Make a Memory

Capítulo III – A última briga


No caminho de casa, muitas coisas se passavam em minha cabeça. O carneirinho não havia me deixado falar para ele que eu pretendo levar o papi para morar conosco quando nos mudarmos para a casa em Angra. Era importante ele saber disso e ele simplesmente nem me deixou falar. Também... Veio com todo aquele chamego, jogando charme pra cima de mim e... Nossa! Sexo com o Niko é bom demais! É de outro mundo, sei lá... Ele me faz esquecer todos os problemas. É como se no mundo só existíssemos ele e eu... E eu adoro pensar assim às vezes. Imaginar que somos só nós dois. E que cada vez que eu me sinto mal ele vai lá e me resgata. Me abraça, me beija e me faz feliz como eu nunca fui.

Eu me sinto tão bem por tudo que aconteceu na minha vida ultimamente. Eu não esperava ter uma segunda chance... Quanto mais uma segunda chance tão cheia de presentes. O carneirinho, o Fabrício, Jayminho, Mary Jane... Como eu os amo!...

Engraçado... Me sinto tão estranho quando penso nisso. Eu os amo. Amo de amar de verdade, amo como nunca amei ninguém... Nem a mim mesmo. Me sinto estranho, mas é bom. Me sinto confuso também. Como eu mereci tudo isso? Como? Quando? Por quê?...

Sempre que me pego fazendo tais perguntas me lembro das palavras do carneirinho na nossa primeira noite juntos... “Sentimento é assim mesmo... Não tem explicação... Só existe.”

Quando penso nisso, compreendo um pouco essa coisa louca chamada amor. Entendo porque alguém como o Niko valoriza tanto esse sentimento. Porque ele é bom. O sentimento e a pessoa que o tem. É muito bom.

E o melhor de tudo é que mesmo compreendendo o quando, o como e o porquê do sentimento... Ainda assim é um sentimento incompreensível. E incompreensível é também o quanto eu me sinto um homem bom, como o carneirinho diz, só por ser capaz de amar.

Ah! É o apocalipse eu estar divagando sobre essas coisas dentro do carro no meio do trânsito infernal de São Paulo! Felizmente já estou perto da casa de mami poderosa. Espero que dessa vez o papi não tenha notado minha ausência. Eu não aguento mais brigar com ele. É nessas horas que eu me sinto mal até por estar me sentindo tão bem. Mesmo com todas as diferenças que tivemos, eu não queria ver o papi soberano no estado em que ele está agora. Às vezes eu queria ser aquele Félix que não pensava em ninguém... Se pelo menos eu tivesse conseguido ser assim um dia. Porém, eu sempre estava pensando em alguém quando fazia alguma coisa... Para o bem ou para o mal. E mais para o mal, claro. ... Como fui burro! Eu nunca pensei realmente em mim, nos meus sentimentos... E eu já chamei o carneirinho de bicha burra, olha só!... A bicha burra era eu que fazia de tudo para chamar a atenção, ainda mais de um homem que nunca vai me amar como deveria... Meu próprio pai.

Conformado em sair do meu conto de fadas com meu príncipe loiro fabuloso e voltar para o mundo real do pai jaz soberano que esculacha o filho por n motivos, entrei em casa após estacionar o carro. Cruzei os dedos torcendo para que o papi ainda estivesse quietinho no quarto dele e de bom humor, embora isso já fosse pedir demais.

Eu havia ficado muito mal depois da nossa última briga. Eu disse ao carneirinho que já estava acostumado e que não iria mais chorar... Mas, era muito difícil não ficar de coração partido quando eu pensava nas palavras do papi e sabia que, se ele pudesse escolher, não me teria como filho.

...

— Mami? – Chamei-a quando a vi descendo as escadas. – Bom dia!

— Bom dia, filho!

— Já levaram o café da manhã do papi? Eu vou vê-lo para depois ir descansar um pouco.

— Descansar? Não acredito que está cansado a essa hora!

— Ah, mami, se você soubesse... O carneirinho não me deixa dormir, sabe...

— Entendi. – Ela riu sabendo muito bem a que me referia. – Olha, você não vai acreditar! A Paloma veio, disse que queria conversar com ele e acabou convencendo-o a sair um pouquinho para o jardim e tomar o café lá fora.

— Não me diga! Isso sim é um verdadeiro milagre! É sério isso?

— É sim.

— Que coisa!... Mas, claro, né... Se tratando da Paloma...

— Ei, filho...

— Eu sei, mami, eu sei, não estou com ciúmes. Talvez só um pouquinho. Mas... Eu sei desde que me entendo por gente que não sou o filho favorito do papi soberano. Nem que eu fosse filho único eu seria o favorito, então... Enfim, eu vou ver como ele está... Ou você acha melhor não?

— Você que sabe, Félix. Olha, a Paloma só conseguiu convencê-lo porque disse que queria conversar sobre a gravidez dela. Você sabe que é delicada e mesmo no estado que o César está ele tem sua experiência como médico.

— Eu sei. E... Está tudo bem com ela? Com o bebê? – Sempre sinto uma pontada de arrependimento quando lembro que a Paloma está grávida de novo e precisa ter seu bebê nos braços dessa vez. É sua última chance, pois a primeira eu lhe tirei.

— Está, eles estão bem. E você? Por que não vai logo trocar essa roupa, descansar um pouco e aí você vem. Não acredito que o César vá querer ficar muito tempo lá fora.

— Isso com certeza. Bom, então eu vou para meu quarto, mami. Depois eu desço, tá?

— Tá bom. – Ela me deu um beijo na testa, me mimando como sempre. Se tinha uma coisa que não havia mudado em mim e acho que nunca mudará, é o fato de eu gostar de ser mimado.

Corri para o quarto, troquei a roupa e me deitei em minha cama. Não podia negar que ainda me sentia um tanto triste, frustrado talvez. Eram as brigas constantes com o papi e tantas decisões a tomar... Por um lado, ter uma nova vida com o meu amado carneirinho, por outro, tomar conta da vida do papi para sempre. Eu não tinha a mínima segurança se ia conseguir dar conta das duas coisas, mas era o que eu precisava fazer.

Fiquei pensando nisso, nas minhas indagações, mas, como eu não gosto de ficar pra baixo, e já estava bastante, eu tratei de recordar a única coisa que me fazia sorrir sozinho... O rosto e o corpo lindos do meu carneirinho, a paixão que sinto quando olho naqueles olhos e todo o amor que ele tem por mim, assim, de graça, sem querer nada em troca. Isso é o que mais me deixa feliz. Claro que lembrar as nossas noites de amor também me deixa bem alegrinho. Fechei os olhos e vi a imagem dele tirando a roupa, todo sensual, depois em cima de mim... Aquela expressão de prazer no rosto... E antes então quando foi se agachando olhando nos meus olhos e me abocanhou... Ai, que delícia!... Que deleite... Ah! Meu carneirinho... Não vejo a hora de estar com você de novo, e para o resto da minha vida...

— Félix!

Levantei depressa quando ouvi o chamado. Eu já estava quase cochilando aqui quando levei um susto ao baterem na minha porta!

— O que foi? – Perguntei ao abrir. Era mami poderosa.

— Filho, o seu pai te viu chegar e quer falar com você. Acho melhor você descer. Ele ainda está no jardim.

— Ele... Ele me viu?

— Viu. E pode imaginar como ele está...

— Imagino. – A angústia de antes voltou a mim. Havia mais uma coisa que eu não havia contado para o Niko, nem para mais ninguém. Era só entre mim e o papi. E provavelmente era sobre isso que ele queria falar. Desci rápido e fui ao seu encontro.

...

...

— Queria me ver, papi soberano?

— Já disse para não me chamar assim. – Ele foi respondendo logo da forma mais grosseira que podia. É a única forma que ele sabe falar comigo.

— Como quer que o chame, então? Doutor César? Se quiser marco hora também...

— Não me venha com gracinhas que você não tem graça nenhuma!

— Tudo bem! O que é?

— Eu vi quando você chegou de manhã...

— Para quem está enxergando tão mal o senhor até que vê muita coisa, não é não?

— Cala a boca, Félix, que eu estou falando!

Calei-me para que ele falasse tudo que ele bem quisesse. Sei que não deveria mais me importar, mas era mais forte que eu.

— Fale.

— Mais uma vez você dormiu fora de casa.

— Não sou mais nenhum adolescente para o senhor se preocupar com isso.

— Nunca me preocupei com o que você faz ou deixa de fazer, não vai ser agora que vou me preocupar.

Cada coisa que ele dizia me machucava por dentro como se pisassem no meu coração. Sempre senti isso e ele nunca se importou.

— Então? Pra que me chamou?

— Você sabe muito bem. Você me falou dos seus planos de se mudar para a casa em Angra dos Reis...

— E falei que quero lhe levar para lá...

— E eu lhe disse das minhas condições para ir.

— Hum! É o apocalipse, papi, que eu queira te levar para cuidar de você, te ajudar, e você me vem com condições!

— É a única maneira de eu ir, Félix! Eu nunca vou aceitar morar na mesma casa que você e um... Um qualquer...

— Um qualquer não! É o meu namorado, eu já te disse!

— Namorado... Coisa mais absurda!

— Absurda por que, hein? Por que ele é um homem e eu também? Grande coisa, doutor César!

— É por isso sim, isso é absurdo, é nojento, é ridículo!

Minha paciência já estava se esgotando. Segurei nos braços da cadeira de rodas e fiquei bem de frente a ele. – Ridículo é um velho se deixar enganar por uma mulherzinha que tem um filho dele só para tirar tudo que ele tem!

Sei que a verdade dói, mas era o que eu queria mesmo jogar na cara dele naquele instante. A verdade. E claro que ele não me perdoaria.

— Você não tem o direito de falar assim comigo!

— Ah, eu não citei nomes, doutor César, mas se a carapuça serviu...

— Você não sabe o que diz! - Ele gritou.

— Ah! Eu que não sei o que digo? É o apocalipse mesmo!

— Pelo menos eu amei a Aline e você que só está com esse tal aí por safadeza.

— Safad... O quê?! Eu amo o Niko!

— Ama?... Faça-me rir, Félix! Você não ama ninguém.

E cada vez ele tratava de pisar mais e mais em mim e nos meus sentimentos. Eu não estava mais sabendo lidar com tanta dor.

— Eu não amo? Eu que não amo, doutor César? Vamos recomeçar essa briguinha então? É assim? Ok. Então, escuta. Eu amo minha mami poderosa, amo o meu namorado, amo os filhos dele, amo meu filho Jonathan, até a Márcia, minha ex-babá, eu amo de paixão. E você, hein? Que não foi capaz de amar nem o próprio filho, hein? Fala! Quem aqui que não ama ninguém?

Ele levantou o olhar para mim e mesmo sabendo que ele não conseguia me enxergar direito, senti medo. Acho que a convivência com o Niko havia me feito alguém mais sensível e, sendo assim, mas suscetível aos ataques do doutor César.

— Como queria que eu te amasse se eu nunca quis um filho como você?

Ele falou da forma mais fria possível. Naquela hora não era só a vista dele que estava embaçada, a minha também... Pelas lágrimas que teimavam em aparecer sem que eu quisesse.

— S-Sabe... Eu fiquei muito tempo da minha vida me perguntando o que eu tinha feito de tão errado para o senhor não gostar nem um pouquinho de mim... Mas, hoje eu sei o que foi... Foi o simples fato de eu nascer, não foi, doutor César? O senhor nunca me suportou!

Ele virou a cabeça para o lado como se não quisesse me responder. Eu precisava de respostas.

— Fala! Não foi isso? Você nunca me suportou, nunca nem me quis! Pelo senhor eu não teria nem nascido, não é?

— Não! – Ele gritou na minha cara. – Eu nunca suportei esse seu jeitinho, suas manhas, seus problemas. E o pior de tudo foi quando perdi meu primeiro filho e percebi que você jamais seria igual a ele.

E a resposta veio como um tiro no meu peito. Pelo menos doeu tanto quanto se fosse. Eu não queria chorar, não iria chorar. Mesmo que lágrimas escorressem contra minha vontade pelo meu rosto, o choro, a decepção, a raiva, a revolta, tudo estava contido em mim. Me sufocava... E doía. Doía demais.

— E-Eu já te perguntei isso uma vez, mas vou perguntar de novo... Se você pudesse trocar a vida do Cristiano pela minha... Você trocaria?

Vi outra vez meu pai virar a cabeça para o lado sem querer me responder. Aquilo me revoltou de uma maneira que eu tive que gritar as verdades na cara dele.

— Você não entende? Eu estou aqui, eu estou tentando te ajudar, eu estou vivo! O Cristiano morreu, entendeu? Morreu! Ele morreu e não vai mais voltar! Sou eu quem está aqui, quem sempre esteve aqui, e quem o senhor ignorou a vida inteira!

— Cale a boca, Félix! – Ele gritou e depois falou normalmente, mas para mim ainda era como gritos que me estremeciam por dentro. – Você não sabe, não conhece a dor de perder um filho...

— Se fosse eu?... Vamos supor... Se fosse eu que tivesse morrido, se fosse meu carrinho de bebê que tivesse caído na piscina e eu tivesse me afogado, o senhor sentiria essa mesma dor?

—... Provavelmente.

— Provavelmente? – Eu não sabia se gostava dessa resposta ou a repudiava. – Como assim provavelmente?

— Teria me doído perder um filho de qualquer maneira. Mas, você ainda era só um bebê e eu não tinha como saber como você ia ficar quando crescesse.

Aquilo tudo estava me matando.

— Eu não acredito que o senhor disse isso...

— O que você quer? Que eu minta? Você quem entrou nesse assunto, agora aguente o que tenho a dizer. A morte do Cristiano me doeu muito porque ele já era maior, era meu primogênito, e eu conhecia a personalidade daquele garoto, ele se tornaria um homem como eu. Já você... Você é uma decepção como homem. Olha onde você passa quase todas as noites, atracado com outros homens...

— Não é com outros, é apenas um, e é o meu namorado!

— Isso não é namoro, por favor! Não existe namoro se não for entre um homem e uma mulher! E mesmo assim, você já teve seus casinhos com outros por aí, ou vai dizer que estou mentindo?! Você mesmo tratou de colocar um dos seus casinhos para trabalhar no hospital quando foi presidente.

Tentei respirar, mas estava difícil. – E-Eu... Eu devo ter jogado pedra na cruz para o senhor vir me lembrar dos meus erros do passado! Aquele lá foi um erro e para seu governo eu não tinha casinhos como o senhor diz, ok? Era apenas um.

— E quer dizer o quê? Que era fiel ao seu amante? Faça-me o favor, Félix, você traía a sua mulher com um macho e devia fazer outras coisas que não vale a pena citar...

— Era só o que me faltava! Vai defender a Edith também agora? Chega, papi! Chega porque essa conversa está tomando um rumo muito estranho!

— Chega digo eu! Eu não estou aqui para defender ninguém, mas para falar do seu comportamento.

— Meu... Do meu o quê? Meu comportamento? Ah! Não sabia que sua especialidade era a psicologia, doutor César...

— Não seja cínico! Sabe muito bem do que estou falando! Se pensa que vai se mudar para a casa de Angra com o pretexto de me ajudar e sua verdadeira intenção for me jogar em um lugar qualquer e continuar levando a mesma vida que você leva, está muito enganado!

—... C-Como?! Do que está falando?

— Estou falando que eu acho que essa sua ideia de morar em Angra nada mais é que um pretexto para continuar levando essa vidinha nojenta que você leva, conseguir alguém que te banque, é isso!

A suspeita do papi havia acabado de destruir minha alma.

— N-Não... Não pode ser!... É isso o que você pensa?

— É.

— Então... Acho que não entendi direito ou não quero entender. Você pensa que eu quero ir para Angra dos Reis para arrumar um rico que me banque? Está dizendo que vou me vender, é isso?

—... Isso se você não já se vendeu?

— Como é?

— Você mesmo, quando me falou desse seu tal namoradinho, disse que ele é dono de um restaurante, não disse?

— Disse...

— Então? É claro que você não estaria andando com alguém sem dinheiro, não é, Félix?

— Está insinuando que eu estou com o Niko só por interesse?

Ele ficou calado, mas claramente confirmou. Juro que senti vontade de levantar a mão e desferir um soco na cara dele, mesmo sendo meu pai. Mas, mesmo que eu quisesse fazer isso eu não tinha mais forças.

— Q-Que... Que parte de eu amo aquele homem você não entendeu? E não me venha com “você não ama, ninguém” de novo, porque eu sim sou capaz de amar alguém! Bem diferente de você!

— Não importa o que você diga. Se quer mesmo ir para Angra, vá. Mas, eu só vou se você fizer as coisas direito.

— Ah, como se o senhor tivesse muita escolha!

— Se quiser me enfiem num asilo, onde bem entenderem. Mas, do jeito que você quer, eu não vou.

— E o que é fazer as coisas direito pra você, hein, doutor César? Por acaso eu devo acatar suas ridículas condições de largar o meu parceiro, esquecer todos os meus planos com ele e ficar servindo de seu enfermeiro para o resto da minha vida?

— Nunca disse para ser meu enfermeiro! Aliás, nunca sequer pedi sua ajuda para nada. Mas, se quer mesmo me ajudar, sim, faça todo o resto. Não vou nem entrar no mesmo lugar onde você vive com outro homem.

Eu tentei fazer uma piada, rir de desespero talvez, mas nem sorriso nem lágrimas saiam mais. A dor estava me consumindo por dentro, junto com um ódio e uma tristeza que eu não queria sentir, mas não conseguia evitar.

— Quer saber... Papi soberano... – Enfatizei ao chamá-lo assim de propósito. Ele ia abrir a boca para reclamar, mas o interrompi. – Dane-se se você não gosta que eu lhe chame assim, não estou nem aí pra você! E já que não gosta de nada do que eu faço, que não pode me aceitar do jeito que sou e nunca vai aceitar viver no mesmo lugar que eu e a pessoa que amo, muito bem. Prepare-se para ir amanhã mesmo para um asilo, pra um abrigo ou pra o raio que o parta! Porque eu é que não vou mais ficar servindo de capacho para você! Essa é a nossa última briga, ouviu? Porque agora sou eu que não estou mais disposto a te aguentar! Eu era sua única esperança de viver o resto dos seus dias numa casa, num lar, doutor César... A Paloma tem a vida dela, a mami não tem obrigação nenhuma de te deixar aqui e eu... Eu vou ser feliz! Entendeu? Eu vou ser feliz com o homem que amo e com a família que ele me deu. E não se preocupe que já que sou o filho que nunca quis ter, de agora em diante será como se nunca tivesse tido. Ouça-me pela última vez chamá-lo de papi soberano, porque essa é a última vez que me vê. Adeus, doutor César Khoury. Aproveite seu resto de vida, se é que pode!

Me virei e a passos firmes entrei em casa, tratando logo de pegar a chave do carro. Eu só queria sair dali o mais rápido possível e ser acalentado pelo meu carneirinho. Só ele podia me reconstruir, pois eu estava despedaçado.

— Filho, filho, o que houve? – Mami veio em minha direção.

— Eu não aguento mais!

— Vocês brigaram de novo, não foi? Eu ouvi um pouco, mas não entendi bem o que aconteceu...

— O que aconteceu... Não. O que vai acontecer.

— O que foi, Félix? Você está muito alterado.

— O que foi é que de hoje em diante eu não tenho mais pai.

— O quê?

— É isso que você ouviu, mami. Agora, com licença, eu preciso ir. E saiba que eu amo a senhora, mas para essa casa eu não volto mais.

...