Make a Memory

Capítulo XV – O Encontro


Ao voltar para casa fui direto para meu quarto e sentei na poltrona, pensativo, me questionando...

— Quando eu me apaixonei por você, Niko? Por que me apaixonei por você? – Perguntava a mim mesmo, pois só podia ser isso. Só podia ser paixão. Como explicar com outro nome tudo aquilo que senti ao estar perto dele?

Quando?... Como?... Por quê?

Tantas questões e tão poucas respostas.

Será que mais alguém sabia disso? Dos meus sentimentos? Porque o Niko parecia saber muito bem.

Fechei os olhos e pude ver seu rosto próximo ao meu... Sua boca rosada... Seu sorriso... Sua voz... Tudo nele me trazia paz!

Como isso podia ser possível?

Eu precisava conversar com alguém.

...

— Pai? – Bati na porta do quarto esperando que ele estivesse disposto a me ouvir.

— Entre.

Entrei e fechei a porta com cuidado. Não queria que ninguém ouvisse o que eu tinha a conversar com ele.

— Tudo bem com o senhor?

— Estou como sempre. E você? Como está se sentindo? – Ele me perguntou e, por uns segundos, fiquei procurando as palavras para responder.

— Eu não sei muito bem...

— O que você tem?

— Dúvidas. Muitas dúvidas.

— Dúvidas? Sobre o quê?

Outra vez fiquei procurando as palavras... Mas, tudo era confuso demais para tentar explicar.

— Não me chama mais de Cristiano, pai?

—... É claro. Fale, Cristiano. Quais são suas dúvidas?

— Eu... Eu posso mesmo te contar qualquer coisa?

— Claro que pode. Você não disse que confiaria em mim?

— Disse, mas... Eu não sei como te falar isso.

— Como me falar o quê? É algo grave?

— Não sei se é. Acho que não, mas ao mesmo tempo... Eu tenho medo.

— Medo? De quê?

— Da sua reação.

— Não entendi...

Respirei fundo e resolvi confiar nele, apesar de uma vozinha dentro de mim que me dizia para não falar o que eu sentia para meu pai.

— Pai, me diz uma coisa... A gente sempre conversava?... Sobre qualquer coisa?

Vi-o respirar fundo como se não quisesse me responder.

— Nós... Não, não muito. Mas... Podemos começar agora, não?

— Podemos?

— Podemos. Ou... Será que é tarde demais para... Para conversarmos como pai e filho?

Aquelas palavras vindas do meu pai me faziam bem, mas me soavam tão estranhas! Era como se eu nunca o tivesse ouvido falar assim. Será que nossa relação já foi diferente? Bem, o que me importava mesmo era desabafar com alguém o que eu trazia no peito.

— Pai, eu... E-Eu acho que eu... Estou apaixonado.

Sua expressão foi de surpresa e total estranhamento, como se eu tivesse dito algo absurdamente bizarro.

— Apaixonado?

— Sim.

— Como?... Como isso aconteceu?

— Eu não sei! Por isso que eu quis vir falar com você, eu precisava falar com alguém! Eu não sei como, nem quando ou porque, eu só sei que eu... Eu sinto que... É algo que eu não sei explicar! Eu devo ter me apaixonado por e... E-Essa pessoa... Talvez até antes mesmo do acidente, e eu não me lembro!

— Antes do acidente?

— É. Será, pai? Será possível que, mesmo sem recordar, eu sinta algo mais forte que eu quando estou na presença dessa pessoa? Uma ligação, sei lá!... Como se eu quisesse muito estar junto dessa pessoa...

— Essa pessoa... Quem?

Não tive coragem de responder sua pergunta que me soou quase como se eu lhe tivesse ofendido.

— Não vai falar?

— Eu... Eu... Não sei como te dizer...

Não sei porque, mas tive a impressão de que meu pai sabia sobre o que ou quem eu estava falando. Mas, de uma hora para outra, ele se exaltou.

— Se não se lembra de nada, como pode saber que está apaixonado? Como pode saber por quem se apaixonou? Por favor, você não gosta de ninguém, isso deve ser só uma ilusão porque sua cabeça está confusa! Só isso!

Aquela exaltação repentina do meu pai me trouxe um tom de desafio na voz. Por que ele havia ficado com raiva de mim?

— Por que está falando desse jeito?

— Porque é um absurdo tudo que você disse! Pode ter as dúvidas que for, pode vir conversar comigo, agora me dizer que se apaixonou assim do nada, faça-me o favor...

— Mesmo que não compreenda, e eu também não compreendo, essa é a verdade. Se eu não me apaixonei, eu, pelo menos, sinto algo muito... Muito intenso, m-muito estranho, muito inexplicável por essa pessoa...

— Não pode ser!

— Não pode ser o quê, pai?...

— De novo não! – Ele ficou nervoso.

— Espera! De novo não o quê? – Fiquei de frente para ele, encarando-o. – Por acaso, você sabe de quem estou falando? Você sabe se eu já... Já tinha ou tive algo com essa pessoa? Se eu...

— Chega! Chega! Para de falar disso! Você é o Cristiano, não é? Cristiano Khoury! Você não pode se apaixonar por outro homem!

Sentei na cama dele, atordoado com as palavras do meu pai que pareciam mais confusas que as minhas.

— O que quer dizer? C-Como você sabia que eu falava de outro homem?

Ele se calou e virou o rosto. Eu poderia jurar que ele havia se arrependido do que tinha dito.

— Pai! Me responde! Como sabia que era por outro homem que eu havia me apaixonado? Então... Eu já gostava dele antes mesmo do acidente? É isso?

Ele continuava calado.

— Pai... Pai, por favor, fala alguma coisa! Eu só queria conversar com você, tentar entender o que eu estou sentindo. Porque eu sinto que... Que nada é meu. Nada do que eu vivo sou eu. Mas, às vezes, imagens, vozes, cenas, vêm a minha mente sem que eu consiga controlar... E eu me pergunto nessas horas... Quem sou eu? O que eu preciso fazer para descobrir?

— Por que se pergunta quem é? Você é o que é... E nada mais. Eu não posso te mudar. Nada pode.

Meu pai falou em tom de derrota e ressentimento. Não entendi o que ele queria dizer, mas fiquei pensando naquilo. Passei a achar que a ideia de falar sobre tudo com ele não tinha sido a melhor das ideias. Então saí do seu quarto para deixá-lo sozinho, pois parecia que era o que ele queria.

Voltei ao meu quarto com um objetivo... Eu só tinha agora uma pessoa a quem deveria encontrar para me dar uma luz: o Niko.

Meu pai... Praticamente havia me confirmado que eu já era apaixonado por ele. Meu filho... Havia me levado para vê-lo e me deixado a sós com ele. E meu espírito... Era preenchido pelo desejo de estar com ele. Parecia até a santíssima trindade da verdade, da vida e do amor. Minha verdade, minha vida... E, talvez, meu amor.

Porque você é tão importante para mim, Niko, eu não sei. Mas, eu sinto uma coisa... Minha vida não é nada agora, não tem sentido nenhum. E é você quem vai mudá-la.

...

...

...

À Noite...

Eu não andava e sim corria de um lado a outro, ansioso como um adolescente no primeiro encontro.

— Pronto, seu Niko. Já arrumei lá o quarto dos meninos...

— Ótimo, Adriana! Muito obrigado!

— Imagina, seu Niko! Olha, eu tô torcendo pra que o seu Félix volte com o senhor.

— Deus te ouça! Mas, primeiro ele tem que voltar a ser quem ele realmente é, para aí voltar a ser meu.

Jayminho veio correndo em minha direção.

— Papai, o acampamento tá pronto. Por que você não vai acampar com a gente?

Eu tinha combinado com a Adriana de brincar de acampamento com o Jayminho no quarto dele até ele dormir, e claro, levar o Fabrício para lá também. Assim ele brincaria com o irmãozinho a ainda a ajudaria a cuidar dele enquanto eu estaria no meu jantar com o Félix.

— Ah, Jayminho, é que hoje eu tenho um jantar importante e não vou poder brincar com vocês. Mas, no dia da folga da Adriana eu é que vou brincar de acampamento com você e seu irmãozinho, tá bom?

— Tá bom.

— Tá combinado então? Bate aqui! – Batemos as mãos e eu combinei mais uma coisinha. – Ah, e mais uma coisa, Jayminho... Quando estiverem lá no quarto é pra brincar e depois ir dormir, tá? Nada de ficar saindo do quarto, nem desobedecer a Adriana. Só ela vai poder sair de lá se precisarem de alguma coisa, ok?

— Ok.

— Isso! Me dá um abraço de boa noite, filho.

Demos um abraço e ele correu de volta ao quarto. Foi só meu filhote sair de cena que eu voltei a ficar ansioso.

— Ai, ai, ai... Não vejo a hora de ele chegar. Eu estou bem assim, Adriana?

— Tá ótimo, seu Niko.

— Não acha que eu deveria me vestir diferente? Sei lá... Mais chamativo ou mais discreto?... Já sei! Tive uma ideia! Sabe onde está aquele meu casaco de capuz?

— Qual deles?

— O prateado! O que eu usei no dia que o Félix veio jantar aqui e... E ficou pra dormir...

— Ah, sei... Eu vou pegar pra o senhor.

— Ah, obrigado, vai lá. Eu vou ver como está o jantar.

...

...

...

Na casa dos Khoury...

— E aí, pai? Pronto para ir à casa do Niko? – Jonathan entrou no meu quarto me perguntando o que eu também me perguntava: eu estaria pronto para ir a casa dele? Estaria pronto para conversar sinceramente, tirar minhas dúvidas, falar do que eu sentia?

— Eu... Não sei se estou pronto.

— Tô vendo, você nem se vestiu ainda. Por que está de roupão?

— Porque eu não sei se vou! – Falei logo numa tentativa de fuga que, na verdade, eu não queria que se concretizasse. Eu queria muito ver o Niko, mas eu tinha tanto medo do que poderia acontecer.

— Como não sabe se vai, pai? Você tem que ir!

— Por que eu tenho que ir, Jonathan? Me fala a verdade!

—... De que verdade está falando?

Respirei fundo e perguntei de uma vez: - O que eu tinha com o Niko?

— Oi?

— É isso que você ouviu. Eu tinha alguma coisa com o Niko, não tinha? O quê? Eu... E-Eu não queria falar sobre isso com você, você é meu filho, mas... Você já é um adulto, pode me responder isso perfeitamente. E pelo jeito você sabe responder a minha pergunta sim.

— Q-Qual pergunta, pai?

— Que tipo de relacionamento eu tinha com o Niko? Porque eu estou duvidando de que era só amizade.

Fiquei esperando uma resposta que parecia difícil de sair da boca dele. Ele, claramente, procurava as melhores palavras para me falar. E eu insisti.

— Você sabe me dizer se... Se eu tive um relacionamento com ele? Hein, Jonathan? Eu tive uma relação com outro homem? Eu sou... Gay? Bissexual? O quê, o que eu sou?

— É.

— É o quê?

— Você é gay.

Aquela afirmação não me surpreendeu tanto depois de tudo que eu havia sentindo.

— Mas... Eu... Como?...

— Você se casou com minha mãe, mas praticamente obrigado. Vocês nunca se amaram. Foi meio que por mim...

— Por você?

— Porque ela engravidou. E você se casou com ela.

— Mas... – Lembrei a reação que meu pai havia tido momentos atrás. – Jonathan... Todo mundo sabe? Sempre souberam que eu era gay?

— Não. Quer dizer... Suspeitar todo mundo suspeitava, né? Mas, daí a concordar e, acima de tudo, respeitar...

— Não tô entendendo...

— Pai, eu não vou mentir, as pessoas geralmente percebiam que você é gay, você nunca foi muito discreto, digamos assim. Só que você tentava. Mantinha as aparências com minha mãe e... Bom, a família colaborava.

— Como?

Ele me olhou nos olhos, parecia triste.

— Ah, pai... Como vou te explicar? Eu não quero que você fique triste...

— Meu filho, eu já estou triste por não lembrar o meu passado. Por favor, me conta tudo.

— Pai... Sabia que as formigas deixam um rastro quando passam para outras formigas seguirem?...

— O que isso tem a ver?

— Se nós fossemos formigas, nossa família deixaria um rastro de mentiras pelo caminho.

Aquelas palavras em deixaram preocupado. – Por que diz isso?

— Porque é a verdade. Aqui todo mundo sempre fingiu ser o que não era. Sempre fingimos ser a família modelo de perfeição... Sendo que estávamos longe disso. Você mesmo... Você fingia ser algo que não era. Sempre fingiu. E assim nunca foi feliz.

— Nunca fui feliz?

— Não. Até conhecer o Niko.

— O Niko? Então ele é mesmo muito importante para mim!

— É demais! Ele foi um divisor de águas, ele... Ele mudou sua vida.

Tal revelação me fez ter vontade de saber mais.

— Como ele mudou minha vida? Ele e eu...

— Pai, certas coisas você só vai descobrir com ele. E, talvez, com o tempo. Continua tentando recordar. Eu sei que deve ser um esforço enorme pra você e você deve ficar cansado, mas vai valer a pena quando você voltar a ser quem deve ser. – Ele me olhou nos olhos, com os dele cheios de lágrimas. – Vê se volta logo... Eu tô com saudade do meu pai.

Abracei-o agradecido por ele ter me dado uma luz em meio a tanta escuridão.

— Oh! Obrigado, meu filho. Mesmo que eu não compreenda tudo que você me diz, eu já fico muito feliz só por você ter falado comigo e se mostrar esse filho espetacular que você é.

— Imagina... Eu te amo, pai. E quero te ver como você sempre foi outra vez. Portanto você vai a casa do Niko, não vai?

— Eu quero ir. Mas, acho que... Sei lá, tenho um pouco de medo de não saber como agir, o que falar... Eu ainda nem escolhi a roupa!

— Hum... Não fica pensando muito. Eu sei que ele vai te ajudar bastante. E aí? Quer que eu te ajude?

— Pode ser.

— Deixa eu ver... – Ele abriu meu armário, ficou olhando até que tirou algumas peças, as quais ele colocou em cima da cama para me sugerir. – Escolhe uma dessas, você fica bem com essas roupas.

Olhei para aquelas roupas e dentre elas estava aquela que eu senti um arrepio quando toquei ao voltar para casa.

— É com essa que eu vou.

...

...

...

Algum tempo depois...

Eu já estava sozinho na sala esperando cheio de anseios que o homem da minha vida batesse a minha porta.

— Está ficando tarde!... Por que ele não chega? Será que não vem? – Eu me perguntava mesmo não tendo sequer marcado uma hora exata com ele.

— E se ele não vier? Será possível que ele esqueça o nosso encontro? Ou será que ele vai fugir, desistir?... Se ele não vier como ele vai se lembrar de mim?

As angústias inevitavelmente davam voltas em minha mente. Era um lado que me dizia para continuar tendo esperança, e outro que me dizia para me conformar e esquecer.

— Como eu poderia esquecê-lo se eu o amo?

Sempre que fazia a mim mesmo essa pergunta uma tristeza enorme tomava conta de mim. Afinal, se ele me amava tanto quanto eu a ele... Como ele havia me esquecido?

Mas, de certo modo, eu conseguia compreender seus problemas. Conseguia compreender toda a vida atribulada que o havia levado a essa condição incomum. E o objetivo da minha vida nesse momento era trazer de volta a verdadeira vida do meu amado Félix.

— Por favor, vem meu amor. Vem pra mim. – Eu pedia quando a campainha tocou!

Fui rápido atender a porta com o coração saltitante de emoção.

— Oi!

É ele! Ele veio! Ele não fugiu de mim, ele veio mesmo! Eu sentia como se fosse cair para trás e ao mesmo tempo flutuar.

— Oi!

Sei que ficamos uns segundos nos olhando sem dizer nada... Mas, eu nem vi o tempo passar. Fiquei admirando-o. Que lindo! Ele estava com a mesma roupa que usou na nossa primeira noite! Quanta emoção!

— Posso entrar? – Ele indagou daquele jeitinho meio tímido e charmoso que estava me encantando.

— Ah! Sim, claro, entra!

Dei passagem e ele entrou em minha casa olhando para todos os lados. Vi sua expressão mudar e ele ficar muito sério antes de comentar:

— Eu me lembro...

Aquelas três palavras me causaram um arrepio.

— V-Você se lembra? De quê?

— De já ter estado aqui.

— Ah... Disso? – Infelizmente ele não havia recordado tudo que eu gostaria, mas já era um começo. – Que bom, né? Que você se lembra... É... Como você chegou aqui?

— O Jonathan me trouxe. Eu queria ter chegado às oito horas, mas como ele não dirige muito bem ainda, demorou um pouco porque ele veio devagar para não causar um acidente.

— Ah, sim. Menos mal! De acidentes estamos cheios, não é?

Ele sorriu e balançou a cabeça concordando. Eu sabia que eu devia estar quase babando por ele, mas também sabia que poderíamos ficar mais à vontade. Chamei-o para a mesa para jantar comigo sem perceber que ele me olhava diferente.

...

...

Segui-o até a mesa que estava muito bem posta, muito bonita. Mas, não era exatamente na mesa em que eu mais prestava atenção.

— Espero que goste. – Ele me servia e eu, sem jeito, sem saber como começar uma conversa com ele, não tirava os olhos dele. Queria observá-lo a cada instante. Queria que ele se abrisse comigo sobre o que realmente havia entre nós.

— Parece muito bom. Obrigado. – Agradeci após ele me servir e se sentar.

— De nada.

— Niko... – Eu queria muito dizer-lhe que não aguentava mais de curiosidade para saber o que existia entre nós, mas, tudo que eu tive coragem de falar foi: - N-Não está com calor com esse casaco?

Mas, que tipo de bobagem é essa para se falar?!

...

...

Que bobo que eu fui pensando que ele poderia ter um flashback por me ver com esse casaco prata! Mas, é claro que não... Ele nunca gostou muito das minhas roupas.

— É... Você tem razão, está calor. Eu só... Nada. Deixa. Eu vou tirar, é só um minutinho.

— Tudo bem, eu só comentei...

— Não, tudo bem, você está certo. Foi besteira minha vestir isso. É que, às vezes, eu acho que meu corpo não está muito legal, sabe como é... Mas, eu já volto. É rapidinho.

...

...

Ele levantou da cadeira e correu para outro cômodo da casa, provavelmente o quarto. Confesso que por uns segundos tive vontade de ir atrás dele, mas... As dúvidas sempre me paralisavam! Eu ainda pensava no sim e no não quando ele voltou.

— Voltei. Estava mesmo ficando muito quente com aquele casaco. Acho que agora estou bem melhor.

Ele voltou com uma camisa polo azul que combinava perfeitamente com a pele dele e com aquele cabelo dourado cheio de cachinhos...

— Está bem melhor assim. – Acabei concordando com ele quase na forma de um elogio. Eu queria muito mesmo dizer o quanto ele estava bonito, mas... Como é difícil lidar com o desconhecido! Ele ainda é um desconhecido para mim, assim como o que eu sinto por ele.

...

...

Continuamos jantando calmamente, falando de coisas banais. Mas, só de vez em quando, pois o Félix quase não abria a boca. Tanto silêncio era tão estranho para ele que sempre foi tão falante! Eu só sabia pensar em como quebrar o gelo, em como me reaproximar dele sem assustá-lo. Mas, não tinha como o fazer recordar algo sendo sutil demais.

Ao terminarmos o jantar, pedi que me ajudasse a retirar a mesa e levar os pratos para a cozinha. Ele foi me seguindo e eu decidi dar uma ajudinha à memória dele...

— Você gostou mesmo do jantar?

— Gostei, estava ótimo!

— Espero que também goste da sobremesa. Você me ajuda a pegar na geladeira?

— Sim.

— Espera. Antes experimenta um pouquinho para ver se você gosta disso. – Peguei um copinho da sobremesa que eu havia preparado, passei o dedo no creme de leite e ofereci a ele que, como que já soubesse o que era para fazer, pegou em minha mão e chupou o meu dedo.

Eu mal podia acreditar que aquela cena estava ocorrendo de novo!

...

...

Fazer aquilo me trouxe uma lembrança! Não uma imagem, mas uma sensação. Uma sensação boa e quente. Todo meu corpo se aqueceu naquele gesto.

— Está gostoso? – Ele me perguntou olhando fundo nos meus olhos e eu sei que fiquei ruborizado ao soltar a mão dele. Nem consegui responder, só afirmei com a cabeça e dei um passo para trás.

O que é isso ele me causa?!

Ele não teve reação nenhuma com o que fiz! Por quê? Talvez eu já tivesse feito isso antes. Talvez ele já estivesse acostumado com tanta intimidade entre nós. Talvez...

Respirei fundo e decidi: Talvez fosse a hora de eu parar de ter medo e falar de uma vez por todas tudo que eu queria tanto saber. Afinal, eu não tinha culpa de ter me esquecido dele.

— Niko!...

— Hã?

Travei de novo! Droga! Eu preciso falar sobre o que está martelando aqui!

...

...

Vi que ele estava com dificuldades para se expressar e tentei confortá-lo.

— Pode falar o que quiser. Confia em mim.

— Eu... Posso... Posso te fazer uma pergunta?

— Claro que pode!

De novo com isso? Ele insistia em repetir as palavras da primeira noite que passou comigo. O que eu não daria para saber o que se passava na sua cabeça.

— E-Eu... Queria te pedir uma coisa...

— Pede, então. – Me aproximei mais dele.

— Você... Eu... Ah!... – Ele suspirou profundamente quase desesperado para falar algo que não conseguia.

— Ei!... – Toquei no rosto dele com ambas as mãos trazendo-o para mim. – Fala! Fala o que tá se passando aí dentro. Se abre comigo.

...

...

Eu queria tanto pedir uma coisa, mas não tinha coragem!

E ele estava tão perto de mim...

...

...

O que ele queria me dizer e não conseguia? O que queria me pedir?

Eu estava tão perto dele... Tão perto que não resisti mais à imensa saudade e deixei nossas bocas se aproximarem instintivamente até se tocarem num beijo.

...

...

Quando nos beijamos senti como se um choque de sensações tomasse conta de mim. Meus olhos se fecharam e eu me deixei levar pelo sabor dos seus lábios...

Como ele sabia que era exatamente isso que eu queria pedir?

...