Loving a soldier

Capítulo 5 - Aquele do dinheiro


05 de Setembro de 2015

Independentemente do cansaço perceptível no cabelo em um coque bagunçado e olheiras, o sorriso mantinha moradia fixa nos lábios da garota. Ela encontrava dificuldade em se manter séria diante da cena da filha segurando seu dedo indicador com a pequenina mão enquanto ressonava calma no berço e apenas lhe restou velar o sono dela, aproveitando o escasso momento de silêncio na casa.

Amelia não era complicada, contudo, nos últimos tempos, com o nascimento de seu primeiro dente, tem chorado bastante. Ally fazia o melhor que podia para confortá-la como, por exemplo, esfregar o dedo limpo na gengiva dela, porém são medidas paliativas e logo o ambiente era tomado pelo choro de novo. Dessa forma, não se importou de ter que ficar com a mão estendida por muito tempo para que a bebê a segurasse, o qual era o único jeito que ela conseguia dormir, se isso significava alguns instantes de tranquilidade.

Depois de certo período na mesma posição, cuidadosamente retirou o dedo do abrigo da palma da filha e não conseguiu se conter em tocar a macia face de Amy, passando levemente os dígitos pelas bochechas sobressalientes, os lábios carnudos, a região próxima dos grandes olhos castanhos e, por fim, os finos fios loiros no topo da cabeça. Além disso, antes de realmente se afastar do berço, ainda sussurrou:

“Bons sonhos, bebê.”

Allycia deu alguns passos para trás, sempre observando o sono alheio, e se jogou no colchão quando a panturrilha encostou-se à madeira de sua cama. Ajeitou-se melhor para ficar confortável, buscou o urso polar de pelúcia da Amelia largado pelo leito, abraçou-o, iniciando, em seguida, a análise da confusão que estava o quarto.

O cômodo era partilhado por ela e pela filha, com uma parede inteira sendo ocupada pelo berço, cômoda, a qual também servia como trocador, nichos para guardar os pertences necessários, além de livros infantis que fazia questão de ler para Amy toda noite, enquanto nas outras duas estava disposto o guarda-roupa e sua escrivaninha – O teclado agora ficava em um canto da sala de estar -, o que, no decorrer da semana, quando estava uma correria, ficava desordenado, contendo itens jogados por aí.

Entretanto, não era como se ela sempre tivesse disposição para arrumar nos finais de semana, afinal, algumas vezes, a rotina de ir trabalhar, deixando a bebê com Lester, voltar para casa e ter mais a fazer a deixava exausta. Ademais, o plano de separar os quartos após dois meses do nascimento com uma reforma no escritório do pai, conseguindo assim mais organização, foi por água abaixo ao descobrir que parte do seu salário e de Austin seria destinada a leite fórmula para complementar a alimentação de Amelia, já que foi notificada não ser capaz de lactar o suficiente.

Em suma, o cômodo era uma bagunça assim como a vida, rotina e conta bancária de Ally.

Quando ela finalmente estava deixando-se envolver pelo sutil ruído do ventilador ligado na velocidade média e fechando os olhos por alguns segundos a mais que os normais de uma piscada, a notificação num volume alto de uma chamada de vídeo no seu notebook a despertou no mesmo instante.

Levantando-se velozmente, quase caindo ao pisar em um chocalho da Amy depositado no chão perto da cama, Allycia pegou o eletrônico, desconectou o cabo do carregador dele e correu para fora do quarto o mais rápido possível, pois seu coração disparava ao meramente imaginar a filha acordando e chorando.

Desceu a escada comedidamente, dedicando-se a enxergar os degraus com a tela erguida do notebook, para, em seguida, acomodar-se no sofá da sala. No visor, o nome do Austin aparecia e, de modo automático, aceitou a chamada, logo se deparando com o namorado em uma farda, a qual a garota acharia excitante se seu cérebro não estivesse tão fatigado, de cabelo curto e carregando um semblante mesclando cansaço a alegria.

“Por que você não me avisou antes que ia me ligar, Austin? Estava quase dormindo, devo estar toda desarruma...” Ally reparou em sua imagem no canto da conversa e soltou um ofego “Caramba, meu cabelo está horrível! Olha essas olheiras, amor.”

“Baby, você está linda. Para. Bem, já te vi em situações piores também. Lembra quando a gente foi visitar a fazenda do meu tio e minha prima trombou contigo te fazendo cair na lama e seu cabelo ficou empastado e você toda suja?” Moon começou a rir ao recordar da memória, todavia o olhar sério que a parceira o direcionou o fez parar aos poucos “Desculpa. Não me aguentei. Aliás, oi.”

Apesar de ter feito uma fisionomia sisuda quando Austin evocou a lembrança, por dentro ela estava alegre, pois, posteriormente a esse convívio no exército e todos embates com o Mike no final da adolescência - Motivados principalmente por sua existência - que o transformaram em um pouco circunspecto, era agradável o ver rir abertamente. No entanto, não pretendia externar a sensação, portanto, continuou a conversa:

“Oi, oi. Como você tá’ hoje?”

“Um pouco cansado, mas sei de algo que pode mudar isso totalmente: Você e a Amelia. Onde ela tá’?”

“Dormindo” Austin fez um beicinho desapontado ao ouvir a informação, fazendo Ally sorrir bobamente “Desculpa, amor, mas eu não sabia que você me ligaria para a manter acordada e, além disso, tive que aproveitar a oportunidade quando ela ficou com sono para ter uma pausa de tanto choro.”

“Choro? Por que choro?” O garoto franziu o cenho e ajeitou-se na cadeira demonstrando preocupação.

“É, há uns três dias ela começou a chorar muito e, quando busquei por um médico, fiquei sabendo que o primeiro dente está nascendo. Dói o coração a cena, porém não tenho muito que fazer infelizmente.”

“Os dentes dela estão nascendo? Nossa, a Amy vai ficar tão fofa quando eles nascerem. Deve ser incrível poder acompanhar isso.”

“Austin...” Ally lamentou ao perceber o tom quebrado que o namorado usou na sua última fala.

“Não, não. Está tudo bem” O garoto deu um sorriso fraco a fim de tentar convencer Allycia de que não estava abalado ao notar novamente o quanto estava perdendo do crescimento da filha, o que era mentira “Será que eu poderia pelo menos vê-la, amor? Só... poder observar?”

“Como vou fazer isso?” Questionou-se baixo a menina enquanto sua mente pensava em maneiras de realizar o pedido, porque simplesmente não tinha como ela ignorar. De repente, sua feição mudou para uma entusiasmada ao elaborar algo “E se eu apenas ficar sentada na frente do berço e você a vê por meio das grades? Não é a melhor coisa, mas...”

“Já está bom para mim. Vai ser o essencial para eu ter mais certeza do que farei.”

“Certeza de quê? O que você fará, Austin?” Tentou rememorar se o namorado havia lhe contado uma novidade, no entanto, a seu ver, eles continuariam a viver a mesma rotina pacata.

“Vou te contar daqui a pouco, baby. Antes me leve até a Amy, por favor.”

Embora duvidosa e receosa do que poderia vir pela frente, Allycia atendeu a solicitação, levantou-se e caminhou de volta até seu quarto com o notebook em mãos. O ambiente permanecia silencioso, além de levemente escuro por causa das cortinas fechadas visando impedir a entrada total de luz da tarde, sendo assim, ela foi cautelosa quando se sentou no chão encostada-se ao berço branco da bebê, a qual, para sua felicidade, estava com a face voltada em direção das grades de forma que o parceiro podia a ver melhor – O computador também estava acomodado nos joelhos dobrados dela a fim de maximizar a experiência de contato.

Austin, no mesmo instante que focou na filha adormecida, soltou um sorriso alegre que contrastava com seus recentes olhos avermelhados denotando choro, exatamente como aconteceu quando a viu pela primeira vez por uma tela de computador na maternidade do Jackson Memorial Hospital. Todavia, dessa vez as escassas lágrimas escorrendo pela face dele compondo a cena eram inesperadas, o que alarmou a menina a qual estava sofrendo em se controlar para não exigir uma explicação do que estava acontecendo.

Certos minutos passaram em que Moon continuou calado, absorto nos próprios pensamentos desconhecidos por sua espectadora, no entanto, por fim parou de chorar, à medida que Ally estava com os braços cansados de tentar equilibrar o eletrônico – Uma tarefa árdua – e se corroendo de curiosidade.

“A Amy é realmente linda, né'?” Maravilhado, Austin sussurrou antes de finalmente voltar o olhar em direção à namorada “Nós podemos ir conversar.”

Concordando com um aceno, Allycia apoiou o notebook na cama, ergueu-se do solo, aproveitou o momento para ver se a filha estava bem e ficou contente quando verificou que ela permanecia serena no sono, pegou o computador de volta, logo retornando para seu assento na sala de estar.

“Ok, o que tem para me contar? Eu estava praticamente mordendo a língua para não implorar para me dizer a verdade lá no quarto. Você estava chorando! Quase nunca te vi chorar durante todo o tempo que te conheço. Dever ser sério” A garota desatou a falar, visivelmente nervosa, quase direcionando uma mecha de cabelo solta do coque para a boca a fim de mordiscar, todavia parou no meio do alto - Era um hábito antigo seu, não faria de novo.

“Preciso que você tenha em mente que faço qualquer coisa por nossa família...”

“Não” Ally interrompeu, fechando os olhos por um segundo e inspirando profundamente “Isso é um déjà vu. Você me disse algo similar quando me revelou ter se alistado no exército. Austin Monica Moon, o que aconteceu dessa vez?”

“Por favor, não se altere" O loiro respirou fundo antes de mirá-la atenciosamente, de forma que seus olhos pareciam ambicionar acalentá-la "Lembra daquela nossa conversa há uns dois meses? Sobre missões no exterior?”

“Sim e também lembro que pedi para você não se voluntariar em nenhuma” Ela proferia as palavras calmamente, dando uma ênfase na parte em que recordava de sua solicitação.

“Eu totalmente entendo o seu ponto de vista, mas quero que saiba que nunca concordei.”

“Então, o quê? Você vai me dizer que se alistou em alguma?” Allycia riu, como se a ideia fosse insana ou ainda de nervoso. A última opção lhe pareceu mais correta quando o parceiro não negou, somente ficou a encarando “Não é isso, certo, amor? Você não faria algo assim com a gente, eu sei.”

“Estou fazendo isso por vocês, baby” Moon falou com pesar, desejando nunca ter que dar essa notícia para a namorada. O anseio de nunca machucá-la permanecia dentro de si, contudo parecia ser inviável.

“Como? Como pode ser por nós?” A voz dela estava exasperada assim como o semblante. Sentia que podia chorar, talvez vomitar, entretanto resistiu, precisava ser forte.

“Meu salário será maior, ou seja, vou poder enviar mais dinheiro para ajudar vocês.”

"A gente não precisa disso, amor. Por favor.”

“Ally, a gente tem muitas despesas. Nós precisamos sim de mais dinheiro. Comprar leite para a Amy, fralda, consultas médicas e tantas outras coisas... Não é barato, baby.”

"E se eu pedir ajuda para os nossos pais?" Ela vincou o cenho e cravou o olhar no seu colo, começando a raciocinar alternativas para contornar o cenário.

"Nós dois sabemos que não fará isso" Austin deu um sorriso melancólico, reconhecendo a realidade esmagar progressivamente seu peito.

"Se for para te manter aqui, até mesmo conversaria com seu pai e pediria auxílio" Determinada, levantou a cabeça e fitou o parceiro.

"Mas eu não quero que o faça. Meu pai vai querer começar de novo a controlar a criação da Amy só porque está bancando algo. Não desejo nunca para ela a mesma pressão e ensinos que sofri com ele."

"O Lester vai ser complicado, pois ele já está pagando um funcionário para a loja e nós não temos muito sobrando, porém..."

"Tá' vendo? É a nossa única opção."

“Calma. Posso tirar alguma coisa do meu fundo estudantil! Já estava até contando com isso" O namorado lhe fitou incrédulo “É sério.”

“Não, tudo bem? Você precisará do dinheiro no futuro quando for fazer a faculdade, porque, caso tenha esquecido, voltará a estudar, se formará em Música e será incrível" Austin tentava dizer tudo de modo gentil a fim de tentar confortar a namorada, a qual parecia estar prestes a surtar.

"Vou ter dinheiro para me formar à custa de você se arriscando em Missão? De verdade? Dessa forma? Eu não quero."

"Ally, é uma decisão que já tomei. É importante para mim poder ajudar minha família" Ele assistiu a parceira negando com um balanço de cabeça, sinalizando rejeição da situação, e em troca acenou afirmativamente "Estou com medo também, mas me deixe fazer isso."

"Você já se voluntariou, não é?" Allycia questionou, embora, no fundo da mente, tinha noção da resposta.

"Sim. Também já recebi a convocação. Não achei que fosse tão rápido. Nem tive tempo de te avisar antes."

"Qual vai ser seu destino?"

"Afeganistão."

"Ah, meu Deus" A garota colocou a mão na boca e esbugalhou os olhos, sentindo seus batimentos cardíacos aumentarem significativamente.

Não era uma novidade para si que o quadro no Afeganistão era crítico, o que serviu para apavorá-la. As notícias das mortes de civis e soldados durante a guerra contra o terrorismo naquele país iniciada depois do 11 de Setembro de 2001 e a guerra civil vivenciada surgiram em sua mente como se fosse um mecanismo de tortura.

"Não, não! Não surta. Pensa pelo lado positivo: Vou poder passar uma semana com vocês antes de ir."

Allycia jogou a cabeça para trás enquanto sentia o nariz começar a arder denunciando o choro próximo.

Ela estava entendo cada vez mais como era amar um soldado.