O sol daquele dia ameno de outono há muito surgira... Pessoas circulam pelas ruas do centro da Capital Fluminense apressadas, outras a passos lentos, cada qual com suas motivações...Dentre os transeuntes da Ouvidor, Albertinho, com a imponência de sua farda verde oliva, anda a passos largos... Atrasara-se... Devia estar no quartel ao toque do Alvorecer.. Se tivesse dormido mais cedo... teria acordado na hora certa...Mas o motivo valera a pena... Ao lembrar-se do sorriso de Manoela e da risada da moça o rapaz sorri ... Perdido em pensamentos continua seu trajeto... até ser chamado por alguém...
Fernando: Albertinho... ei... Albertinho! Espere!
Albertinho: Ah... Fernando! Desculpe... Estava distraído!... Bom dia!
Fernando: Tome cuidado... Continue andando distraído assim que o bonde acaba te atropelando... Mas então... o que tanto te distrai?
Albertinho: Oras... Fernando.... que pergunta é essa?
Fernando: Você mesmo disse que estava distraído! Então... me conte... quem é a moça?
Albertinho: Está tão na cara assim? (começando a andar)
Fernando: Alberto... eu não te conheço de ontem... (começando a acompanhar o amigo pela rua)
Albertinho: Tá... vou te contar... até porque... logo vais ao meu casamento...
Fernando: Casamento? Vais me dizer que fez mal a moça e agora ela está exigindo retratação...
Albertinho: Estive em vias... mas não! E eu resolvi me retratar sem que ela pedisse... Gosto de Manoela... Quero me casar com ela...
Fernando: Quem diria! O mais convicto solteiro do time... está apaixonado e vai casar...
Albertinho: E você, o que me conta? Sei que já não está mais na tecelagem...
Fernando: Não... e quer saber a verdade? Tanto melhor!... Assim não me envolvo com a minha adorável família...
Albertinho: E Catarina?
Fernando: Não sei... Não sou mais noivo dela.... Prefiro não tocar nesse assunto... Tem de ir ao quartel?

Albertinho: Sim... e estou atrasado!.. Sai com Manoela ontem a noite... acabei chegando tarde em casa... e perdi a hora hoje...

Fernando: Mas que romântico...

Albertinho: Senti um tom galhofeiro em suas palavras, meu caro... Devo lembra-lo que você mesmo estava me dizendo o mesmo há um tempo atrás...
Fernando: Mas cheguei a conclusão que o romantismo não é para mim!.... Sou um boêmio!....
Albertinho: Você diz isso por ter se envolvido com a pessoa errada... Mas nem tudo está perdido... Ainda vai encontrar alguém...
Fernando: Bem... enquanto não encontro a mulher certa... me divirto com as erradas... E por agora... eu estou indo para o Clube... Te acompanho uma parte do trajeto...

Os amigos seguem conversando até seus destinos... A manhã passa...Na tecelagem Vieira mais um turno de trabalho intenso nos teares está por terminar... Nos escritórios da fábrica, após apresentar Manoela às atividades que realizará no local, Filipa e Edgar e a moça verificam os livros da indústria têxtil...
Manoela: Bem... teremos um longo trabalho... Como tem papel aqui!..

Edgar: Tem... e preciso que verifique toda a movimentação financeira do último ano... entradas e saídas... notas de compra e venda... borderôs...enfim... tudo..
Filipa: Certo.... e eu vou ver como está o andamento da produção... Ontem percebi muitos gastos com consertos de máquinas... e temos um pedido grande para entregar... Pelo contrato, eles deram um sinal em dinheiro... Vou ter de ver isso junto ao banco...

Edgar: Veja..... bem (erguendo-se)...preciso me ausentar agora... tenho que ir ao fórum... volto à tarde...

Filipa: Certo... vejo mais detalhes disso convosco à tarde...
O advogado levanta-se e toma a direção da porta, saindo. Ao certificar-se que estão sozinhas, Filipa continuando com seus afazeres conversa com Manoela...
Filipa: Então, Dra. Manoela Medeiros... como foi o passeio com Albertinho?
Manoela: Foi bom... muito bom.... Albertinho me levou a um lugar lindo... Vista Chinesa... dá para ver a cidade toda!... E à noite... as luzes... é tudo tão bonito... Você e o Joaquim deviam ir até lá...
Filipa: Ah sim... as luzes... imagino o quando você devia estar prestando atenção nelas...
Manoela: Filipa...
Filipa: O que foi? Não vai dizer que vocês só ficaram observando as luzes da cidade...
Nisto toca o telefone... A administradora faz um sinal para Manoela e vai em direção ao aparelho...
Filipa: Alô... Filipa Borges
Joaquim: Alô... Filipa... é o Joaquim... Como está minha administradora favorita?
Filipa: Olá! Vou bem... Estou me adaptando... mas acho que vou pegar o jeito... Pensei que ia encontrar contigo ontem...
Joaquim: Oh meu amor... desculpa!... Mas ontem finalmente consegui ir ao Federal Sport Club... e acabei saindo tarde de lá..
Filipa: Que ótimo! Conseguiu alguma coisa?
Joaquim: Olha... não sei o que pensar!.. O tal Rufino não tem vínculo empregatício com o clube... Não há nada lá sobre ele...

Filipa: Estranho... tinha informações de que o clube é uma empresa com toda documentação legalizada... Algo errado aí tem!... De qualquer forma, vamos ter de começar a procurar novas pistas... Obrigada por tentar...
Joaquim: Não foi nada... Se conseguir mais algum dado importante para as investigações te aviso.. E agora... Será que minha... como direi... querida... amada... namorada... me dá a honra de busca-la para jantar hoje?
Filipa: Claro... meu namorado... te espero no hotel... Até mais ver...(colocando o telefone no gancho e olhando para Manoela) Essa investigação está cada vez mais complicada...
Manoela: Pelo que entendi... perdemos a pista...
Filipa: Sim... vamos ter de procurar outra coisa... Mas... voltando ao nosso assunto... Então os dois inocentes ficaram a observar as luzes.... Sei...
Manoela: Não... a gente... conversou...
Filipa: Conversou...
Manoela: Ai Filipa... a gente não fez nada demais... só..
Filipa: Eu sei... não precisa se justificar... Vocês estão namorando... logo vão casar... e quase...
Manoela: E quase naquela noite... não nessa!.. Filipa... eu sou uma moça séria!...
Filipa: Longe de mim duvidar... Mas... vou te falar uma coisa... tome cuidado... esses passeios noturnos... sozinha... e voltando tão tarde...
Manoela: Não era tão tarde... eram...
Filipa: Três e meia da manhã!... Eu te vi chegar!.. E como ia dizendo... Manoela... eu sei que o casamento está marcado... mas vai com calma... Sei que não sou a pessoa mais indicada para lhe dar conselhos... mas posso te dizer isso... não faça algo que possa se arrepender depois...
Manoela: Eu sei minha amiga... mas fique tranquila... com o que aconteceu naquela noite na casa dos pais do Alberto, tive minha lição... E agora... que tal voltarmos a trabalhar?
Enquanto as moças voltam a suas funções, Edgar vai ao fórum e após ao Senado... Conversa com seu contato lá dentro e pede para apurar mais dados sobre a denúncia que receberam sobre o desvio de dinheiro, indo em seguida em direção a sua residência... Já no bairro Laranjeiras, sentada no banco de madeira do quintal, Laura dá uma última lida em um de seus planos de aula, enquanto Daniel e Melissa brincam sentados no gramado sob a sombra da figueira.... O menino joga suas bolas de gude, enquanto a filha de Edgar veste uma de suas bonecas... A menina olha para sua filhinha de faz-de-conta... pensa que algo lhe falta...
Laura (erguendo os olhos dos papéis e olhando para Melissa): Princesa... o que foi?
Melissa: Ah tia... a minha filhinha... tá faltando alguma coisa nela...
Daniel: Mamãe... alguém pode brincar comigo? É chato jogar isso sozinho...
Melissa: Dani... isso é brincadeira de menino...
Daniel: E boneca é de menina...
Laura: Que tal brincarem de pega-pega?
Daniel: Mas mamãe... faz dias que não brinco com minhas bolinhas..
Melissa: E eu estou vestindo minha filhinha...
Laura:Bem.. então não resta outra alternativa... Cada um brincando com aquilo que prefere... E como não são as mesmas coisas... Vão brincar sozinhos....(olhando para o relógio que trazia em seu pulso) Meus amores... Só que agora temos que ir lá para dentro... Está quase na hora do almoço... Guardem os brinquedos e vão se lavar... Logo o papai deve chegar...
Melissa: Mas tia... Queria colocar uma flor no cabelo da minha boneca...
Laura: Está bem... então vai rapidinho até o jardim... colhe uma florzinha... e depois vem lavar as mãos... o Daniel e eu vamos na frente...
Enquanto Laura e o filho encaminham-se ao lavatório, Melissa circunda a casa e logo está no jardim... Encanta-se com uma flor e outra, ficando indecisa... Mal sabe que a poucos passos dali, escondida atrás de uma árvore alguém a observa... Vendo que a menina está sozinha e que não há ninguém na rua... sai de seu refúgio... Anda alguns metros e chama a atenção da garota...
Catarina: Melissa...(abrindo os braços) Ei.!.. Vem aqui minha abelhinha!...
Melissa: Mamãe!(correndo para os braços da cantora lírica)
Catarina (dando vários beijos na testa da menina): Ai filha... Como fiquei preocupada com você!...Como você está meu benzinho?
Melissa: Estou bem mamãe... A tia Laura e o papai cuidam muito bem de mim...
Catarina: Eu queria ter vindo te ver antes...
Melissa: Por que não veio? Estava com saudade...
Catarina: Também estava... mas agora a gente vai ficar todo o tempo juntas... Não é bacana?
Melissa: Sério? Que bom mamãe!
Catarina: A mamãe vai ter de viajar para bem longe daqui... e eu vim buscar você... vamos?
Melissa: Mas e o papai?
Catarina: A gente manda uma carta para ele...
Melissa: Mas eu tenho que estudar... A escola está quase pronta...
Catarina: Filha... eu vou achar outra escola para você... Essa escola do morro é muito perigosa! Olha só o que aconteceu com você...
Gertrudes (gritando de dentro da casa): Melissa... vem...
Melissa: A Tude está me chamando...
Catarina: Vamos menina...
Nisto Catarina ergue a cabeça e percebe que o automóvel de Edgar vem se aproximando... Olha para sua filha... Não há o que fazer... precisa fugir...
Catarina: Melissa... a mamãe precisa ir... Não diz nada para ninguém que eu estive aqui...
Melissa: Nem para o papai?
Catarina: Nem para ele... Cuide-se... (dando um beijo na menina e indo em direção ao quintal enquanto Edgar chega em frente a casa)
Edgar: Melissa...
Melissa: Oi papai... estava... procurando uma flor para minha boneca...
Edgar: Hum... e já escolheu?
Melissa (olhando em volta e dizendo sem muita certeza): Já... pode ser.... essa aqui (pegando uma gérbera)
Edgar: Bela flor... e agora... minha abelhinha... vamos... que devem estar esperando pela gente... (dando a mão para a menina)
Ao perceber que o advogado e a filha entraram na residência, Catarina, que a tudo observava, sai de onde se escondera...... Seu plano não havia dado certo... mas estava longe de desistir da ideia... No momento precisa sair dali... mas voltaria... E com estes pensamentos cruza o portão da casa dos Vieira... Tomando um rumo só conhecido por ela.. e ninguém mais...
Passam-se os dias... O trabalho na fábrica segue...Nas investigações nenhuma novidade surge... Caniço na delegacia continua negando a autoria do incêndio, mesmo com todos os subterfúgios usados por Praxedes... Edgar estranha o silêncio de Catarina em relação às visitas à Melissa e fica sabendo que a cantora lírica fora procurada mais de uma vez pelo oficial de justiça com uma ordem para pagamento da indenização a Isabel e que não fora encontrada... Preocupa-se... Esse sumiço repentino da mãe de sua filha só aumenta suas suspeitas... Já na casa dos Vieira, tudo segue de forma costumeira... agitada pelas as crianças com suas brincadeiras e peraltices.. O advogado desdobra-se com seus afazeres no escritório e auxilia Filipa e Manoela na tecelagem...Laura, com sua barriga já proeminente, tem uma gestação tranquila, mesmo preparando com as colegas os últimos detalhes para a inauguração da escola e ao mesmo tempo escrevendo com a ajuda de Edgar a matéria solicitada pelo Correio da República... O jantar de noivado de Celia e Guerra é marcado... E neste ínterim, finalmente as obras da escola terminam...
Naquela manhã, o sol mal despontara no horizonte e Laura poe-se em pé... Mal conseguira dormir tamanha sua ansiedade... O dia tão esperado chegou... Seus sonhos de normalista estavam sendo concretizados... Iria lecionar em sua própria escola... Com os métodos que considera os apropriados para o aprendizado sadio das crianças.. Olha para a cama e vê que seu marido ainda dorme... Sorri....Está vestindo-se para descer quando Edgar desperta...
Edgar (de olhos fechados tateando a cama a procura da esposa): Laura?
Laura: Aqui! Bom dia meu amor (dando um beijo leve no esposo e levantando-se rapidamente terminando de arrumar-se)
Edgar: Bom dia... que horas são?
Laura: Não sei ao certo... Acho que cedo...
Edgar (pegando seu relógio de bolso sobre a mesinha): Amor... são seis da manhã... Por que está de pé essa hora? Tem muito tempo para inauguração...
Laura: Eu sei... mas tenho tanto por fazer ainda... Tenho que chegar cedo no morro... Edgar... tudo tem que estar perfeito!... A Sandra e eu ontem organizamos tudo... A tia Jurema vai preparar o que será servido.. mas mesmo assim... é bom revisar se não está faltando nada...
Edgar: Você está muito ansiosa... Pensa que não sei que mal dormiu essa noite? Eu te conheço, Sra. Vieira... e creia... vai dar tudo certo!
Laura: Onde foi parar seu sono pesado?
Edgar: Com tantos problemas... o que menos tenho tido é sono... Mas hoje não é dia de falarmos disso...
Laura:Não... não é dia! É dia de coisa boa...
Edgar: Sim..... Só que não dormir e toda essa sofreguidão não faz bem para você e nem para o...
Laura: Já sei... para o bebê... amor... não se preocupa... está tudo bem...(percebendo que Edgar a observa com o cenho cerrado) O que foi? O que está pensando?
Edgar: A gente ainda não escolheu um nome para ele, né? Precisamos pensar... Quando decidiu o nome do Daniel?
Laura: Eu estava com 4 ou 5 meses... Sempre gostei de Daniel Defoe.. E pensei que ia gostar se eu homenageasse um autor que sabia que gostava... A Maria me contou que você ficava horas à beira do lago lendo Robinson Crusoe quando criança...
Edgar: Ficava mesmo... e já disse que foi uma boa escolha... E dessa vez... já tem um nome que tenha pensado?
Laura: Na verdade, meu amor... queria que dessa vez você escolhesse...
Edgar: Eu? Sério?
Laura: Sim... eu escolhi de um... Agora é sua vez...
Edgar: Bem... então... vou pensar com carinho... Só te digo uma coisa... Infelizmente não vou homenagear teu autor preferido...
Laura: Como assim?
Edgar: Desculpa... mas Joaquim não está na minha lista de nomes prediletos... por motivos óbvios...
Laura (rindo): Tudo bem... tudo bem... mas e o teu autor preferido? Gosta de Filipe?...
Edgar: É um bom nome... mas pode se chamar Bernardo... Olavo...tem tantos nomes...
Laura: E meninas?
Edgar: Aí sim... as personagens machadianas tem nomes fortes... Helena... Virgínia... Raquel.. como as mulheres dessa família ... basta escolher...
Laura: Temos tempo... E agora... que tal se me ajudasse aqui? Não estou conseguindo amarrar essa fita aqui atrás do vestido..
Edgar: Que absurdo esse seu pedido...
Laura: Se é tão absurdo... vou pedir a Matilde...
Edgar: Não precisa... eu ajudo... (levantando da cama e começando a fazer um laço) Só que sempre vou preferir desamarrar... desabotoar... Laura... é tão cedo... vem aqui, vem... (virando a moça e dando um beijo com paixão)
Laura: Amor...É cedo... mas se a gente não se apressar.... vai ficar tarde....
Edgar (suspirando): Está bem....Vou me arrumar
Laura: E eu acordo as crianças... Melissa estava que não cabia em si de contentamento... Hoje é seu primeiro dia de aula...
Edgar: Minha menina está crescendo...
Laura: Nossa... nossa menina... ela não é minha filha de sangue... mas ela é minha também...
Edgar: Laura... não sabe como é bom ouvir isso...
O casal troca mais um beijo rápido e termina de arrumar-se para a inauguração... Após algum tempo a família Vieira se põe em direção ao Morro da Providência, onde Laura verifica se tudo está de acordo na instituição para receber os alunos acompanhados por seus pais...Enquanto isto, na casa da Rua do Catete, a Baronesa de Boa Vista está sentada diante de sua penteadeira... Empoa as maçãs do rosto repassando mentalmente o que pretende fazer e dizer... Volta de seus pensamentos ao ouvir batidas à porta...
Carlota: Tem certeza que vamos fazer isso? Eu ainda não sei como me convenceu!
Constância (rindo ironicamente): Admita Carlota... se não fosse por mim sua vida seria monótona como a de uma viúva qualquer...
Carlota: Ainda acho que não é boa ideia...
Constância: Oras Carlota... é uma inauguração... de uma escola... que pertence a minha filha... e onde vai estudar meu neto... Num morro... longe de tudo.... e de todos... terra de ninguém....ou melhor... terra de gentinha... biltres... larápios...capoeiras... e tudo o que não presta nesta cidade....
Carlota: Se sabe o que vai encontrar lá... para que ir?.. Sinceramente Constância... desista disso...
Constância: Não... Já te disse que preciso intervir nisto... antes que a catástrofe esteja completa... e agora vamos...
Enquanto as duas senhoras dirigem-se ao Morro da Providência, na escola, tudo já está organizado... Tia Jurema e Gertrudes dispõem os quitutes a serem servidos em uma grande mesa montada no centro da sala... Cadeiras são postas por todos os cantos..... Sandra, Isabel e Laura começam a receber alunos e seus pais... As crianças correm pelo pátio... Amigos das professoras e da dançarina se fazem presentes.... Por todos os cantos da instituição se veem pessoas contentes pela iniciativa das moças... tudo corre bem...
Laura: Gente.. com incêndio e tudo... o dia da nossa escola chegou...
Sandra: Laura... me belisca... Acho que eu estou sonhando...
Laura: Melhor que beliscar... dá cá um abraço... E você também (abraçando Sandra e Isabel ao mesmo tempo)
Isabel: Ah bom...
Laura: Isabel... não tenho como te agradecer...
Isabel: Eu que tenho que agradecer vocês... Graças a vocês duas as crianças aqui do morro vão estudar... ter um futuro melhor...
Edgar (chegando do pátio): Olha, minhas caras sócias... meus parabéns.!.. A escola está linda!... Entendam uma coisa... o que fizemos foi grande... muito grande...
Jurema: Não ia ser um balão que ia acabar com uma coisa tão bonita...logo as pessoas lá de baixo vão saber que o pessoal aqui do morro tem muito por dizer... e quem vai falar vai ser essa criançada aqui...
Assunção: Eu estou muito orgulhoso... que belo trabalho...
Guerra: Belíssimo... amanhã vou colocar uma nota no jornal a respeito...
Enquanto isso, Constância sobe o morro... anda pelas vielas esburacadas desviando de uma poça de lama e outra... olha escandalizada para tudo a seu redor... Sabia que o lugar não apresentava muitos recursos... mas não imaginava que pudesse haver tanta pobreza... Tudo ali lhe provoca asco... A passagem das duas damas chama atenção entre os habitantes do morro... Logo a notícia se espalha... Senhoras da sociedade carioca estão subindo o morro..
Constância: Só mau cheiro... buraco... terra...meu vestido está todo sujo.. o sapato está destruído...
Carlota: Querida... vai ver tiraram o piso de mármore para dar um ar mais... rústico
Constância: Mais um comentário como esse e o que terá aspecto rústico será seu rosto, cara irmã...
Carlota: Tem certeza que quer continuar com isso? Já viu que tudo é sujo... pode ter assaltantes... marginais..
Constância: Eu viria de joelhos... carregando a cruz de Cristo sobre os ombros se for para convencer sua sobrinha...
As irmãs continuam em seu trajeto... Sobem mais alguns poucos metros... Na escola, o burburinho de pessoas conversando se confunde com as gargalhadas das crianças que correm pelo pátio e demais locais daquela edificação... Na maior das salas, Laura, rodeada por seus alunos sentados ao chão, conta uma história... Ergue os olhos por um momento e subitamente para com sua leitura ao ver quem se aproxima...
Constância: Boa Tarde... como vão todos?
Assunção: Constância? O que faz aqui?
Constância: Eu vim em paz... Desejar boa sorte ao novo empreendimento de minha filha... Essa escola era um sonho tão antigo de Laura... Carlota e eu fazemos questão de celebrar com ela...
Laura: Minha mãe... não a esperava aqui!... Sabe... mesmo que a senhora tenha essa intenção... isso me soa tão falso...
Constância: Filha... não diga isso! Eu só quero sua felicidade... seu bem... Por sinal... gostaria de conversar particularmente com você e seu esposo...
Edgar: D. Constância... se não percebe... estamos em meio a uma festa... Não é o momento...
Constância: Meu genro... eu quero conversar com vocês... e não quero causar nenhum transtorno... onde podemos falar?
Laura: Seja lá o que for... não perca seu tempo...
Edgar: Laura... é melhor falarmos em outro lugar... Pelos pais e alunos que estão aqui...
Assunção: Vou com vocês... melhor conversarmos na secretaria... (indo em direção daquela sala sendo acompanhado pelos outros)
Laura (abrindo a porta da secretaria): Muito bem... fale...
Constância: Eu já disse a que vim... Vim conhecer a escola e celebrar sua vitória...
Laura: A senhora sabe que não acredito nisto... Vamos... pode mostrar sua verdadeira face... Todos nós aqui a conhecemos...
Constância: Muito bem...Filha... precisava ver com meus próprios olhos esse despropósito...escola no morro... cercada por pobreza por todos os lados... Eu sempre soube do seu sonho em lecionar... E mesmo a contragosto aceito...
Assunção: Constância
Constância: Deixe-me terminar... Estou mudando meus conceitos sobre muitas coisas... Sei que a gente que mora aqui, precisa de ajuda... mas não precisa ser se enfurnando no meio dessa gente... com todos os perigos que existem aqui... Filha... você quase morreu aqui dentro!
Laura: Mãe... por favor... quem precisa de ajuda é a senhora...
Constância: Edgar... me espanta você... um homem com o conhecimento que tem... deixar que sua esposa, ainda mais grávida, lecione num lugar assim...
Edgar: D. Constância... não vejo nada de errado em Laura ministrar suas aulas... seja onde for e em que estado físico se encontre... O Morro é um lugar como qualquer outro...
Constância: Mas não é mesmo! Esgoto a céu aberto... pocilgas... gente morando amontoada... É esse tipo de lugar que querem que meus netos frequentem?
Laura: Exatamente... melhor um lugar assim do que os salões da alta sociedade... onde pode não haver mau cheiro... mas há hipocrisia... soberba...preconceito... corrupção... escondidos pelo mais fino tapete persa...
Carlota: Vamos Constância... chega com isto...
Constância: Eu devia ter lhe dado umas palmadas quando começou com esta história de livros.!.. Agora estou vendo este descalabro! Minha filha, grávida, lecionando em uma escola de morro... E com o apoio do marido...Em que mundo estamos!
Laura (alterada): Saia daqui!
Assunção: Chega Constância! Se o que queria era estragar com meu dia conseguiste com louvor... Desculpe minha filha... (pegando a esposa pelo braço e a conduzindo para fora da escola)
O Senador conduz a esposa e sua irmã para casa... Laura senta-se e suspira... Tenta acalmar-se... Edgar aproxima-se da esposa e pega sua mão... tenta conforta-la...
Laura: Por que Edgar? Minha mãe sempre tem que se meter... por onde passa sempre deixa uma marca ruim...
Edgar: Amor... Ela sempre foi assim.... Não vai mudar agora... E quanto às marcas... se ela deixa ruins... temos que suplanta-las e deixar boas marcas...
Laura: Não vejo nada de que possa me orgulhar dela...
Edgar: Não pense nisso... tem uma festa linda acontecendo pela realização de um sonho de três moças lá fora... Moças que vão deixar uma marca boa nos corações e nas cabecinhas de muitas crianças aqui...
Laura: Oh meu amor... obrigada...
Edgar: Vem... vamos voltar....
O casal sai da secretaria e volta para junto dos convidados... O tempo passa... Aos poucos as pessoas vão se retirando... Logo apenas as professoras e alguns ajudantes ficam para organizar e limpar a escola... Gertrudes após ajudar tia Jurema com a arrumação, percebendo que as crianças estão cansadas, pede a Laura o que deve fazer...
Gertrudes: Menina Laura... precisamos fazer mais alguma coisa aqui?
Laura: Eu tenho que organizar alguns livros..
Gertrudes: As crianças estão com sono... Brincaram muito durante a tarde...
Laura: Bem... o Edgar pode leva-las... Depois eu pego um coche...
Edgar:Não senhora... Eu levo e volto para te buscar...
Guerra: Não precisa... se quiserem Celinha e eu podemos deixar a Gertrudes e as crianças em casa...
Edgar: Meu amigo... muito obrigado!
Sandra: Bem... também já vou...
Isabel: E eu te acompanho...
E assim, em pouco tempo, Edgar e Laura encontram-se sozinhos nas dependências da escola... A professora junta os livros e encaminha-se para a secretaria...Edgar, que conversava animado com Zé Maria em frente a porta principal, entra e procura pela moça... Para na soleira da porta e observa a esposa que começara a guardar os volumes na estante... Dá mais alguns passos sem fazer ruído, parando atrás da moça
Edgar (abraçando Laura por trás): Mas que moça mais compenetrada em suas tarefas...
Laura: Amor... me assustou...
Edgar: Desculpe... mas você estava tão linda... assim... concentrada...
Laura (virando para o marido e dando um beijinho leve): É? Mas agora... meu interesse foi desviado....
Edgar: Ah sim?
Laura: Sim... sabe... tem um certo advogado que de repente se tornou alvo de toda a minha atenção...
Edgar: É... pois me acontece o mesmo... não é estranho? Tem uma certa professora que me desconcentra completamente... (dando um beijo intenso em Laura)
Laura: Bem... deixa terminar com isso...quero muito ir para casa...tenho um assunto a tratar com o senhor advogado...
Edgar: Que tipo de assunto?
Laura: Bem maçante... assim (dando mais um beijo apaixonado no marido)
Edgar: Acho que não precisamos esperar par resolver esse nosso assunto pendente em casa....
Laura: Edgar!
Edgar: O que tem demais? Estamos sozinhos aqui...
Laura: Amor...
Edgar: Não pensa muito... vem... (puxando a moça mais para si e tornando a beija-la)
Aos poucos o medo e relutância da moça dão lugar ao desejo... Beija o marido com a mesma intensidade com que é beijada... Os carinhos cada vez mais ousados, vão seguindo o caminho dos botões e laços das roupas, que vão sendo afrouxadas... O rapaz apoia Laura na secretária.... Beija e afaga todo o corpo da moça, tateando até encontrar a barra da sua saia... Suspende e acaricia suas coxas... Os corpos moldam-se um ao outro... As sensações misturadas aos sentimentos ganham ainda mais força... Amam-se... até encontrarem a plenitude nos braços do outro....
Algum tempo se passa... Edgar sentado, exausto e extasiado tem Laura repousada em seu colo... Dão-se um último beijo e levantam-se... Recompõem-se e saem daquele lugar indo para sua casa.... onde mais problemas os estão esperando...