Kiss Kiss

Solução


A quarta-feira chegou tão rápido quanto o fim de semana passou. Os meus hematomas estavam desaparecendo aos poucos, as unhadas que ganhei já tinham casquinhas, e minhas costelas já não doíam tanto quanto antes. A divisória entre meu rosto e a parte inferior a orelha havia arranhões que já estavam melhores.

Depois daquele domingo a noite terrível, Koma voltou na manhã seguinte acabada e ainda com as marcas e sangue seco no nariz e boca. Nós nos encaramos e ela foi para seu quarto, só saindo de lá com duas malas. Eu estava atrás do balcão, com uma xícara de café, vestindo um top verde musgo que exibia meus machucados e de cabelos presos em um clichê coque que exibia as marcas de unha na lateral do rosto.

Koma me analisou com um olhar inexpressível, olhando minhas marcas. Eu encarava cada movimento seu enquanto levava minha xícara até minha boca para beber o líquido quente, sem piscar uma única vez. Uma gracinha dela para encostar um dedo em mim e o meu café iria parar em seu rosto e piorar os ferimentos que fiz nela.

— Precisa de dinheiro? – Ela questionou fria e eu terminei de bebericar o café.

— Tenho que fazer as compras do mês. – Respondi enquanto ela puxava um pequeno bolo de dinheiro do bolso e se deixou algumas notas em cima do encosto da poltrona.

— E para os seus-...?

— Ainda tenho as pomadas do último acontecimento. – Ela engoliu em seco quando interrompi seu questionamento com o meu fato.

— Volto em um mês. – Avisou indo em direção à porta, mas eu não lhe respondi. Fiquei a encarar o dinheiro e a calcular o quanto tinha ali. Exatos quatrocentos dólares.

Koma olhou em minha direção estranhando o fato de eu não me despedir nem nada. Eu continuei a olhar para o nada enquanto sentia o resto do gosto da bebida em minha boca.

De volta à quarta-feira; Eu preferi permanecer em casa até me sentir melhor, ou meus hematomas melhorarem. O que vier primeiro. Minha campainha começou a tocar freneticamente e eu fiquei nervosa, deveria ser ela de novo.

Fui pisando duro até a porta e já pronta para falar as palavras mais duras que existissem. Abri a porta de uma vez já falando.

— Toni, se você veio me ameaçar de novo eu juro que te-... – Meus olhos dobraram de tamanho quando vi quem se tratava. – Richard...?

Kor.— Ele estava com um buquê de rosas e uma caixa de chocolates em suas mãos e estava tão surpreso quanto eu. Meu namorado me olhou e ficou mais boquiaberto ainda.

Eu estava usando uma camiseta rosa bebê que deixava minhas marcas ainda a mostra. Ele olhou para o meu rosto e viu as marcas de unha. Dei passagem e ele entrou rapidamente, colocando as flores e o chocolate no balcão e se voltando para mim. Fechei a porta e caminhei alguns passos.

— Toni fez-...? – Sua voz estava baixa.

— Não. – Murmurei. – Eu e minha irmã nos desentendemos outra vez. – Eu respirei fundo e soltei de uma vez, levantando o olhar para uma das paredes com vontade de chorar. – Passamos um pouco do limite – dei de ombros – ou foi ela quem passou. Eu... Não sei ao certo.

Richard se aproximou de mim e me abraçou. Ele sabia que não era a primeira vez que havíamos discutido, mas Koma sempre aprontou e eu sempre fui machucada. Eu já estava cansada de deixar ela me ferir desse jeito e Richard devia estar tão cansado quanto, já que sempre me consolava.

E a Toni?— Ele murmurou.

Já cuidei dela, não se preocupe.— Ele riu.

Ameaçou jogar suas pantufas nela?— Ele zombou e eu ri.

Não— revirei meus olhos – disse que iria enchê-la de abraços carinhosos.— Rimos juntos.

Kory...— Ele me chamou e nós ficamos em silêncio por longos segundos. – Eu sei que é estranho, mas...

— Mas? – Me afastei cautelosamente de seu abraço.

— Meu apartamento pode ser pequeno, mas tem dois quartos. Um deles está vazio e você pode ficar lá comigo até você e a sua irmã voltarem a se falar e pedirem desculpas uma a outra.

No final das contas, a ideia não me parecia tão ruim. Eu estaria perto do meu namorado, porém mais longe da minha escola e dos meus amigos; exceto de John e Ray, estaria mais próxima deles. E o bairro de Richard era mais tranquilo que o meu.

Eu havia pedido um tempo para pensar na questão e ele concordou. Disse que o convite estaria sempre de pé para quando eu precisasse. Ele não tardou a ir embora, pois pedi para ficar sozinha. Estava mal e preferia me resolver sozinha e pensar no que faria.

Coloquei minhas flores em um vaso com água, guardei os chocolates na geladeira e peguei o dinheiro que minha irmã havia me deixado. Retirei uma parte que considerei ser o bastante e saí de casa em direção ao mercado.

No local, eu fazia minhas compras bem lentamente enquanto empurrava meu carrinho preguiçosamente. Minha cabeça martelava todos os acontecimentos e possibilidades. O que era certo. O que era errado. O que era o melhor.

Eu realmente havia decidido que morar no apartamento de meu namorado seria realmente divertido e interessante. Mas estava em duvida: eu achava isso porque apenas queria ir ou pelo fato de eu estar com problemas? Eu estava sendo cômoda com a possibilidade de ir morar com outra pessoa apenas para fugir de meus problemas? Era uma necessidade ou um capricho?

Apesar de ter decidido uma coisa, eu não havia decidido a outra. Eu realmente deveria ir? Sei que Koma havia prometido me bancar até os vinte anos, assim como o nosso irmão, mas era certo abandoná-la no nosso apartamento? Seria certo fazer o que ela fazia comigo?

Sexta-feira logo chegou e eu liguei para o meu irmão, eu queria sua opinião. Ele era sempre sincero comigo e, apesar de ser um pirralho, ele tinha noção das coisas.

— O que acha? – Questionei depois de lhe contar toda a história.

Eu juro que nunca vou entender como o relacionamento de vocês duas chegou a isto.— Ele disse perplexo. – Vocês eram tão amigas, faziam tudo juntas.

— Algo mudou. – Expliquei. – E foi ela. – Ryan suspirou.

Isso você tem razão.— Ele ficou em silêncio por alguns segundos. – Confia nesse cara?

— John e Mel confiam tanto quanto eu.

É. Eles não se enganam por ninguém e o jeito que nossa irmã está te tratando piorou muito. Não concordo com isso de jeito nenhum.— Ele suspirou. – Quais são as chances de você vir para Gotham?

— Baixíssimas.

Isso me entristece.— Ele fingiu um choro e eu pude rir.

— Eu só preciso terminar o terceiro ano, juro. Só faltam cinco meses e eu vou ir morar em Gotham com você, eu juro. – Prometi a ele. – A babá está cuidando bem de você?

Demais, vem me ver a cada meia hora.— Rimos.

— Quando eu for para aí, não vai mais precisar dela. Vou trabalhar e você vai poder concluir seus estudos tranquilamente e ir para a faculdade. – Ryan riu.

Eu sei, Kor. Estou ansioso para isso.

— Eu também maninho. Eu também. – Ele suspirou.

Minha opinião? Saia daí.— Engoli em seco.

— Tem certeza?

Claro. Koma vai entender.

— Então irei fazer isso. Obrigada maninho.

Disponha, mas vai ter um preço.— Ri.

— Qual o preço?

Quando vier morar comigo vai ter que fazer meu prato favorito três vezes na semana.— Gargalhamos.

— Feito, feito.

Na manhã seguinte eu mandei uma mensagem para o meu namorado, avisando o que havia decidido. Eu iria morar com ele, mas eu não queria atrapalhar. Richard disse que eu teria meu próprio quarto para me sentir mais confortável e que jamais iria invadir meu espaço pessoal.

O meu final de semana foi de mudanças. Nós empacotamos minhas coisas em caixas de papelão com a ajuda de meus amigos que apoiavam a mudança. Todos achavam que eu estaria melhor com o Richard do que com minha irmã.

— Eu só não fiz isso porque não queria que Kory vivesse comigo e minha mãe. – Mel admitiu para meu namorado.

— O apartamento é das minhas mães e não tem quartos disponíveis. – Michael contou.

— O meu tá cheio de malucos, não queria um lugar desses para nossa ruivinha. – John explicou.

— Meu pai some e brota do nada e seu quarto está sempre ocupado, além do meu ser pequeno. – Ray disse triste. Já havíamos pensado na possibilidade há algum tempo.

— Não se preocupem, eu vou cuidar bem dela. – Richard bagunçou meu cabelo sorrindo. – Vamos pintar o quarto dela e vocês têm o meu endereço, fiquem a vontade para ir nos visitar.

Apesar de o quarto ser pequeno, Richard e eu o pintamos de rosa bebê. Quando entravamos no quarto, víamos a cama encostada na parede à esquerda, com uma janela a sua direita e uma cômoda embaixo. Ao lado da porta um closet caseiro e um pouco a frente uma escrivaninha seguida de uma penteadeira simples posicionada na direção da cama. Todos os móveis tinham uma cor clara na madeira.

Apesar de pequeno, era aconchegante. Consegui me instalar bem. Ao lado esquerdo do quarto o banheiro e do lado o quarto de Richard. A minha direita estava à sala e na sua frente à cozinha com área de serviço.

Morar com Richard se mostrou algo bem tranquilo e confortável. Ele respeitava meu espaço e eu o seu, além de não entrarmos no quarto do outro. As refeições eram divertidas e o apartamento ganhou vida com rostos conhecidos indo nos visitar no meio da semana. Tudo estava perfeito até o momento.

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