Last Chance

Capítulo 1 - Piloto.


SELINA

Contagem de corpos. Um pai sentenciado a morte, a esse dou graças a Deus. Uma mãe viciada, morreu em meio a uma overdose de tantas drogas diferentes que o legista parece ter perdido o interesse em catalogar todas, terminando o relatório de autopsia com “e mais variadas”. Um irmão psicótico, morto no fogo cruzado. Holly, degolada em minha sala de estar, bem depois de descobrir que estava traíndo a nossa amizade. Agora é certo, eu sou a próxima.

Esse lance de gato e todas as vidas me dá certa vantagem, mas quantas das nove já foram usadas? Não saberia mais dizer, só sei que meu corpo queima de dentro para fora, e tento em vão conter todo o sague que está saindo como uma cachoeira do centro de meu peito. Com certeza essa é a nona vida, não suportaria mais um dia nesse inferno, é melhor que acabe de vez.

O sangue passa a sair também de minha boca e minha garganta se enche do liquido viscoso e quente, me fazendo engasgar. Sozinha em uma cela nojenta, sem reforços, deixada para morrer. É mais fácil partir quando não tenho nada a perder, ninguém para deixar. Selina Kyle ou Mulher Gato, as duas vão passar despercebidas, meu corpo vai acabar em alguma vala, sem nome, flores ou uma lápide. Mas quem colocaria flores em um pedaço sujo de concreto com meu nome? Quem vai se dar ao trabalho de visitar um lugar demarcado onde meu corpo se decompõe?

A resposta vem quando meus olhos se fecham e a dor passa a se tornar amena. Olhos muito azuis, e uma voz grave que me desperta os melhores e piores sentidos. Bom, serei mais uma nesse caso também, a menos importante de sua interminável lista de perdas. Pobre Wayne, em um mundo perfeito seriamos um casal brega, que solta palavras vergonhosas e tem o coração balançado por gestos e olhares inesperados, mas não estamos em um mundo perfeito, e se quer estamos juntos. Espero que morra velhinho, com seus moleques em volta, todos vivos. Espero que encontre a paz, nem que venha nos últimos instantes de uma longa vida lutando por ela.

Sinto muito.

ROY HARPER

—Tem certeza que esse é o caminho descrito no mapa? -Thea questiona Nyssa pela milionésima vez.

—Quer ver? -oferece o pedaço grande de papel, revirando os olhos com a impaciência da Queen. -Merlim deveria ter incluído lições sobre paciência e controle em seu treinamento.

—Passa todos os seus dias ao meu lado, pode ensinar se te irrito tanto. -devolve cheia de petulância e seguro o riso, tomando a frente depois de espiar o mapa em suas mãos.

—Pensei que seu contato nos encontraria na entrada das ruinas. -falo olhando para um monte de pedras escuras, cheias de lodo e vegetações crescendo entre elas, em frente a uma caverna de aparência selvagem e antiga.

—Continue a andar Harper, e logo ele se fará ser visto.

—Enquanto me ensina a ser paciente, vou te ensinar meia dúzia de gírias. -Thea brinca com um sorriso largo no rosto, Nissa tenta por um tempo não ceder e manter a pose, mas não pode mais impedir as reações que o carisma de Thea provoca.

Algo vermelho se move de dentro da estranha caverna em ruinas e aos poucos, começo a ver. Um cara com o rosto completamente coberto por uma espécie de capacete vermelho andar em nossa direção. Ele usa uma jaqueta marrom, sobre algo que me lembra um uniforme militar, com o símbolo de morcego no peito.

—Meu contato. -Nissa anuncia, quando o cara para a nossa frente, só me pergunto como ele consegue respirar naquilo? -Podem o chamar de Capuz Vermelho. -apresenta solene, Thea a e eu não nos movemos. -Arsenal e Speed. -gesticula nos indicando, sem nenhuma formalidade que empregou ao se dirigir ao outro, posso perceber.

—Três arqueiros. -dá de ombros. -É melhor do que nada. -a voz do cara é sarcástica e furiosa, de um jeito que me lembra outro garoto sarcástico e cheio de fúria. Thea parece pensar o mesmo, pois me lança um olhar divertido, com um sorriso discreto para me provocar. -Lembra do acordo, eu te dou um...

—Claro, quando falhei com minha palavra? -Nissa o olha de uma forma intima, que me surpreende. As palavras do cara não apenas a ofenderam, ela estava magoada por algum motivo.

—Pode entender meu receio ao confiar em um Al Ghul. -ele dá as costas e começa a caminhar novamente em direção a caverna, mas algo me diz que se nos movimentarmos mais rápido sua primeira reação será atirar em nossa direção sem pestanejar.

—Não sou Thália, e sabe muito bem. -me sinto um mero expectador da conversa que ambos estavam tendo, o cara relaxa quando Nissa começa a caminhar ao seu lado.

—Qualquer pessoa pode ver isso. - apesar do tom seco do garoto, Nissa sorri como se acabasse de receber um grande elogio. -Aliás, é legal o que estão fazendo. Esses poços deveriam deixar de existir a muito tempo atrás.

Havia uma imensidão de rancor em sua voz, Nissa coloca uma mão sobre seu ombro como se o consolasse por uma grande perda. E começo a perceber o quanto os dois são próximos. Ele balança a cabeça para ela, como se agradecesse pelo pequeno gesto, depois eles voltam a falar de coisas que não entendemos, mas tanto eu quanto Thea estávamos fascinados com a forma fraternal que eles se tratavam, por vezes se empurrando de brincadeira e arrancando risadas do outro, meu queixo cai quando ele a ergue com um braço ao passarem por uma bifurcação e Nissa solta risadinhas protestando. De todas as faces da Filha do Demônio que vi durante essa nossa incursão, essa é a primeira vez que a enxergo como uma garota normal, o estranho é que esse cara é a coisa menos normal que já coloquei meus olhos até hoje.

—Como o garoto está? -ela o pergunta cheia de receio.

—Bom, sabe quem são os pais dele. Está tão bem quanto se pode ficar naquelas circunstâncias. -mesmo no escuro, posso ver algo brilhando no rosto de Nissa. E quando ela começa a falar tinha dor em cada letra, mais dor do que alguém pudesse conter, algo parecido com a forma que fica ao lembrar de Sara.

—Aquela desgraçada o levou a morte, uma mãe que tem a honra de gerar algo tão precioso quanto uma vida em seu próprio ventre, não deve descartar o filho como... Como nosso pai faria. -ela limpa o rosto, e agora o garoto quem toca seu ombro. -Só existem monstros em minha família, pequeno detetive.

—Enquanto eles tiverem você, o número cai consideravelmente. -fala casual, depois aponta a lanterna para uma bifurcação de água que dava em um grande poço de águas verdes. -Chegamos.

—Aqui. -ela o entrega um pacote. -Pode acabar com esse.

—Mesmo? -soa como uma criança ganhando um presente de natal e Nissa solta uma risadinha balançando a cabeça para ele que sai correndo e começa a lançar o conteúdo do pacote ao redor do poço, enquanto gritava animado.

—Por que ele está tão feliz em acabar com isso? -Thea estava incomodada, o que em outros tempos me deixaria pirado, olha, acho que finalmente sou um adulto!

—O Pequeno Detetive tem sua cota de dor causada por meu pai. -responde cheia de tristeza, mas depois um sorriso nostálgico surge em seu rosto. -Ele é um bom garoto. -sussurra, falando com ela mesma enquanto o observa, depois se vira em nossa direção. -Vocês se dariam bem juntos, com um cara que superou o Mirakuru e outra morta regenerada, vocês têm mais em comum do que pensam.

—Quem tem o que em comum? -ele pergunta já de volta ao nosso lado e a devolve o pacote vazio.

—Vocês. -dá de ombros e volta a andar com ele correndo para alcança-la.

—Precisa para de tentar me arranjar amigos, já percebeu que eu provavelmente sou o único na sua lista? -reclama, e ela o empurra em resposta.

—Somos amigos dela! -Thea se cansa de ser ignorada e ele para. Nos estuda por um instante, o que faz meu instinto ativar e preciso reprimir a vontade de lhe apontar uma flecha.

—Sua mãe sabe que está na rua a essa hora? -prendo o riso, sentindo piedade da pobre alma desavisada.

—A sua sabe que está brincando de Power Ranges por aí? -Thea devolve, e os dois se encaram por um tempo.

—Devo me preocupar? -sussurro para Nissa ao meu lado.

—Não, ele nem está tocando nas armas. -diz como se falasse de algo trivial como pedaços de papeis ou comida. -Para entender o Capuz, precisará ver uma camada abaixo dessa casca.

—É muita marra para uma pessoa tão pequena. -ele diz a Thea que mantinha o nariz empinado e o olhar firme sobre ele.

—E você, como consegue respirar dentro disso? -questiona, se esquecendo por um instante que estava no meio de um tipo bizarro de duelo. Não posso ver as expressões do tal Capuz Vermelho, mas deve estar bem confuso.

—O que?

—A sua máscara, esse capacete. -ergue o dedo e toca com a ponta. -Não parece confortável.

—Devo lembra-la que estavam brigando? -Nissa me pergunta dessa vez.

—Que nada, ela está com uma adaga em mãos desde o começo. -aponto para a mão de Thea que estava casualmente sobre o bolso da calça.

—Nós temos que ir, e você quer saber se eu consigo respirar? -pronto, nem mais o sarcasmo restava na voz dele. Thea balança a cabeça confirmando. -Claro que posso, ou estaria morto, de novo. -a olha por um tempo, depois volta a falar. -Você é bem estranha. -conclui.

—Falou o cara que usa um capacete que quase o sufoca. -toma a frente e os vemos continuar a discussão ao longo do caminho. Mas agora que sabíamos que não acabaria em briga, o interesse acabou passando de imediato.

—Para onde nós vamos? -Nissa pergunta, e vejo uma bela moto parada ao lado do nosso carro. Do tipo que deixaria Oliver com inveja.

—Ah, o capacete é para ele não precisar ficar colocando e tirando o tempo todo. -Thea sussurra para mim e dou risada de sua implicância com o uniforme do cara. -Agora tudo faz sentido!

—Tenho uma amiga que vai precisar de ajuda, e nós estamos quase atrasados. -ele mexe no celular e o de Nissa apita, ela retira o aparelho do bolso. -Mandei o endereço, mas vou estar visível o tempo todo, qualquer problema é só me seguirem.

—Tudo bem. -Nissa gesticula para que a gente entre no carro e mal afivelamos o cinto ela já estava arrancado em disparada.

JASON TODD

A cada segundo que nos aproximamos mais dos arredores de Gotham, penso que não deveria ter perdido tanto tempo. Mas é complicado negar algo a Nissa, não acredito que vá dizer não a qualquer coisa que me peça ao decorrer da minha segunda vida. Acho que não estou fazendo sentido, bom, vou tentar resumir da melhor forma.

A alguns anos, fui assassinado pelo Coringa. Um vilão psicótico do meu mentor, que me espancou até a morte e depois lançou tudo pelos ares. Aprendi da pior forma que o Batman não pode salvar a todos, e não importa o que seja para ele, o grau de importância é basicamente o mesmo de algum desconhecido que ele salva todo maldito dia. Fui muito ingênuo ao pensar que o Robin teria algum tratamento especial, pois é, tem isso. Antes de ser o Capuz Vermelho, costumava usar uma roupa colorida e andar por aí ao lado do Morcego de Gotham. Mas voltando ao meu assassinato e morte, o Rás Al Ghul pensou que era responsável por minha morte, afinal ele havia contratado o Coringa a fim de distrair o Batman enquanto executava mais um de seus planos de dominação mundial. Acontece que matar um adolescente fica completamente fora de suas linhas estranhas de honra. Pensando nisso, roubou meu corpo afim de me reviver nos poços de Lázaro. A pior ideia que já teve, e acredite, Rás Al Ghul é dono de um grande acervo de ideias ruins.

Quando voltei da morte, e era apenas uma besta em um corpo humano, muito forte e treinado para deixar qualquer um ao redor em segurança, Nissa quebrou escondida cada uma das tentativas de controle mental que o Ra’s e Thalia tentaram me submeter. Enquanto mantinham segredos, Nissa me contou quem era, me forçou a lembrar por que lutava e por fim me mandou para Ducra, uma velha feiticeira e suspeito que completamente imune a qualquer sanidade ou coerência. Mas a filha mais nova do demônio me prometeu que ficaria bom outra vez. Um trabalho em progresso, é o que diz sempre que nos vemos. Ela sempre foi mais humana que a irmã mais velha, aliás, acredito que seja a única humana com a qual convivi durante meu tempo na Liga dos Assassinos que possui qualquer coisa que se pareça com humanidade.

Mas não posso entrar onde vou entrar sem um Batman, de peito aberto e me sentindo o dono do lugar. Por isso preciso fazer parecer que a ajuda que a daria sem cobrar, não passa de uma troca de favores. Pois é o que a Gata precisa, e aí está outra na lista dos rejeitados. Odeio dever as pessoas, e Selina apesar de nunca ter cobrado é uma das pessoas que devo, aquele tipo de dívida que não tem como pagar. Divida de família, eternamente chutando seu saco, só para a dor ser uma lembrança constante de sua existência.

Olho para o conversível vermelho ao meu lado, buzino duas vezes e acelero mais. Nissa acompanha sem dificuldade durante as duas horas de viajem e quando para na parte de trás do Asilo de Arkham, nenhuma das duas crias de Arqueiro demonstra surpresa, Nissa tão pouco. Quem se surpreende sou eu, ao ver discretas silhuetas a sombra, conto rapidamente sete delas, a garota irritante estava armando o arco quando Nissa a faz abaixar.

—Estão todos com a gente. -informo.

Asa Noturna é o primeiro a ficar visível, ele sai de um emaranhado de árvores a direita, com Batgirl e Robin ao seu lado. A esquerda Batwoman, Salteadora e Red Robin e para fechar o cerco o próprio Batman sai do centro das sombras. Vai ser uma noite e tanto, não tenho tempo para apresentações. Damian se adianta e para ao lado da tia, uma das poucas pessoas com a qual essa praga age como uma criança deveria agir.

—Oi garoto. -ela sorri radiante para ele que devolve um grande sorriso. É a primeira vez que se veem após a volta dos mortos dele, e nem mesmo tem tempo de trocar algumas palavras.

—Quem são esses? -pergunta, e o vejo dar um passo para mais perto da tia, até que parte do seu braço a esteja tocando, o pobre garoto é capaz de derrubar o Exterminador se tiver a motivação certa, mas não entende o que é sentir falta e ter afeição a ponto de precisar abraçar alguém. Batman precisa parar de ter filhos, urgente, com a progressão de estragos tenho medo de pensar quão perturbado um próximo Robin poderia ser.

—Hoje são o reforço, mas depois apresento. -pisca para ele que aceita prontamente, e mal posso crer no que vejo.

—Por que não fica por aqui Nissa? -Grayson dá voz a meus pensamentos. -Parece bem mais fácil com você por perto. -indica Damian que fecha a cara em resposta.

—Onde ela está? -Batman por fim para a nossa frente, cortando a conversa paralela com seu jeito hospitaleiro de ser. Que babaca.

—No subterrâneo. -respondo. -Ela deixou uma garantia com o Steve Trevor, caso não voltasse era para me mandar um sinal de alerta.

—Okay. -era o que ele precisava, mas o paro e seu olho vai direto para o local em seu braço onde estava o segurando, primeiro aviso.

—Vamos tirá-la e eles vão voltar, de novo e de novo. -sustento seu olhar até que perceba o óbvio.

—Precisamos de um plano. -Asa Noturna dá um passo a frente e sustenta meu argumento.

—Podemos tirá-la da cidade, mas duvido que Selina concorde. -Tim acrescenta.

—Não precisa concordar se for inconsciente. -Nissa simplifica, demonstrando certa impaciência com a discursão em círculos. -Mas se continuarem assim, não vão precisar salvar nada.

—Conhecemos pessoas que podem cuidar dela. -a irmã do Arqueiro Verde sugere e todos nós a encaramos, algo que faria qualquer pessoa sã se encolher, mas ela apenas sorri como se aquilo fosse muito divertido. -Vamos logo, vou pedir a Sentinela para deixar um quarto arrumado. Ninguém concordou, mas a verdade é que não temos tempo.

—Eu vou junto. -falo entre dentes, com esforço. -Se ajudar a decidir logo, antes que ela sangre até a morte!

—Se for o caso. -Batman dá de ombros, tentando minimizar o fato de sua voz ter voltado a ser firme. -Vamos logo.

—Vocês vão entrar pela porta da frente? -a garota exclama em choque, e posso escutar o riso de Grayson.

—Então? -espera que ela diga seu nome.

—Speed.

—Speed. -continua. -Aqui menos por muitas vezes é mais. Hey Dorian! -cumprimenta o recepcionista que relaxa ao perceber que não é o Batman a tratar com ele. -Temos assuntos urgentes. Quem ficou de plantão nos casos medianos?

—Lyton. -responde de imediato. Tim vai para seu lado verificar as câmeras, Salteadora e Batgirl partem atrás do guarda. Batwoman fica a postos travando a primeira saída, Nissa chama os outros dois e o Robin para se posicionarem nas outras saídas e desço com Bruce e Dick para pegar Selina. Nos enfiamos em vários corredores, com Tim ditando o caminho.

—Que merda! -Asa Noturna exclama quando paramos de súbito.

Selina se arrastou por todo o caminho deixando um rastro largo de sangue e estava branca feito papel, com os lábios azulados. Caída a nossa frente, completamente imóvel. Bruce trava e tomo a frente por ele, me abaixo e percebo a respiração fraca e uma grande perfuração no peito direito, ele solta o ar e a pega em um movimento rápido.

—Antes de Star City, vamos para a caverna. -ordena e Grayson começa a ligar para Alfred, avisando sobre Selina.

—O que faço com os outros?

—Leve todos eles, não é segredo que Oliver Queen é o Arqueiro Verde e ele conhece minha identidade a anos.

—Você me disse que o Arqueiro Verde era um mito! -Grayson exclama. -E que o cara que começou a aparecer no noticiário era algum maluco suicida.

—Não deve me culpar por acreditar no que digo, Asa Noturna. Sua escolha, seus problemas. -se não estivesse concentrado na mulher estática nos seus braços, provavelmente estaria rindo da expressão inconformada do Menino Prodígio.