Magic Mystery Theatre

Capítulo 11 - A Força do Homem.


Poderia dizer que é simples fazer estas aplicações... São dolorosas e demoradas. Cada tatuagem demora uns doze dias para ficar pronta. O pior é a ardência. Depois de um mês, exibo a minha tatuagem para receber o beijo da Lua e do Sol. Como num encanto, a mesma some na pele. Ou melhor, dos olhos dos outros, pois dos meus, os desenhos dançam e penetram sob a carne e ossos.

É poder... Gosto disso...

O meu mestre dizia que a tintura é perigosa, como também as tatuagens. Ele dizia que os desenhos poderiam tomar Vida própria, como alguns grimórios. Carlos dizia muitas coisas. Porém tem uma coisa que não sabe...

Os desenhos já estavam vivos. A tintura faz isso. Todas as tatuagens são indivíduos que são obrigados a me servir, por uma condição rara, o meu sangue é complemento de controle do poder. Se eu morrer, as criaturinhas morrem junto comigo. Aposto que vocês devem pensar que fico louco em “ouvir” tantas vozes conflitantes em todo o meu corpo.

Esquizofrenia é uma doença engraçada. É como areia movediça quanto mais resiste, mas afunda. O segredo é boiar. Não existem inúmeras vozes, só há uma. Essa é a âncora. Essa voz é a sua. Você controla. És o Rei, todas são súditos e conselheiros, mas a palavra final é a sua. Não há como uma delas “conspirar” e assumir o controle da minha consciência, pois a mente é complexa. Requer memórias e as memórias são a prova de sua existência como ser e indivíduo. Esses carinhas sabem que são desenhos criados por mim e são parte de mim.

Por que tomar o lugar de algo que é parte da mesma fonte?

Em por falar de memórias...

Eu fiquei divagando e esqueci-me de apresentar-me. Sou João Magnífico. Tenho 19 anos e sou de Malpetrim. Sim, nasci na cidade dos heróis. Todavia, os meus pais decidiram serem fazendeiros e mudamos de lá resolveram construir uma queijaria. Todos os tipos de queijos e leite para as crianças ficarem mais fortes.

O meu pai era um guerreiro. Forte à beça. É capaz quebrar uma espada ou dividir um homem ao meio com um só golpe. Muitos pagavam uma fortuna só para tê-lo no seu grupo. A minha mãe era uma sacerdotisa de um deus que ela abandonou depois que se aposentou. Acho que a sua última missão foi o motivo que a levou a esquecer a sua vida de aventureira. Os dois se apaixonaram e acabou.

Ambos não gostam de contar muito sobre o passado.

O meu pai construiu sozinho a fazenda. Força era o que não faltava. A minha mãe é uma administradora muito competente. Além de ordenar as cabras e vacas como poucas. Sim... Namoravam muito também. Somos ao todo oito. Quatro meninas e quatro meninos. Todos fortes e sadios como eu. Ah, sim... Sou o primogênito.

Muitos devem pensar que o meu sobrenome “Magnífico” é alguma pretensão de minha parte. Para a surpresa de muitos, este é o meu sobrenome original. O meu pai o conquistou na sua época de guerreiro e foi mantido para todos os membros de minha família. E pretendo continuar esta tradição.

Com o tempo descobri que o meu corpo tem diferenças com os outros membros de minha família. Sou forte como o meu pai e inteligente como a minha mãe. O curioso é que sou muito mais forte e muito mais inteligente do que os meus pais e qualquer um dos meus irmãos.
Quando completei os meus dezoito anos perguntei a minha mãe se havia algo diferente em mim ou alguma condição que desconhecia. Não é preciso dizer que ela foi reticente e tentou desconversar. Todavia confessou que ela havia sido violentada pelo Deus que cultuava.

Isso explica muita coisa...

Um dia decidi que iria me tornar mago e entraria para Academia Arcana.
A reação dos meus pais foi a mais indiferente possível. Foi como eu dissesse que iria comprar doces ou pão. Algumas recomendações, malas prontas, dinheiro para a inscrição e “vai ser feliz”.

Uma espada que o meu pai me deu, um beijo carinhoso da minha mãe e um abraço coletivo dos meus numerosos irmãos foi à senha para a minha partida rumo a Valkaria. Não senti qualquer frieza da parte do meu pai. Ele me criou como filho dele e tenho orgulho disso. Sempre esteve presente e me ajudou a construir uma postura ética. Acredito que devo ser melhor do que aquele miserável que feriu e traiu a confiança de minha mãe.

Na minha jornada em linha reta. Isso mesmo. Linha reta. Atravessei montanhas, um império belicoso, criaturas anti-sociáveis e reinos com defesas fracas. Só duas vezes que acabei usando a minha espada. Quando entrei na área de Tormenta e liquidei grande parte daqueles insetos. E quando encontrei o meu pai biológico.

O pirado queria que eu fosse com ele para a sua residência para tratar de alguma herança divina ou algo assim. Só sei que dividi o canalha no meio num só golpe. Aí eu vi que a espada do meu pai adotivo é bastante eficiente. Por isso que a batizei de “Matadora de Deuses”. Não sei o porquê, mas acho que virei ateu. Não vejo graça nenhuma em ficar cultuando esse monte de vagabundos divinos...

Eu tive os meus momentos, nessa minha ida a Valkaria. Lâmias safadas querendo me comer, literalmente. Dragões mal-humorados que reclamavam pelo meu roubo de algumas moedinhas. Só uns vinte quilos de ouro, só isso. Uma bruxa gostosa e fogosa que não agüentou uma noite de Amor comigo. Camelos babantes e apresentação do meu punho nos rostos deles. Salteadores azarados que tiveram o desplante tentarem me roubar as minhas moedinhas.

Muitas aventuras são de pouco interesse. Aposto que alguns aventureiros tiveram uma Vida muito mais excitante. Tudo que fiz era dar um soco e quase tudo se resolva. Força bruta é simples demais.

Quero desafios de verdade e estes desafios estão no conhecimento e no plano das idéias.

Quando estava viajando, recolhi inúmeras ervas com propriedades mágicas e suas extraordinárias aplicações. Pude estudar a utilidade de cada uma delas no laboratório da bruxa que era incompatível com a minha virilidade. Neste laboratório, desenvolvi a tinta para as minhas tatuagens mágicas. Pude clonar as sementes para a produção posterior. A própria bruxa me ajudou bastante, isso foi antes da nossa desastrosa noite de Amor...

Então cheguei a Valkaria.

Gente fraca e pouco inteligente, mas podia manipular para facilitar a minha vida quando fosse a Academia Arcana. Aluguei um quarto e contratei umas prostitutas para minha diversão. Mas uma vez, destrui a intimidade das pobres moças. O que posso fazer que tenha a herança divina do meu pai tarado?

Quando consegui ser aprovado para ingressar para a Academia Arcana foi a minha primeira realização intelectual sem a utilização da força física. Para comemorar, resolvi ir à Arena e ver as lutas dos gladiadores. Para a minha decepção, são lutas armadas e coreografadas. Acho que não queriam ferir aquela elfinha do unicórnio.

Acho que um conterrâneo de Malpetrim disse que sou um gladiador. Eu nem liguei, mas me disseram que teria uma graninha. Não tinha o que fazer resolvi ir a arena de mãos limpas. Jogaram um dragonete, uma manticória e um javali gigante. Meia dúzia de socos e acabou. Nem teve um arranhão. Seria interessante se a manticória tivesse me arranhado. Poderia estudar a reação do veneno no meu corpo. Fiquei um pouco chateado por perder a oportunidade de ter sido uma cobaia.

Depois de receber o dinheiro por minhas lutinhas, iniciei o processo de mudança para o interior da instituição mágica. Foi divertido ver pessoas intelectualmente desenvolvidas. E a minha primeira ação foi a minha entrada na biblioteca e ler sobre Herbalismo e Alquimia avançada.

Comecei a fazer equações complexas e estudar reações místico-orgânicas. Para a minha surpresa conheci o primeiro colega que me auxiliou na tradução dos simbólicos alquímicos. Tensey. Aquele elfo é brilhante. Foi a primeira vez que tive mostrar os meus talentos intelectuais e não os meus músculos.

Isso foi mais tarde, quando tive que levar as minhas malas para o meu quarto no alojamento e Tensey ficou impressionado com a minha força.

Não demorou muito a minha entrada para o grêmio do Falcão e conheci o meu maior adversário intelectual. O professor Carlos Castanheira. Eu ADORO aquele sujeito! Mostrava os meus trabalhos e a minha segurança em fazer os experimentos de cabeça. O professor ficava louco. O coitado acha que o meu cérebro tem as mesmas funções humanas e suas limitações.

Eu dizia coisas que poderiam ser comprovadas com testes simples, mas como dizia que tinha feito de cabeça só para provocar o meu mestre. ADORO os gritos e discussões que o meu mestre dizia para mim. Na verdade, tudo que queria era me poupar de qualquer adversidade ou problemas posteriores.

O meu maior desafio é uma solução para a doença degenerativa na coluna de Luiza Blue. Essa doença não é daquelas que é uma contaminação ou agente patológico. Muito menos, uma síndrome auto-imune a qual o corpo destrói a si mesmo. Enquanto Jeniffer Nice cuida para garantir o seu bem estar físico, eu trato efetivamente da cura em si.

É uma das lutas mais desafiadoras de minha Vida.

Isso sim que é um desafio!

Apesar dos “empates” em breve devo conseguir uma cura para ela. Pois aquela “doença”, na verdade é uma condição mágica de ligação existencial com a sua irmã natimorta. Com o tempo, eu posso utilizar uma de minhas tatuagens para corrigir a paralisia. O problema é estrutura química dela. Em mim, não tem problema algum, mas eu fiz a besteira de usar a tinta que utilizo em um humano.

Não foi das experiências das mais agradáveis de ver...

Posso descrever que a tinta substitui toda a água no organismo humano e a morte é por envenenamento. Depois o corpo é possuído por este novo tipo de organismo que procura sobreviver a todo custo. Acredito que seja contaminação, inoculando a tinta para algum individuo seguinte. Eu fiz uma bola de fogo e a tinta se consumiu em chamas.

Fico imaginando uma contaminação a longa escala com meu produto em humanos ou qualquer outra espécie.

Eu tenho um particular interesse na Luiza. Se não der a minha versão mis fraca da tinta, estou pensando seriamente em transformá-la em um semideus como eu. Eu tenho estudado muito sobre as possibilidades de utilizar a perigosa magia Divina e a traiçoeira magia do Caos.

Sobre sentimentos, bem... Se ela se tornar divina, acho que posso ter uma companheira a altura de minha sedenta vontade de ter uma mulher que não se fira com a minha virilidade.

A morte do Professor Castanheira, a partida dos cinco antigos para revivê-lo e aquela investigadora rosada, tornaram as coisas mais interessantes por aqui nos últimos tempos. Eu estou cansado de intimidar o grêmio da Serpente. Eles são escrotos, mas são ótimos para serem explorados.

Ultimamente, tenho observado que há algo estranho no ar. Uma conspiração ou um plano muito mais elaborado. Não acredito muito nessa teoria do “roubo” que a garota rosada disse para todos. Mais uma coisa é certa. Há algo muito mais sinistro...

Mas João Magnífico está aqui para salvar o dia mais uma vez.

Ou acho que vou