Laços

Capítulo 1 x 3


Beatriz
Beatriz acordou olhou para o alto e viu seu reflexo em um espelho que ficava prendido ao teto. Ela sabia o que tinha acontecido. A pessoa com quem ela havia transado não estava mais ali, no entanto deixou-lhe um bilhete.
“Obrigado pela noite Beatriz, você é uma mulher surpreendente, espero lhe ver outras vezes um grande beijo nessa sua boca deliciosa: Ycáro Sales”.
Ela fez do bilhete uma bolinha de papel e a jogou no canto do quarto. Enquanto seguia para uma poltrona do quarto onde suas roupas estavam jogadas. Beatriz se vestiu rapidamente enquanto abotoava os botões de seu vestido ela viu que seu celular começara a vibrar. Era Noah no telefone, ela não podia atendê-lo naquele momento. Ele tocou cinco vezes logo em seguida ela viu que o amigo havia desistido. Alguém bateu na porta e ela foi ver quem era. Ela olhou pelo olho mágico da porta e viu que era a mulher responsável pela limpeza dos quartos. Então ela abriu a porta.
– Me desculpe não sabia que o quarto ainda estava em uso. – disse a senhora toda recatada.
– Você não tem que se desculpar, eu também já estava de saída dona... – Beatriz se conteve alguns segundos suas palavras para olhar no crachá da mulher afim de ver qual era seu nome. – Dona Graça.
Beatriz fez um sinal para que a mulher entrasse. A mulher entrou com um carrinho pequeno que tinha uma vassoura, esfregão, dentre outros materiais de limpeza, ela começou a tirar a roupa de cama e o jogou em um saco que ficava pendurado do lado direito de seu carrinho. Enquanto Beatriz ia ao banheiro dar uma olhada no espelho e ajeitar o cabelo. Ela se despediu da senhora e a deixou fazendo seu trabalho.
O dia estava lindo, o céu estava azul sem nenhuma nuvem no céu. Tudo pedia uma boa piscina. Ela teria de pegar um taxi até sua casa, seu celular tocou, era Noah novamente;
– Bom dia mano lindo! – disse ela com tamanho entusiasmo.
– Bom dia Bia, ta saindo de que Motel? – disse Noah ironicamente.
O entusiasmo de Bia foi substituído por uma onda de frustração e divertimento. Ela sabia o quanto Noah a conhecia. Afinal eram oito anos de amizade e não oito dias ou oito meses. Por mais que eles não tivessem o mesmo sangue e não tivessem sido criados pela mesma mãe. A cumplicidade entre os dois era de irmão e irmã
– To saindo daquele que é o melhor da cidade, afinal você me conhece. – disse Beatriz pegando um maço de cigarros na bolsa. – Gosto de ter o melhor e nessa noite mano, tive o melhor.
Uma onda de gargalhada foi ouvida do outro lado da linha, ela sabia o quanto ele adorava suas histórias de sexo de fim de semana.
– Já entendi sua ninfomaníaca, vem passar o fim de semana aqui comigo? – perguntou Noah. – Vem pra cá agora tem roupa sua aqui em casa e eu também tenho uma coisa para lhe contar.
Beatriz percebeu uma incitação na voz dele. Ele também havia aprontado na noite passada, a questão era com quem aquela bicha havia transado.
– Daqui uns vinte minutos eu chego ai seu gay. – disse ela sorrindo.
– Passa na padaria e traz pão. – intimou ele.
Ela desligou o celular e foi andando para o ponto de ônibus. Ele estava vazio e do outro lado da rua, uma mulher chegava ao que parecia ser sua casa, a mulher trajava uma roupa toda branca deveria ser enfermeira. Beatriz se pôs a pensar que sua mãe também poderia estar chegando em casa naquele exato momento. O seu devaneio foi interrompido pelo freio do ônibus que parou no ponto para deixar algum passageiro desembarcar.
Beatriz embarcou no ônibus ela encostou-se à roleta da condução para pegar a carteira, o motorista não deu a partida. Pelo visto estava esperando que ela se sentasse. No momento em que foi dar o dinheiro ao cobrador ela percebeu que o mesmo não parava de olhar para o seu decote.
– Achou bonito? – perguntou ela com as sobrancelhas erguidas o que significa desprezo e até mesmo ironia às vezes. Quando vinha de Beatriz Alighieri
O cobrador levou um susto.
– Como, minha senhora? – retrucou o cobrador tentando se fizer de desentendido.
Ela apenas olhou para o decote e depois para o cobrador. O motorista olhou pelo retrovisor do ônibus não conseguindo esconder o sorriso por ver o cobrador passando vergonha.
_ Não senhora. – disse o cobrador envergonhado.
O cobrador pegou o dinheiro e liberou a roleta para que ela passasse. Beatriz se sentou em um banco bem no fundo do ônibus. E no que parecia ainda mais perturbador, alem do motorista e do cobrador, ela era a única passageira. Isso não importava até que chegassem ao centro da cidade, outros passageiros iriam embarcar e logo, logo ela estaria na casa de seu amigo, para passar um fim de semana agradável, com direito a muita risada.
Assim que chegou a porta do apartamento de Noah, sentiu o aroma de café feito na hora. Eram 9hrs da manhã de sábado. Ela tocou a campainha uma vez e de repente, lá estava seu amigo com o seu pijama que consistia em uma cueca samba calção vermelha e uma camisa vermelha, Gustavo foi quem havia dado aquele pijama a ele.
– Chegou rápido! – falou Noah dando um abraço em sua amiga.
Ela adorava ser abraçada por ele, pois havia sinceridade nos braços que a envolvia, havia segurança naquele abraço.
– Pra te vê, eu sempre ando rápido. – disse ela sorrindo e fazendo cara de irmãzinha mimada.
– Coloque o pão na mesa lá fora, já vou levar o café. – ele a instruiu.
Para chegar à pequena sacada, ela tinha que passar por seu quarto, a cama já estava arrumado com um cheiro de maracujá. Ela amava aquele cheiro. A mesa do café da manhã estava linda. Havia suco de laranja, torradas, bolo, três tipos de geleias e iorgute de morango. Ela se sentou a mesa, um raio de sol batia em suas costas. Noah chegou com um pequeno bule preto com café.
– Você gosta de comer muita coisa no café. – comentou Beatriz. – Não sei como não engorda.
– Eu não tomo um café da manhã assim todos os dias, só quando alguém em especial dorme aqui em casa ou vem tomar café comigo. – disse Noah em sua defesa.
Os dois tomaram café tranquilamente, dando risadas e fazendo criancices como sempre faziam, debateram alguns temas históricos. Como bons historiadores que eram. Os dois se formaram juntos na faculdade. Naquele período muita coisa aconteceu na vida dos dois. Beatriz estava junto dele, quando sua mãe faleceu até mesmo quando ele assumiu sua homossexualidade, foi um momento conturbado em sua vida. No entanto ele sempre manteve a cabeça erguida. Ele também sempre esteve pronto pra ela nos momentos bons e ruins, como no período em que sua mãe ficou com câncer, todos os dias ele estava lá, mesmo sabendo que sua mãe não gostava dele. A amizade e o amor dele por ela sempre falaram mais alto.
– Noah você se sente feliz com as escolhas que fez para seguir em frente na sua vida? Pra ser quem você é hoje? – perguntou Beatriz pousando suas mãos em cima das mãos dele.
– Você não faz uma escolha esperando que ela seja a certa. Você escolhe porque a todo o momento, a vida vai lhe obrigar a fazer uma escolha. A felicidade nesse quesito chega a ser incerta. Então você descobre que suas escolhas podem lhe fazer chorar ou sorrir. Mas, no entanto você deu um passo, seguiu em frente. – respondeu Noah olhando para o céu, na esperança de saber que sua falecida mãe estava feliz pelo homem que ele havia se tornado.
Beatriz não pode deixar de notar que aquela pergunta havia deixado o seu semblante meio que amuado, mas que em poucos minutos se desfez em um sorriso cativante e convidativo. Ela queria ter força e a energia positiva que ele tinha para ver o lado bom das coisas. Queria poder parar de procurar nas relações amorosas de fim de semana com algum desconhecido, uma maneira de sair do abismo de solidão e desespero que ela se afundava cada vez mais.
– Filosofou amigo! – ironizou ela.
Ele fez uma careta colocando a língua pra fora. Beatrz adorava as respostas filosóficas do amigo, pois mostrava o quanto ele era maduro.
– Agora me fala Bia, quem foi o cara desse fim de semana? – perguntou Noah curioso, louco para saber quem era.
– O nome dele é Ycaro Sales, uma excitação de homem faz um sexo como ninguém. – falou Beatriz se abanando com as mãos.
Noah, assim que ouviu o nome ergueu uma das sobrancelhas. Afinal ele sabia quem era Ycaro Sales. Sales era um grande amigo dele, os dois sempre mantiveram contato e saiam algumas vezes para beber e ver o jogo do Flamengo quando era uma partida importante.
– Nos conhecemos no Boa, ele me pagou uma bebida e você sabe como termina a história. – finalizou ela não contendo o riso. – Mais não fui só eu quem se divertiu noite passada, quem foi dessa vez?
Noah pegou um copo e o encheu até a metade, com suco de laranja antes de responder. Ele então respirou fundo como se o nome da pessoa ainda o deixa-se sem ar.
– Andre! – falou ele
Beatriz não pode conter a felicidade e a preocupação, pois ela sabia o quanto André havia balançado Noah anos atrás, os dois faziam um casal lindo. Sophie e ela chegavam até a dizer a ele, que ele feria o lado feminino delas.
Afinal Andre era tudo o que uma mulher queria, ele era um príncipe. Mas quando ele partiu sem ao menos se despedir de seu amigo, parecia que o mundo iria desabar. Noah não comia, não queria sair de casa, quase foi reprovado num período da faculdade.
– E como foi? Vocês transaram? – perguntou Beatriz louca para saber.
– Sim.
– Ele ainda te balança, não balança, ao ponto de te deixar querendo mais sempre?
Ele não precisou responder. Estava estampado em seu olhar, era o mesmo olhar de anos atrás. O olhar que todos os nossos amigos em comum tinham medo. Noáh iria se entregar novamente, sabendo que aquilo poderia machuca-lo de novo.
– Eu nunca o esqueci, afinal ele foi o meu primeiro amor, é uma das coisas que você não esquece. – disse ele com um suspiro.
– Só toma cuidado meu irmãozinho. Você já sofreu muito no passado. – aconselhou Beatriz fazendo carinho nos cachos de Noah.
– Beatriz, ninguém ama porque quer. – falou ele tentando demonstrar uma certeza que ele não tinha em relação àquela situação.
– No entanto sofre por escolha. – rebateu ela.
Ambos ficaram alguns segundos sem dizer nada. Ela percebeu que não tinha como argumentar sobre aquele assunto. Ela teria apenas que estar ali, pra ele caso o seu mundo desmoronasse novamente.
Enquanto Noah foi lavar a louça do café da manha. Beatriz decidiu ir tomar um banho, estava se sentindo suja. No momento em que se despia começou a olhar seu corpo e ver o quanto era linda. Sua pele branca, os cabelos ruivos e curtos, olhos azuis e um sorriso que cativava. Ela então se viu tomada por uma questão. Será que um dia ela encontraria um homem disposto a tocar aquele corpo pra sempre, na intenção de faze lá sua? Porque de certa forma todo mundo esperava se sentir propriedade de alguém.
O banho estava ótimo, ela adorava o chuveiro da casa de Noah. Assim que saiu do banheiro viu seu amigo sentado na cama, terminando de amarrar os cadarços do tênis. Ele estava com uma bermuda cape marfim e uma camisa social vinho. Ela gostava tanto daquele estilo esporte fino dele.
– Tudo isso é pra mim? – perguntou ela colocando por baixo da toalha a calcinha que ela sempre tinha de reserva dentro da bolsa.
– Não. – respondeu ele. – Vamos almoçar com André.
Beatriz não fez questão de esconder sua cara de desapontamento.
– Pensei que fossemos passar o fim de semana juntos?
– E vamos, nós apenas vamos almoçar com André. Depois ele vai pra casa dele. Eu e você vamos voltar pra cá e ficar agarradinhos naquele sofá ali da sala vendo filme. – explicou ele dando um beijo na testa da irmã.
Ela se sentiu mais aliviada com aquela explicação do irmãozinho. Mesmo assim ela se sentia incomodada em relação ao André.
– Vou me apressar então, porque se lembro bem, André odeia atrasos. – explicou ela.
Noáh deu um sorriso e saiu do quarto para que ela terminasse de se arrumar. Ela ficou quieta dentro do quarto esperando tudo começar a fazer sentido. Ele estava se apaixonando novamente.
Ela colocou um short e uma camisa xadrez verde que ela havia deixado na casa dele, depois de sua ultima visita onde eles foram a Pedra do Cão Sentado, um dos pontos turísticos da cidade para comemorar o fim das provas no colégio. Porque o pior não é passar provas, o pior é ter que corrigi-las depois. Ela terminou de se aprontar e foi até a área de serviço pendurar a toalha. Noah estava na cozinha tomando um copo de água.
– Vamos? – perguntou ela
Ele respondeu fazendo um sinal positivo com o dedo. Assim que ele trancou a porta do apartamento seu celular tocou. Era um assovio dizendo que havia chegado uma nova mensagem. Era André dizendo que já estava lá em baixo os esperando.
Beatriz não podia discordar. André realmente era lindo, seu corpo moreno e um físico atlético, cabelos curtos e negros e seu par de olhos verdes. Ela era o genro que qualquer mãe havia pedido a Deus para suas filhas. No entanto era Noah quem o havia fisgado. Ela sentou no banco de trás e os dois na frente. Ele o cumprimentou com um selinho.
_ Olá Beatriz! – cumprimentou André a olhando pelo retrovisor.
_ Oi André, como você ta?
_ Estou bem, melhor agora com essa pessoa aqui do meu lado.
Ela viu que ele olhava fixamente para Noah, e não pode esconder uma ponta de náuseas passando pelo seu estomago, como também sentiu pela primeira vez um pouco de inveja do amigo, pois ela via sinceridade nas palavras e no olhar dele. E aquilo a fez pensar se um dia uma pessoa também a olharia daquele jeito.
– Tá! Agora vamos acabar com o papo mela cueca, pois estou com fome. – falou Beatriz cortando qualquer clima que pudesse estar se restabelecendo naquele recinto.
Os dois pareceram não se importar com o comentário dela, mas também decidiram não insistir. Eles seguiram para Lumiar, provavelmente iriam almoçar na Casa Nova, era o restaurante predileto de seu amigo e o outro ia fazer de tudo para agrada-lo nesses primeiros reencontros de amor.
***
O restaurante tinha o aspecto de uma casa velha e ali estava a ironia no nome do restaurante, pois ele não tinha nada de novo. Até o modo de preparo da comida era como se fazia antigamente. No fogão a lenha o que deixava a comida com um gosto completamente diferente. A deixava excepcional.
– Como eu gosto de almoçar nesse lugar! – comentou Noah sentindo aquele cheirinho de comida caseira e mineira, adentrar por suas vias nasais.
André estava procurando um lugar para estacionar o carro, Beatriz escolheu uma mesa para os três perto de uma janela que dava para um canteiro, cheio de verduras e hortaliças.
– Pelo visto aqui é tudo caseiro mesmo! – observou ela.
– você já comeu aqui? – perguntou Noah
– Não que eu me lembre. – respondeu ela.
O almoço foi bem agradável, com direto a brincadeiras, recordações de lembranças boas e ruins. Mas como seria á vida se não houvesse o oposto a algumas coisas. Beatriz não deixou um minuto se quer de relembrar a primeira vez que André partira e como Noah havia ficado. Ela tinha de se preocupar afinal ele era o seu melhor amigo.
– Preciso ir ao banheiro. – disse Noah se levantando e indo para o banheiro.
Enquanto ele seguia para o banheiro. Beatriz não perdeu tempo em dizer aquilo que pensava para o André, porém ela foi surpreendida. Ele a olhava com uma expressão como se já esperasse que ela dissesse algo.
– Faça logo a sua ameaça Beatriz! – Falou André se recostando na cadeira e cruzando os braços.
– Eu não tenho que lhe ameaçar. Só espero que você pense bem no que você vai fazer com ele dessa vez. – disse ela o olhando severamente, sem vacilar no olhar.
– Eu sei que errei com ele no passado, percebi meu erro.
– Será?
André se inclinou para frente debruçando seus braços cruzados sobre a mesa.
– Qual o seu problema Beatriz? Pois acho que você tem uma ponta de inveja do Noah, pelo fato dele pelo menos conseguir ter alguém ao seu lado, porque quer ficar com ele. Já você, consegue homens que a querem apenas por uma noite.
Beatriz se sentiu apunhalada por aquelas palavras, por mais que ela odiasse admitir. Ele estava certo, ela queria ter metade do que Noah tinha, No entanto se via incapaz de ser feliz ou de se deixar ser feliz ao lado de alguém.
Os dois repararam que Noah estava voltando.
– Acho melhor essa conversa terminar por aqui. – sugeriu Beatriz.
Ele apenas fez que sim com a cabeça.
– O que vocês estavam conversando? – perguntou Noah.
– Beatriz apenas estava dizendo o quanto quer que nós venhamos a dar certo dessa vez. – falou André dando um largo sorriso para Beatriz.
A única coisa que ela podia fazer naquele momento era retribuir o sorriso de uma maneira bem convincente.
***
André os deixou na porta do edifício onde Noah morava e seguiu para sua casa. Disse que iria tirar o sábado e domingo para ver seriados. Assim que eles chegaram em casa, Beatriz ligou a TV e viu que iria começar o filme Um Dia. Ela já havia lido o livro e visto o filme varias vezes e ali se incluiria mais uma vez.
– Noah vai começar o filme Um Dia. – informou ela.
– Espera ai que vamos ver então. – falou ele da porta do seu quarto.
Ela ouviu as portas do guarda-roupa baterem. Meio minuto depois e lá vinha seu amigo com um cobertor azul e um travesseiro. Eles se aconchegaram no mesmo sofá. Ele a envolvendo em conchinha com suas pernas sobre ela deixando a se sentir confortável.
– Noah? – chamou ela.
– Oi.
– Será que vou me apaixonar um dia?
– Todo mundo é apaixonado por alguma coisa, você só tem que descobrir pelo que.
Ela sentiu os braços de seu amigo a envolverem num carinho aconchegante. Ele não podia oferecer a ela o amor que ela queria, porém ele podia a fazer se sentir amada a sua maneira.