Legacy - Interativa

Capítulo 5 – They got luxury, I want love


CAPÍTULO 5 – They got luxury, I want love

“Duvidar de si mesmo é o primeiro sinal da inteligência”

Ugo Ojetti

Amelia desceu para o jardim frontal assim que soube que rainha Marie a esperava para um café da manhã ao ar livre. O convite pareceu algo adorável e a condição climática era reconfortante, com o sol brilhando timidamente por entres os riscos brancos que eram as nuvens, o vento frio soprando com sua calmaria e serenidade outonal, deixando tudo com um aspecto adormecido e sereno, no palácio, a movimentação não seguia o rumo frenético da noite passada e os criados pareciam mais silenciosos do que nunca.

Alguns poucos Lordes e Condes haviam tomado a decisão de ficarem por Portugal mesmo. No dia 23 de novembro, ou seja, pouco menos de um mês, aconteceriam as festividades do décimo sexto aniversário da princesa Teresa e os especulas já apostavam que a família real se pronunciaria sobre o casamento de Kai e Amelia. A intuição da princesa grega apontava que Marie estava apressada e ansiosa para isso, mas a princesa não. Estranhamente, não sentia a euforia tomar conta de sua alma e seu plano era enrolar até saber onde iria se meter para o resto da sua vida. Gostaria que a casa Berenguer pudesse compreende-la nessa decisão, pois Melia a julgava importante.

Assim que avistou a mesa solitária no vasto gramado, a princesa sorriu. A surpresa agradável foi ver que suas duas melhores amigas já estavam a mesa junto com a rainha. A princesa Teresa também estava por lá e alguns criados ficavam contemplando seu silêncio interior. Eve e Naomi estavam sorridentes logo pela parte da manhã, Melia nunca as vira tão felizes quanto naquele momento. Elas pareciam realmente honradas por dividirem uma mesa de café da manhã junto a rainha Marie, coisa que apenas encarjou Amelia a se aproximar do pequeno grupo. Passando pelo gramado com passos elegantes e feição relaxada, ela se aproximou da rainha e a cumprimentou com um aceno de cabeça tímido.

–Majestade.

–Amelia, querida, sente-se e sirva-se.

A menina o fez, e timidamente uma criada deslizou ao seu encontro, tão leve e silenciosa quanto um fantasma, mas um rosto tão agradável quanto o desenho de um anjo. Ela fez uma reverência e a princesa cochichou seu pedido. Em seguida, a moça a serviu com uma generosa fatia de torta de peixe, um prato com porções pequenas de uva e uma xícara de chá.

–Suas damas são adoráveis, princesa. – Marie sorriu encantanda e estendeu uma mão para Naomi.

–Obrigada, Marie. Foram educadas no castelo, e crescemos muito próximas.

Amelia trocou um olhar de cumplicidade com as amigas. As três esforçaram-se para não soltar um risinho. Em geral, todas as vezes que ouviam um elogio tão importante, ficavam estasiadas e animadas, mas ainda melhor que o elogio em si, era o lampejo de orgulho e satisfação nos olhos azuis cristais de Marie, que deixavam bem claro que suas palavras eram verdadeiras.

–Ah, meu desejo sempre foi arrumar damas para minha filha, mas logo depois do seu nascimento veio Dimas, e imaginei que pudessem se divertir juntos.

–Mamãe, você apenas esqueceu que eu e Dimas nem temos os mesmos gostos e de que sou uma mulher – Teresa colocou a mão sobre a boca enquanto terminava de mastigar uma nozes.eEla parecia tão distante hoje, mas Amelia achou de melhor tom não perguntar – E, de qualquer forma, acho que não conseguiria me acostumar com duas amigas sempre tão próximas a mim.

–Porque não, Alteza? – Eve perguntou timidamente – Naomi, Melia e eu somos muito próximas e temos livre arbítrio para conversarmos.

Amelia incentivou:

–Foi uma das melhores coisas que meus pais fizeram por mim. Tenho consciência do quão complicado deve ser crescer com dois irmãos, só Ítalo seria suficiente para me fazer perder a cabeça!

As três riram descontraídas. Amelia enfiou um pedaço da torta na boca e saboreou o misto dos temperos marcantes e da massa rígida. Era uma combinação que, por fora, não parecia correta, mas que quando se juntava, simplesmente se encaixava.

–Vocês me deram uma ideia – anunciou a rainha, deixando de lado sua xícara – Filha, estamos integrando pessoas nova à Corte, e se for de seu desejo escolher suas damas, ficarei feliz. Assim você ocupa sua cabeça com coisas mais certas também.

O tom de censura na voz de Marie fez com que Eve corasse e olhasse fixamente para as comidas em seu prato. Naomi e Amelia não se importaram, mas sabiam que a rainha mãe criticava as atitudes da filha, sempre tão alto astral e livre.

–Sim – Teresa respirou fundo depois de muito pensar – Posso considerar essa ideia.

XX

–Amelia, se não se importar, preciso ter uma conversa com você – Marie disse enquanto largava seus talheres com sutileza.

Antes mesmo que a princesa pudesse responder, viu Teresa pular de seu banco e tomar o rumo do palácio, seguida por perto de Eve e Naomi, que se levantaram não sem antes uma troca de olhar tensa.

–Recolham a mesa.

Às ordens da rainha, as criadas silenciosas puseram-se aos seus trablahos. Amelia acomodou as costas no encosto da cadeira para dar passagem para uma moça recolher sua xícara e a outra pegar os guardanapos sujos. Por um tempo, o barulho das porcelanas reais foram o que preencheram o silêncio. Melia sentia-se tensa e tentava olhar diretamente para os olhos da rainha, que subitamente tornaram-se sérios. Era difícil encará-la sem ter receios, pois Marie cultivava de um gênio carinhoso e prestativo e era certeiro que nunca mostrara essa sua face rígida à ninguém. Imediatamente, a princesa listou mentalmente as coisas erradas que poderia ter feito.

Seria incapaz de imaginar que alguém tivesse desaprovado seu vestido do baile. Intencionalmente, Amelia pedira um vestido de alças, mas apenas pela curiosidade em saber como era mostrar os ombros e, além do mais, tomara bastante cuidado para que seus seios pequeninos ficassem bem cobertos embaixo do tecido. Não era sua intenção soar vulgar! Será que sua curiosidade inocente havia feito com que Marie a desaprovasse totalmente e pudesse mandá-la para casa? Engoliu em seco antes de perguntar com a voz calma:

–Fiz algo de errado, Majestade?

–Não creio que tenha – ela sorriu. Melia apertou seus própios dedos, num impulso – Mas o casamento deve ocorrer logo e preciso fazer algumas perguntas.

Houve um silêncio desconfortável até que Marie engatou, com gentileza, seu questionário:

–Quanto tempo faz desde sua chegada?

–Nem bem uma semana.

–O tempo passa depressa, minha querida. Tem consciência disso, não tem?

Amelia fez qe sim com a cabeça mas não estava gostando dos rodeios que a conversa estava fazendo e sentia-se cada vez mais acuada. Diminuida.

–Você já... Esteve com outro homem?

–Como assim?

–Já se envolveu em um romance? Desejou outro?

Por alguma razão aquilo foi o estopim. A princesa sentiu-se desprovida de confiança. A forma como Marie aborava o assunto... O jeito que seus ombros estavam relaxados e os lábios pronunciando as palavras sem nenhum pudor foram o suficiente para fazê-la pular da cadeira. Os guardas, observando tudo a distância, se aproximaram feito uma ave de rapina a proteger seu ninho. Formaram sua posição de proteção e estabeleceramse rigídos, preparados para qualquer agressividade vinda da moça.

Nunca ninguém havia sido tão direto e brutal com palavras e isso abrira uma pequena ferida no ego de Amelia. Ela... que fora criada para ser tão pura quanto um recém-nascido, tão delicada quanto a primeira flor da primavera! Seria impossível que não pudessem enxergar esses ideais nela.

–Desculpe, Majestade, mas a senhora está me ofendendo – quando falou, sua voz soprou baixa e calma, mas com entonação de seriedade. Nem mesmo ela podia acreditar que conseguia falar de tal maneira.

–Entendo. Mas imagino que sua beleza tenha atraído alguém. Ou até mesmo vários!

–Se sim, não é do meu conhecimento.

A rainha Marie inclinou-se confortávelmente em seu assento real. Respirou fundo e depois estalos a língua três vezes seguidas, não acreditando nas palavras que acabara de ouvir, parecendo um pouco... decepcionada.

–Mas certamente já viu homens que despertassem sua curiosidade – insistiu firmemente – Amigos do seu pai, por exemplo.

–Seria incapaz de me deitar com um homem que tem idade para ser meu pai, senhora.

–Então você é pura?

–Sim.

A pequena e importante palavra foi dita com convicção e flutuou pelo vento pelo o que pareceu longos segundos até chegar aos ouvidos de Marie. A rainha, pensativa, foi deixando-se absorver a verdade explícita em cada membro do corpo de Amelia e abriu um sorriso dócil e maternal. Os ombros da princesa caíram, felizes por se aliviarem de tensão, mas ela sabia que não poderia sair até que a rainha mãe desse permissão e ela enrolava. Levantou-se lentamente, ajeitou a saia e caminhou na direção da menina.

–Querida...

Marie tomou as mãos de Amelia e pareceu prester a desenrolar um grande discurso, mas em uma fração de segundos engoliu todas as suas palavras, como se medisse o peso de suas consequências. Tal atitude fez com que o coração juvenil de Melia se aquecesse, mas não o suficiente para apgar o diálogo recente, ainda fresco em sua memória. Não poderia negar que a forma direta que haviam invadido sua privacidade tinha sido uma grande arma para desabá-la, o que lhe fez pensar que, na verdade, muito pouco lhe pertencia.

Eve, Naomi, Teresa, Kuanna e tantas outras mulheres e meninas ao menos gozavam de certa liberdade. O rei Gregório e a rainha Gemma haviam vendido a virtude da filha para Kai - isso quando ela era apenas um bebê de três dias de vida – de forma que a família real portuguesa havia tomado conhecimento sobre cada passo de sua infância. Agora sabiam até mesmo sobre sua vida amorosa – inexistente, diga-se de passagem – e sobre sua virtude.

–Não fique aqui fora. Pode se resfriar.

–Sim, rainha. Logo entrarei.

Com um último sorriso caloroso, Marie a deixou. Levou consigo a pequena tropa de soldados fiéis e a aura de superioridade, auto-confiança e luz divina que parecia exalar até mesmo da raiz mais funda de seus cabelos ruivos.

XX

Nunca escrevi para mim mesma um registro de meus pensamentos. Penso que um dia, caso me tornar importante, estes rascunhos em que hoje deposito minhas lamúrias hão de ser influentes. Por enquanto, procuro um leito para sossegar minhas palavras.

Me chamo Amelia Patras, e completei minha quinzena no inverno rigoroso do atual ano. Meu nome ainda é sobreposto e protegido pelo nome de papai e pelo nome de minha querida madrasta. Penso que ambos tiveram o cuidado de não me exibir para o mundo e acabaram por esquecer de me avisar que simples palavras machucam mais que o terror do além das muralhas.

Cheguei nem bem a uma semana em Portugal, lugar onde muito provavelmente hei de casar com o príncipe Kai de Berenguer e criarei nossos filhos. Tinha receio, mas nesta manhã outonal tivve ainda mais. Sua sempre tão adorável mãe, a rainha Marie Susanne Parsons de Berenguer, me surpreendeu ao perguntar-me sobre minha vida pessoal. Quis ela saber se já me permiti ser tocada por algum homem. Fui-lhe franca e disse que não. Sua insistência me ofendeu e quase estropolei de más palavras, mas fui catita, pois estou certa de que não preciso explicar que fui criada para o – até então – intrigante príncipe Kai.

Agora que voltamos a dividir teto, me refiro a mim e ao meu futuro esposo, e que também estamos em idade mais avançada, me questiono se por livre e espontânea vontade Kai me escolheria. E eu, diria que sim?

Devo reconhecer a bagunça que está meu coração e a minha mente. Mas senti a vontade de expressar-me em estato atual para que daqui pouco tempo possa voltar a reler este meu pequeno e simplório depoimento e rir de minha situação.

Acho que nunca parei para pensar o quão importante o matrimônio é. Sempre vi e convivi com famílias, e abençoado seja o Senhor por ter me entregado à uma família tão terna, no entanto, sempre tive as coisas entregas na minha mão. Durante toda minha pacata vida soube que contraria matrimônio com um príncipe do qual desconheço seu interior. Explicando-me claramente, digo que sei sua idade, o nome de seus pais e o nome de seus irmãos. E também sei que fazem e fizeram muito para me receber em sua casa aconchegante e rica, mas não o conheço. O meu futuro marido. Sei de seus olhos azuis-esverdeados tão intensos que podem deixar um homem tonto, mas ele parece ter uma armadura muito forte, moldada perfeitamente em seu corpo e que protege seu coração. Kai me instiga. Me deixa a dúvida de que se o problema é ele ou se sou eu. E, neste real momento, colocando minhas experiências e minhas ideias e vontades sobre minha mesa, questiono-me: Tenho motivos para sentir os medos que sinto?

Amelia Patras, primeira princesa da Grécia, Futura Príncesa-Rainha Consorte de Portugal,

Setembro, 1523

Amelia dobrou as folhas de pergaminho que usara e as enfiou entre um livro de poemas que não era seu, mas que já estava no quarto. Apertou as amarras do livro bem forte e depois de observar a capa dura vermelha, o enfiou no meio da estante praticamente vazia. A leitura era um prazer que a princesa gostava de usufruir, mas em Portugal haviam muitos poucos livros que ela entendia de verdade. Podia comunicar-se com qualquer portugues desde que seus diálogos não se estendessem para palavras muito estudadas e sofisticadas. Em geral, estava bem orgulhosa do seu palavriado desde que chegara, pois não tinha pedido sequer uma vez para alguém repetir uma frase ou uma palavra sequer. Mas gostava mais quando podia conversar com suas amigas na sua língua-mãe. Era mais fácil e não precisaria se deter pensando em palavras, era por isso mesmo que tomara a decisão de que seus registros de desabafos seriam todos manuscritos na língua grega.

Não tinha medo que alguém abrisse o livrinho histórico e encontrasse sua carta, mas achava que seria bom guardar somente para si. De certa forma, descobrira que a escrita podia funcionar como um alívio para a mente. Sentia seu cérebro mais relaxado e era mais fácil pensar. Até mesmo sua audição parecia estar mais apurada. Escrever poderia ser tão revigorante quando um banho quente no inverno gélido!

Suspirou ao encarar a estante pálida, tão escondida em suas cores opacas e seu vasinho de margaridas murchas e ajuntou seu bordado, aquele que vinha a tanto tempo enrolando para terminar, e desceu para o Salão Principal Social.

XX

–O que tanto escreve? – Amelia finalmente perguntou. Teresa, sentada ao seu lado e quase afundada em montes de pergaminhos e tinta de caneta, escrevia com certa agressividade e pressa durante horas seguidas.

A portuguesa levantou os olhos castanho-esverdeados e Melia reparou que ela tinha aplicado mais maquiagem no rosto desde que a vira no café-da-manhã. Ficaram se encarando no silêncio por um curto segundo, Teresa estudando o olhar da outra princesa.

–Convites. Para meu noivo e seus amigos.

–Noivo? Não sabia que estava noiva. Deixe-me lhe dar os parabéns.

Amelia se levantou e abraçou Teresa. Ela resmungou, mas retribuiu o abraço de maneira carinhosa antes de explicar:

–Não gosto dele, futura cunhada. Aceitei casar com ele e só.

–Nunca me contaram sobre seu noivo.

–Ele é um duque – ela explicou – Para ser franca, é tão humilde que me enoja – ao dizer isso, fez uma careta de dor – Não gosta de admtir que é primo do meu pai e prefere usar o título de ‘Duque’, mas asseguro, tem muito dinheiro. E me ama.

–E porque você não gosta dele?

–Ele tem trinta e oito anos. Velho demais para mim. E já se casou três vezes antes. Ou seja, serei sua quarta. É como ser sua quarta opção. É como se ele fosse rever seus estoques e ver que só sobrava uma última opção: eu.

Amelia mordeu os lábios, tentanto acompanhar o raciocínio:

–Ok. Mas você disse que ele a ama, então talvez não seja bem assim esse negócio de quarta opção.

Teresa largou a caneta com calma e ajeitou o decote profundo. Ela era um ano mais velha que Amelia, e tinha mais peitos! Como poderia ter tanta diferença

–Ele me ama. Me manda presentes, vive recitando poemas chatos e longos, me envia dúzias de cartas e sempre tenta me tocar. Meu braço, meu cabelo, minha cintura... Parece que sempre quer me sentir, entende? Mas não nasci para ser a quarta. Nasci para ser a primeira.

–Então aceitou se casar com um homem por causa de seu dinheiro?

–Quase isto. Mas me casarei com ele porque sei que tenho certo comando sobre ele, também.

–A política do: ‘Não fui abençoada e nem tenho a capacidade para governar um país, então governarei algo menor, um homem talvez’

Amelia e Teresa se viraram em direção a voz fria e firme. Uma mulher de mais ou menos quarenta anos, cabelos tão platinados que causava tontura e olhos verdes escuros estava sentada bem atrás das duas princesas, ouvindo toda ou pelo menos a maioria da conversa. Ela também escrevia, mas diferentemente de Teresa, se detia apenas em uma longa e aparentemente complexa carta.

A portuguesa bufou e jogou voltou a encarar seu próprio colo:

–Governarei um marido, certamente. E você, Guida, que não teve capacidade para nem fazer isso?

A mulher parou a caneta. Um pingo gordo de tinta caiu no chão.

–O que teve a audácia de dizer, menina?

–Ora, volte a escrever a carta para seu amado. E aproveite sua estadia aqui na Corte, onde pode descansar e onde tem mulheres para massagear-lhe, pois as guampas que você carrega são tão grandes que devem prejudicar sua coluna desgastada.

–Sua boca é tão suja...

–Quanto as coisas que seu homem fica lambendo por aí. Eu imagino.

Amelia arregalou os olhos e levantou-se rapidamente, apavorada e constrangida com o palavriado. Nem Teresa e nem a tal Guida notaram seu estado de choque. Antes que pudesse sair pelo corredor e voltar para seu comodo, um burburinho agitado e sons de sapatinhos de saltos atravessaram o Salão. As poucas cabeças femininas que estavam ali se levantaram em direção ao barulho. Teresa parou de escrever suas cartas e Amelia mante-se de pé, parada.

Uma jovem donzela, na faixa dos seus vinte anos entrou embasbacada pela sala. Ela usava um magnífico vestido de bordados de ouro e ombreiras largas. Seu cabelo ruivo caía em ondulações até o seu ombro e seu rosto estava carregado de uma maquiagem refinada. Só poderia ser uma das muitas damas que auxiliava a rainha. Logo atrás dela, vinham duas meninas, tão iguais com suas cascatas de cachos negros que só poderiam ser gêmeas. Eve e Naomi também estavam no grupo, mas pareciam estar ali por acaso, já que também olharam impressionadas para o trio animado.

–Arrumem-se, Arrumem-se! – disse a ruiva – A rainha pediu, pessoalmente, para que eu lhes avisasse sobre as boas-novas!

–Coloquem os melhores vestidos – acrescentou a gêmea da esquerda.

–E trabalhem em sua educação e requinte! – a outra disse, sorrindo tanto que suas bochechas pareciam apertar os olhos.

–A Corte está feliz em receber o maior número de convidados possíveis.

Todos pararam e se inclinaram em seus devidos lugares. Eve e Naomi caminharam rapidamente para o lado da princesa a qual serviam e ficaram em seu silêncio curioso, esperando.

–Convidados de Mônaco, Grécia, Inglaterra, França e tantas outras partes da Europa estão lisonjeados pelo convite do rei Thomás e da rainha Marie. Irão vir a Corte. Chegam em poucos dias e os trabalhos no castelo já estão sendo encaminhados. Princesas, Duquesas, Damas... Alta-sociedade Portuguesa e... Grega. Arrumem-se!

E saltitando de felicidade, as três saíram porta a fora. Eve e Naomi caíram no abraço de Amelia, que sorria, ainda boba ao ouvir o nome do seu país! Será que sua família viria também? Será que já conseguiria matar a saudade do pequeno Ítalo? A princesa não deteve-se em dar um pulinho animado e soltar sua gargalhada ritmada. Naomi a acompanhou enquanto Eve apenas sorria feito boba. A princesa apertou forte a cintura das amigas e sorriu tanto que suas bochechas ardiam de dor.

–Vamos! – Naomi puxou as duas amigas – Vamos desenhar modelos de vestidos, tomar chá e comer vários doces enquanto conversamos.

Ela parou abruptamente no meio do caminho. O corredor estava vazio, mas mesmo assim, a dama morena verificou o lado direito e o esquerdo.

–O que foi? – riu Amelia.

–Será que é dessa vez que encontro meu marido? – confidenciou.

Eve rolou os olhos e apertou a mão da amiga com força exagerada.

–Vamos torcer para que ache o amor.

–Eve e o amor – brincou Amelia e Naomi acompanhou com um risinho

–Mas ela tem razão.

–Tenho sim! Aposto que vocês não sabem o que é o amor e é por isso que pensam assim.

–O que?

–Eve, o que você nos escondeu?

–Nada! – a loira abriu um sorriso envergonhado – É que apenas não tivemos tempo para conversar, mas aconteceu algo comigo no baile...

–Seu primeiro beijo? – Amelia torcia para que sim.

–Ah, quem dera fosse, Melia. Foi outra coisa. Conheci um jovem

–Ande, conte – insistiu Naomi, sedenta por novidades.

–Dançamos um pouco, conversamos, rimos... Ele é o comandante.

–O comandante! – os olhos de Naomi brilharam – Sei quem ele é.

–Eu também sei! Ele parece tão generoso... E é muito bem apresentável. Não me diga que marcaram de sair?

Eve corou:

–Ainda não, mas com visitas no palácio provavelmente vamos conversar mais.

–Como é mesmo o nome dele? – quis saber Amelia.

–Elliot Soverosa.

–Elliot – Naomi pronunciou o nome numa falsa voz refinada e Amelia fez o mesmo, rindo.

Eve se colocou no meio das amigas e apoiou-se em seus ombros. Ela era, ainda que em baixa escala, a mais baixa do grupo. Sua voz atravessou o corredor vazio:

–Eu estou tão feliz.

–Que bom! – a princesa abraçou-a pela cintura. Naomi apertou a bochecha delicada da amiga, como fazem com as crianças.

–Uma mulher, quase – brincou a morena.

–Menos – mas o sorriso de Eve não queria discordar de nada. – E você, Amelia, pois bem a vi conversando com o príncipe.

–Ah, isso...

A mais nova do grupo realmente não quis ficar corada, ou ao menos não quis que seu corpo tremesse em respota ao lembrar da sensação dos dedos exageradamente longos de Kai segurando-a com delicadeza pela cintura. O primeiro contato com alguém do sexo oposto. E como ficava ao lembrar dos seus ombros, nús contra as chamas das velas? Envergonhada, ela levantou os olhos para as amigas e abriu a boca para responder:

–Dancei – disse – Dancei. E ele me segurou pela cintura. E giramos pelo salão de forma que nunca dancei.

–Porque vocês se sentem... Tentam se entender através da linguagem corporal e isso é lindo. É como poesia.

–Devo concordar – Naomi tinha um tom sério na sua voz, mas ao mesmo tempo parecia controalr para não rir, coisa que fez com que Melia balançasse a cabeça.

–Mas não é do meu desejo casar. Não ainda. Estou meio desesperada – confessou.

–Por que? – Eve se colocou diante da amiga, fincando o olhar no dela. Para aquela garota, tudo tinha amor e poesia e ela vivia em um mundo tão cor-de-rosa e de algodão que sua inocência era encantadora.

–Percebi que estou mais exposta a essa família do que jamais pensei estar. Rainha Marie perguntou sobre minha virtude para provavelmente entregar um relatório ao filho. Ele deve ter minha ficha completa. Deve saber as medidas do meu quadril e da minha cintura, minha cor favorita, meu prato preferido, o nome dos meus parentes distantes... O que me faz pensar que ele me conhece. E eu não o conheço. E cheguei a uma conclusão.

Naomi pareceu interessada:

–Qual?

–Apesar de adorar a sensação de ontem a noite. Não consigo amar alguém que sabe sobre a raíz do meu cabelo até a sola dos meus pés