SELINA KYLE

Sinceramente, prefiro o jogo de gato e rato. Pular telhados e enganá-lo até que me perca em meio a um deles. Não gosto de sentir que estou sendo cuidada, não pelo Bruce Wayne, Batman ou como ele preferir ser chamado. Eu o amo, essa é a maldita verdade que cada parte do meu corpo parece gritar, dentro desse apartamento enorme de três andares que se tornou pequeno demais desde sua chegada. Quando me dei conta que não importa quantos metros quadrados existam entre nós, estar abaixo do mesmo teto é como um interruptor que nos liga, dando início a tortura sem fim.

—Então grandão, vai ficar aí na porta até que horas? -digo quando não suporto mais o magnetismo que me puxa em sua direção.

Bruce vira seu corpo, escorado no batente da porta e me encara na cama. Um pouco zonza pela leva de remédios e procedimentos alternativos que tenho feito na tentativa de me curar mais rápido. Mas no momento não saberia dizer se o fato de minhas pernas parecerem pesadas se deve a todas as drogas ou a forma que sou observada.

Em anos do nosso jogo passei a perceber a diferença sutil em cada um de seus olhares, tem o de aviso que é seco e sem emoção, o que usa quando quer muito não ser contrariado na frente de alguém que deve liderar, esse tremula levemente antes de desviar para outra pessoa. Tem o olhar de desamparo, beirando a traição, quando sou pega em meio a um roubo, o de culpa, pavor. O olhar de “vou rasgar todas as suas roupas e fazer amor com você, ou te levar para Arkham”. Conheço e posso lidar com cada um desses, mas não com esse aí, com esses olhos em chamas, onde sua íris se dilata a ponto de cobrir quase todo o azul, seu maxilar se trava em um esforço perdido de trancar suas emoções, esse olhar brilha. Odeio esse olhar, e o amo ao mesmo tempo.

—Não posso ler sua mente, e não é divertido tentar. -murmuro ao ver que nada sairia dali. Em seguida preciso morder os lábios para suprimir um gemido de dor ao me virar, com uma cólica que não quer mais parar, não me lembro quando foi que essa merda começou. -Onde Jay está? -olho em volta, nessas horas o cabeça vermelha é bem útil.

—Com Roy Harper. -responde andando lentamente até a cama e suprimo a vontade de me encolher. Bruce se inclina sobre mim e me ajeita como se fosse uma boneca de pano, rápido, preciso e delicado. Mal começo a sentir seu toque e ele cessa.

—Não é perigoso o soltar assim sozinho? -contenho uma pitada de preocupação, mas não parece funcionar, um mínimo sorriso de lado aparece por um milésimo de segundos no seu rosto.

—Ele está bem, John Diggle vai ficar de olho nos dois, mas o garoto do Oliver parece ser bem controlado. -Bruce observa cada centímetro do meu rosto e meu estômago chega a sofrer pequenos espasmos. Por fim ele toca minha face, não sei se por vontade ou para medir minha temperatura. -Está vermelha, sua temperatura está subindo novamente. Não deveria mais estar assim. -se levanta de imediato e mexe em uma maleta sobre a cômoda, quando volta tem uma seringa nas mãos cobertas por luvas de látex. -Me dê o seu braço.

—É a primeira vez que pede. -provoco por hábito, me arrependendo me mesmo instante. Ele corre sua mão da base do meu ombro até meu pulso, olhando minha pele reagir a cada fase do percurso, depois olha nos meus olhos, muito sério me fazendo engolir em seco e finalmente começa a tirar meu sangue. Chego a sentir alívio com a picada da seringa.

Estávamos prestes a nos casar, eu já usava meu traje Bolo de Festa quando Holly a minha amiga morta me disse o que essa união custaria a identidade do Batman. Que todos os seus inimigos sabiam do casamento entre Batman e Mulher Gato. E assim no instante em que Bruce Wayne fosse visto ao lado de Selina Kyle, a última peça do quebra cabeça estaria montado, e seria o fim do Batman e por consequência da minha cidade. Segundo ela, Bruce estava disposto a assumir o risco e foi bem aí que entendi que dessa vez eu deveria me sacrifica.

Não me orgulho de dizer que fugi, sim, dei as costas e desapareci deixando um bilhete com desculpas esfarrapadas que deveriam fazer com que esse homem me odiasse. Precisava descobrir por mim mesma quem estava por trás daquilo, por mais que já tivesse uma suspeita razoável. Foi o que me levou a Steve Trevor, a Argus e me deixou nessa maldita cama agora. A pior parte é que hoje sei que Holly era parte do esquema, me afastar do Batman era outra. Acabaram com meu casamento para ter a chance de capturar o morcego, e fazer dele um Avatar bizarro e sem livre arbítrio.

—Felicity deve ter recursos para analisar essa amostra no porão do Arqueiro. -Bruce se levanta com o frasco do meu sangue. -Vou pedir a Nissa que a leve para eles.

—Acho que chamam o QG deles de caverna. -comento.

—Sabe que aquilo é um porão, não uma caverna. -desdenha sem mudar um traço se quer em seu rosto lindo.

O plano que armaram deve ter sido um fiasco, por que esse cara não parece abalado em nada. Desde que me salvou, o assunto término ou casamento nem mesmo foi abordado, não que esperasse o Batman sendo sentimental e pedindo DRs, só que é muito confuso... Em momentos como esse é fácil fantasiar, fingir ser importante em sua vida, parte de sua causa. Em momentos assim preciso ser ainda mais forte e me forçar a focar no que sou, quem eu sou e por que isso nunca vai ser possível. O vejo sair e aos poucos posso acalmar meu corpo aos pouquinhos, até que sou pega novamente pela inconsciência e fico grata por que dessa forma não existe dor.

Abro meus olhos e sou inundada pela claridade do sol que brilha forte através das janelas de vidro e estou cercada por Bruce, Jason e Felicity Smoak. Os três com olhos tristes me observando, mas os de Bruce beiram o desamparo. Não consigo entender o que aconteceu, então me lembro que devo ter usado minha última vida e provavelmente estou prestes a receber minha sentença final.

—Quanto tempo? -tento soar fria, tentando me sentar e Jason prontamente me ajuda, me poupando a dor.

—Não seja boba. -ele diz com um sorriso triste em seu rosto normalmente irritado. -O inferno não te quer, e sabemos que não vai para o céu! -Bruce o encara recriminando, mas sorrio com carinho para Jason que retribui.

—Vou esperar lá fora, dar um tempo para vocês. -Felicity sussurra em voz baixa e se inclina para apertar minha mão de leve, saindo com Jason em seguida.

—O que está acontecendo, Morcego? -respiro fundo suprimindo o desespero que parecia querer tomar conta de mim.

—Vamos ter que te levar ao médico, Selina. -ele se senta na beirada da cama e toma minhas mãos com as suas, cheio de pesar em seus olhos. -Eu sinto muito...

—Estou doente? -o olho, confusa e ele nega. -Então o que infernos eu tenho!

—Você estava grávida. -baixa seus olhos para nossas mãos e não consigo puxar o ar. -Eu... Eu não sei o que dizer. -soa devastado e tão pouco eu posso proferir uma palavra se quer. -Sua hemorragia foi pulmonar, Alfred não viu nada que indicasse uma gravidez, mas agora seu corpo precisa expelir o feto... -a voz falha e tudo ao meu redor gira.

—Não, eu não estava. -murmuro, fazendo várias contas mentais. Desde que nos separamos a pouco mais de dois meses eu não estive com ninguém, até por que estava imersa na missão que peguei na semana seguinte pela Liga da Justiça da América, me infiltrando na Legião. Mal comi ou dormi durante todo esse tempo, mas nem de longe cogitei uma gravidez ou não teria me deixado ser pega... -Estava? -olho desamparada para ele, que afirma com um aceno breve. -Ah Deus, não pode ser verdade. -solto minhas mãos das dele e olho em volta, mas me mover dói, o nó que se forma em minha garganta é igualmente doloroso. -Eu fiquei pensando enquanto perdia sangue nos bueiros de Arkham, que poderia morrer agora, que não tinha mais ninguém que chorasse ou viesse a lamentar minha morte. Eu... -levo as mãos ao meu ventre, onde meu filho, nosso filho morto está. -Eu não estava, sinto muito. -digo para a criança, em meio ao choro.

Em algum momento Bruce me abraça, mas nem isso me incomoda com todo o desamparo que me engole. Não que sonhe em ser mãe, nem de longe isso passa se quer por minha mente, mas nunca tive bons pais, e o mais próximo de família que tinha era Holly, o que acabou em traição e morte. Talvez seja minha sina, viver em um mundo solitário cheios de pessoas que querem me matar, e talvez esse seja o único fim possível para alguém como eu.

JASON TODD

Posso ouvir o choro dela do outro lado da porta, o desespero que existe. Selina tenta se fazer de forte e talvez por isso nós dois acabamos nos dando bem, em partes somos semelhantes, nenhum dos dois é exatamente o que aparenta ser. Bruce vai lamentar e sofrer do jeito dele e sinceramente, ajuda-lo é muito mais coisa do Dick do que minha, quem me preocupa é ela. Selina teve todo seu mundo desabado a pouco tempo, foi acusada de ser responsável por um incêndio em um orfanato. Por pouco, muito pouco não foi condenada a morte. Descobriu que a responsável era sua melhor amiga, depois de confessar a traição, confessar que arruinou o casamento dela de propósito, Selina ainda a perdoaria. Mas só que fez foi encontrar a garota morta em sua sala de estar. Então posso simpatizar com quem tem tanta falta de sorte na vida, a Gata é como eu, o tipo que nasceu para servir como saco de pancadas da vida.

O que me leva a pensar no que seria dessa criança se viesse ao mundo? Talvez Selina parasse por um tempo, mas quando crescer, provavelmente acabaria com uma máscara. Com o Coringa a seu encalço. Esse pobre bebê, nasceria fadado e mesmo assim todos lamentam sua morte.

Minutos depois Bruce sai do quarto com ela em seus braços, não nos olha e não fazemos questão de ser vistos. Felicity Smoak parece ter sua cota de depressão para ponderar e acaba por não ser incômodo ficar com ela por perto enquanto tenho a minha própria para rever. Ela solta um longo suspiro que me tira de meus pensamentos.

—O que vamos ganhar no fim de tudo isso, Todd? -questiona com os olhos presos a uma pintura abstrata na parede.

—Eu ganhei um pé de cabra, me espancando até a morte. -dou de ombros, tentando soar indiferente ao mesmo tempo que ignorava a piedade em seus olhos. -Depois uma bomba que levou minha vida e a da minha mãe ao mesmo tempo, que por sinal foi quem me entregou para o cara que me matou. Acredito que qualquer coisa que vier agora é lucro. – dou de ombros.

—Você passou pelo poço? -vejo que passo a fazer muito mais sentindo para ela.

—Dei um mergulho por lá. -debocho piscando para ela.

—Sinto muito. -murmura com empatia sincera, o que desperta minha curiosidade. -Meus amigos passaram por isso também. -me olha de lado. -A ex namorada de Nissa, Sara Lance. -confirmo, já conheço a história. -E Thea, namorada do Roy e irmã do meu marido. Bom, Ra’s a deixou a beira da morte para forçar Oliver a entrar para Liga.

—Ra’s é um desgraçado. -solto entre dentes. -Bom, graças ao seu marido, era. Ao menos por enquanto.

—Sabe, ele até pode ser. -seus olhos se tornam escuros por um instante. -Mas não foi ele o culpado exatamente, o pai dela quem arquitetou tudo, cada passo. -vejo como o ódio sobre humano toma seu rosto de beleza infantil, a fazendo parecer outra pessoa de imediato. -Viu como Bruce e Selina estão devastados por um feto com poucas semanas. Me faz pensar no desgraçado do Merlim, que deve estar tostando no inferno agora. Como ele pode fazer algo assim... -Smoak não consegue concluir a frase, tem muito nos seus ombros e como não tenho coisas legais a dizer, fico em silencio respeitando sua dor. -Sei que estamos te pedindo demais com isso de fingir ser o Oliver. -volta a falar depois de muito tempo. -Mas Dias quer acabar com minha família. -observa as mãos trêmulas. -O filho do Oliver, bom, meu filho William. -se vira em minha direção, como se precisasse que soubesse por que estão lutando. -Não posso deixar que o tirem de nós, pode entender a dor da sua madrasta, talvez consiga entender a minha.

—Sou um dos alvos, só estou fazendo minha parte. -tento amenizar a situação, sem parecer me importar, mas não estou acostumado com olhares de mães desesperadas como o que ela tem no rosto agora. -Pode apostar que vou fazer o melhor que posso, ele agora conseguiu irritar de verdade o meu time. Não somos do tipo afetuoso, mas nossa política é que somente nós podemos machucar uns aos outros. Bruce não vai parar enquanto não o destruir. -é estranho que isso soe quase delicado em minha voz, mais estranho ainda que isso pareça realmente ser um conforto para a mulher do arqueiro. -Talvez você também possa ajudar no treinamento. -comento e ela assente, meio rápido demais.

—Qualquer coisa. -afirma enxugando algumas lágrimas que havia deixado escapar.

—O Roy me disse que você observa Oliver todas as noites desde o início, e provavelmente seria a última a ser enganada por um falso arqueiro. -volta a concordar. -Cada um deles sabe golpes, mas não a forma do Oliver agir, o que faz em cada sequência.

—Eu faço isso! -ergue as mãos como uma CDF dando a resposta certa ao professor, e não consigo evitar de sorrir. -Mas como não podemos ser vistos juntos e acredito que também queira ver Selina, vamos fazer o que podemos por aqui. - retira o tablet da bolsa. -Tenho alguns arquivos que podem ajudar.

Me passa um dossiê completo sobre seu marido e não sei se acho isso fascinante ou estremeço ao pensar que ela coletou esses dados do cara com quem divide a cama todas as noites. -A quanto tempo tem isso? -faço meu melhor para não soar chocado.

—É um trabalho antigo, Oliver era meio bobo quando nos conhecemos e eu precisava de respostas. – coça o alto da cabeça desviando o olhar. -No entanto eu comecei a traçar um perfil do arqueiro mais detalhado do que a especulação que tinha, quando o FBI apareceu. Precisava formar um plano para desacreditá-los e graças a Deus você acabou sendo esse plano. -dá de ombros como se aquilo não fosse incrível. -Ontem enquanto batia na bacia, acrescentei dados pessoas, trejeitos e coisas que podem te ajudar a montar o personagem.

—É um trabalho muito bom. -elogio imaginando a reação de Bruce ao ver algo nesse nível. Esses caras tem um gosto bem estranho para mulheres, parecem gostar de dormir com o perigo.

—Vou ficar em silêncio e te deixar estudar, qualquer coisa é só me dizer e te ajudo.

—Claro. -respondo por educação, imerso no que estava lendo.

OLIVER QUEEN

Entro no hospital no inicio da tarde, e posso ver Bruce sentado em um banco. Passei a odiar esses corredores com todas as minhas forças, parece que o cheiro de morte se torna palpável por aqui. Ele percebe minha presença, mas não tem energia para fazer muito mais do que me lançar um olhar breve, então baixa a cabeça novamente e encara as próprias pernas.

—Alguma notícia? -me sento ao seu lado.

—Eles estão retirando o feto. -esfrega o rosto, acho que desde que o conheço, tirando a faixada de playboy que usa tanto quanto eu, essa é a primeira vez que o vejo realmente abalado, com emoções reais o atingindo, e é uma sensação estranha perceber que mesmo o grande Bruce Wayne tem um lado vulnerável.

—Sinto muito, irmão. -digo em voz baixa. Me lembro de como me senti vazio quando Samantha mentiu me dizendo ter perdido William, mas não acho que dividir vá ajudar nesse caso.

—É como minha maldição particular. Eu só conheci Damian aos oito anos, e ele era uma máquina de matar, criada e treinada pelo Ra’s Al Ghul. -parece falar com ele mesmo, como se estivesse a ponto de explodir. -Não tive opção senão o treinar e tentar desfazer o que a liga fez do garoto. Encontrei Jason no beco do crime, roubando os pneus do Batmovel. -ele sorri com tristeza. -O garoto era encrenca, mas nunca vi ninguém com tanto talento. Anos depois, foi morto e não pude fazer nada para o salvar, Oliver. -olha para as mãos, como se o sangue transbordasse delas. -Damian foi morto e todos os dias é como se não pudesse me desligar mais de nenhum deles. Fico imaginando quando vai acontecer com Dick ou Tim, prevendo como fazer para evitar.

—Somos bem parecidos. -é tudo o que consigo dizer.

Roy sempre fora um estopim fácil para me desestabilizar, imaginar qualquer coisa o acontecendo... Bom, eu o conheci tarde, não é meu filho de fato, Bruce criou esses garotos. Só posso compreendê-lo por que o sequestro do William e cada segundo que Prometheus o manteve em sua mira, passou a caracterizar minha nova definição de inferno. Um garoto que mal conhecia e já era o meu maior motivo para continuar respirando. Quer dizer, quão diferente isso pode ser do que Bruce e Selina estão passando agora?

Nós avistamos o médico andando em nossa direção, e nos levantamos no mesmo instante. -São a família da Srta. Kyle? -questiona e Bruce confirma. -Ela vai ficar bem, o corpo tentava expelir o feto, mas vai começar a reagir melhor a partir de agora. -seu rosto se torna mais sério. -No entanto, aconselho o acompanhamento psicológico necessário, perder um filho, não importa o tempo que tenham é sempre perder uma parte de nós mesmos. Sua esposa vai precisar de ajuda. -Bruce confirma novamente.

—Posso vê-la?

—Podem ficar no quarto dela, se preferirem, mas não vai acordar por enquanto. -responde indicando o quarto. -Manteremos sedada para o corpo recuperar do estresse que sofreu e para sua mente ter um descanso breve.

—Muito obrigado, Dr. -digo pois Bruce está imerso em seus próprios pensamentos. -Quer ficar sozinho com ela? -questiono quando o médico se afasta e Bruce começa a andar em direção ao quarto.

—Temos assuntos a tratar, Oliver. -responde e nossas semelhanças chegam a me assustar as vezes, posso entender por que Felicity fica louca ao me ver imerso em cada caso. -Selina está sedada, vamos cuidar disso por enquanto.

—Claro. -seguro a porta aberta e ele passa por ela, com seu corpo perdendo um pouco da tensão ao ver a mulher linda, inconsciente, mas viva sobre a cama hospitalar.

Bruce se senta ao lado dela em uma cadeira e segura sua mão. Mas ainda assim passa a me inteirar de tudo o que sabe sobre Dias e o que Selina descobriu sobre o programa avatar, e como minha irmã era um dos nomes listados nele. Conto tudo o que sei em seguida, com um desconforto que me é estranho, não parece certo que ele esteja nisso agora, mas não serei eu a dizer o que o Batman tem ou não que fazer. Parte da minha mente vaga, e começo a cogitar apresenta-lo para Barry, só para ver a reação do garoto. Seria divertido, Deus sabe que preciso de um pouco de diversão.

JASON TODD

As semanas que se seguiram foram uma espécie de intensivo, onde tudo o que fiz foi respirar e absorver o Arqueiro Verde. Passava minhas manhãs com Felicity Smoak e o garoto dos Queens, William, que poderia ensinar a Dam alguns de seus modos, só para ver se aquela peste melhora o mínimo possível. Felicity corrigia tudo o que havia falhado no treinamento do dia anterior, que ela gravava todos os dias. O garoto parecia apenas querer passar um pouco de tempo com ela, o que é compreensível considerando a vida que tem levado. Não se importava muito com nossas conversas, mas sei que é mais inteligente do que deixa transparecer. As vezes Oliver estava presente, outras não. Tudo dependia de sua agenda na prefeitura. Mas mesmo quando estava por lá, ele deixava Felicity no controle e começo a entender o papel da Sentinela no que o Arqueiro Verde é como herói, em parte é como se ela também fosse o Arqueiro, sua consciência e olhos.

À tarde, era treinado pelo restante do Time. Melhorei consideravelmente no arco e flecha, mas sinto falta das minhas pistolas. Tenho uma mira boa o que ajuda muito, mas atirar flecha requer uma certa paz de espírito e equilíbrio interior que não são exatamente minha praia. Estava prestes a explodir, quando finalmente tive sucesso. Foi estranho, todos pareciam ter alcançado um grande prêmio ao ver que estava pegando o jeito. Esses arqueiros, são bem complicados de decifrar.

Na semana seguinte passamos para o corpo a corpo. O que foi fácil a princípio. Thea é rápida e meio psicótica, mas não sou diferente, então é como imaginar o pior e antecipar os movimentos. John Diggle é um professor, não era bem uma luta ele me ensinou a me passar por Oliver, assim como Roy. Com quem tenho passado muito do meu tempo. Sua forma particular de lutar é fascinante, mas não estávamos focando em nossas técnicas, apenas as de seu mentor interessavam.

Um dia Oliver e Bruce estavam no porão ao mesmo tempo, e sugerimos em tom de brincadeira que os dois lutassem, precisei me esforçar para não rir ao perceber o quanto eles queriam isso. Foi a primeira vez que vi a real potência do Arqueiro Verde, algo que um vídeo ou o treinamento dado por seu time era incapaz de passar. Ver de perto Oliver se movendo e atacando me fez relaxar e provavelmente foi o que conquistou meu respeito. Entenda, eu tenho respirado esse cara, então sei que é bom, mas ser bom a merecer ser respeitado são duas coisas diferentes.

Por que sinceramente, se expor a esse ponto não estava ajudando a crer em sua credibilidade. E conhecer seu time deixava minha indignação ainda maior. No fim de cada dia eu me pegava pensando como ele foi idiota a ponto de colocar um alvo nas costas de todas essas pessoas? Por que cada membro de seu time parece pronto para pular na frente de uma bala por ele?

Acho que tanto Bruce quanto Oliver estavam usando aquilo para descontar as próprias frustrações. Vi Felicity se levantando de sua cadeira no mínimo duas vezes, quando os dois pareciam estar realmente dispostos a matar o outro. Eles lutaram de igual para igual, e sei que Bruce deve poder ganhar se quiser, mas o rosto de Roy me diz que ele pensa o mesmo de seu mentor. Então não podemos julgar com clareza, o fato é que aquilo merecia ser gravado. Poucas pessoas conseguem fazer o Batman parecer estar completamente imerso em uma luta, no geral ele já inicia um combate sabendo exatamente como, quando e onde ele vai terminar. Oliver tornou seus cálculos impossíveis, e qualquer um que consiga acertar uma boa sequencia de golpes na fuça do Bruce, ganha meu respeito.

Roy e eu fazemos uma partida como a deles, mas a nossa é só por diversão, o bizarro é concluir que parecemos mais controlados do que eles. E poder lutar como eu mesmo é libertador. Harper é um oponente a altura. Seus movimentos são precisos e violentos uma mistura de capoeira, boxe, artes marciais do oriente que provavelmente é a parte que pegou de Oliver, mas está tudo com a própria assinatura. Percebo o que o arco concede uma certa calma em combate e um controle maior do próprio corpo e força, o que os dá mais potência. Roy é capaz de parar o golpe mais potente no último instante, algo que dependendo da quantidade de força empregada se torna uma missão quase impossível.

—Seu garoto é bom. -escuto Oliver dizer a Bruce, quando Roy e eu fazemos uma pausa, nós sentamos no tatame enquanto bebemos água e recuperamos o fôlego.

—O seu também. -devolve o elogio. -Não parece que foi você quem o treinou. -Bruce tem um sorriso de diversão ao implicar com Oliver, como se o instinto alfa aflorasse e eles precisassem ficar puxando a liderança de tempo em tempos, metade da alegria ao se baterem deve ser creditada ao quanto devem estar querendo fazer isso desde que começaram a trabalhar juntos.

—Se o professor é bom, o aluno tem que ficar melhor. -Oliver rebate com a mesma presunção.

—Acha que isso tudo termina com uma guerra entre morcegos e arqueiros? -Roy murmura me fazendo rir.

—Jason, consegue enfrentar Oliver? -Bruce se vira para mim e mal posso acreditar. Todo meu corpo dói, mas no instante que vejo seus olhos sei que não é uma sugestão, então me forço a ficar de pé e Roy sai do tatame.

Não gasto energia falando. Oliver se aproxima e começa a desferir golpes em uma velocidade impressionante, apanho muito a princípio, mas depois começo a desviar com certa dificuldade enquanto pego seu padrão aleatório, é quase impossível o ler, mas graças a anos de um treinamento com o morcego e todas as manhãs com Felicity que tem suas sequencias gravadas em sua mente, consigo entender sua falta aparente de sentido. Mas não é contra o Capuz que ele tem que lutar, devo ser ele mesmo, me mover e agir como o verdadeiro Arqueiro Verde faria. Então vemos o progresso dessas semanas.

Começo a pôr em pratica todas as minhas aulas, as sequencias que Felicity sabe de cor. O controle que Roy me ensinou, a falta de padrão de Thea e precisão de John. Então finalmente percebemos que sou o Arqueiro, nos movemos da mesma forma, desferimos os mesmos golpes e Oliver sorri satisfeito, encerrando o treinamento ao ver que não estávamos nos atacando, mas realizando uma espécie de dança marcial sincronizada.

—Está pronto. -escuto a voz de Felicity dizer, um pouco animada demais.

—Vamos pegar o Dias. -Bruce decreta com um peso mortal em sua voz que quase me faz estremecer.