O menor esperneava como um bebe há horas.

Tudo quase inaudível de acordo com o timbre e velocidade que usava; já era costumeiro este abusar dos tímpanos alheios com sua mania de exaltar a voz. Mas desta vez os dois ouviam quietos, como crianças que haviam aprontado.

–--- Apaixonados? E ainda por cima por uma Kanker nojenta? Como? Quando? Por queeeee!!!

Seu escárnio era visível, parecia querer agredir ambos ate que recobrassem toda a razão e desfizessem o que já estava feito.

Mas nenhum chilique do mundo faria o tempo voltar atrás.

=~^~ ºº~^~=


Tinha chego em casa desnorteado.

Marie Kanker sempre me agarrava quando esta tinha (ou não) a chance; mas nunca tinha sido deste modo. Eu nunca a havia correspondido.

O que estava acontecendo comigo?

E ainda por cima em um ambiente como aquele! Eu só podia estar doente...

Cheguei em casa, fiz minhas tarefas diárias e logo fui fazer meus deveres. Mas “aquilo” não saída da minha cabeça. Como pude? O que deu em mim? Nem parecia eu mesmo...

Com isso, acabo indo dormir muito tarde; e ainda fico revirando na cama como se estivesse passando muito mal. Não tirava o ocorrido da minha cabeça. E se as câmeras... ai meu deus as câmeras de segurança da ala de detenção?

Eu vou morrer...

oOoOoOoOo

Passei o fim de semana todo pensando no ocorrido, preocupado com as câmeras de segurança e com o tamanho do castigo que poderia levar. Mas a escola não ligou.

Edu quis bolar mais um ou dois planos, mas minha cabeça não estava lá muito boa e ele logo esqueceu e fomos jogar vídeo game.

Por um tempo consegui tirar o problema da cabeça ate que... A segunda chegou e me vi no mesmo corredor.

Engoli seco, suei frio e segui em frente.

Tentei focar minha atenção nas matérias que eram dadas, e ao termino da mesma não pude compreender o porque de ate o momento não ter recebido meu devido castigo.

Aquilo me consumia.

Era uma tortura!

Então fiz a coisa mais sensata possível. Durante o intervalo fui a sala do coordenador me “confessar”.

[Tok, tok.]

–--- Entre. ---- ele ordena com uma voz firme, mas assim que me vê abre um sorriso. ---- Eduardo? O que faz aqui?

–--- E-eu... vim perguntar uma coisa. Vocês já... glunp... pensaram o meu castigo? ---- estremeço, minhas pernas perdem a força. Minha ficha escolar! O que será de minha pobre ficha escolar?

–--- Castigo? Mas meu jovem... Por que iríamos castiga-lo? ---- era claro que o vigia não havia contado, ele nem ao menos tinha visto as gravações. Mas antes que eu pudesse por tudo em pratos limpos como havia planejado:

–--- Por que este idiota pegou um livro amais e devolveu atrasado. ---- ela invade a sala do coordenador me arrastando de lá, antes que eu pudesse dizer qualquer coisa. ---- O que pensa que esta fazendo? Sabe o que ele “teria” de fazer com nós dois? ---- logo me prensa contra uma parede qualquer, e meus pensamentos vão longe. O que tinha de errado comigo? ---- Teria por que todos estes idiotas te idolatra... não iriam te expulsar por vontade própria.

–--- E-expulsar? ---- admito que quase desmaiei, tremi e cai mas mantive a consciência. ---- Estas são as regras? Eu cometi algo tão grave assim? Meu deus... Meu deus!

–--- É. Ate você tem um lado mal... Gostei. ---- ela sorri e eu coro.

–--- Marie... Eu,eu...

–--- Não precisa dizer nada. Você já se ‘expressou’ “muito bem” aquele dia. ---- ela ajeita o cabelo azulado por detrás da orelha selando seus lábios em minha bochecha e assim se despedindo.

E fácil assim... fácil... que perdi o resto da pouca concentração que me restava.

oOoOoOoOo

A verdade é que por muitas vezes tentei fazer de conta que não sentia nada estranho ou novo. Mas como era completamente novo para mim, não consegui muito bem “lidar” com tal fato, que para outros era corriqueiro.

E então fiz a coisa mais idiota possível.

Fui falar com ela...

~~ºº~~

Ele bufa uma ultima vez. ---- Vocês... podem ao menos tentar me explicar? ---- em seus olhos continha um brilho assassino e um timbre de traição. Em momento algum conseguia aceitar tal fato.

Mas os dois permanecem mudos.

Afinal de contas, como se explica um sentimento ou como ele havia começado?

–--- Desculpa Edu... Mas eu não tenho como te explicar algo que não consigo explicar nem para mim mesmo. ---- o magro e mais frágil dos Du’s se levanta encarando o amigo com um olhar de desapontamento. ---- Fiquei com medo todo este tempo de te contar. Mesmo sendo amigos há muito tempo eu... Não conseguia imaginar que você pudesse me apoiar ou pelo menos me ajudar. ---- dizendo isso ele se vai fechando a porta. ---- Fico feliz de saber que meu senso básico de dedução não esta errado.

As palavras apesar de macias e adocicadas, atingiram ferozes o pequeno que apenas vê o amigo parir.

“Fui um grande idiota. Como pude tratar assim os meus amigos?” ele pensava ao se sentar sobre a cama larga e macia, nem percebendo que o maior ainda estava ali.

–--- Esta tudo bem. Eu falo com o Dudu. ---- a voz fanha do maior soa seria e um pouco triste, ele não gostava nada de ver os amigos brigando. ---- Ele andava mesmo avoado estes dias... agora sabemos o por que.

–--- Tudo bem Du. Eu que tenho de ir ate lá me explicar e pedir desculpas.

Os olhos do maior se arregalam com tal confirmação. Edu iria pedir desculpas a Dudu por livre e espontânea vontade? O próprio Edu?

Espantado e preocupado ele chega ate mesmo a medir a temperatura do amigo, preocupado com sua saúde; sendo logo repelido.

oOoOoOoOo

O frágil dos Du’s chega em casa logo abraçando o travesseiro.

Já imaginava que não haveria aceitação em seus sentimentos estranhos pela Kanker, mas receber uma repudia tão forte era algo doloroso. Começava a imaginar a reação dos demais, se um de seus melhores amigos de infância o havia tratado desta maneira... Como os outros agiriam?

Não queria nem imaginar.

Mas sua mente se perdia entre as piores fantasiais que poderia cogitar: e seus pais? Seus tão metódicos e exigentes pais, o que diriam? Eles jamais aceitariam uma jovem de classe inferior que vivia em um trailer com grandes problemas familiares e que ainda por cima fumava. No mínimo iria o mandar a um internato em Londres; e o mais correto é que o enviassem a algum tipo de reformatório militar...

–--- Por que... porque? Comigo... ---- choraminga ao apertar a cabeça entre o travesseiro macio, não conseguiria imaginar como poderia seguir com sua vida.

A cada dia seus sentimentos pela travessa Kanker aumentavam; ela o mostrava um mundo novo que ele nunca imaginou conhecer; sentimentos e atitudes que nunca cogitou ter. Não poderia de modo algum simplesmente terminar tudo... não queria.

“O escondido é divertido”; ela dizia, mas no fundo sabia que a jovem queria poder assumir ao mundo o que eles tinham e se sentia mal por manter as coisas como estavam. Questionava com o olhar: “Você tem vergonha de mim?”, mas o sempre doce Dudu não sabia como responder a uma pergunta que não era feita com palavras.

–--- Esta chorando? ---- a voz dela invade sua mente como um tapa e ele se vira assustado.

–--- N-não!

–--- Não mente... Você nem sabe como se faz isso. É muito feio quando alguém tenta fazer o que não sabe, sempre fica muito mal feito. ---- ela sorri de soslaio e logo desce da janela indo ate ele. ---- O que fizeram com você? Foi o Kevin? Aquele...

–--- Não me fizeram nada. ---- vendo que a moça já se alterava ele a pega pela mão a trazendo para junto de si. ---- Contei aos meus amigos sobre nós e... o Edu não ágil muito bem. Só fiquei imaginando o que os outros vão fazer quando souberem também.

Ele realmente não sabia mentir, então resolve ser franco sobre o que lhe atormentava. Não tinha vergonha de assumir o que sentia, mas sentia muito medo do que fariam com ele depois de souberem.

Sentia-se errado em manter o segredo; errado por vários motivos: mentir para todos que conhecia, fazer com que ela achasse que ele tinha vergonha. Mas como lutar contra aquele medo? Dudu nunca foi uma representação de coragem.

–--- Você não tem que contar nada a ninguém. Eu não estou te cobrando isso! ---- ela esbraveja ao ver o semblante abatido do namorado, claro que queria assumir o namoro mais do que tudo na vida, entretanto não queria arrumar encrencas. Bem não para os dois. Nada que pudesse atrapalhar a relação dos dois a agradava.

–--- Mas eu...? Como nós...? ---- não conseguia terminar uma única frase com coerência, seu nervosismo não permitia. Mas isso não quer dizer que ela não podia entender exatamente o que ele tentava falar.

–--- Damos um jeito... ---- confirma firme apesar de não saber como completar a frase, se sentando a seu lado, logo pegando em sua mão e entrelaçando os dedos aos dele. ---- Você não é bom em mentir, mas eu sou. E se ate você conseguiu mudar um pouco por mim... Por que não posso fazer o mesmo? ---- ela deita a cabeça em seu ombro esperando que ele conseguisse se acalmar sozinho. Já tinha se acostumado a seu modo, e não se incomodava.

–--- Marie. Eu... te amo. ---- ele pontua como um fato ainda de cabeça baixa, corado como se algo fenomenal estivesse ocorrendo ali. ---- E... não quero... que ninguém separe a gente. Nem mesmo eu, com este...

Desta vês ela o beija.

Era sempre assim, ela tinha de tomar todas as atitudes iniciais; mas era muito divertido ver como ele reagiria. Não estaria tão apaixonada se achasse estes atos ruins.

As vezes ele tentava se segurar e lutar contra seus “instintos”, outras vezes perdia completamente a cabeça; era impossível saber como iria ser sua reação.

E hoje era um destes dias.

Dudu estava triste, o amigo o repudiou; temia pelo que os pais fariam com ele e ainda tremia pela falta de ar do pequeno ataque de asma a poucos segundos.

Mas isso não o impediu de revidar o ato no mais caloroso beijo que poderia dar, roubando cada supro de ar que ela poderia ter, tomando cada pensamento que poderia possuir; trazendo-a para si em um firme abraço caindo ambos sobre a cama perfeitamente arrumada.

oOoOoOoOo

Edu nunca pedira desculpas na vida.

Sempre dava a entender com um ato ou dois de boa vontade e logo tudo estava bem novamente, mas desta vez era diferente, havia magoado profundamente seu amigo de infância.

Com Du era fácil, pagava uma porção de balas de caramelo e tudo estaria em pratos limpos, mas Dudu era frágil e meigo; esperava uma aceitação do amigo e o que tinha feito era muito longe daquilo.

Ficava remoendo todas as palavras ásperas que disse. Cada uma parecia uma pontada violenta se parasse para prestar atenção: -- Você ficou louco? Sabe o que o seus pais vão saber quando descobrirem!? O Du pode fazer o que ele quiser com quem quiser, desperdiçar a vida dele que os pais não se importam. Mas você Dudu? Eles vão te mandar pra Budapeste e nunca mais você vai ver ninguém daqui do beco. E tudo por culpa de uma Kanker nojenta que toma banho de lagoa em um balde, porque na casa delas não tem água encanada! Se você beija ela é bem capaz que pegue alguma doença grave e morra...

No mínimo tinha sido vil.

Devia ao amigo mais do que um punhado de balas, devia as palavras mais difíceis que iria falar na vida.

A casa de subúrbio bem abastada estava sempre aberta, e mesmo que não estivesse ele possuía a chave. O local sempre bem organizado e silencioso trazia um tom sombrio a qualquer um, menos para ele que já se sentia em casa por freqüentar o ambiente com freqüência, tanto que nervoso por ter de falar com Dudu, se sente muito à-vontade em abrir a geladeira e pegar um ou dois copos para matar sua sede.

As escadas ate o quarto de Dudu pareciam longas e intermináveis aos olhos do pequeno, que subia lentamente cada um dos degraus como quem se apresenta a uma execução.

Mas ao abrir a porta devidamente etiquetada não é com o costumeiro quarto organizado que ele se depara, muito menos com um Dudu choroso.