Judith

Capítulo 12 – O grande dia (Parte 02)


Felicity Smoak

Às vezes a sensação que tenho é de que estou flutuando em uma escuridão, falta-me ar, a sensação é como se um túnel estivesse se tornando menor cada vez que tento alcançar a superfície. Parece algo abstrato demais, mas foi isso que senti assim que encontrei Oliver colocando todo o seu medo para fora. Ele agiu como se estivesse em uma dinastia, onde proteger a sua cria fosse o único propósito, mesmo que precisasse quebrar pessoas pelo caminho.

A primeira lembrança que surgiu na minha cabeça foi o dia em que o ameacei com a arma mais destrutiva de Starling City, o meu moedor de carnes! Afinal, uma mulher com saltos-alto quebrados depois de um encontro falido quer guerra com meio mundo sim. Mas é engraçado lembrar desses fatos, porque nesse dia Oliver estava com sua regata suada me tocando em um abraço repleto de implicância, ele sabe que o suor alheio era um paradigma cruel e, mesmo sabendo da minha repulsazinha, decidia me tirar do sério.

A risada ela malditamente gostosa.

O humor de sabichão era o fim da picada.

Quem poderia imaginar que hoje estaríamos juntos?

Agora estamos aqui esperando cada segundo como se fosse o último. Nos tornamos pais de uma garotinha depois de termos presenciado o quanto a dor da perda consegue ser fugaz como um projétil firme que rasga a musculatura de um corpo em movimento. O desespero de Oliver se contrasta ao meu, a única diferença é que quando o sinto deslizar para aquele túnel apertado, decido virar uma rocha para simplesmente fazer com que ele alcance a superfície. À medida que o deixei lá fora esperando por sua vez, deixei também parte do meu coração, pois somente assim iria conseguir sentir a firmeza de dizer com as minhas palavras tudo o que Judith me fez aprender ao decorrer desse tempo juntas. Aprendi dentro de um furacão como ser mulher, como ser uma possível esposa e, principalmente, como ser mãe.

E esse aprendizado ninguém arrancará de mim.

Minhas mãos estão frias, o meu depoimento é o último, Oliver ainda estará aqui para ouvi-lo, no entanto o Sr. Johnson disse que Karen e Edward decidiram depor. É claro que isso é uma jogada de Chase, ele viu como o comportamento de Oliver os entregou pontos difíceis de serem pegos de volta. O depoimento de dois avós preocupados com o futuro da neta será crucial para conseguirem a guarda, ainda mais depois de Oliver quase desenhar que eles são uns hipócritas mercenários.

— Senhoras e senhores, dou início ao retorno da audiência! O Sr. Chase irá instruir aos avós de Judith para o seguimento do processo. — Laurel volta a se sentar em sua poltrona.

Suspiro.

Karen Snow se levanta, os olhos estão avermelhados de quem forçou lágrimas de crocodilo.

— Bom dia — é um sussurro — Estou aqui não como mãe e avó, mas sim como um ser humano. Dona Laurel, irei chama-la assim, tudo bem? — Laurel apenas destina um sorriso breve. Karen meneia a cabeça dando prosseguimento — Bom... Eu nunca fui a favor do relacionamento da minha querida filha com Barry. Nada contra o rapaz. Mas não o achava aos pés da minha menina, ela tinha todas as chances nas mãos de crescer, só que as jogou pelos ares quando decidiu se casar com um simples corretor de imóveis e morar em uma casa hipotecada — a senhora limpa uma lágrima pelo rosto — Caitlin era turrona, não nos ouvia, nem tampouco perguntava nossa opinião. O casamento foi às pressas quando soube que estava grávida, ou seja, nada saiu como eu e Edward sonhamos! Mas ao decorrer desses meses de gravidez Caitlin já estava bem empregada fazendo o que sabia de melhor. Números eram a sua casa — um vento frio risca a minha espinha, agora é no meu rosto que desliza uma singela lágrima — Caitlin sempre foi contra tudo que deveria nos fazer parte também, mas vejo em Judith uma forma de pedir perdão por não ter a entendido todo esse tempo! Peço a senhora, Dona Laurel, que me dê a chance de recuperar o tempo perdido com Caitlin ao lado da minha neta. Obrigada.

Karen está chorando.

Pasmem.

Mas consegui ver um misto de verdade nas suas últimas palavras e só tem duas saídas... Ou ela está realmente arrependida pelo tempo perdido com Caitlin, ou ela é uma ótima atriz.

— Eu é quem a agradeço senhora Snow. Obrigada. — Laurel deixa as palavras ao advogado da família Snow.

— Edward, você gostaria de dizer algumas palavras? — Chase dirige a atenção ao avô de Judith.

O senhor um pouco grisalho pigarreia — Erramos. Não enxergamos a vontade da nossa filha, mas os pais erram, erram o tempo todo! A diferença é que a maioria desses pais tem tempo de correr atrás, só que esse tempo foi tirado de nós — o homem seca o suor que corre no cenho — As palavras me fogem, não sou tão bom com elas, mas deixo claro que iremos lutar até o fim pela guarda de Judith Snow Allen.

O que deram a esses dois?

Algum chá?

Camomila isso não é!

Cruzes.

Até eu estou acreditando.

— Senhor Edward, obrigada pelas palavras. — Laurel o agradece — Mas precisamos dar seguimento ao caso... Sr. Johnson, chame seu cliente! Lembrando que qualquer alteração ele será novamente expulso e proibido de depor.

— Sim Meritíssima. Sim! — ele se levanta rapidamente para buscar Oliver.

A onda de arrepios na espinha volta.

Não que eu não confie em Oliver, mas os depoimentos de Karen e Edward foram impecáveis, irreconhecíveis. Talvez pareça que eu esteja sendo pessimista, mas eles são os avós de Judith e depois de Caitlin, eles são os que tem a maioria ligação sanguínea. Isso pode nos deixar comendo poeira.

Oliver retirou o terno que escolhei para ele, os botões estão um pouco abertos, as mangas dobradas até o antebraço, moda alá Oliver Queen. Se Barry estivesse aqui, com certeza não deixaria que Oliver amassasse o tecido macio dessa caminha, ele tinha total cuidado com esses pequenos detalhes! Mas o olhando assim, consigo vê-lo melhor, enxergar realmente o homem que tenho ao meu lado.

Ele volta a se sentar ao meu lado, os olhos em um azul cristalino rodeados pelo inchado de um choro sem vergonha. Oliver me olha destinando um sorriso amarelo seguido de um suspiro prolongado. As mãos estão agarradas uma a outra com os dedos entrelaçados. Por mais que dê a entender como um sinal de nervosismo, consigo sentir a paz que ele me passa somente ao sentir o ritmo da sua respiração.

— Podemos iniciar? — Laurel pergunta.

— Sim... — Oliver balbucia — É difícil estar aqui. Há alguns anos se alguém me contasse que estaria sentado em uma mesa diante de tantas pessoas importantes, eu não acreditaria. Não iria acreditar pelo simples fato de não reconhecer o homem que me tornei em um período de tempo tão curto — sua voz quebra quando se vê envolvido em um silêncio — Barry seria a única pessoa que acreditaria caso o contassem — ele sorri brevemente — Porque ele acreditava mais em mim do que eu mesmo, em tudo, em todas as loucuras estúpidas! Assim que soube que Caitlin havia engolido uma melancia, olhei para ela assustado e gritei “Você está louca? Não quero nem imaginar como isso vai sair de dentro de você!”, Felicity bufou e revirou os olhos — agora Oliver ri. Mas é verdade. Eu queria dar uns tapas nele quando resolveu dizer essa asneira na frente de todo mundo justamente no dia em que Caitlin e Barry iriam nos convidar para sermos padrinhos da nossa princesa — O meu amigo apenas riu e em seguida me chamou para ser padrinho da pequena. Padrinho? Eu? Logo eu? Fiquei sem respostas por exatamente dois minutos. Mas Felicity me assustou com sua histeria — ele ri novamente quando me encontra ruborizada. É, eu fiquei histérica. — O que estou querendo dizer é que quando peguei Judith nos braços pela primeira vez, minha concepção de mundo mudou completamente! Porque agora eu havia segurado um pedacinho da minha nova vida que começou a ser construída naquele momento — Oliver suspira — Os meus melhores amigos se foram tão cedo... Queria ter dito que os amava mais vezes, mas digo a Judith todos os dias até o momento em que ela se estressa e sai de perto de mim. Nunca iria imaginar que uma criança tão pequenininha, depois de ter saído de dentro de uma melancia, se tornaria um dos motivos de querer ser um cara melhor a cada dia que passa. Aprendo cotidianamente a ser um pai melhor, porque honrarei até o fim a promessa que fiz a Barry e a Cailtin, ser o melhor pai do mundo, junto da melhor mãe do mundo — ele volta a sorrir para mim. É, acho que já derreti. — Me desculpem se às vezes saio dos trilhos, é como os disse, sou um homem determinado a aprender todos os dias. Obrigado por terem acreditado em mim quando eu pensei em desistir!

Ouço palmas.

Vêm da plateia.

É Robert aos prantos, orgulhoso.

Own meu amor... — sussurro para que apenas Oliver ouça.

Laurel está em silêncio.

— Meritíssima! — Chase se incomoda.

— Obrigada pelas suas palavras Senhor Queen. — Laurel, pela primeira vez, anota algumas palavras em seu bloco. Não sei se me assusto com isso ou se me assusto com isso. É, não tem saída. Ela continua — Por último, mas não menos importante, finalizaremos os discursos com a Senhorita Smoak!

Meus dedos dos pés estão congelados.

As batidas do meu coração estão como uma escola de samba.

— Olá. — aperto minhas mãos uma na outra — Sempre fui uma mulher de negócios, como Caitlin, os números se tornaram o meu abrigo. Tanto que em um momento da vida esqueci de cuidar de mim, de encontrar com amigos, de conhecer novas pessoas e até mesmo ver minha mãe nos finais de semana! Só existia a Smoak Technologies na frente. Nada ao redor conseguia desviar minha atenção — mordo o lábio inferior por um momento — Foi quando Caitlin contou sobre estar grávida, no primeiro instante fiquei assustada, pois éramos tão amigas e eu nem percebi que tudo estava acontecendo! A chance de me tornar madrinha de Judith me fez desacelerar, acompanhei Caitlin em todos os pré-natais, encontrei tempo para fazer programas de madrinha. Como o quartinho de bebê iria ser, a cor, as roupinhas, tudo. E, claro, Barry e Oliver eram nossos escravos! Só Deus sabe quantas vezes os fizemos trocar a posição dos móveis até que encontrássemos a perfeita! — rio brevemente. A sensação de voltar ao passado é gostosa — No dia em que nossos amigos partiram, não entendi o porquê de terem feito isso com a gente. Mas quem disse que temos o poder de entender todas as coisas? Só que hoje consigo ver com outros olhos Caitlin e Barry terem nos escolhidos para serem os pais de Judith, porque só assim iríamos conseguir crescer. Desabrochar — minha mão escorrega até encontrar as frias de Oliver — Encontrei dentro de um caos o caminho para ser uma boa mãe ao lado de um ótimo pai. Eu os amo com toda a minha força! E não exista outro lugar que eu queira ficar se não for dentro do nosso amor.

Suspiro finalizando.

Várias lágrimas escorreram sem eu ao menos perceber.

Te amo. — leio os lábios de Oliver.

Chase ri.

Ironicamente.

— Algo engraçado, Sr, Chase? — Laurel o pergunta.

— Meritíssima, a senhora não irá comprar esses depoimentos, não é?

— O senhor está tentando me persuadir?

Chase arregala os olhos.

— É claro que não, só acredito que esse momento não é para declarações de amor quando o assunto em questão é a guarda da menina Judith! — Adrian Chase está vermelho feito um tomate.

Será que o esperto advogado sentiu que pode estar em desvantagem?

Ops.

— O senhor tocou em uma ótima palavra. Amor. — Laurel sorri para nós — Vi amor aqui dentro e fico imensamente feliz por saber que independente da conclusão da guarda, Judith estará em ótimas mãos! — a juíza reúne os papéis — Peço que todos esperem lá fora, preciso de alguns minutos para imprimir os papéis com a decisão para os responsáveis assinarem.

Nós concordamos com a cabeça.

— Mas meritíssima! — Chase parece uma criança mimada.

— Terminamos por aqui.

A loira com saltos-alto impecáveis de um nude lindo se levanta da poltrona seguindo dois agentes da polícia de Starling City. Parece que dentro daquela sala ficou parte de nós, da nossa ansiedade, do nosso imediatismo e da nossa euforia em saber qual foi a decisão de Laurel.

Thea me abraça. — Você foi incrível!

— Seu irmão me deixou inspirada — dou um beijo singelo no ombro de Oliver que permanece quieto.

— Qual é Ollie, cadê a esperança? — Thea o aperta.

— Só estou com medo... — o durão meneia a cabeça.

— Por incrível que pareça, prefiro a versão de quando quis arrancar minha cabeça quando descobriu que Thea e eu iriamos nos casar! — Roy murmura.

— Não queira isso!

Thea e eu falamos ao mesmo tempo.

Podem acreditar, essa não é uma boa versão.

— Meu filho... — Robert abraça Oliver por um bom tempo — Sua mãe estaria orgulhosa!

Oliver apenas sorri.

— Bebeeeeeê! — pelo tom de voz, eu poderia estar em Marte que reconheceria minha mãe.

— Mamãe... — murmuro.

— Você foi tão fofa! — ela me agarra pelos braços com aquele aperto de urso. Essa é Donna Smoak.

— Obrigada? — pergunto entre os afagos.

— Agora vem cá meu filho! — Donna puxa Oliver pelos braços dando um aperto ainda maior.

Filho?

Ah não...

— A madrasta mais gostosa que eu poderia ter! — ele sorri dentro do abraço.

— Oliver! — Robert o reprime.

Por que eu não esperaria outro comentário?

Céus.

— Maninho... — Thea faz cara de eca.

— Senhores! — um dos agentes abre a porta, Laurel tem papéis nas mãos — Peço silêncio até que a meritíssima possa concluir o seu veredito.

Os nossos advogados estão próximos a Laurel.

— Tentarei ser breve! — Laurel retira uma caneta de dentro do bolso, ela é dourada — Os depoimentos foram enriquecedores e ponto chave para que eu pudesse chegar a uma conclusão! — ela meneia a cabeça — Não tenho dúvidas de que com que a menina for ficar será um lar feliz, mas precisamos dar fim a essa audiência. Há uns meses checamos que a menina foi deixada em uma Supermercado, o que fez com que a audiência fosse mais cedo do que o esperado! — caramba. Como eu poderia ter me esquecido desse grande detalhe? Estamos ferrados! — Averiguei a ficha corrida de vocês e, bom, o Sr. Queen já teve passagens pela polícia — Laurel segura a risada — Mas o tribunal de Starling City por muito tempo foi muito rígido, com os olhos vendados, porém decidi chegar aqui para mudar os caminhos. Direcioná-los para o caminho do amor! Caitlin e Barry Allen decidiram desde o início confiar nos melhores amigos Oliver e Felicity... Isso me fez ser um pouco mais rebuscada no momento de interpretar as palavras dos dois e, eu não posso negar que, não há outro lugar mais confiável que ao lado de vocês dois!

— Como é que é? — Chase grita.

Laurel o ignora.

— Diante de todos vocês, digo que a guarda de Judith Snow Allen está sob os cuidados de Oliver Queen e Felicity Smoak, sendo os finais de semanas intercalados destinados aos avós, de forma com que a família entre em um acordo pessoal para melhor organizar a possibilidade. — Laurel sorri.

— É injusto! — Edward se enfurece.

Cadê o vovô bonzinho?

— Eu não estou me sentindo bem... — Karen finge um mau estar. Típico.

— Os documentos precisam ser assinados para o reconhecimento de firma pelas autoridades de Starling City. — Laurel entrega os papéis nas mãos do nosso advogado.

— Isso não vai ficar assim, não vai! — Adrian Chase está rasgando a calcinha. Perfeito.

— Peço que mantenham a calma. Qualquer dúvida estarei disponível. — há um sorrisinho de Laurel.

Enquanto observamos os avós de Judith sendo levados para o lado de fora, mantemos as emoções por respeito. Mas aposto que Oliver quer dar um chute na bunda de Chase.

Eles se retiram.

Minha mãe grita à medida que agarra Robert. Os dois dão pulinhos.

— Como eu queria dar um chute na bunda desse cara! — Oliver resmunga entre uma risada.

— Eu não sei o porquê, mas sabia que iria dizer isso!

Nós caímos numa risada divertida.

O abraço tão forte.

Meu rosto descansa no espaço do seu pescoço cheiroso.

— Meu amor... — Oliver apenas sussurra.

— Eu te disse que não perderíamos a nossa menina, não é?

— Obrigado por acreditar. — os braços de Oliver estão agarrando minha cintura como se fosse a última vez. Ele costuma fazer isso sempre que me abraça. É único.

— Você é o melhor pai. — volto a sussurrar.

— Aprendi isso com o meu pai. Se eu for metade do que ele foi para mim, serei o melhor!

— Você ainda tem dúvidas?

Hummmm... — Oliver brinca.

— Acho que alguém estava com saudades... — Thea entra na pequena sala com Judith nos braços — Os agentes do conselho tutelar não queriam deixar eu pega-la, mas estar grávida me dá certa preferência — Thea dá uma piscadela.

— Estou frito. — Roy murmura.

— Minha princesa! — meu coração se enche de amor.

Mãmã! Mãmã! — Judith abre os bracinhos e junto vem o beicinho.

É isso mesmo que vocês ouviram.

Judith passou a me chamar de mamãe esses últimos tempos, foi o dia mais marcante da minha vida. Mas desde que ela começou a me reconhecer como sua mãe, todos os dias que a ouço é como se fosse a primeira vez.

— Vem cá, vem! — a pego nos braços.

— Minha pequena... — Oliver abre mais seus braços para incluir Judith. Ele faz um beijinho de esquimó na pequena que sorri e acaricia a barba por fazer do grandão.

Mãmã... — a pequena volta a chamar.

— Eu amo vocês. Amo mais do que consigo carregar... — Oliver suspira profundamente.

— Quando eu pensar em esquecer, você vai me lembrar? — meus olhos se quebram em tamanha felicidade.

— Mais do que consigo carregar.

Ele repete.

Apenas para que eu não esqueça.