Lances da vida

Nem tudo é como queremos


SOLUÇO

Estou sendo testado. Prisão, mamãe, pai, Luane. E agora Astrid. Quando saí daquela festa ridícula da minha mãe, a última coisa que eu precisava era ficar cara a cara com a Astrid. Ela me olhou como se eu a houvesse atropelado de novo. Sem me dar nem meia oportunidade. Só falei com ela porque... porque talvez eu queria mostrar que não sou o monstro malvado que ela obviamente pensa que sou.

Ainda estou no parque feito um idiota. Olho para o velho carvalho. Em poucos meses as folhas secas darão lugar a folhas novas.

Eu me sinto uma folha velha. Eu fui embora, e no fundo uma parte de mim morreu. Eu jurei para mim mesmo que voltaria para Berk e conseguiria minha vida de volta, minha velha vida, onde tudo era fácil.

Eu me apoio no carvalho, seu tronco tão forte que nem uma escavadeira poderia derruba-lo. Como eu queria ser como uma árvore e não como uma folha insignificante. Gostaria de falar com minha mãe, com Luane, com Astrid... E ser forte o suficiente para convencê-las a pararem de agir como se o acidente tivesse mudado tudo.

Foi um acidente.

O menino está na cadeia porque esfaqueou uma menina... isso não foi um acidente. Mario por traficar drogas... isso tão pouco foi um acidente. Não que eu ache que dirigir bêbado não seja um crime, porque é. Quando me declararam culpado, eu estava pronto a enfrentar qualquer punição, sem arrependimentos.

Fui acusado pelo crime, paguei. Acabou.

Só tem um probleminha, Astrid não me perdoou.

Ela disse que eu não paguei a minha dívida com ela.

Terá algum fim esse castigo imposto sobre mim?

Não deixarei que Astrid, ou minha família tirem meu foco. Se passar um ano preso não me oprimiu, as pessoas em Berk não podem. Minha irmã vai ter que contar porque acha que ser uma esquisita é melhor do que voltar a ser quem costumava ser antes que eu fosse. Minha mãe, de algum jeito, vai ter que voltar para a realidade e parar de atuar como se vivesse em um filme. Meu pai... meu pai tem aprender a ser homem e assumir as rédeas. E Asty... ASty vai ter que assumir que o acidente foi apenas... um acidente.

Não importa o que aconteça, não vou sair de Berk. Ela que vá se acostumando comigo.

Será melhor todos eles se acostumarem comigo.

ASTRID

– Como foi a festa ontem? Minha mãe pergunta enquanto passa seu uniforme.

– Ótima.

– Sua perna está bem?

– Está, nem sequer pensei na minha perna essa manhã. É o menor dos meus problemas. Estou obcecada pelo Canadá. Ver o Soluço ontem me fez querer ainda mais sair dessa cidade. – Não recebemos nenhum pacote do programa de intercâmbio ainda? O site disse que chegaria à uma semana.

– Não vi, espero que o pacote inclua informações sobre acessibilidade. Se a perna começar a doer você terá que usar cadeira de rodas.

– Mãe, por favor. Teremos sempre que ficar discutindo os “ses”?

– Não machuca se certificar, eu não estarei lá para te ajudar.

– Vou ficar bem, mãe. Pare de se preocupar tanto.

Em um momento ela me empurra para sair e em outro age como se eu fosse incapaz.

– Quero que você vá para o Canadá, você esperou tanto por essa oportunidade. Só quero me certificar de que ficará bem. Eu te amo muito.

– Eu sei. Digo.