Living in the North

Capítulo 06 - Nadin Al Kolayb Laada


A chuva da primavera caía de forma intensa do céu. Quem tinha que sair de casa teria que usar capa de chuva, pois quem usasse guarda-chuva com certeza iria perde-lo por causa dos ventos fortes, além de que não iria proteger da chuva forte.

Nadin estava sentada sobre uma poltrona trajando um roupão verde-escuro e branco, estava segurando um livro intitulado "Apanhador no Campo de Centeio" do autor J. D. Salinger, e à sua frente sobre uma mesa de centro tinha uma caneca com café e mais dois livros intitulados "Os Sete Irmãos" e "Odes", ambos do autor Aleksis Kivi.

— De novo lendo esse livro, querida? – perguntou uma voz grave masculina.

— Sim – respondeu Nadin, tirando os olhos das páginas para olhar seu marido. – Eu já li e reli esse livro diversas vezes, você sabe disso.

— É, eu sei – disse, com um sorriso no rosto. – Já até perdi a conta de quantas vezes você já leu esse livro.

Nadin retribuiu o sorriso e voltou os olhos para as páginas do livro.

Rafiq Ahmed Tahir Javed era um homem alto e magro, com a pele morena clara, cabelos negros curtos e lisos, barba que cobre o pescoço e bochechas, olhos castanhos e nariz um pouco maior do que o comum. Ele também nascera no Paquistão, assim como Nadin, mas diferentemente dela que nascera em Islamabad, ele nascera em Sukker, na província de Sinde. Rafiq conheceu Nadin há cinco anos e estavam juntos há três anos e meio, ele era um político de North Hopeville e trabalhava Câmara dos Vereadores, ou como também era chamado: Câmara Municipal.

Rafiq sentou-se em outra poltrona e abriu um jornal da cidade pra ler as notícias. Como era um político da cidade, ele tinha o hábito de ler as notícias para saber o que a mídia e população estavam falando. Os dois ficaram lendo em silêncio até começar a anoitecer, quando Nadin parou de ler e deixou o livro ao lado dos outros dois sobre a mesa de centro.

— Essa chuva não vai ter fim? – perguntou mais para si mesma do que para seu marido. Ela se retirou da sala e foi até a cozinha para preparar a janta.

Nadin pegou algumas ervas, especiarias, vegetais, cebolas e um pacote de farinha do armário, colocou tudo sobre a mesa e começou a preparar pakora, um típico prato paquistanês e indiano, para ser a janta daquela noite. E para sobremesa ela fez um gulkand, que é um doce composto por pétalas de rata de gaja. Nadin sempre teve boas mãos para fazer comida, tanto é que sempre era ela que fazia comida para seu grupo quando estavam sobrevivendo do lado de fora de North Hopeville.

Quando terminou de preparar a janta e sobremesa, chamou seu marido para ambos jantarem juntos. A chuva lá fora continuava intensa com ventos fortes. O casal tinha programado para saírem e visitar o bar de Stefan e James, mas como a chuva estragou o plano, eles resolveram assistir alguns filmes no DVD na sala de estar.

— Qual filme você quer assistir, querida? – perguntou Rafiq enquanto ajeitava o sofá-cama para ambos deitarem.

— Jago Hua Savera – respondeu Nadin, deitando-se sobre o sofá-cama e esperando seu marido colocar o filme no DVD.

Depois de ter colocado o DVD dentro do aparelho, Rafiq pegou o controle remoto e deu play no filme enquanto deitava-se ao lado de sua esposa. O casal ficou assistindo filmes, tanto paquistaneses quanto estadunidense até as primeiras horas da madrugada, quando ambos acabaram dormindo ali no mesmo no sofá-cama na sala de estar.

Na manhã seguinte, Rafiq acordou primeiro e levantou silenciosamente para não acordar Nadin. Ele foi pra cozinha para preparar o café da manhã com: torradas com geleia, e suco de acerola com mamão, como opção ocidental; um pão chamado aloo paratha, feito de pão de trigo e manteiga clarificada que é assado em uma frigideira e recheado com vegetais, e chá preto com canela em ramo, baunilha e casca de limão, como opção oriental. Após ter preparado tudo, ele foi acordar sua esposa para chamá-la pra tomar o café da manhã, mas antes que ele saísse da cozinha ela já estava vindo em sua direção.

— Hmm... que cheiro bom – disse enquanto bocejava e coçava os olhos. – O que temos aqui?

— Torradas, suco, aloo paratha e chá preto – respondeu. – Bom dia, querida.

— Ah, desculpa... – riu nasalmente. – Bom dia, meu amor.

Ambos sentaram-se e tomaram o café da manhã juntos. Depois disso, Rafiq foi tomar uma ducha e se arrumar para ir trabalhar na Câmara, enquanto Nadin voltou a ler o seu livro favorito até a hora do almoço. Nesse horário, ela também tomou uma ducha e trocou de roupa, que até o momento ela estava o seu roupão verde-escuro e branco, e saiu de casa.

As ruas estavam todas molhadas e o ar gelado e úmido por causa da chuva forte do dia anterior. Nadin teve que vestir uma blusa de moletom e segurar um guarda-chuva nas mãos pois estava garoando. Ela achava incrível como ontem caíra o céu e naquele momento estava apenas garoando.

A advogada caminhou até uma floricultura e entrou no estabelecimento. Fechou o guarda-chuva e o colocou numa espécie de cabideiro que tinha ao lado da porta de entrada. Caminhou pelo local olhando as prateleiras que estavam repletas de flores naturais e artificiais de todos os tipos, ali tinham: rosas, tulipas, margaridas, orquídeas, girassóis, violetas, copos-de-leite, entre outras variedades.

Nadin comprou duas rosas vermelhas e duas tulipas azuis, pegou seu guarda-chuva do cabideiro e saiu da floricultura. Ao dar os primeiros passos do lado de fora do estabelecimento, ela já estava sentindo falta do cheiro perfumado que entrava em suas narinas.

Ela caminhava lentamente em direção ao seu novo destino, que era um cemitério. Nadin estava indo visitar o túmulo de Dave. No caminho até o cemitério, Nadin lembrava dos momentos em que eles passaram juntos, nos diálogos que tiveram e principalmente das inúmeras dificuldades que superaram. Além de Dave, Nadin lembrou dos outros companheiros que morreram na longa e difícil jornada que tiveram até acharem North Hopeville. O que mais fazia falta e que ela mais sentia saudade era Benjamin.

Quando parou de pensar no passado e voltou pra realidade do presente, ela se viu de frente pro túmulo de Dave. Dobrou os joelhos sobre a grama molhada e colocou as quatro flores defronte ao túmulo do texano. Ficou de pé novamente e disse algumas palavras na sua língua nativa.

— Boa tarde, Nadin – disse uma voz conhecida. Nadin virou o rosto e viu que era Stefan.

— Boa tarde, Stefan – respondeu a paquistanesa. – Tudo bem? Como vai o bar?

— Está tudo certo e em ordem. Obrigado por perguntar – abriu um pequeno sorriso no rosto enquanto se agachava para colocar uma flor no túmulo de Dave. – E você? Como estão as coisas?

— Perfeitamente bem – respondeu. – Íamos para o bar ontem mas a chuva impediu – contou Nadin, voltando a olhar pro túmulo. – Rafiq disse que você está devendo oitenta noho's pra ele – completou sorrindo.

— O que?! Ele nem aprendeu a jogar direito ainda! – disse Stefan, rindo baixo. – Ele está aprendendo qual mão é melhor que a outra, sem falar que nem sabe blefar...

— Você sabe que eu não entendo nada de pôquer, Stefan – ela também estava rindo baixo. – O Ben tentou me ensinar algumas coisas, mas achei muito complicado e não entendi nada – o riso da advogada cessou quando o nome do seu finado marido saiu de sua boca.

— Ben era um cara legal, querido por todos... – o riso dele também cessou e sua voz estava melancólica. – Sinto muito por ter chegado nesse assunto.

— Não, tudo bem, Stefan – disse Nadin. – Sinto falta dele, é verdade, mas tenho que seguir minha vida, né? Agora tenho o Rafiq e estou muito feliz com ele – completou, voltando seu olhar pro seu amigo.

— Tem razão – concordou Stefan, assentindo com a cabeça. – E o Rafiq é um cara muito legal também. Péssimo jogador, mas um cara legal.

Stefan abriu um grande sorriso ao ouvir sua amiga rir. Os dois ficaram em silêncio e olhando pro túmulo de Dave por alguns minutos, até que Stefan quebrou o silêncio.

— Ficou sabendo da Ariel?

— Não. O que tem ela? – perguntou Nadin, olhando fixamente nos olhos de Stefan, demonstrando interesse. Ela e Ariel não tinha uma boa relação por questões religiosas, mas ainda assim eram amigas de longa data.

— Está sumida há algum tempo... Ninguém tem notícias dela – informou Stefan, retribuindo o olhar. – Ela não dá sinal de vida. Quando Mark veio pra cá, ele disse que a viu mas não sabe o que aconteceu com ela.

— Isso é estranho... – sussurrou. – O que será que aconteceu com ela? O Mark disse como ela reagiu quando ela viu que ele está casado? Mais alguém sabe disso?

— Mark disse que ela reagiu normalmente, até sorriu ao saber que ele estava casado. Todos que era do grupo está sabendo, e o prefeito também. James e sua equipe estão fazendo patrulhas em busca dela.

— Você sabe como aquela menina amava o Mark. Pensei que ela pudesse ter feito alguma coisa ao saber que Mark estava casado e com uma família.

— O que? Suicídio? – perguntou o rapaz. Nadin balançou a cabeça positivamente. – Acho que não... Ela não é o tipo de pessoa que faria isso.

— Bom, nunca se sabe. Mas espero que James a encontre viva e bem – disse de forma sincera.