Levittown Is For Lovers

Capítulo 9 – I Will Hold The Past Over Your Head


- Obrigado, Sra. Jenks! – John observou Jesse dizer enquanto sacudia a mão da senhora idosa algumas vezes, a empurrando para fora de casa, sem prestar a menor atenção às instruções que ela dava. Virou o rosto, observando a casa grande, a sala bem organizada com móveis de cor clara, sofás bem dispostos, tapetes caros. Haviam reformado a casa toda, não lembrava em nada a casa que John freqüentava há quatro anos e meio. –Ela é a babá do Cody. Está meio caduca... – disse o mais baixo, passando por ele, jogando a mochila em cima do sofá.

Cody? Quem diabos era Cody?

O cachorro?

- Cody...? – perguntou John, se sentindo realmente desconfortável ao ficar sozinho na sala quando Jesse sumiu pela porta da cozinha. Segundos depois a cabeça do outro surgiu pela passagem, um muffin preso entre os dentes. Ergueu a mão e fez sinal para que John o acompanhasse.

- Deixa a mochila aí. – gritou da cozinha. John olhou ao redor, pousando a mochila no chão mesmo, encostada ao sofá, não sabia se levaria bronca ao colocar a mala em cima do sofá claro, afinal, se tratando daquele louco, tudo era possível.

- Oi... – disse ao chegar à ampla cozinha da casa, com uma mesa grande, muitas cadeiras, uma geladeira duplex, forno de microondas, fogão de seis bocas. Jesse estava de pé em uma cadeira, mexendo em algo em cima do armário, o muffin de chocolate ainda enfiado na boca enquanto as mãos tateavam um pote de vidro. John viu quando ele pegou mais um muffin e desceu da cadeira, vindo em sua direção.

- Cody é o pivete. – explicou ao tirar o muffin da boca com uma mão, empurrando para ele o muffin intacto. –Pegue as mochilas e vamos subir, eu tenho que ver se ele ainda está vivo.

Querendo muito avisar a Jesse que ele não era seu empregado, John voltou até as mochilas, jogou as duas sobre os ombros e apertou o passo para alcançar o infeliz na escada carpetada. Quando chegou no alto, Jesse já não estava mais visível, mas havia uma porta entreaberta, de onde vinha um som baixo de criança, e a voz de Jesse sussurrada, falando qualquer coisa.

- Jesse? – chamou, já se aproximando da porta.

- Aqui! – a voz do outro veio. Se aproximou da porta, empurrando fraquinho até que ela se abrisse por completo, revelando o chão atulhado de cubos de plástico vermelhos, azuis, amarelos, verdes, bichos de pelúcia, dados, carrinhos, bonecos, e no centro de tudo, Jesse abaixado na frente do que poderia ser uma miniatura sua. Era um garotinho de olhos tão azuis quanto os de Jesse, cabelo claro, abraçado ao que parecia ser um dinossauro azul. –Esse é o Cody, meu irmãozinho. Ele tem um aninho, obviamente você não o conheceu. – Jesse disse, sorrindo para o pequeno, que olhava diretamente para John parado na porta.

- Vinnie...? – a criança perguntou, e Jesse riu, voltando os olhos azuis para John. O que? O pirralho o confundiu com... Vinnie?

- Não, esse chama John. – Jesse explicou com calma. – Ele chama todos os meus amigos de Vinnie. – se levantou, indo na direção de John.

- Certo... – comentou somente, ao ver Jesse sair começando a fechar a porta. –Ele vai ficar bem, sozinho?

- Ah, vai... – Jesse comentou, chutando para dentro do quarto o pequeno Cody que começava a sair, e então dando um sorriso inocente para John ao fechar a porta, abafando o choro da criança. –Eu cuido dele todos os dias depois da aula, acredite, ele é imortal.

John viu Jesse passar por ele, na direção do fim do corredor, indeciso entre seguir o garoto ou acudir a criança.

- I- imortal? – perguntou, começando a correr atrás do outro.

- Sim, ele engoliu a roda de um carrinho semana passada. A mamãe só percebeu o que havia acontecido quando foi ensinar ele a usar o troninho. – de ombros, abrindo a porta do quarto.

Era um quarto simples.

Paredes azul claro, uma flâmula do New York Yankees pendurada sobre a cabeceira da cama, um quadro do The Smiths, um dos Beatles, uma estante repleta de livros, uma cama de solteiro, um guarda-roupa, tudo na mais perfeita ordem.

Tão perfeita ordem que chegava a o desconsertar...

- Ah. – resmungou, jogando a mochila de Jesse no chão junto com a sua. –Bom, o trabalho...

Jesse o olhou, fazendo uma careta.

- Uhn... é. Pode começar procurando na estante algum livro que sirva pras informações complementares. Eu vou fazer a mamadeira do Cody e pegar alguma coisa pra comermos. Enquanto isso, você pode tentar engolir esse muffin, eu te garanto que não envenenei. – sorriu, e só então John se deu conta de que ainda segurava o muffin inteiro na mão. –Mesmo que eu quisesse muito o fazer... – Jesse saiu resmungando ao fechar a porta.

Ótimo, então.

Tinha uma estante gigantesca com todo o tipo de livros e um muffin – livre de veneno – na mão. Puxou um pouco o papel, dando uma mordida pequena, sentindo o gosto do chocolate na boca.

Gosto um tanto diferente, mas bom do mesmo jeito.

Seus olhos passaram pelas lombadas dos livros espalhados pela estante, digerindo mentalmente cada nome escrito. Havia livro de todo o tipo: livros específicos de física, livros sobre música, história do rock, literatura, O Senhor dos Anéis...

Respirou fundo, terminando o muffin e puxando um dos livros, se sentando no chão mesmo com o livro aberto em seu colo, correndo os olhos sobre o índice antes de caçar o conteúdo. Ouviu a porta se abrindo, mas não ergueu os olhos das páginas, apenas folheando vagarosamente.

- Sabe, eu acho que nesse a gente consegue bastante coisa, juntando com o livro da escola... se faltar algo nós podemos tentar a biblioteca pública. – disse, ainda concentrado. Ouviu um risinho fraco, que definitivamente não pertencia a Jesse, e erguendo os olhos se deparou com ela: tia Sandy.

- Você não mudou nada, John! – ela exclamou. Ainda tinha o cabelo loiro longo nos ombros, em cachos definidos, e olhos azuis. Não havia mudado praticamente nada nos anos todos em que ficou sem a ver!

Se levantou, sorrindo, deixando que Sandy Lacey o abraçasse.

- E como estão seus pais? – perguntou.

- Bem! – disse, não sabia muito o que dizer quando uma senhora da idade de sua mãe ficava lhe dizendo que ele estava lindo, que havia crescido mais que Jesse, que...

- Quando o Jesse me disse que você voltou fiquei mesmo ansiosa para te ver. Vocês eram tão grudados! – sorriu. –Mande um beijo para seus pais, e para a Michelle. Ela deve estar linda...

- Sim, está. – John assentiu, corando, ficando ainda mais sem jeito. Não contaria a ela que o seu filhinho adorado o havia desprezado na escola e fingido que não o conhecia, mesmo porque, Jesse estava na porta do quarto, observando tudo com desdém e uma bandeja nos braços.

- Mãe, temos um trabalho pra fazer, dá licença? – a voz de Jesse soou monótona, como sempre soava. A mulher o fitou Jesse ao que parecia ser um tanto desconsertada, e depois pousou os olhos cheios de carinho em John.

- Eu estarei lá em baixo com os outros quatro, caso precise de alguma coisa, está bem, querido? – e dando um beijo em sua cabeça, saiu pela porta.

Jesse chutou o pedaço de madeira, até que ela se fechou, pousou a bandeja na cama, sem olhar John, que sorria vitorioso.

- Sua mãe lembra de mim, estranho, né? – comentou com o livro em mãos. Queria ver Jesse sair dessa.

- Ela está fazendo tratamento psiquiátrico, acha que conhece todo mundo. – ergueu os olhos frios para ele, e sorriu. – E então juntamos minha mãe louca e o garoto esquizofrênico e olha só, os dois se entendem.

- Sua mãe não é louca! – exclamou indignado. –Ela lembra o nome da minha irmã!

- Michelle? – Jesse arqueou as sobrancelhas rindo. –Tem nome mais comum do que John e Michelle?

-Jesse. – afirmou com a cabeça. O outro o encarou alguns segundos, apontando para dois pratos na bandeja, um com um sanduíche inteiro, o outro com um sanduíche picado em pequenos cubinhos, e dois grandes copos de suco.

- Come. – ordenou, pegando o sanduíche inteiro e o copo de suco. –Aquele livro serve?

John pegou os cubinhos de sanduíche, tomando o suco, agradecido por ter sido poupado do trabalho de picar pedacinhos.

- Acho que serve sim. –assentiu, captando um meio-sorriso nos lábios de Jesse enquanto os olhos azuis se fixavam no tapete azul-marinho do quarto, repleto de estrelinhas amarelas. Era a chance que tinham para se entender.

John se virou de bruços na cama, ouvindo Adam falar sem parar sequer para respirar, o telefone preso entre a cabeça e o ombro. Havia voltado da casa de Jesse há uma meia hora e jurava nunca ter visto tanto Lacey junto, e contou isso para Adam, que o explicava sobre como os Lacey não faziam a menor idéia do que significava “controle de natalidade”. E depois disso começou a falar de sua família, de Matt, que o havia ajudado a reformar o quarto e agora estava com o braço esquerdo engessado porque quando Adam foi passar com a lata de tinta, tropeçou na escada, o que causou uma queda de Matt pela janela do segundo andar de cima do sobrado onde morava, direto no canteiro de petúnias de sua mãe.

- Coitado do Matt, sempre que vai te ajudar... – começou John, um sorriso fraco nos lábios enquanto falava.

- Hey! Não coloque a culpa em mim! Ele disse que perdoou. – resmungou Adam. –Coitadinho, eu estou me sentindo péssimo.

- Relaxa, ele sempre te perdoa. – riu John do tom de voz arrependido de Adam.

- Eu sei. – fez silêncio alguns segundos. –John, vamos sair amanhã? – perguntou animado. –Terá uma festa, todo mundo vai. Será na praia, e o Matt vai tentar pegar o carro do pai dele emprestado. Podemos beber e nos divertir...

John riu da animação do outro ao telefone. Adam era o tipo de pessoa que sabia de todas as festas em todos os lugares, e raramente deixava de ir a alguma. Matt e ele sempre voltavam com a bolsa cheia de fofocas sobre todo mundo, era bem engraçado ouvir o que eles tinham a dizer sobre as pessoas da escola.

- Parece legal. Eu acho que vou sim. – disse, não animado para a festa em si, mas para estar junto com Adam e Matt.

Fazia tempo que não se deixava apenas rir com eles, o tempo todo pensando no que Jesse faria com ele na aula, ou em como faria para não acabar magoando Adam. Fora isso, passavam o tempo todo falando sobre a vingança, e rindo de como Jesse se sentiria, e John, para sua própria surpresa, não sentia a menor pena. Queria mesmo ver Jesse destruído.

- Vamos sim! A gente passa aí pra te pegar amanhã às sete, então! – exclamou.

- Combinado. – disse, se despedindo e desligando logo em seguida. Ficou ainda deitado algum tempo, esticado na cama, encarando o teto enquanto se perguntava o que seu pais diriam se soubessem que ele estava ficando com um garoto que havia acabado de conhecer.

Não era nem o fato de ter acabado de conhecer, era o fato de ser um garoto.

Era o fato do garoto mexer com ele, o fazer pensar nele o tempo inteiro, o fazer gostar dele.

Adam era um infortúnio em sua vida, mas também era a única coisa que o estava mantendo são naqueles dias. Era em Adam que pensava quando ouvia alguma música bonitinha, era em Adam que pensava quando acordava nas segundas-feiras, era em Adam que pensava quando ia pro intervalo...

E tinha medo.

Medo porque não estava apaixonado, porque sabia que gostava dele, mas que nunca conseguiria se apaixonar, porque nunca conseguiu.

- John, a janta está pronta! – sua mãe gritou do andar de baixo, e ele não achava que tinha forças pra levantar da cama e ir até lá. Por um lado, queria ir para a festa com Adam e Matt, por outro, queria ficar em casa vendo televisão.

Podia alugar filmes...

Podia continuar sendo o recluso que sempre foi, ou poderia erguer a cabeça e fazer amigos, porque sabia que não votaria logo para Londres, porque sabia que sua vida estava ali, e que era com aquilo que ele teria que se acostumar, cedo ou tarde.

- Já vou! – respondeu, começando a erguer o corpo magrelo de cima da cama. Calçou o all star surrado, fazendo uma nota mental de que precisava comprar outro logo. Caminhou na direção da porta, e a abriu, sentindo o cheiro de comida quentinha lá embaixo.

Deu uma última olhada para o telefone e foi se juntar à sua família pro jantar, onde fingiria que estava tudo bem em sua vida, e não pensaria em Adam.