Little Angel

Capítulo 11 - Proibido


A cidade dos ossos era um local para descanso daqueles que já tinham ido, um local de estudos e uma prisão para aqueles que infringiram as leis.

Um local de difícil acesso, de vários níveis e protegido pela magia e runas mais antigas conhecidas pelos nephilim. Sua proteção impedia a invasão de demônios e submundanos, mas nada a tornava segura contra aqueles com sangue angelical, e isso incluía os anjos caídos agora conhecidos como príncipes do inferno.

Asmodeus era muito mais antigo que qualquer runa ali aplicada, estando vivo quando a própria luz do dia foi criada, e sua queda não mudou sua essência.

Ainda era paciente.

Aguardou por séculos um contato de seu filho, e qual não foi sua surpresa ao saber que agora não só tinha um filho, mas um neto. Porque Jonathan podia não ser um herdeiro de sangue, mas sabia que Magnus o tinha sob sua guarda e o tratava como tal.

E o menino era especial.

Apesar de ter sido criado por Valentim, ele não era como o filho de Lilith, não era uma aberração.

O sangue forte de anjo exalava nele, e não como os nephilim, mas mais puro. Puro como nos inúmeros irmãos que Asmodeus deixou para trás ao cair, mas com um toque de magia. Porque além de muito sangue de anjo aquele menino tinha também um pouco de sangue demoníaco Eidolon. Diluído por muitas gerações, mas ainda presente.

Um pequeno anjo que nunca poderia adentrar aos céus.

Observou de longe após achar o pato com a flecha em Edom.

Espelhos eram sua forma preferida de observação.

O menino era fascinante. Divertido, esperto e carinhoso.

Foi difícil se conter e não forçar sua presença quando arbitrariedades foram cometidas contra ele, mas ele era paciente. A hora chegaria.

Chegou mais cedo do que imaginava quando o viu sozinho brincando na madrugada.

Deveria se sentir culpado por fazer o menino se cortar e liberar sua entrada nesse plano, mas não se sentia porque ele parecia contente pela companhia.

Obviamente, não deixar sua presença ser notada pelo seu filho era mais do que necessário porque saberia que seria considerado um tanto rude aparecer sem ser convidado e na calada da noite, então esperou mais uma vez a hora certa para ser recebido de braços abertos.

Por isso estava lá, no meio de um salão especial para interrogatório olhando o corpo desfalecido de seu neto.

— Quem é você? - perguntou Aldertree, temeroso.

Asmodeus sequer se virou, contemplando como levar o menino com o mínimo de dano.

Os irmãos do silêncio se afastaram, mas Victor era arrogante.

— Não pode entrar aqui assim. Estamos no meio de uma sessão. - Falou, tocando o ombro do demônio.

Sua mão queimou assim que entrou em contato com o ser a sua frente, e ele recuou, quase tropeçando para trás.

— Mortal insolente. - Resmungou, ao levantar o menino do chão com sua magia e abrir um portal. Fez um sinal de silêncio antes de sumir através do portal.

Os olhos de gato foram a última coisa que Aldertree viu antes que o demônio sumisse com o menino.

***

Magnus tinha acabado de chegar ao instituto quando viu Alec cair gritando, acompanhando o grito que vinha da tela.

Era uma cena um tanto surreal.

O alarme acionado com o portal tocando, shadowhunters gritavam querendo saber como ele abriu um portal diretamente no instituto, Lydia gritava querendo saber quem tinha autorizado levarem uma criança para a Cidade dos Ossos, ele gritava exigindo a devolução do menino e Alec vomitava.

— O que houve com as câmeras? - Isabelle estranhou quando a imagem da tela sumiu.

O feiticeiro não teve tempo de formular algo, pois um portal se abriu às suas costas, uma mão o puxou para dentro, e se fechou em seguida.

Quando deu por si estava de volta ao loft.

— Olá, filho.

Magnus deu um pulo para trás e levantou as mãos, pronto a se defender.

— Cuidado. Não me faça perder a concentração. - Ele comentou, apontando para Jonathan que flutuava, na mesma posição que estava depois da retirada da última runa. Ele tinha se certificado em não mudar de posição para não agravar nada que pudesse ter acontecido ao menino. — Eu acho que o quebraram. Alguma ideia de como arrumar?

— O quê?!

— A espinha. Está torta.

— Catarina!

— Já fui chamado de muitas coisas, mas disso é a primeira vez.

— Não, minha amiga Catarina. Ela trabalha num hospital. - Magnus escreveu uma mensagem de fogo e mandou.

Quando não recebeu resposta, mandou outro.

E mais cinquenta quando a resposta demorou novamente.

— Eu sei que estou em dívida com você, Magnus, mas não é como se estivesse desocupada. Estou pesquisando o que me pediu, mas não achei nada ainda que valesse a pena, e tenho que trabalhar. - A feiticeira reclamou assim que saiu do portal direto na sala do amigo, mas estancou assim que viu Asmodeus ao lado dele.

— Esqueça o que pedi antes, Catarina. Preciso de algo mais urgente agora. - Apontou para o menino.

Ela o olhou e levou as mãos à boca, se aproximando.

— Foram os shadowhunters. - Magnus explicou.

— Cruéis até com os seus próprios. - Ela comentou, examinando o menino.

— Pode ajudá-lo? - Asmodeus perguntou.

— Não aqui. Ele vai precisar de cirurgia.

Sem mais delongas, foram para um hospital.

***

Isabelle sempre procurou apoiar seu irmão em tudo, mesmo que não concordasse com suas opiniões porque Alec era o mais velho, o mais inteligente e capaz, e o mais responsável. Porém, naquela situação não conseguia entender o que levou seu irmão a tomar tão estúpida.

— Você entregou o Jace pra eles!

— Eu cumpri ordens, Izzy.

— Os dois se acalmem, por favor. - Lydia pediu.

— Ordens para torturar o nosso irmão, Alec.

— Eu nunca teria trazido ele pra cá se soubesse que fariam isso. Aldertree me disse que só iriam fazer umas perguntas.

— E fizeram! Não gostaram das respostas e decidiram arrancar as runas dele! Ele só tem cinco anos agora, Alec! É tão pequeno e indefeso. - Ela falou com a voz embargada.

— Você acha que não sei? A nossa runa sumiu também, Izzy. E a deixaram por último. Eu senti tudo o que ele sentiu, toda a dor, todo o desespero. Acha mesmo que eu faria isso com ele? Isso não foi minha culpa, quem disse que ele era uma ameaça foi a mãe dessa praga que só surgiu nas nossas vidas para atormentar.

— Agora a culpa do Aldertree ser um maluco lunático é da minha mãe também? Ele se excedeu completamente ao torturar o menino…

— O Jace!

— ...Daquele jeito, mas ele era uma ameaça. Sabe-se lá o que as experiências do meu pai e esse feitiço fizeram com ele. Pelo menos agora ele não é mais uma ameaça.

— Você escuta o que diz, garota?!

— Chega! Esse bate-boca não leva à nada! - Lydia gritou, e depois de chamar atenção de todos na sala, se acalmou. — Primeiro temos que descobrir o paradeiro do Jace e como Magnus conseguiu abrir um portal aqui sem o nosso consentimento ou conhecimento, e ainda ser abduzido por outro.

— Magnus fez todas as seguranças e barreiras do instituto, não fez? Talvez ele mesmo consiga ultrapassá-las se realmente quiser? - Clary sugeriu.

— É plausível. Ele estava bem fora de si quando chegou.

— E quanto ao portal que se abriu e o puxou?

— Magnus não trabalha com outros feiticeiros normalmente. Não acho que haja algum no nível dele agora. - Alec comentou. — O único que era tão forte quanto sofreu uma morte horrível quando cruzou o caminho dessa aí. - Indicou Clary com a cabeça, e Lydia a olhou pensativa.

— Não foi minha culpa.

— Nunca é.

— Estava em contato com uma amiga para ajudá-lo com o feitiço do Jace, mas ela não tinha dado retorno ainda.

— Ajuda?

— Ele queria saber se havia algum jeito seguro de reverter o feitiço para que ele envelhecesse de novo.

— Há chances de ser essa amiga então.

— Ou alguém forte o suficiente para sequestrá-lo.

— Alec e Isabelle, quero que descubram quem foi, onde está e com que intuito fez isso. Me avisem, assim que descobrirem algo.

— E quanto à Aldertree?

— Já enviei o vídeo da tortura para o conselho, e um relatório explicando como tudo ocorreu. Ele já sairá da enfermaria diretamente para Idris.

Izzy e Alec já iam saindo quando foram seguidos por Clary.

— Você não, Morgenstern.

— Mas eu sempre vou com eles.

— Hoje não. Quero você sob minha vista.

— Mas eu posso ajudar.

— Eles são os melhores que temos, você só iria atrapalhar.

Alec lhe deu um sorriso de gratidão antes de sair da sala acompanhado da irmã.

***

Internar Jace foi um pouco mais trabalhoso do que imaginavam, e foram necessários vários feitiços para suprir a falta de papelada mundana para internação. Além, é claro, de alguns para confundir os achados únicos como o tipo de sangue único do menino e uma explicação plausível para aquelas lesões em alguém tão novo.

Para isso, tentaram se manter o mais próximo da verdade possível. Magnus era o guardião legal do menino depois que ele foi retirado de seu lar abusivo, onde foi agredido repetidamente por seu pai, e abandonado por sua mãe. Porém, o menino tinha sido sequestrado no último dia pela mãe que, tendo problemas mentais, acusou o filho de ser um demônio e o agrediu violentamente.

Obviamente, a polícia foi chamada e vendo que o autor da reclamação a da entrada no hospital tinha sido o próprio Magnus Bane, Luke decidiu verificar o que ocorria.

De todos os cenários que imaginou, certamente a reclamação ser totalmente coerente com a verdade não era uma delas. Jocelyn realmente estava louca se compactuou com aquele absurdo.

Registrou toda a ocorrência, sabendo que nenhum shadowhunter seria punida pela justiça mundana, mas era o mínimo a se fazer,e quem sabe com isso conseguir denunciá-los à clave.

— Vou registrar e jogar tudo no sistema, Magnus, mas você sabe que a probabilidade algum deles ser pego pela justiça mundana é mínima.

— Eu sei.

— E mesmo se levarmos isso a clave, pode não dar em nada porque ele é um deles. Não é uma quebra dos acordos.

— Fizeram isso porque ele tem sangue de demônio. Isso faz dele um de nós. — O feiticeiro respondeu sem paciência.

Luke suspirou e decidiu não discutir.

— Me avise quando tiver notícias.

Asmodeus esperou que o lobisomem se afastasse para se manifestar.

— Posso fazê-los pagar, se quiser. - Ofereceu e o filho só o olhou com nojo.

— Por que está aqui ainda?!

— Esperando notícias do meu neto, é claro.

— Ele não é seu neto. Fique longe dele!

— Se tivesse mantido distância, ele estaria morto agora. E é claro que é meu neto filho.

— Ele não é meu filho, seu doente!

Asmodeus só o olhou nem um pouco impressionado com as palavras rudes do filho.

— Ele está sob sua guarda, mora com você e você gosta dele.

— Eu tenho um contrato de serviço que me obriga a isso.

— Você é muitas coisas, filho, mas estúpido não é uma delas. Você nunca aceitaria fazer algo que não quer por alguém que não gosta.

— Fiz pelo Alexander.

O demônio deu de ombros.

— Inicialmente pode até ter sido, mas você se apegou ao menino, não minta para mim. E não o culpo, ele é adorável. - Concedeu.

Magnus o olhou por um segundo até que tudo fez sentido.

— È você! - Pulou da cadeira, apontando para o pai, chamando atenção de alguns enfermeiros que passavam pela sala de espera.

Asmodeus só ergueu as sobrancelhas e esperou o filho se sentar novamente.

— Você é o amigo imaginário.

— Não seja tolo, Magnus. Não sou nem um pouco imaginário. - E tocou no filho para provar.

— Pare de brincar e admita que foi você que brincou com ele a noite toda.

— Mea culpa.

— Eu devia saber, ele não tinha comentado de dragões e do dia para noite virou a paixão da vida dele.

— Eu talvez tenha contado sobre os meus dragões.

— Não acredito que contou sobre dragões do inferno para uma criança!

— Ele adorou! - Se defendeu, fazendo o filho bufar. — Filho, se não queria que eu viesse vê-lo, não deveria ter me mandado um convite.

— Convite? Eu não mandei convite algum.

— Não? O que foi aquele pato com uma flecha no olho?

— Ah, aquilo foi porque ele estava certo de que o pato era um demônio, e que deveria ir para o inferno. Eu nem pensei direito antes de mandar pra lá. Só abri um pentagrama. - Explicou sem graça, fazendo o pai rir.

— E ainda diz que não é seu filho? - Riu com gosto. — E bom, ele estava meio certo. Tem uma raça de demônios no leste de Edom que se parecem muito com esses patos. Criaturinhas nojentas… - balançou a cabeça.

Magnus ficou pensativo um instante e tomou coragem para enfim perguntar.

— Por que ficou? Até aceito a curiosidade em vê-lo, mas não é como se fosse seu único neto. Nunca veio ver o Raphael.

— Não vim?

O feiticeiro pareceu surpreso pela admissão.

— Mas por que ficou? É porque é menor e mais impressionável? Não vou deixar levá-lo.

Passou a mão no rosto, considerando o que contar exatamente ao filho.

— Vai precisar de mim quando descobrirem o que ele é e virem atrás dele.

— Ameaças de Edom?

— Um pouco mais pra cima, filho. - Apontou para o céu.

— O que quer dizer? Viriam atrás dele só pelo sangue de demônio?

— Não, filho. Aquele mortal não experimentou com anjo de demônio nele, mas de anjo.

— Então ele é um anjo?

— O mais próximo disso.

— Não entendo. Se é assim por que viriam atrás dele?

— Porque aquele mortal é um estúpido que usou uma criança com resquícios de sangue Eidolon.

— E como sabe que não é o contrário?

— Filho, ele cheira como eu. Não como outros demônios, como um nephilim ou até um seelie. Esse garoto é um anjo condenado a nunca adentrar os céus.