um padrinho qualquer. A sensação de ter sido pega no flagra quando o ex-policial levantou a taça que tinha em mãos em um cumprimento amigável se fez ainda mais presente, como se de repente, houvesse percebido toda a dinâmica entre seu filho e ela nos últimos anos.

Engoliu em seco, mais consciente do que nunca do corpo de Barry contra o seu sem qualquer cerimônia, e forçou um sorriso que certamente jamais soaria natural voltando a olhar o velocista, que continuava a falar sem parar.