BRUCE WAYNE

Ser suficiente.

Isso é o que todos nós, heróis sem poderes tentamos. Ao menos enquanto nossos ligamentos permanecem intactos. Treinamos incansavelmente para alcançar um terço do que alguém atingido por um raio, tocado pela luz do sol ou com uma luz verde em um anel poderia fazer sem esforço. Não salvamos vidas com super poderes, no nosso caso isso se trata de sacrifício e disciplina. Técnica, treino e inteligência. Três alicerces que mantêm nossas cabeças presas ao pescoço, por que sem poderes, até mesmo para apanhar é necessário saber o que se está fazendo, ou uma surra pode ser fatal.

Oliver é a prova viva disso no momento. Confesso que o cara é realmente bom, poderia ser mais inteligente talvez, mas até isso ele arrumou uma forma de compensar com a mulher com a qual se casou. Não que o Queen seja burro, as vezes o ver é como olhar um espelho meio desfocado e distante, provavelmente com um pouco mais de sorte do que eu tive. Mas não posso negar as semelhanças. Seu único erro foi buscar aprovação em uma cidade como Star City, tentar sair das trevas ao fazer justiça, Oliver foi ingênuo. Entendo a intensão, mas o fato de entender não a torna menos estupida.

—Qual arma você usa? – Damian pergunta ao filho do Queen que parece não querer olhar na direção do meu garoto. Dam precisa aprender a ser mais sociável.

—Meu pai me deu um arco – responde inseguro, olhando para a mesa a sua frente.

—Arco e flecha, hum – franze o rosto com desdém. – Soube que podem arrancar uma cabeça se atirar a flecha no local certo – a esse ponto o rosto de William já estava ganhando tons de verde.

—Eu atiro em alvos na parede, por diversão. São flechas de pressão – murmura com as bochechas vermelhas e Damian arregala os olhos, como se ele o tivesse contado que pretende se tornar um terrorista em um futuro próximo.

—Will tem dez anos, pirralho – Jason intervém entregando uma rosquinha a cada um deles, William agradece, Damian fecha a cara.

—Aos dez eu já dominava todas as armas brancas criadas pelo homem – retruca com arrogância.

—Você acabou de fazer doze – Jay revira os olhos.

Nesse instante Felicity entra na cozinha, com um tablet nas mãos e o rosto preocupado. Ela se senta ao meu lado na mesa e me passa o objeto, enchendo uma caneca de café em seguida. Observo a planta baixa da sede do FBI, onde Roberta Harper vai visitar em algumas horas. Marco todos os locais onde podemos montar vigilância sem chamar atenção e a devolvo o aparelho.

—Como Oliver está?

—Não tão dopado, para a tristeza do William – quase sorri, os olhos se voltando para o filho como um reflexo. – Obrigada pelo mingau, ele não gostou nada de comer aquilo, mas vai ser uma cena que vou guardar na memória para sempre – agora sorri de verdade e acabo retribuindo o gesto.

Estava prestes a responder qualquer coisa que a tranquilizasse, mas Dick, Thea, Roy e Roberta entram na cozinha juntos. Jason para imediatamente de tentar mediar a conversa entre os dois mais novos, o que já era uma atitude estranha da parte dele, mas acho que gosta do menino dos Queens. Seus olhos se focam na garota Harper, o rosto perdendo completamente a habitual máscara de controle de fúria, agora ele parece apenas um cara de vinte e três anos, isso me faz conter um sorriso genuíno, acho que pela primeira vez em alguns meses. John Diggle caminha em silencio porta a dentro e ocupa o lugar vago ao lado de Felicity.

—Falta Nissa e Selina – Dick comenta olhando em volta e se senta ao lado de Damian.

—Elas estavam treinando – Thea responde se sentando com o namorado e Roberta na outra ponta da mesa. – Nissa foi tomar banho a alguns minutos, já devem estar descendo.

Não temos poderes, nada além de uma teimosia beirando o sobrenatural, nenhum contrato nos prende a esse ramo, mas ainda assim cada um nessa cozinha está tão entrelaçado nessa vida que não acho que abandonem o manto antes da morte. O que no nosso caso pode acontecer em algumas horas. Uns conseguem ter filhos, famílias, empregos. Com o tempo nos tornamos ambiciosos, e não queremos abrir mão de nenhum dos lados da moeda. Sem poderes, isso pode ser nossa perdição.

Selina entra na cozinha ao lado de Nissa, com os cabelos curtos molhados, usando jeans e camiseta simples, não que alguma coisa possa ficar simples em seu corpo. Consigo sentir todos os meus instintos aflorarem a cada passo seu em minha direção. Ela tentou fazer o que provavelmente deve ser o certo, é o certo. Mas pela primeira vez estou pouco me fudendo para certo e errado, tem o que eu quero e o que vou lutar para ter, o resto que se adapte a isso. Então quem sou eu para julgar a estupidez do Oliver? Sou tão ambicioso quanto ele.

Ela se senta ao meu lado, enche um copo de leite e o vira como se aquilo fosse água gelada. Sorrio de lado e volto minha atenção para a mesa, precisamos decidir quem vai acompanhar a policial. Roy vai optar pelo conhecido e seguro para a prima, provavelmente votando por alguém do seu time ou Jason. Jay por sua vez vai querer o que a seus olhos não deixaria falhas, mas a verdade é que aceitaria com mais facilidade qualquer um do nosso time, com preferência para Dick, por mais que tente negar, sabe que ele é o melhor em disfarces disponível para esse caso.

Thea pode querer opinar também, a garota é importante para ela. Felicity deve ter feito gráficos e listado cada ponto forte de suas opções, pesando contra a possibilidade de criar alguma exposição. Não vai querer ninguém do seu time, e aposto que vai tentar deixar Jason o mais longe possível do FBI, mas com certeza vai os incluir em alguma possibilidade. Pode parecer egoísta à primeira vista, mas ela quer o melhor não só para sua família, se importa com todos e mais do que deveria com Jason, aos seus olhos ele passou a ser um deles, por tanto família. Roy e Jason se importam com Roberta o que a torna importante para a Smoak, se ela não for exposta com um rosto que podem ligar ao time do Arqueiro ou ao prefeito, vai estar mais protegida. É uma mulher inteligente.

—Temos três horas para deixar tudo pronto – digo abrindo a discursão.

—Quem vai acompanhar a Bobby? – Roy pergunta, se esforçando para não transparecer como não quer que a prima faça nada daquilo.

—É o que precisamos decidir primeiro – olho para Felicity, se ela começar, isso acaba antes de se tornar um debate, com o resultado obvio, mas me poupa de todo o percurso.

—Pensei em duas opções – começa. – John pode usar um passe da ARGUS e ir como escolta, no meu time é o mais indicado para esse trabalho, Bobby estaria segura – agora vem o argumento que vai quebrar essa possibilidade. – Mas isso é arriscado, ele costumava ser o guarda costas não só do prefeito, mas também de quando Oliver era CEO da QC. Não é segredo que é um amigo próximo da minha família, não queremos associar Oliver ao Arqueiro e conseguimos dar um passo nessa direção ontem com um custo muito alto para retroceder agora.

—Verdade – Selina beberica seu segundo copo de leite. – Qual a outra opção?

—Grayson – fala indicando Dick que não se surpreende. – Jason seria arriscado demais e vocês possuem o mesmo mentor – aponta em minha direção. – Já vi o que Todd pode fazer, e fiz minhas pesquisas, Dick é tão eficiente quanto ele, e tem mais tempo de experiência. Mas essa não é minha decisão, só acredito que pode ser o mais seguro.

—O que acha, Bobby? – Thea se vira para a garota que estava no meio de um debate silencioso com Jason, se encaravam enquanto nós discutíamos, o vejo assentir discretamente, depois voltar sua atenção para William.

—É melhor que seja alguém que não possam reconhecer, Grayson não tem ligação com os Queen, a agente Watson deve ter um dossiê de cada pessoa próxima a eles – garota esperta. – Só tenho uma dúvida, entendo a parte da Laurel como minha advogada, Lyla Michaellson para pressionar usando a ARGUS. Mas o que justificaria sua presença?

Dick sorri, Jason revira os olhos. Mas ele já pegava uma credencial no bolso e a colocava sobre a mesa. Ninguém poderia ver do que se trata, mas Jay fica feliz em destacar a estupidez de seu gesto.

—Conheço uma garota em uma organização de controle do governo, tão secreta quanto a ARGUS. Trabalhamos juntos por algum tempo e ela vai liberar meus acessos para que pensem que ainda estou nessa organização, o FBI é um dos subordinados, então vou ser basicamente sua passagem.

—Temos um plano, agora vamos ao reserva – declaro.

BOBBY HARPER

Grayson é estranho, para dizer o mínimo. Estava dirigindo o carro em um terno escuro, com um ponto estilo segurança no ouvido e óculos escuros. Tão relaxado que poderiam dizer que estávamos saindo por diversão, cineminha a tarde, talvez uma caminhada no início da noite. Nada em sua postura indica que está prestes a arriscar sua bundinha dentro de uma sede governamental. Definitivamente eu prefiro o jeito quase psicopata do Jason, ao menos aquilo ajuda a me manter alerta.

Me arrumaram um terninho feminino cinza, que poderia ser pior, o que me irrita são os saltos. Consigo andar perfeitamente, mas detesto precisar usá-los como um código de vestimenta, um cara não passa por esse tipo de problema. Fiz um coque alto nos cabelos e Jason me entregou um par de óculos redondos de armação delicada e lentes transparentes. Bem normal à primeira vista, mas que agiu como seu capacete no instante em que os coloquei nos olhos, sua pressão sanguínea estava aumentando bastante conforme eu me aproximava, mas o chato percebeu o que estava fazendo e acabou com minha festa. Idiota.

Me forço a voltar para o presente. Grayson me faz ficar à vontade demais com essa vibe que exala. Paramos no meio do caminho e uma mulher loura usando terninho marrom e não parecendo em nada contente, entrou no banco de trás.

—Star City está caindo aos pedaços – diz batendo a porta com certa força, o que faz o Grayson a olhar através do retrovisor, por cima de seus óculos.

—Promotora – cumprimento a olhando pelo retrovisor.

—Que bom que não explodiu, Policial Harper – diz com seu jeito sério.

—É, também estou feliz com isso – respiro fundo. – Esse é Dick Grayson, Dick, Laurel Lance.

—Sereia Negra – ele fala com os olhos na estrada e vejo Laurel trincar o maxilar.

—Nessa terra os morcegos são tão irritantes quanto na minha – murmura cruzando os braços e volta seu olhar para a janela, nem isso abalou a vibe do cara ao meu lado.

Estacionamos em frente a um prédio alto e espelhado, ajeito os óculos no rosto e saio do carro. Grayson e Laurel me ladeiam e seguimos em silencio. Passei esse maldito plano por mil vezes nas últimas horas, não que tenha problemas em me impor, ainda mais se levar em conta que se dependesse da vaca da Watson, eu estaria espalhada onde costumava ser a delegacia de Star City, a questão é que estou ao lado de um vigilante, ex agente duplo e uma super criminosa, isso passa uma certa pressão. Lyla Michalson estava parada na porta, com dois armários em ternos parecidos com os de Grayson as suas costas.

—Estão prontos? – pergunta me passando uma pasta quando a alcançamos. Acenamos em resposta antes de entrar no prédio.

Por todas as medidas de segurança que tomamos, quase fiquei decepcionada quando só nos mandaram pegar um elevador e aguardar na recepção do terceiro andar. Um homem jovem que está sofrendo de calvície precoce, estava atrás de uma mesa na recepção do escritório da Watson. Ele nos atende com educação e não aparenta se impressionar com a comitiva.

—A Diretora Watson, vai atendê-los – gesticula em direção a uma porta dupla de madeira.

—Diretora? – sussurro para Grayson que estava ao meu lado e ele apenas dá de ombros, agora completamente focado na missão.

O escritório era grande, com sofás de couro preto na lateral direita e uma grande bandeira dos Estados Unidos na parede, atrás da mesa onde uma mulher negra em seus trinta e alguns anos se levantava para nos receber. Pela primeira vez vejo alguém ter uma reação desde que entramos naquele prédio, ela franze a testa ao me ver, mas assim como a expressão surgiu, ela desaparece.

—Está viva – declara o obvio, me olhando impassível.

—O Arqueiro Verde me avisou, sabe, precisei pedir ajuda a ele quando não tive resultados com o FBI – franzo os lábios em desgosto. – Essa é a promotora de Star City, Laurel Lance – gesticulo para a mulher loura que não parecia nada amigável no momento. – E essa...

—Lyla Michaellson – a esposa de Diggle se adianta, estende uma mão em cumprimento.

—Diretora da ARGUS – Watson se pronuncia. – Prazer em conhece-la.

—Igualmente – Lyla dá um sorriso cordial. – Precisamos tratar de negócios.

—O FBI não está interessado em trabalhar com vigilantes, Michaellson, acho que já sabe disso – decreta, mas gesticula para o sofá.

Nós três nos sentamos de frente para ela, mas os dois guarda roupas de Lyla e Grayson, permanecem em pé. Cumprindo o papel de guardas costas. Respiro fundo e abro a maleta que havia recebido mais cedo, sobre a mesa de centro.

—Sinceramente, não costumava ser tão pró vigilantes – começo a dizer, retirando diversas pastas com provas anexadas a cada ficha de funcionários do departamento de polícia. – Queria que a polícia fosse o bastante, perdi meu pai por causa disso – ofereço as pastas a ela que as pega sem alterar nada em seu rosto. – Foi por isso que me tornei uma policial, queria ser uma heroína da forma correta, dentro da lei. Ainda quero, acredito nisso. Minha mãe foi morta em uma explosão causada por um desses mascarados que o Arqueiro Verde combateu e meu pai perdeu a vida salvando pessoas, por que ele achava que aquilo era de alguma forma sua responsabilidade e hoje não tenho mais nenhuma família. Não desejo o mesmo para os filhos, irmãos, pais ou esposas desses vigilantes.

—Onde quer chegar, Policial Harper? – solta um longo suspiro, baixando os documentos.

—Meu primo era o Arqueiro e foi morto dentro do presidio – estremeço involuntariamente. – Era a última pessoa que me restava.

—Oliver Queen é o Arqueiro – ela corrige e preciso reprimir minha vontade de revirar os olhos.

—Oliver Queen está escondido no momento, junto de sua família – Laurel se pronuncia. – Acho que é o mais sensato depois da figura política de mais peso de Star City sofrer um atentado daquela magnitude. Não acho que ele consiga bater em ninguém depois do que o Dias fez com ele.

—Já viu os noticiários, Diretora Watson? – Lyla pergunta.

Sem responder a mulher liga uma televisão de tela plana, que ficava anexada a parede. A imprensa fazia cobertura ao vivo do caos instalado na cidade. Era possível ver uma figura de verde tirando pessoas das ruas, ao lado de outro de uniforme preto. Ao longe conseguia ver homens com metralhadoras, caminhando calmamente em direção a multidão.

—Mandei meu pessoal ajudar o Arqueiro Verde – Lyla volta a dizer, agora a agente, ou diretora Watson não parece mais tão marrenta. – Aqui está, Oliver Queen – passa o celular para ela, com uma chamada de vídeo em curso.

—Prefeito, não parece estar em bom estado – comenta encarando a tela do aparelho.

‘Já estive melhor.’ A voz de Oliver continha dor, como se só por conversar fosse algo torturante. ‘Preciso que envie quem puder para a cidade, não tenho mais um departamento de polícia a disposição.’

—Não que o que tivesse fosse dos mais uteis – rebate parecendo cansada. – Recebi os documentos, e sua esposa também me enviou algumas gravações. Estava as analisando quando sua comitiva chegou.

‘Queria ser o Arqueiro Verde.’ Ele solta um riso seco e doloroso. ‘Assim não estaria apavorando meu filho nesse momento ao me ver todo arrebentado dessa forma. Mas não sou ele, apesar de estar grato por ter salvo minha vida e a da minha família, enquanto eu mesmo não pude.’

Nossa, aquilo foi perfeito. O pesar em sua voz, a entonação. Meu coração chegou a se apertar. Oliver Queen é um excelente ator, apesar que algo me diz que ele realmente sente por Jason ter protegido sua cidade, mulher e filho em seu lugar. Watson parece finalmente se convencer.

—Qual a sua proposta? – questiona, devolvendo o celular para Lyla.

—Quero ser o canal desses vigilantes de Star City, não a polícia local, mas a ARGUS. Não tenho interesse em suas reais identidades para ser sincera, meu jeito de trabalhar vai além disso. Mas se é controle o que deseja, posso fornecer.

—Os colocaria na folha de pagamento de vocês? – ergue uma sobrancelha.

—Quem falou sobre pagamento? Estou dizendo que vou monitorá-los, garantir que não passem da linha. Viu como está o departamento de polícia, ou melhor, eles nem mesmo possuem um. Os que não são corruptos, estão mortos ou aqui ao meu lado – gesticula em minha direção.

—O que me leva a perguntar, onde Harper entra nessa história?

—Vou ser a ligação entre a ARGUS, a polícia de Star City e os Vigilantes – respondo.

—O que vai te colocar bem na linha de fogo – aquilo em seu rosto quase parece ser admiração.

—Acho que não posso negar tanto assim meu próprio sangue – dou de ombros. – É o que a cidade precisa no momento e mesmo eu precisei dar o braço a torcer em relação a isso – a tristeza em minha voz é perceptível.

—Posso fazer melhor – Watson se levanta indo em direção a sua mesa. – Andei observando sua ficha desde nossa conversa ontem. Pode fazer mais do que ser só a ligação da ARGUS, pode ser nossos olhos dentro da polícia de Star City.

—O que quer dizer com isso? – pisco algumas vezes, tentando digerir a informação.

—Acho que estou te oferecendo um emprego, o que me diz?

—Eu responderia a você nesse caso, o que faria dos vigilantes e da ARGUS seus subordinados – descrevo calmamente observando sua expressão falhar por meio segundo antes de voltar ao normal.

—Entende que nossa ideia é não revelar as identidades dessas pessoas? – Lyla intervém. – Não por que tem essa ideia idiota de que Oliver Queen é o Arqueiro Verde, mas por que existe um preço por trás da máscara que eles usam.

—Perdi meu primo por essa máscara e por minha segurança fui obrigada a deixar a cidade às pressas – falo a olhando nos olhos, o remorso ainda é algo que não pude superar por completo. – Um alvo foi pintado em minhas costas por ser a prima do Arqueiro Verde e cada bandido da cidade queria minha cabeça em uma bandeja.

—Está disposta a colocar todas essas vidas inocentes em risco por conta de seus ideais? – Laurel pressiona e Watson recosta o corpo no sofá, respirando fundo enquanto encarava o teto.

—O que querem que eu faça então? – nos encara parecendo bem mais cansada do que transparecia antes.

—Me use como uma ponte, assim como a agente Michaellson está fazendo – sugiro agora tirando uma nova leva de documentos da pasta. – Mande uma ordem de reintegração para a detetive Drake e o antigo Comissário de Polícia Lance. Sinceramente, eu sou só uma novata, eles possuem mais experiencia. Preciso de ajuda para reestruturar o departamento de polícia da cidade.

—Quentin Lance não abdicou da vice liderança como prefeito por que teve problemas com alcoolismo? – franze a testa encarando as fichas pessoais dos ex policiais que foram forçados a deixar o departamento quando Dias assumiu o sub mundo de Star City.

—Sim – Laurel sussurra a resposta. – E ele está a dezoito meses sóbrio.

—Ele ajudada os vigilantes – reforça a acusação e ergo uma sobrancelha.

—Sério? – Lyla desdenha sorrindo. – Não é exatamente isso que estamos discutindo nesse momento?

—Não temos tempo, agente Watson – a lembro. – Minha cidade está sob ataque, seu prefeito está fora por medidas de segurança e como acabou de lembrar a exposição do vice dele pelo Ricardo Dias, deixou a liderança da cidade completamente vazia.

A assistimos enquanto permanece estática por quase dez segundos, provavelmente revendo os prós e contras do que estávamos tentando a convencer. Solto um ar que nem sabia estar prendendo, quando ela se levanta e vai até sua mesa. Abre uma gaveta e volta com uma pequena bolsa, parecida com uma necessaire e a deixa em minha frente.

—Tudo bem Policial Harper – afirma empurrando o objeto em minha direção. – Aí dentro vai encontrar um acesso de consultora, é provisório, vou enviar um definitivo com suas credenciais dentro de alguns dias – começa a descrever enquanto abro a bolsa. – Um microchip que pode ser usado em qualquer aparelho celular, funciona a satélite, uma linha direta – aponta para o telefone em sua mesa.

Observo um terceiro objeto, quadrado do tamanho de uma caixinha de fósforo com um botão vermelho e duas luzinhas acima. Fico tentada a perguntar se aquilo era um detonador, mas acho que Grayson deve ter previsto meu questionamento pois negou sutilmente, antes de voltar a encarar o nada. Isso ou só estava me mandando não falar besteiras. Bom, tanto faz, pois, a resposta vem assim que a agente me vê encarando o objeto.

—É um dispositivo de alarme, só apertar e mando um grupo de apoio para a localização em que ele estiver.

Em outras palavras um GPS com localização em tempo real. Ela pode estar começando a acreditar que o Prefeito não é o vigilante da cidade, mas ainda quer comprovar. Aceno sem demonstrar nada em minha expressão, guardo tudo dentro da bolsa outra vez e a seguro em meu colo.

—Temos um acordo? – Lyla se levanta caminhado em direção a outra mulher e estende a mão.

—Sim, temos um acordo – Watson aceita o aperto de mãos e me levanto junto a Laurel. – Estarei enviando reforços nesse instante.

—Mais uma coisa – digo quando todos começam a seguir em direção a porta. – Dias, ele é um traficante, mas seu perfil é de um narcisista megalomaníaco com tendencias homicidas, é carismático o bastante para atrair tantos seguidores e os fazer pensar que é alguém que os está ajudando. Se tivermos provas o suficiente, pode me garantir que ele nunca mais vai andar livremente por nenhum lugar desse mundo outra vez?

—Vou fazer o que estiver ao meu alcance para que ele nem mesmo veja a luz do sol, de tão fundo que pretendo o enterrar – algo em seu olhar me fez crer que aquilo era realmente sua vontade.

Saímos do prédio em silencio e quando estava na segurança do carro com Grayson novamente em sua pose rilex no volante encaro a nécessaire do FBI em minhas mãos.

—Pode bloquear o sinal de rastreio? – pergunto a ele que dá um sorriso de lado.

—Percebeu que ela quer te monitorar para descobrir a identidade do Arqueiro – recita o obvio como se estivesse me dando sua aprovação, só não sei exatamente em que estava sendo aprovada. – Vamos seguir para Star City, é importante que ela veja onde está nesse instante. Laurel te deixou um presente – aponta para o banco traseiro onde estava uma bolsa preta, abro e encontro meu distintivo e arma, um suporte e três cartuxos de bala.

Retiro o casaco e prendo o suporte, guardando a arma logo depois de carrega-la e as munições reserva. Espero sobreviver até o fim desse dia, mas espero mais ainda acabar com esse desgraçado do Dias.

—Posso perguntar uma coisa? – o escuto dizer, quando estávamos nos aproximando das fronteiras da cidade.

—Você é o enigmático de nós dois, Sr. Grayson – dou de ombros e escuto sua risada cheia de deboche e acho que nem foi intencional é só quem ele é.

—Fez direito criminal na universidade de Gotham, então por que trabalhava em uma farmácia? – me olha por um segundo e não sei se consigo ficar incomodada por ele ter levantado minha ficha depois de tudo o que descobri que ele e sua família fazem.

— Foi a condição do meu pai – dou de ombros. – Tenho um técnico em farmácia. Ele queria que eu pudesse ter um emprego que pagasse razoavelmente bem, caso algo o acontecesse, assim não fosse obrigada a sair da faculdade por não ter como pagar.

—Inteligente.

—Se quiser chamar assim – murmuro encarando a estrada.

—E como deveria chamar?

—Uma saída – mordo meus lábios antes de o encarar. – Ele perdeu a mulher da vida dele e se convenceu que deveria salvar a todos quanto fosse possível para evitar que mais pessoas sofressem essa perda. Mas ele não se importava em me perder. – Dick engole em seco antes de desviar os olhos para estrada. – Mal o via. Entre seus turnos no corpo de bombeiros e sua cruzada nas ruas de Gotham atrás de bandidos. Quando ele morreu, – respiro fundo cruzando meus braços sobre o peito – fui simplesmente oficializada como órfã, mas a verdade é que já era desde a morte da minha mãe.

—Tenho certeza que em meio a tudo isso, o que ele mais desejava era te manter segura – posso sentir o misto de receio e culpa em sua voz. – E ele teria orgulho de pudesse ver o que está fazendo hoje, pode não parecer, mas vai salvar muitas vidas.

—Sabe qual foi minha tese final na faculdade? – ele nega com um aceno, então continuo. – O perfil psicológico dos vigilantes. Grayson engasga com a própria saliva, então volta a encarar a estrada e eu faço o mesmo. – É melhor encostar ali – aponto para um ponto na estrada deserta. – Precisa se trocar, não é?