Laura

When the Children Cry


Little child, dry your crying eyes

How can I explain the fear you feel inside

Observou Logan muitas vezes no tempo em que conviveram, no fundo sempre a procura de semelhanças entre os dois. Eles tinham o mesmo sangue, deviam ser parecidos certo? Observou o jeito que ele falava, olhava, se comportava... Observou o jeito que ele sorria, e viu que era bonito.

No entanto, era o jeito que ele se mexia que lhe chamava atenção. Por que ele andava tão pesadamente? Como se estivesse carregando algum peso em suas costas; sempre cansado, sempre tossindo, sempre doente.

“Ele está mesmo doente.” Charles havia confirmado em sua mente. “O adamantium o deixa doente.”

Adamantium... Laura tinha adamantium.

“Laura não doente.” Ela tinha contestado, franzindo o cenho.

O olhar de Charles se distanciou, triste.

“Logan, velho.”

Agora, Laura se perguntava se estava ficando velha também.

A X-23 matou todos aqueles que tinham se posto à sua frente. Suas garras rasgando entre as arvores enquanto corria, afastando-se do fogo e da fumaça que percorria a floresta como névoa.

Seus ouvidos atentos aos soldados 2km à sua direita, os olhos prestavam atenção no céu cada vez que um helicóptero passava. Eles tinham vindo para mata-los, mas tinham vindo em um número relativamente pequeno. Nenhum exército de carniceiros à vista, talvez porque não existiam mais. Aqueles homens não queriam chamar atenção, ela ponderou, vendo o dia aos poucos nascer. Os minutos se tornando horas.

E Laura caminhava.

Pesadamente, assim como seu pai costumava caminhar.

Sua saúde estava ótima, e não havia hipótese de estar velha; restava apenas o sangue em sua roupa. O peso em suas costas eram as mortes que havia presenciado (que havia causado!), se perguntou quantos mais iriam morrer até que todos estivessem livres?

Depois de um tempo, viu pequenas crostas no chão, seguidas de uma depressão não natural do solo. Sinais claros de geocinese.

Rictor.

Forçou as pernas a correrem, escorregando pela areia, pulando raízes altas. Havia um barranco perto de uma árvore caída.

— Laura?! – reconheceu Gideon escondido entre os galhos da árvore. — É a Laura!

— Gideon!

Os dois se encontraram em um forte abraço, e ela perguntou: — Estás bien?

Sí, y vos? — de perto, a garota percebeu um profundo corte na testa dele e fez uma careta, levando as pontas dos dedos ao local. — Não tá doendo tanto, tinha que ver como o outro cara ficou.

Oh, essa era uma visão que ela preferia não ter. Os poderes de Gideon consistiam em imitar a fisiologia de um réptil e assim como muitos répteis, ele também conseguia produzir veneno. Seus dentes serrilhados, olhos dourados e pele escamosa costumava causar nojo aos agentes especiais da Transigen. Para Laura, ele era bonito exatamente daquele jeito.

— Outro cara? Espera, eu achei que tinha cuidado de todos...

— E cuidou! Céus, não sei o que seria da gente se não tivesse parado aqueles jipes, foi incrível, Laura! Pero... — o garoto parou, cabisbaixo. — Algunos soldados llegaron hasta nosotros... Perdimos muchos...

Não, não, não, não, não! Perderam mais do que April.

Sentiu como se o chão estivesse girando, e apoiou-se em Gideon buscando apoio. Até o ar parecia difícil de se respirar.

— Laura!

Levantou os olhos, vendo que Rictor, Erica e Joey tinham saído do esconderijo para recebe-la.

Tomou coragem e perguntou finalmente:

— Quem mais perdemos?

— Fora os que você não conhece... Jackson. – Rictor olhou para o chão, sem conseguir encara-la. — Ele tropeçou, não foi tiro. Foi rápido.

Não pediu detalhes, sua mente foi cruel o bastante enviando-a uma imagem do amigo quebrando o pescoço.

— Stephen e Mira também. Eu vi quando aconteceu. — Erica disse, seus longos cabelos loiros cobertos de fuligem e areia. — Depois que acharam a Grace, Erik os mandou correr... correram na direção errada. Só a Grace escapou.

— Erik está morto. — falou de uma vez, sem querer dar tempo ao próprio cérebro de processar o que Erica havia acabado de dizer. — April também.

As crianças a fitaram, chocadas.

— Não consegui protege-los.

— Certo... isso é um problema. — Rictor disse, suspirando.

A filha de Logan o encarou, um pequeno tique em seu olho por conta do estresse. De todos, Rictor era o que mais tinha sangue frio, e não apenas isso, ele era muito esperto, podiam sempre confiar nele e seus planos mirabolantes. Ele analisava tudo e costumava os liderar antes de encontrarem o acampamento.

Na Transigen, sua cela era ao lado da de X-23.

Ele era como um irmão.

Mas tinha sido uma longa noite. E Laura estava irritada.

Um problema? Temos vários problemas, Rictor! O acampamento foi destruído, colocaram fogo em tudo! Perdemos amigos que conhecíamos desde as fraldas! Têm pelo menos cem soldados espalhados por aí querendo nos matar! Não podemos nos esconder debaixo do solo pra sempre! Erik se foi! Eu precisei mentir pra ele dizendo que a Megan estava salva quando ela não está! Então cala a porr-

— Não está? – Erica arfou, a interrompendo. — Espera, como assim, ela-

— Não, não está! Eles vieram pelo rio! Ela estava no rio com Bobby e-

Laura paralisou, a voz morrendo em sua garganta. Atrás de Erica, um menino gordinho com pele cor de café surgia, subindo o barranco com dificuldade.

— Bobby? — perguntou incrédula. Não, não era possível, Bobby estava morto! Assim como Megan, assim como todos que estavam com ele perto do rio, então... — Como?

— O Lance! – Bobby explicou afoito, ficando frente a frente à mutante. — Ele apareceu do nada! Desesperado! Falando coisas sem sentido, então esses soldados apareceram e nós corremos, foi uma loucura! Eu até eletrocutei todos que estavam na água! E então chegamos aqui e Lance abriu esse buraco enorme pra gente se esconder! Foi quando encontramos os outros...

A garota piscou, absorvendo a informação. Lance Alvers? Ele era um babaca.

Mas Laura lhe daria um abraço caloroso agora.

— Então... a Megan...

— É. – Rictor segurou seus ombros, fazendo uma breve massagem em apoio. — Ela está com a Siryn, Grace acabou de sair com Jamaica à procura de perdidos. Ela está bem, Laura.

Megan estava salva. Estava com a senhora Theresa.

Laura não tinha mentido para Erik. Ele morreu acreditando que sua filha estava viva e era verdade.

Muita informação, informação demais.

— Desculpa. — ela sussurrou para o amigo.

— Estamos todos estressados, não se preocupa. — ele suspirou mais uma vez e olhou ao redor. — É melhor você entrar, deve estar cansada... e não fala nada sobre o Erik ainda. Ainda vamos decidir o que fazer.

— Sinta-se à vontade pra contar. — a mexicana ergueu as mãos, não querendo tocar no assunto novamente.

O local era exatamente como uma toca. Os poderes de Lance e Rictor eram exatamente iguais, e combinados com a manipulação de plantas de Erica e Jamaica, aquele buraco, apesar de um tanto claustrofóbico, cabiam todos e era seguro. Por algumas horas, pelo menos.

Se aconchegou ao lado de Rebecca, olhando em volta. Siryn mantinha tudo iluminado com uma lanterna, Megan deitada no colo dela, dormindo.

Viu? Ela está bem, agora quer parar de se martirizar? A voz de seu pai soou irritada em sua cabeça.

— Não foram eles que colocaram fogo no acampamento. — ela foi arrancada de seus pensamentos por um Tomás, declarando de modo hesitante: — Fui eu.

Laura o encarou.

— Me assustei... tentei me defender e... não consegui controlar.

Suspirando após um breve silêncio, a filha de Logan ergueu a mão e tocou no ombro do garoto em compreensão.

— Estou com a sua mochila. — Rebecca comentou num fio de voz. — Voltou mesmo pelos nossos arquivos?

Laura meramente assentiu.

— Obrigada. — Rebecca sorriu, lhe estendendo a mochila de volta.

— Por que é tão importante? — Siryn perguntou. — Esses arquivos... por quê?

— São a única coisa que temos como identidades. – Rebecca respondeu. — Também serve pra nos lembrar que... enfim, eu sei que pode parecer bobo, mas... é importante.

Siryn balançou a cabeça, eles ainda são tão jovens, pensou.

— Vou te dizer uma coisa querida, uma coisa que eu já falei pra sua amiga de garras aí, você é quem faz sua própria identidade, não um papel. Não precisa dele para provar nada.

Do outro lado da toca, o garoto de cabelos grandes e pele pálida riu.

— Sem falar que esses arquivos tratam vocês como objetos do governo, ratos de laboratório mesmo.

— Que a propósito você também é, Lance. — Rebecca rebateu, com raiva.

— Era, não sou mais.

Laura rolou os olhos. Não havia tempo para refletir nas palavras da senhora Theresa ou se irritar com as de Lance.

— Deixa ela em paz, Lance. — a voz em favor de Rebecca surgiu próxima ao rapaz, e Laura esgueirou-se para ver quem era, surpreendendo-se ao se deparar com uma Ariel acordada e viva. Quando a viu nos braços de Tamara, ensanguentada, poderia jurar que estava morta. Pelo visto, o sangue não era de todo da garota. Junto de Ariel, havia um rosto conhecido da mexicana, a menina de oito anos chorando silenciosamente.

Como se lê-se seus pensamentos, Tomás a cutucou, murmurando em espanhol em seu ouvido:

— Pietro não voltou.

Oh. Isso explicava muita coisa.

Pois não importava qual a situação, a pequena Wanda Maximoff não chorava. Nunca.

Subitamente, a areia se mexeu e pelo buraco de entrada, uma americana surgiu descabelada.

— Erik? Erik!

Rictor vinha logo atrás. — Grace, se acalma!

— Laura, onde ele está? Onde está Erik?! — Grace indagou, jogando-se aos pés da garota que não esboçou reação nenhuma além de choque.

— Por que a Laura saberia? — Siryn arqueou as sobrancelhas.

— Porque ela estava com ele! Rictor acabou de me contar!

— Eu também te disse o que aconteceu, Grace-

— Eu não acredito em você! – ela respondeu histérica. — Laura viu tudo, ela estava com ele! Onde ele está, Laura?! Onde?! Foi capturado?! Me diga!

— Mamãe! – Megan tinha acordado assustada.

— Grace, você tem que se acalmar. — Rebecca tocou no ombro da mulher.

Eu estou calma!!!

— Erica, volta pra guarda, por favor. – Rictor pediu para a amiga, voltando-se para a mulher. — Grace, deixa a Laura em paz, o que aconteceu-

Ela o ignorou, mantendo os olhos fixos na filha de Logan, o clima de tensão era quase palpável.

Lo siento. — Laura murmurou. Grace respirou incrédula. — Não estavam lá... para nos capturar... ele... ele lutou para nos proteger... eu sinto muito.

Lágrimas desceram pelo rosto da mulher e Laura limpou algumas, sentida. Siryn se arrastou pela toca e segurou os ombros da amiga de longa data, puxando-a para um abraço.

— O que isso quer dizer? – a voz de Megan despertou todos do transe. — Eu... eu não entendo...

Ariel ergueu a cabeça para responde-la. Como Grace, tivera seu coração partido naquele mesmo dia. Erik jamais voltaria... assim como seu amado Pietro Maximoff. Ter dado aquela notícia para a irmãzinha dele tinha sido a coisa mais difícil que havia feito na vida.

Não queria Grace, ou até mesmo Siryn, tendo a mesma infelicidade.

— Significa que ele morreu, pirralha. – Lance foi mais rápido, assustando todos com seu tom.

— Lance, SEU IDIOTA! – Ariel gritou, chutando o rapaz a sua frente. — Não consegue manter a boca fechada?!

— E o que você queria que eu dissesse? Não podemos mentir pra ela-

— Ela só tem sete anos, seu animal!

— Ótimo! Assim ela vai ver que a vida não é um conto de fadas e que muitas vezes, ela te dá um soco!

— Não vai ser a vida que vai te dar um soco, vai ser eu mesma e agora! — ela exclamou, pronta para avançar em cima dele, quando a própria Megan gritou:

— Chega!

Laura fitou a pequenina, surpresa em ver que ela não estava chorando. Parecia exausta.

— Chega vocês dois, só... chega.

Todos ficaram em silêncio, claramente de luto.

E pela décima vez nas últimas cinco horas, Laura se perguntou: quantos mais iriam morrer até que todos estivessem livres?

When the children cry,

let them know we tried