Legacy - Interativa

Capítulo 2 - That's Loyal


CAPÍTULO 2 – That’s Loyal

“Quando fores crescido, hás de querer ser feliz. Por enquanto não pensas nisso e é por isso mesmo que o és. Quando pensares, quando quiseres ser feliz, deixarás de sê-lo”

Claraboia

–Ainda lembram um do outro?

A rainha Marie esfregava o braço do filho com uma mão e na outra segurava o pulso de Amelia de uma forma delicada.

–Claro que sim, mãe – Kai disse com um sorriso fraco. – Como foi de viagem, princesa?

–Bem. Muito bem.

Melia lhe estendeu a mão em cumprimento e ele depositou um beijo ali.

–É bom revê-lo Kai – suspirou.

–O mesmo.

Ao ver a menina puxar a mão de volta para si, Marie interviu. Fez um gesto rápido para todos se movimentarem e seguiram a frente.

–Quanto ao seu cabelo, minha querida, o que anda fazendo?

–Ah, apenas deixando crescer.

–Cada dia mais lindo. Kai, aonde está indo?

–Se não se importa... mãe. Tenho alguns assuntos com meus irmãos.

Marie pareceu desapontada por um instante, mas depois soltou um suspiro, dando-se por vencida.

–Vá logo – disse, acenando com a mão – Espero que seus assuntos se resolvam até o jantar.

Assim que recebeu a deixa, o príncipe saiu correndo pelo lado oposto. Sem se despedir de ninguém.

–O príncipe está mudado - Amelia disse apenas para puxar assunto.

–Nem tanto. Lembra como ele foi teatral a primeira vez que esteve aqui? Não crie expectativas, pois Kai insiste em não amadurecer.

–Naomi e Eve, vocês se importam de me deixarem conversar com a princesa?

As garotas, entretidas em arrumar os últimos pertences para a viajem, parecem um pouco tristes de início, como se Harriet tivesse cortado sua empolgação em um ato violento, mas não contestaram contra a rainha e deixaram o quarto. Amelia também foi pega de surpresa e assim que se viu sem as amigas, caminhou cautelosamente até o lado da madastra. Se perguntando se havia feito algum desagrado.

–Como está se sentindo?

A princesa suspirou aliviada com a pergunta. Também se sentia grata por alguém querer saber algo tão simples e puro sobre ela.

–Não preparada.

–Para ser uma princesa de dois países ou para se casar com Kai?

–Hum.. Os dois. Lembro de achar Kai chato quando era criança e pode ser que o conheça de verdade agora e minha opinião não mude.

Harriet se inclinou para o lado de Amelia e passou a mão pelas bochechas da menina.

–Acredita em amor verdadeiro?

–Acredito em casamento arranjado.

–Não! – a rainha riu – De verdade, acha que pode amar o príncipe?

–Algo que papai sempre me disse foi para não ter expectativas quanto o amor. Ele sempre diz que isso pode valer para qualquer pessoa, mas que para mim, que tive um marido escolhido, é muito difícil.

–Certo. A opinião do seu pai é válida, mas e quanto a sua?

–Torço para que meu caso seja um fio desencapado.

–Confesso que eu também – a rainha sussurrou. – Ah, Melia. Tenha uma boa sorte lá. Meu coração está com você.

A princesa se jogou nos braços de Harriet. Afundou seu rosto nos cachos dela e tentou guardar a sensação do abraço de alguém da sua família. Suspeitava que demorasse a vê-los, então queria aproveitar ao máximo essa proximidade. E mesmo após se desgrudarem, nenhuma delas sentia vontade de parar de conversar.

–E como você acha que vai ser meu casamento? – perguntou Amelia.

–Lindo. No mínimo o mais luxuoso de toda Europa. Aposto que nem a família real britânica seria capaz de preparar uma festa tão influente.

–Marie e Thomás babam pelo filho.

–Eles se preparam a anos para o casamento e a coroação, estão muito orgulhosos do rei que Portugal terá. E, falando em rei... Quero que você arrume mais uma distração para sua cabeça.

–O que?

–Quero que você use seus contatos e escolha a pretendente de Ítalo.

–Madrasta!

–Mas com calma, não meta os pés pelas mãos.

–Claro. Mas achei que Ítalo teria um tratamento diferente do meu.

–Eu também – Harriet esfregou os braços – mas Gregório disse que muitas pessoas visitam Portugal, talvez algum senhor nobre ou rei tenha uma filha a altura do seu irmão. De qualquer forma, existem documentos agora que dizem que ítalo se casará apenas com a sua permissão. Ou seja, como foi responsabilidade dos seus pais escolherem seu casamento é sua escolher a dele. Esses documentos serão entregues a você quando já tiver em mente a escolhida e, caso não concorde com as regras, poderá alterar algumas coisas.

–Isso é loucura... Mas sim, eu quero fazer isso. E ter a certeza de que Ítalo terá um futuro perfeito.

–Ótimo.

–Rainha Marie, agradeço sua recepção, mas eu e minhas damas precisamos de algumas horas de descanço, se não se importar.

–Claro. Demorem o tempo que precisarem.

Amelia e suas damas fizeram uma rápida reverência antes de deixarem a sala dos tronos. Marie provavelmente ficaria por lá, sentada em um trono majestoso assinando documentos – era exatamente assim que a princesa se lembrava, quando viera visitá-la e era exatamente assim que Harriet passava a maior parte do tempo. Nada de novidade – Mas o fato era que as garotas queriam visitar suas instalações, e, agora que tinha a permissão de trazer suas duas melhores amigas consigo, esperava que não ficasse entediada como costumava ficar naquele castelo. Ela tinha certeza de quem seria seu pretendente, mas isso não diminuía a excitação que seria ajudar Eve e Naomi a escolherem os futuros maridos.

–Escute, se quiser saber minha opinião, a mais sortuda daqui é você – Eve disse, lançando um sorriso desafiador para Amelia.

–Por favor, não diga isso. Você viu o quão distante Kai soou hoje? Achei que pelo menos pudessemos ter uma conversa.

–Dê um tempo a ele, Amelia. – Naomi.

–Eu gostaria de ter trocado algumas palavras com ele, apenas isso.

–Não é apenas isso... – Eve foi dizendo distraidamente enquanto entrava no quarto de Amelia. Mas foi cortada por seu próprio suspiro ao enxergar o cômodo. – Jesus!

Amelia havia feito algumas poucas exigências para o seu quarto. Pedira cortinas vermelhas longas e uma penteadeira. Não sabia ao certo o porque que achava ideal para o cômodo que passaria a maior parte do tempo, mas estava orgulhosa de seu senso de decoração pois tudo pareceu se encaixar com a paisagem.

A vidraça da janela era clara e enorme, assim, poderia avistar o céu a hora que quisesse. Seria necessário apenas empurrar as cortinas. Além de que, com os campos verdes, seria muito agradável passar horas observando aquele lugar. Talvez até pudesse arriscar algum esboço. Torcia para que a lua também pudesse ser vista dali. O que mais poderia dar mais inspiração do que o céu?

–Marie sabe como agradar a futura nora – disse Naomi, passando os dedos pela penteadeira e parando por um instante para encarar seu reflexo no espelho.

Amelia se fechou a porta atrás de si e foi correndo para sua cama. Jogou-se contra o colchão e ouviu o delicioso som dos sapatos saindo dos seus pés e colidindo com o chão.

–Ela sempre soube. Aliás, Marie sabe bem como agradar qualquer um.

–Deus, isso soou inapropriado – riu Eve.

A princesa colocou um dedo nos lábios, imitando alguém pedindo silêncio:

–Mas estou falando a verdade. E é por agrados que ela vai fazer um dos maiores banquetes de Portugal, especialmente pela nossa chegada.

–Uau

–E o Brasil?

–É exatamente por isso que os Berenguer estão esbanjando dinheiro, Naomi – Melia apoiou-se nos cotovelos – Desde a morte do Imperador eles estão cada vez mais fortes. Dizem que o Brasil é uma nação muito rica e que tiveram sorte em ter encontrado tal território.

–Acha possível que outros países invejem Portugal?

–Inveja pode ter mas nada com o que devemos nos preocupar, imagino. O Brasil já tem um dono e vai ser difícil tirá-lo dos portugueses. Praticamente impossível.

Eve sentou-se na beirada da janela e encostou a cabeça na parede.

–Bom então você me deixa aproveitar dessa riqueza que a rainha Marie está vivendo para pedir vestidos caros?

Amelia riu:

–Desde que seja educada. Você é uma das minhas damas e deve mostrar que somos requintadas, Eve.

–Mas me deixe costurar seu vestido, Eve! Você sabe que posso costurar algumas roupas boas.

–Sei. Mas quero poder desfrutar do que me oferecem. E você poderia tentar investir no seu dom e aprender com as costureiras da rainha, já viu as peças que ela usa? Uma mais magnífica que a outra.

–Mesmo assim...

–Mesmo assim nada. Se preocupe um pouco mais com você, afinal, nós estamos aqui atrás de um marido. Precisamos mandar uma renda para casa também...

–Quanto as rendas, já disse que não quero nenhuma das duas preocupadas – a princesa interrompeu – Foi escolha minha trazer vocês duas. Minhas duas damas. Meu pai pode oferecer qualquer suporte para as famílias.

–Amelia...

–Sem reclamações, apenas consentimentos.

–Vossa Alteza Real, o príncipe de Portugal.

–Desculpe incomodá-lo meu príncipe, mas a Rainha requer sua presença na sala dos tronos imediatamente.

Kai puxou os lençóis macios até a metade da barriga e esfregou os olhos. O sol mal havia se fixado no céu e lá estava a rainha Marie, se fazendo exigente sem nem estar presente no quarto.

–Bem, Tom, diga a minha mãe que estarei lá em alguns minutos.

–Vossa Majestade também pediu para que levasse... “qualquer vadia que estivesse infiltrada em sua cama” sem que nenhuma outra pessoa na Corte notasse. Então receio que terei que levar a moça.

Sim. Lá estava Úrsula, vestindo apenas a saia e dormindo com a cara enterrada nos travesseiros. Seus cabelos estavam emaranhados e ela respirava profundamente, perdida em seus sonhos. Ela havia sido uma boa dama na noite passada, era quase triste pensar que depois de hoje ele nunca mais a veria. Nem ela e nem nenhuma de suas “amigas”, afinal, preferia ser respeitoso enquanto não tirasse suas conclusões quanto à princesa – Kai não queria ser arrogante e prepotente e pensava que enquanto Amelia não estivesse ali, poderia dormir com quem quisesse, mas agora seria diferente. Se Amelia fosse uma boa moça, da qual não mereceria nenhuma traição, Kai seria fiel. E um bom esposo.

–Eu mesma a despacho. Já pode ir.

O guarda fez uma reverência e deixou o quarto sem nenhum questionamento.

–Hora de acordar – o príncipe disse, cutucando o ombro da menina. – Úrsula, por favor, já é tarde.

A prostituta rolou para perto dele e se enroscou em seu braço, ainda parecendo meio perdida. Kai achava que toda mulher ficava muito mais bonita quando não estava tentando chamar a atenção e ali, totalmente indefesa e grogue, até mesmo aquela mulher era extremamente atraente, os cabelos soltos e sem usar nada na parte de cima.

–Sobre a noite passada – ela sorriu, sem abrir os olhos – Como poderei voltar aos outros clientes e me sentir satisfeita?

–Hora de ir...

Kai puxou seu braço, tentando não parecer muito rude e foi direto para o armário, buscando a roupa especial para a chegada de Amelia.

–Príncipe? – Úrsula chamou enquanto ele vestia as calças

–Sim?

–Espero que você tenha aproveitado a noite. - Kai suspirou entre um sorriso enquanto ela o abraçava por trás. O cheiro de perfume feminino barato misturado com uísque e suor exalava da pele de Úrsula. O príncipe se virou e passou a mão pelas bochechas da moça, descendo para o queixo e depois para o pescoço. – e que me chame mais vezes para... Fazer o que você quiser.

Os olhos verdes da prostituta foram se fechando lentamente. Kai observou-a prender um suspiro e depois deixou sua mão despencar ao lado do corpo.

–Hora de ir – repetiu – E, caso precisar, lembrarei de seu convite.

A última lembrança que Kai tinha de Amelia era de quase dez anos atrás. A primeira e única visita da princesa à corte portuguesa havia sido memorável para ele. Primeiro porque achava que poderia enfim saciar a sede de saber como era beijar uma garota e, segundo porque essa sua expectativa havia morrido nas primeiras cinco palavras que trocara com Amelia. Ele a havia odiado e reclamava para seu pai de como era chato ter que passar horas fingindo adorar uma garota que nunca queria fazer o que ele queria. Mas o rei não o levava a sério. Sempre dava risada e dando-lhe tapinhas nas costas, dizia que era para ele arrumar alguma coisa produtiva para fazer.

Bom, até que Kai poderia empurrar com a barriga a chatice que era conviver com Amelia durante aqueles meses de visita, mas então ele começou a perceber que talvez a princesa nunca mudasse e que ele estava condenado a se casar com uma garota sem sal. O príncipe começou a desejar que ela fosse embora logo ou que seus pais desistissem do tal casamento arranjado. Mas ninguém em sã consciência jogaria fora anos de contrato e o que aconteceu foi a primeira opção. Na última vez que eles haviam se visto, toda a família real estava reunida em um jantar agradável. O rei Thomás e a rainha Marie lideravam a mesa – cada um sentado em uma extremidade – enquanto as crianças e alguns parentes estavam distribuídos ao redor. Kai se lembra de se sentar entre a irmã Teresa e o irmão Dimas e na frente de Amelia. Ela parecia irritantemente alegre conversando com uma das sobrinhas de Marie, uma menina engraçada e inteligente apesar da pouca idade. Naquela noite, eles mal haviam trocado palavras e no dia seguinte, ao acordar, seu pai havia lhe noticiado de que a princesa fora enviada para a Grécia ao primeiro raio de sol por causa da morte da rainha grega.

Foi um choque para ele. Por alguns minutos, ficou pensando como seria perder a mãe com apenas seis anos de idade. Deveria ser horrível! Mas depois percebeu que Amelia fora sortuda caso a doença da rainha fosse contagiosa e que se assim fosse, ela estava muito bem protegida a quilometros de distância da mãe. Essa perspectiva foi boa para lhe causar algum conforto, já que na sua mente, ele também se culpava por desejar tanto que Amelia fosse embora – será que seu negativismo havia feito-o culpado?

Mas o tempo passou e qualquer dúvida foi distanciada. Kai foi aprendendo a conviver entre homens e a descobrir que mulheres não são chatas. Na verdade, ele gostava muito das mulheres. Especialmente na fase dos seus quinze e dezesseis anos, em que as damas já começavam a lhe lançar olhares diferentes, como se de uma hora para a outra, ele havia passado a ser notável. Algumas corriam para longe quando descobriam que Kai tinha um casamento arranjado com a princesa grega, outras, eram insistentes e diziam que não tinham medo de competir com Amelia mesmo que ele não visse uma competição. Quer dizer, nada no mundo inteiro iria mudar o fato de que Amelia e Kai casariam. Eles casariam e só. Não eram nem namorados e nem amantes – sequer trocavam cartas!

Meses atrás, enquanto se divertia com uma garota rica da cidade, ela havia mencionado Amelia. Inicialmente, a menção de outa mulher na conversa pareceu quebrar com qualquer atração do ambiente, mas a moça, que se chamava Brena, explicou que a maioria das garotas se sentia mal ou irritada por ter que “compartilhar” um homem com a princesa.

–Ela é uma das princesas mais lindas de todas – a garota havia explicado sorrindo – Meu pai vai mundo seguido a Grécia e diz que nenhum homem ousa sequer cortejá-la em seu respeito, príncipe, mas caso contrário, a princesa Amelia teria exércitos de pretendentes jogados aos seus pés.

A maneira sonhadora e até mesmo impressionada com a qual Brena havia falado aquilo havia tatuado na mente de Kai uma imagem engraçada de alguma princesa bonita e banhada de joias. Naquela hora, não fez importância, porque na verdade, ele estava flertando com Brena. Mas depois ele ficou pensando qual era a influência de Amelia sobre as pessoas – especialmente sobre os homens – e como ela usava disso.

Hoje, depois de tanto tempo sem vê-la, o que passou em sua mente foi: ela mudou.

Essas duas palavras simplesmente pularam na mente do príncipe ao vê-la entre suas duas damas de companhia. A grega estava usando um vestido de bordados dourado e uma capa de viajem cinza por cima. Aos poucos, Kai foi podendo ver os detalhes. Amelia não era uma mulher ainda, mas faltavam poucos passos para chegar a ser. Ele já tinha visto tantas outras garotas bonitas, mas o que ela tinha de especial?

Os olhos eram tão cinzentos quanto uma tempestade furiosa e mesmo assim, encaixavam-se de forma angelical em seu rosto anguloso. Cabelos pretos e longos e estatura média. A pele era tão branca quanto a neve.

Ela era linda. Sim, era.

Mas era preciso esperar apenas mais um tempo. Dois anos, no máximo, e Amelia seria a mulher mais estonteante de toda a Europa. E sim, era completamente aceitável o fato de que homens se jogariam aos seus pés e sacassem espadas apenas pelo prazer de cortejá-la.

Quando Kai entrou no quarto, Amelia ainda tinha aquela expressão séria e elegante de mais cedo, por mais que estivesse mais informal. Estava deitada na cama, apoiada no cotovelo esquerdo. Ela trocou olhares com suas damas e elas fizeram um aceno rápido e em harmonia.

–Vossa Alteza – reverenciaram Eve e Naomi ao passarem pelo príncipe.

–Damas – ele sorriu.

Kai deu um passo a frente e logo depois ouviu atrás de si o barulho da porta se fechar. Amelia soltou o ar e ajeitou a postura formalmente. Ela não se preocupou em ser convidativa e nem em sorrir alegre, o que obrigava o príncipe a olhar bem dentro dos seus olhos e tentar adivinhas suas intenções. Não queria ser invasivo e estava morrendo de medo do fato de que, bem... Ela já estava ali e logo, logo iriam se casar.

–Ah... – a princesa apertou os próprios dedos – Faz bastante tempo não é, Kai?

–Quase dez anos...

–Então, você já tem quase dezessete?

Pelo jeito que ela mordeu os próprios lábios, o príncipe poderia jurar que ela já sabia a resposta.

–Na verdade já fiz dezessete. Posso?

–Claro – Amelia indicou o divã a sua frente para ele se sentar e o lugar se tornou silencioso novamente.

Kai pode lembrar como era ficar quieto em um quarto. Como os aposentos da família real ficavam sempre no andar mais alto, os sons lá de fora eram reproduzidos em um tom baixo e muitas vezes agradável. Naquele momento, ele podia jurar ouvir o vento soprar contra as folhas das árvores.

–Bom, eu não tenho muita coisa para te dizer – o príncipe confessou sorrindo – Bem-vinda a Portugal novamente.

–Obrigada príncipe. Aliás, vocês todos estão me recebendo muito bem. É muito gentil.

–Ótimo.

O príncipe se levantou. Ele tinha um sorriso torto no rosto, que poderia sentir que estava se esforçando para ser simpático. Não como daquela forma falsa que fingira quando criança, mas de uma forma que ele mesmo torcia para gostar de Amelia e para que Amelia gostasse dele.

A princesa também se levantou.

–Você está mais alto – ela observou e então desviou o olhar para os pés, rindo – Como se não fossemos mudar nada.

–Você também cresceu Melia. E, além do mais, está muito bonita.

Amelia ficou séria. Visivelmente impressionada e sem jeito. O príncipe fez uma revêrencia.

–Vossa Alteza – brincou. – Posso ir agora?

–A vontade.

–Antes me deixe lhe fazer um convite para ser minha acompanhante no baile da semana que vem.

–Acho que isso já estava nas regras – Melia disse baixinho

–Verdade, mas mesmo assim, é um convite meu. Aceita?

–Sim.

As três meninas estavam deitadas na cama. Conforme o sol ia se ponde lentamente no horizonte, Amelia sentia o peso do cansaço parar sobre seu corpo. Era como se uma gripe tivesse se infiltrado no seu corpo e ela sabia que precisava de algumas horas de desanço, coisa que prometera para Marie que iria ter mas desde a visita de Kai, ela não conseguia.

–Descanse um pouco – pediu Naomi enquanto passava os dedos pelos cabelos da princesa.

–Dispensei todas criadas para instalar meus pertences – murmurou ela. – Meu corpo pede descanço mas minha mente está acelerada.

Eve engatinhou para mais perto das amigas. Ela bebericava um chá que havia pedido para as três.

–É normal. A viajem foi muito longa e cansativa. Mesmo com o conforto das carruagens do reino é difícil ficar sentada por tanto tempo.

–E mais a conversa com o príncipe. Desabafe, Melia.

A princesa gemeu e ajeitou-se no emaranhado de almofadas e travesseiros, podendo olhar para suas damas.

–Não aconteceu nada – foi franca – Ele me convidou para ir ao baile de boas vindas.

–Achei que vocês já tivessem que ir juntos – disse Naomi.

–Sim. Mas ele disse que gostaria de me convidar pessoalmente.

–Isso é muito gentil.

–E quer dizer que ele se preocupou com você, pensou em passar uma boa impressão – Eve encorajou.

Amelia fechou os olhos por um segundo, pensando muito em deixar sua mente viajar para longe e seu corpo ficar livre de todo cansaço. Mas então algo lhe ocorreu e ela voltou a abrir os olhos, olhando tanto para Naomi quanto para Eve.

–Eu queria que ele não fosse tão... intenso.

Eve pousou a xícara no pires.

–O que você quer dizer?

–Kai tem uma forma de sustentar o olhar que é... determinada. Praticamente o tempo inteiro ele olhou dentro dos meus olhos como se estivesse absorvendo minhas palavras.

–Parece atraente – Naomi confessou. Com o canto do olho, Melia viu Eve concordar e sorrir.

–Poderia ser nervosismo também, não poderia? Mas, acho que não estou achando Kai tão mais chato como antes.

–Então aproveite a proximidade dele. – Eve insistiu – mantenha-o próximo.

–Acha que vocês podem dar certo?

–Torço para que sim. Pelo amor de Deus.

As três riram. De forma descontrolada e animada. O cansaço batendo com a animação só podia resultar em minutos de risinhos inesperados e sorrisos sonhadores.

–Tive uma ideia – Amelia disse, se recompondo. – Vamos prometer uma coisa aqui. Somos três gregas em Portugal. E isso é muito estranho, devemos confessar, mas também é animado. E somos novas e amigas...

–Bonitas... – completou Naomi.

–Então, vamos jurar lealdade. Naomi e Eve, vocês seriam leais a esse grupo tanto quanto eu serei? Vocês seriam leais a nossa amizade tanto quanto são ao seu rei?

–E tanto quanto somos a você.

–Nossa futura rainha – Eve segurou a mão de Amelia e Naomi fez o mesmo.

–Obrigada. Mas não se trata apenas disso. Quero pedir para vocês que vamos confessar tudo umas as outras, mesmo depois de casadas e ainda depois, quando tivermos nossos filhos para cuidar. Vocês serão minhas madrinhas e madrinhas das minhas crianças.

–Eu e Eve dizemos o mesmo.

–Então, vamos começar por coisas simples. Semana que vem, no baile, caso alguma conheça algum pretenente ou beije alguém deve confessar. Assim, como nós estamos fazendo agora – a loira do grupo disse.

A princesa se animou com a ideia.

–Sim. E confessar seus sentimentos. Vamos prometer não ter vergonha de abrir nossos corações uma para as outras?

–Então, se você estiver gostando do príncipe você vai nos confessar?

–Serão as primeiras a saber, Naomi. Talvez antes mesmo de mim. Juramos?

–Juramos.

–É claro que sim. Juramos.