Capítulo 8 - Padawan

No começo da noite acabou a paz que reinava naquele loft quando ele foi invadido por várias visitas.

— Não sabem usar o telefone? - Magnus reclamou quando viu os jovens adultos invadindo sua sala.

Alec ainda não tinha voltado, e ele e Jace tinham passado o dia quase todo vendo televisão no sofá, só levantando para ir almoçar e tomar um lanche.

O feiticeiro tinha se certificado de oferecer várias opções de comida ao menino, que mesmo aceitando, comia muito pouco.

Depois de ouvir a conversa entre ele e Alec mais cedo, Jace tinha ficado introspectivo, pensativo e várias vezes Magnus teve de limpar seu nariz que sangrava. E tinha quase certeza de que tal fenômeno era resultado de excesso de reflexões complexas demais para uma criança.

Catarina, sua amiga feiticeira, que poderia lhe ajudar num diagnóstico mais preciso ainda não tinha aparecido, o que o deixava sem muita opção a não ser distraí-lo.

E a televisão tinha vindo a calhar, já que o menino parecia simplesmente fascinado pela tela com pessoas presas dentro. Porém, mesmo com isso, o máximo que conseguiu foram poucos momentos de descontração.

Quando as visitas chegaram, reclamou da boca para fora, mas no fundo estava até aliviado. Porém, seu alívio se esvaiu quando o menino não só se negou a interagir com todos como chegou ao cúmulo de tentar se “esconder” com o rosto em seu pescoço.

— O que houve, pequeno? - Izzy perguntou ao tentar se aproximar do menino, que se encolheu ainda mais contra Magnus.

— Não sou. - Comentou o menino com uma voz triste, e se escondeu ainda mais, não largando de Magnus mesmo quando ele se levantou, lembrando um agarradinho.

Izzy e Simon trocaram olhares, mas nada disseram.

— Bebem algo?

— Por acaso não teria um O negativo aí, não é? - Simon brincou, tentando descontrair o clima um pouco.

— Na prateleira de cima da geladeira, Shelby.

— Martini, querida?

— Por favor.

O menino, que até então tinha o rosto escondido, olhou diretamente para Simon com os olhos curiosos.

— Você é um vampiro?

— Sim, garotão.

— Prova.

Simon rosnou, mostrando as presas fazendo Jace rir.

— Você será o meu seguidor fiel, padawan. - Disse caricaturalmente. — Encanto!

— Você é um vampiro horrível. - Jace gargalhou e pediu para descer, seguindo Simon.

— Será? Você está me seguindo. - Apontou o vampiro.

Isabelle esperou os dois se afastarem para perguntar o que houve. Era discreta.

— O que houve com ele? Para tão...pra baixo.

Magnus suspirou, servindo os taças dos dois, e entregou o dela.

— Ele ouviu uma conversa minha e de Alexander hoje mais cedo, e sabe que não tem a idade que aparenta.

— Tadinho.

— Pois é.

— Mas por que parece tão triste? Ontem estava tão normal.

— Acho que se deu conta de que as coisas não são exatamente como ele achava que eram.

— Você quer dizer com relação a Valentim?

— Exatamente. Ele achou que íamos colocá-lo para fora. - Comentou. — Claro que disse que não.

— Por isso está colado em você hoje?

— Você tinha que ver como ele ficou com o Alexander. Fiquei até com ciúmes. - Riu. — E ele? Fazendo a ronda?

Isabelle suspirou.

— O instituto está em polvorosa, Magnus. Aldertree ficou em cima da gente o dia inteiro. Não deu uma trégua.

— Devo me preocupar?

— Creio que não. Não há nada que a Clave possa fazer para obrigar que Jace volte.

— Querido, cheguei. - Alec falou assim que entrou, e não pareceu nem um pouco surpreso ao ver a irmã ali.

Ele então foi até Magnus e o abraçou, beijando seu rosto.

Estava sério, e parecia cansado.

— Tudo bem?

— Mais ou menos. Jocelyn está tentando mexer os pauzinhos.

Magnus se afastou, um pouco mais alerta.

— Ela falou com Luke, e ele me ligou hoje.

— Não vão levá-lo. - Avisou.

— Foi o que eu disse e ele concorda de que ele estará mais seguro aqui, mas pediu para que pudessem vê-lo.

— E você deixou.

— Não confio nela, mas nele sim. Luke é um homem decente.

O feiticeiro somente sorriu, largou o copo e começou a fortificar suas proteções na casa.

Alec só o olhou com as sobrancelhas levantadas.

— Só para ter certeza. - Respondeu, dando de ombros e continuando seu trabalho.

— Jace?

— Na cozinha com Simon. - Sua irmã respondeu.

Ela riu quando ele foi para lá a passos largos. O sorriso sumiu de seu rosto quando ouviu tropeços.

Alec estava preparado para muitas coisas ultimamente, mas não para encontrar seu pequeno parabatai com a boca toda suja de sangue ao lado de um vampiro.

Simon estava tomando algo vermelho num copo, e não precisaria ser um gênio para saber que aquilo era sangue. E seu parabatai tinha outro copo à sua frente, e a boca toda suja.

Talvez tivesse sido o estresse dos últimos acontecimentos, ou o clima terrível instaurado por Aldertree no instituto, ou só o fato de não ir muito com a cara de Simon e o achar irritante, mas Alec simplesmente explodiu quando viu a cena e não hesitou em levantar o vampiro pela gola do casaco e jogar contra o armário.

— Você tá dando sangue pra ele?! Quer morrer de vez?

— Vampiro amigo aqui, lembra?

— É brincadeira. - O menino falou, tentando puxar o shadowhunter pela roupa.

— Isso não é brincadeira, Jace!

— A voz das crianças é a voz de D… - Simon tentou falar, mas se encolheu quando Alec levantou o punho.

— Alec! - Izzy ralhou com o irmão. — Larga o Simon!

— Ele está dando sangue pro Jace!

— Na verdade, é groselha. Não sou maluco de dar sangue pra criança.

— É faz de conta. Eu sou o seguidor padawan fiel dele, e nós estamos bebendo sangue para a nossa reunião de cúpula vip para decidir se a força está ou não comigo. - O menino explicou num só fôlego, e Alec só o olhava horrorizado.

Em seguida, empurrou o vampiro contra o armário de novo.

— Olha o que você fez! Ele parece um mini você falando sem parar!

— Alexander, pare de bater nas visitas.

— Ele quebrou o menino! - Esbravejou, se afastando a contragosto do vampiro.

— Eu não estou quebrado. Aqui, tome um pouco do meu suco. É gostoso. E dá pra fazer marca de sangue, aí você pode ser um seguidor fiel também, mas não um padawan porque você é muito velho, e isso ia ser um desbalanço para a força.

— Quê?!

— Não precisamos de outro Darth Vader. - O menino continuou, puxando Alec para uma cadeira e lhe dando seu copo.

— Não mesmo. - Concordou Simon, sentando-se também e voltando a beber do seu copo como se nada tivesse acontecido.

Jace subiu no colo de Alec e se aconchegou, encostando suas costas no peito do mais velho. Bocejou e jogou os braços para o pescoço o shadowhunter, abraçando-o.

— Puxa-saco. - Simon constatou ao ver o jeito que Jace.

— É meu. - Jace atestou, fazendo Alec sorrir presunçoso. — E agora você é meu também.

— Não sei, não. Estou me sentindo preterido. - Fez um drama e o menino esticou o pé para fazer carinho, fazendo Izzy rir ao ver a cena e se sentar também à mesa. — Como ele ganha um abraço e eu um pé? Não é justo.

— Questão de hierarquia, vampiro. - Alec comentou, cutucando.

— É um pé bonitinho, vai? Nem tem chulé. - Izzy comentou e deu uma piscadinha para o menino, que sorriu malvado, levando o pé na direção do rosto do vampiro.

— Isso não é um pé com chulé, é um chulé com pé! - Simon reclamou fingindo que estava passando mal com o cheiro, só para distrair o menino e depois atacá-lo com cócegas.

Magnus estava feliz que Jace finalmente tinha se distraído e ria um pouco, mas suspirou um tanto sem paciência quando ouviu batidas à porta.

Sem falar nada, seguiu para a entrada, e quando abriu a porta deu de cara com Luke Garroway e Jocelyn Fairchild.

— Boa noite, Magnus.

— Estava boa até agora.