Judith

Capítulo 10 — "Porque eu já sabia. Eu sempre soube"


Um mês depois...

Felicity Smoak

A água está morna e confortável dentro da banheira, o sol lá fora me diz que iremos ser cortejados com uma bela manhã. Os raios solares escapam pelas janelas rodeadas por tulipas claras que Oliver anda plantando no jardim, elas são cheirosas e sempre convidam passarinhos para a nossa casa, eles se alimentam de um pouco de água e depois vão embora. Hoje é segunda-feira, eu deveria estar de cabelos em pé na Smoak Technologies, mas Oliver e Judith andam me fazendo repensar sobre dias estressantes.

A porta range avisando que alguém está entrando, levantando um pouco a cabeça consigo ver de longe Oliver com o seu melhor sorriso. Desde que decidimos libertar nossos próprios sentimentos não conseguimos ficar longe um do outro por muito tempo, eu sei, é vergonhoso. Então nossas noites se resumem a fazer algo juntos sempre que ele consegue um tempinho livre da Sony Music, confesso que tenho vontade de mandar uma tal de Susan Williams para lugares bem feios quando aquele tom de voz insuportável pelo telefone decide nos atrapalhar.

Mas tirando esses poucos momentos em que somos interrompidos conseguimos nos divertir na maior parte do tempo. Oliver faz com que os dias sejam mais leves, eu quase não vejo as horas correrem no relógio e também tem as nossas histórias com Judith que está crescendo centímetros a cada dia que passa, agradeço por poder compartilhar cada novidade que ela nos dá. Estar em casa sem ter que carregar o peso da empresa me faz lembrar o quanto eu sentia falta de um lar, porque agora no cair da noite recebo mãos suaves massageando meus pés enquanto assisto Judith brincar no tapete da sala, às vezes, quando pego no sono ao acordar me dou conta de que já estou na cama com Judith abraçada no torço de Oliver que falta babar durante um sono pesado.

Estranhamente me sinto viva.

— O relógio me diz que a essa hora você deveria estar na Smoak Technologies. — a voz de Oliver ainda é sonolenta, ele está vestindo a minha roupa preferida de dormir, uma regata branca com àquela calça de moletom que o deixa irresistível.

— Tirei uns dias de férias.

— As palavras férias e Felicity Smoak na mesma frase?

Nós dois rimos.

Assim que levantamos a Smoak Technologies não lembro a última vez que decidi tirar alguns dias de férias, não que eu vá me afastar totalmente, mas eu consigo resolver algumas coisinhas pelo escritório daqui de casa já que Curtis está tomando conta dos negócios. Essa sensação ao mesmo tempo que é estranha também é muito gostosa porque nada pagaria os olhos transparentes de Oliver que me derretem sempre que decido encará-los. Agora ele está de joelhos apoiado na beirada da banheira me observando com delicadeza só que minhas mãos nervosas quebram a pequena distância quando o traz para mais perto através da gola da regata.

— Não gostou da surpresa? — sussurro com meus olhos fechados apreciando o cheiro bom de Oliver que se mistura ao meu. Os nossos narizes brincam de beijinho de esquimó antes dele encostar a boca de lábios macios novamente na minha com um beijo singelo seguido de um suspiro intenso que sempre faz.

— Por que não me disse nada? Eu poderia falar com a Susan, arranjar um tempinho livre...

— Susan Williams?

— Não me venha com essa ruguinha entre as sobrancelhas.

— Não estou com nenhuma ruguinha.

Dou de ombros.

Mas é claro que estou com àquelas ruguinhas, antes que minha própria consciência me julgue eu tenho os meus motivos. Susan Williams é terrivelmente insuportável, no entanto eu cometi o maior dos crimes quando decidi buscar no Google quem era a dita cuja. Óbvio que me surpreendi com a sua beleza, ela parece ser um pouco mais alta, tem cabelos castanhos que ultrpassam os ombros e uma cintura de deixar qualquer homem com o queixo no chão. Não que eu seja insegura, não sou, nem um pouquinho, mas quando o seu homem está com uma mulher dessas pelo menos três dias na semana a pulguinha atrás das orelhas começa a incomodar.

— Vem cá, amor. Pare com isso. — Oliver molha os braços quando me puxa para mais perto, as mãos que também estão quentes abraçam as minhas costas e a sua boca descança no acesso do meu pescoço me fazendo arrepiar. Não pelo seu toque, mas é que quando ele me chama de amor um gosto estranho sobe pela minha boca, não é algo amargo ou ruim, eu não consigo dizer com palavras com o que se parece. Outra sensação tão estranha quanto o gosto na boca é quando o meu estômago se fecha e lá dentro parece que existem borboletas se chocando uma nas outras. Acredito que a paixão é como um desses vírus que se disseminam pelo ar e atacam as pessoas deixando elas em um estado deplorável.

— Você joga sujo.

— Por quê?

— Porque sabe que derreto todas as vezes que me chama de amor. — dou de ombros.

Oliver espreme os olhos segurando uma risada, não é sempre que confesso essas coisas de menininha boba apaixonada, então sempre que decido deixar escancarado o quanto estou pisando em ovos é um bom motivo para que o engraçadinho faça essa cara de quem vai usar todas as minhas palavras contra mim em um tribunal. Ele se levanta arrancando a regata branca e em poucos segundos seu corpo aquecido entra na banheiro junto comigo colando o abdomên definido por detrás das minhas costas. Ele afasta os fios que fiaram soltos do coque que fiz e cola os lábios ali sugando as gotas d’água. O arrepio é certeiro.

— Amor.

Oliver sussurra.

Droga de sussurro. Literalmente é uma droga.

— Não tente mudar de assunto. — minha voz sai entrecortada.

— Você quer que eu pare?

A boca continua passeando pela minha nuca até alcançar o lóbulo da orelha que é mordiscado, novamente um arrepio capaz de levantar cada pêlo do meu corpo escapa. Os meus olhos comprimem por leves segundos deixando com que a minha cabeça caia para o lado direito descansando sobre o ombro. Ouço a risada baixa de Oliver no pé do meu ouvido onde sua boca está estacionada, as mordidas continuam pela cartilagem dando fim as provocações com um beijo na bochecha, é assim que consegue fazer com que eu perca o racicínio lógico.

Meneio a cabeça negando a sua pergunta.

O meu corpo nu é girado dentro da água morna pelos braços fortes de Oliver, deixando com que meus seios túrgidos encostem seu peito duro. Nós dois sorrimos quando de forma mágica voltamos a nos encontrar, a barba por fazer tem gotículas presas e a vontade de me afogar nelas me faz lambê-lo com lentidão finalizando com mordiscadas que seguem o caminho perfeito da linha do seu maxilar chegando à pele do pescoço e Oliver o inclina para o lado para sentir melhor as pontas afiadas dos meus dentes roçarem por ali, aliviando a ardência com o posseio que minha língua faz.

As mãos dele posicionam o meu rosto resgantando nossos olhares interligados, o polegar acaricia a minha bochecha que queima, os lábios voltam a tocá-la com um singelo beijo que vai escorregando pelos meus lábios os abrindo com calma, a língua vem acompanhada com o seu hálito gostoso, nós dois brincamos um com o outro quando o beijo se intensifica, mas a velocidade é gentil como um cartão postal com palavras cheias de saudade. Não há pressa, porque Oliver parece querer degustar cada pequeno centímetro da minha boca que o recebe no mesmo ritmo, as posições opostas, a sincronia fazendo com que eu o segure pela nuca acariciando os cabelos curtos que ainda não tiveram contato com a água.

— Eu preciso me preocupar? — a minha voz é um pouco ofegante após o beijo.

— Com o quê?

— Susan Williams.

— Felicity...

— Vocês já tiveram alguma coisa?

Não que eu esteja muito interessada no passado obscuro de Oliver, porque se isso realmente fosse importante eu teria entrado em depressão, não é mentira para ninguém que Oliver já deve ter dormido com a metade das mulheres de Starling City. Tudo bem, isso me irrita um pouquinho, se eu pensar na porcentagem que isso me daria, aí sim eu ficaria bastante puta. De novo, eu vou repetir, não é que eu esteja muito preocupada, mas é que hoje à noite é a estréia do musical em que Oliver demorou quase um mês para montar e a Susan vai estar lá com o seu ar arrogante desfilando de um lado para o outro e, assim, preciso estar preparada caso tenha que colocar a vadia no lugar dela.

— Isso é importante? — Oliver me olha com aqueles olhões.

— É.

Mais um pouco eu cruzaria meus braços e levantaria minha sobrancelha esquerda de forma debochada como uma líder de torcida que encosta o capitão de basebol pegador contra a parede até arrancar sua própria alma. Não acho engraçado essa situação, mas digamos que como mulher preciso lutar com as mesmas armas caso Susan Williams queira mostrar suas garras e não vou mentir que quando ouço a voz irritante pelo telefone uma sensação desconfortável me diz que ela pode me dar trabalho.

Oliver engole a seco.

— Nunca tive nada com a Susan além do trabalho...

Espremo os olhos. — Por que parece que você está mentindo?

— Não estou mentindo, Susan nunca fez o meu tipo.

— Susan faz o tipo de qualquer homem, Oliver.

— Mas não o meu e você sabe por quê?

— Porque os meus olhos azuis te deixam louco? — minha voz soa terrivelmente sensual.

— Acertou na mosca, Felicity Smoak.

Os lábios voltam a me acertar dentre um sorriso rápido à medida em que minhas pernas garantem agarrá-lo pelo torso, a água transborda quando faz pressão contra o meu corpo me deixando sentí-lo. É quente como cada sensação grita por nossas entranhas quando decidimos nos tocar, o beijo se torna mais veloz assim como os movimentos que fazemos até conseguirmos voltar a nos sentir como acontece quase todas as manhãs quando nos alimentamos um do outro.

~~~

Oliver Queen

— Isso! — grito ao acertar uma cesta de três pontos.

— Qual é, isso foi falta! — Dean reclama ao se levantar com cuidado.

— Vai chorar como um meninho que arranhou os joelhos? — implico lançando a bola de basquete para que ele agarre . O dia aqui fora realmente é incrível, desde que eu e Felicity decidimos encarar a antiga casa dos nossos melhores amigos como nossa, alguns pontos ganharam um toque especial, o jardim é um dos melhores exemplos. Colocamos uma cesta de basquete nos fundos, cadeiras de madeiras nas beiradas e um chuveirão quando o calor decide atacar. Felicity está sentada em uma delas ao lado de Camila, isso mesmo, aquela que quase acertou um funko da mulher maravilha no meu rostinho de bebê, ela é uma menina legal e bastante inteligente ainda não sei como aguenta Dean, mas parece que os dois estão tendo alguma coisa séria.

— Vai se ferrar. — Dean toma a bola e eu corro atrás dele o marcando como um cão farejador — Então hoje é o grande dia?

Roubo a bola de Dean.

— Acredita que ainda não caiu a ficha? — arremeço a bola em direção a cesta, mas erro e Dean a agarra marcando dois pontos.

— A que diz que você está se tornando um homenzinho?

Dean continua me marcando com os braços no alto dificultando que eu consiga arremessar a bola, mas giro no sentido anti-horário o deixando comendo poeira e, novamente, acerto uma cesta de três pontos. A adrenalina me faz gritar, Felicity do outro lado do jardim acena para mim junto de Judith e eu faço coraçõezinhos de volta em comemoração.

— Um homem de família?

— Quase isso! — Dean ri.

— Hoje Felicity me perguntou sobre Susan. — deixo a bola de basquete de lado indo buscar no cooler uma cerveja estupidamente gelada. Meu corpo continua elétrico pela correria, a camiseta molhada pelo suor está colando em cada músculo e o ar puro sendo sugado pelas minhas narinas.

— E o que ela achou de você quase ter transado com a sua chefe? — Dean abre uma cerveja.

— Cara, fala baixo! — sussurro.

O bastardo arregala os olhos.

— Você falou com ela, ?

— Claro que não!

— Como não?

Suspiro.

— O que você queria que eu dissesse? Algo do tipo: Sim, minha querida, Susan quase me pagou um boquete no dia em que fui um irresponsável deixando a Judith com o otário do meu melhor amigo.

— Não precisava ser tão direto assim.

— Felicity não suporta a Susan, se eu falasse que já tivemos nossos momentos a minha vida se tornaria um inferno!

— Você só prolongou o inferno, porque quando Felicity descobrir aí sim você vai se tornar um grande fudido.

Antes que as pedras comecem a ser jogadas na minha direção, preciso me defender mesmo que pareça que estou sendo um grande cuzão. Esconder o que tive com Susan não é como se eu estivesse escondendo a cena do crime, mas o que estou vivendo com Felicity todos os dias é a melhor coisa que já me acontenceu. Ela é a melhor parte de mim com toda certeza do universo, esses últimos dias seriam agonizantes se eu não tivesse ao meu lado toda a força que Felicity me passou, não há palavras que consigam justificar o quanto a amo. Isso é outro ponto, ainda não dizemos as palavrinhas mágicas, não que isso seja um problema, porque o nosso ponto é exatamente esse, a gente não precisa de palavras quando nossos próprios corpos gritam tanto sentimento.

Quando fui obrigado a ficar dias em Central City passando todas as músicas, dirigindo os personagens para que nada pudesse dar errado no dia da estréia, a ligação dela para me dar boa noite era o que salvava o final do meu dia. Nos momentos em que quase explodia com a voz de Susan me cercando por todos os lados o que me acalmava era o sorriso estampado no rosto de Felicity com Judith no fundo de parede do meu celular.

Felicity é a chave para os meus dias melhores, falar sobre Susan só complicaria as coisas. Amanhã, depois que o caos da estréia acabar e Susan deixar de ser a responsável pelo meu trabalho vou me certificar de contar tudo a Felicity, mas por enquanto a paz precisa ser mantida. Aliás, Felicity é auto-suficiente demais para se deixar levar por uma coisa que aconteceu no passado, quando me deixei levar pelas investidas de Susan nós dois ainda nem sonhávamos em ficar juntos, ela não vai se importar assim como não se importou com Camila, as duas até se dão bem quando Dean decide me visitar.

— Eu sei lidar com a Felicity, ok?

— Não cara, você não sabe. — Dean dá de ombros.

— Você me ajudando muito colocando um monte de besteiras na minha cabeça justamente no dia da estréia de um dos projetos mais importantes da minha carreira. — bufo.

— Se tudo der errado o sofá lá de casa está vago. — ele brinca.

— Não enche!

~~~

As horas voaram e a ansiedade só aumentou desde que percebi o tempo apostando corrida com a minha euforia. Felicity está se olhando no espelho, ela me chamou para ajudar com o zíper traseiro do vestido que é encantador de um dourado cheio de lantejolas do mesmo tom que contrasta com a cor bronzeada da sua pele macia. Os cabelos estão presos em um coque deixando o pescoço completamente nu.

— Acabo de encontrar a mulher mais linda. — sussurro ao pé do ouvido de Felicity à medida em que subo lentamente o zíper do vestido. A vontade de descê-lo a deixando semi-nua grita das minhas entranhas, mas o bom senso me faz entender que nos atrasaríamos. O reflexo do espelho mostra o sorriso aberto dela ao ouvir o meu comentário, a boca com o batom em um avermelhado sangue deixa os dentes alinhados ainda mais evidentes, os olhos azuis em uma transparência magnífica também estão sorrindo constatando o que acabei de dizer, Felicity é a mulher mais linda que já vi.

— Você é suspeito... — a sua voz sai em sussurro tentador.

— Eu tenho algo para você.

— Para mim?

Estamos conversando através do reflexo do espelho.

Minhas mãos escorregam para a parte interna do blazer em um preto fosco que combina com todo o restante, o total black para os homens foi um dos pedidos no convite da festa de gala que abrirá a estréia do musical. As minhas mãos tremem quando pego uma caixinha de veludo negra, aqui dentro está um cordão que mamãe costumava usar em noites especiais o mesmo é coberto por brilhantes tímidos que dão um ar sofisticado. Eu o tenho desde que ela se foi, Thea não quis ficar com nada que lembrasse mamãe e, então, decidi guardá-lo no fundo da minha gaveta de camisas esperando um pingo de coragem para voltar a mexer nele um dia. Hoje é um dia especial, o dia em que me sinto pela primeira vez um cara que chegou a algum lugar com as prórpias pernas sem precisar estar atrás da sombra de alguém e, bom, eu tenho Felicity e Judith comigo.

— Ficará lindo em você. — movimentos calmos me fazem deixar a caixinha de veludo sobre a estante ao lado. As mãos tremem vergonhasamente quando o acerto ao redor do pescoço de Felicity que mantém um olhar curioso até que eu prenda a jóia atrás da sua nuca. Lá estão os brilhantes brincando com a pele clara e suave de Felicity que ergue uma das mãos para alcançar o pingente, a sua cabeça inclina para um dos lados ainda em confusão.

— Oliver... É lindo!

— Mamãe costumava usar em noites especiais.

O olhar de Felicity se quebra momentaneamente.

— Moira? — a sua garganta engole a seco — Oliver, eu não posso...

— Por que não?

— Porque é uma jóia de família, essas coisas são importantes!

— Você é importante.

O corpo de Felicity gira dentro dos meus braços que permanecem a segurando, os olhos azuis estão profundos e cheios de algo que me parecem lágrimas. O sentimento que sinto quando vejo mais perto o pingente de brilhantes que era usado por mamãe atinge o meu emocional como uma porrada na boca do estômago, porque não é uma coisa que estou acostumado a fazer. Não é algo que um dia pensei querer fazer.

— É pesado demais. — um novo sussurro.

— Como assim?

— Parece que estou carregando um pedaço da sua família — as unhas de Felicity deixam o pingente e agarram as pontas do meu blazer nos deixando mais próximos — Não sei se mereço.

— É claro que merece.

— De onde vem tanta certeza?

Sorrio quando encosto nossas testas, o cheiro do perfume suave se torna mais presente, é maravilhoso. Meus braços amarram a sua cintura dando fim aos poucos centímetros que nos separavam, por certos segundos meus olhos se fecham trazendo lembranças de bons momentos que passei junto dos meus pais e de Thea. Mas ao abrir os olhos encontro os de Felicity que continuam alertas e ela sorri, novamente volto a me perguntar por onde andei que não esbarrei com Felicity antes, por que tantas implicâncias que nos deixavam longe? Não há outro lugar melhor para estar do que dentro do seu abraço, do seu sorriso e íris azuis expressivas.

Eu a amo.

— Não sei — a seguro com o polegar pelo maxilar fino — Existem coisas das quais não tem explicação.

Felicity volta a sorrir, mas ainda enxergo uma ruguinha.

— Mas e Thea?

— Thea?

— É difícil para ela.

A morte da nossa mãe foi mais dura para Thea, ela demorou muito tempo para aceitar, na verdade, ainda não sabemos se aceitou. Já faz anos que Moira se foi e até então Thea não toca no assunto, nada que nos faça ter que falar do dia em que as nossas vidas mudaram completamente.

— Thea vai ficar feliz em ver que é você que está usando.

— Não quero ser a responsável por trazer tantas lembranças de uma vez só.

— Minha mãe era bem sincera com as garotas — rio baixo — Se ela estivesse aqui iria dizer: Menina, o que está fazendo com o meu filho? Eu o amo, mas esse rapaz não merece mulheres como você.

Felicity também ri.

Ela espreme os olhos. — Sabe o que eu a diria?

— É impróprio para menos de dezoito anos?

— Crianças, tampem os ouvidos — Felicity ainda está rindo baixo, a boca com lábios gostosos encosta o lóbulo da minha orelha — Eu a diria que ninguém me faz feliz como você está fazendo.

As batidas do meu coração aceleram.

Vou ter um infarto.

Fuminante.

Eu...

O bip do relógio começa a soar.

É sério isso?

Logo agora?

— Estamos atrasados!

— Mas é só um instante. — a seguro mais forte.

— Depois da sua estreia teremos todo tempo do mundo.

Os lábios encostam rapidamente nos meus em um beijo singelo rico em quero mais, mas os seus braços nos desfazem delizando até os dedos das minhas mãos que são entrelaçados. Eu resmungo comprimindo os olhos como uma criança mimada, mas Felicity está me puxando para fora do quarto onde nossos pais esperam lá embaixo junto de Judith.

— E se eu não tiver coragem?

— Coragem? — Felicity para de imediato, as sobrancelhas levantam em confusão.

É, coragem de falar finalmente as palavrinhas mágicas!

Essa é a minha consciência.

— Deixa pra lá. — dou de ombros.

— Tem certeza?

— Absoluta.

~~~

Judith está fazendo o maior sucesso da inauguração com a fantasia de Pequena Sereia que escolheu e eu sou o maior babão acompanhando os passos curiosos que faz pelo salão. Várias pessoas já me abordaram para fotos e pequenas entrevistas, nunca pensei que um diretor musical tivesse tanto espaço assim, é estranho tirar fotos com pessoas desconhecidas que estão aqui só para prestigiar o seu trabalho, mas ao mesmo tempo a sensação de fazer algo dessa proporção é muito gostosa. Felicity e nossos pais estão próximos ao bar para onde estou seguindo com Judith que continua dando passinhos empenhados.

Só que uma trombada nos assusta.

— Então é essa a garotinha que está sendo a atração da noite? — Susan está com àquela voz rouca, a língua risca na borda da taça de cristal quando ingere o líquido borbulhante. O cheiro almiscarado forte do seu perfume corre pelas minhas narinas, o vestido em tom salmão brinca com a silhueta caindo sobre as pernas definidas. Ela está preparada para arrancar um pedaço de mim a qualquer momento.

— Judith? — pego a garotinha nos braços, é notório o orgulho que sinto quando os cabelos de um liso ruivo roçam pela minha barba por fazer e aqueles olhos azuis escuros piscam para mim seguido de um sorriso iluminado. Essa sem dúvidas é a minha garota.

— Exatamente! — a piscadela de Susan me deixa sem graça.

— Judith é incrível.

— Você tem planos para mais tarde?

A mão de Susan descansa no meu antebraço.

Os olhões castanhos estão quase me engolindo.

— Susan, você sabe que...

— É só um novo trabalho. Oliver... Eu não vou arrancar pedaços de você — de novo a língua roça o lábio inferior — A não ser que você peça!

Engulo a seco.

— Seria uma reunião?

— Depois da estreia do musical estaremos esperando você no escritório.

— Os investidores da Sony Music estão de acordo?

— Mais do que de acordo!

— Vai ser rápido?

— Só vai depender de você.

Um arrepio corre pela espinha.

O pigarreio chega junto quando Felicity se faz presente e o cheiro das faíscas começam a tomar conta do pequeno espaço. A loira e a morena se olham por breves segundos que na minha cabeça parecem intermináveis, quando a mão de Susan estende para um cumprimento a explosão se prepara, uma gota de suor frio escorre e a combustão vem assim que Felicity cede ao cumprimento com o sorriso falso conhecido.

Não há nada de bandeira branca.

— Felicity Smoak, não é? — Susan não perde a oportunidade de usar o sarcásmo, ela não sabe com quem está lidando. O olhar da morena é curioso e passeia por cada extensão de Felicity que, por incrível que pareça, não devolve a implicância. Ela está ocupada demais falando com Judith que resmunga um pouco, a pequena deve estar faminta, afinal eu tenho nos meus braços uma réplica do buraco negro.

— Sim. — Felicity a responde sem dar muita atenção.

— Oliver fala muito de você!

— Ah é? Porque ele não me fala nada sobre você. — a loira dá de ombros.

— Meninas...

Tento amenizar.

Mas a tentativa é falha.

— Não? — Susan entreabre a boca com um ar de supresa, o olhar intrigante corta os meus que me fazem abaixar a cabeça rapidamente para não encontrá-los. Agora está na cara que Susan descobriu que não falei sobre o que tivemos a Felicity e isso acaba de se tornar uma carta na manga. Resumindo os fatos, estou fudido e Dean tinha total razão em jogar na minha cara que eu não saberia lidar com a situação.

— Nadinha. — Felicity devolve a resposta direcionando o olhar de inquisição na minha direção, o peristaltismo do meu intestino se torna rápido e àquela sensação de que tudo possa ir para os ares em segundos vem como uma vontade imensa de correr para a primeira privada que eu encontrar.

Mas são os nossos pais que surgem como anjos.

Robert e Donna estão animados depois de algumas taças de champanhe a mais, mas são eles que quebram o clima tenso que estava prestes a se desenvolver por aqui. Susan é a mais conhecida Anunciadora do Apocalipse, e não, ela não perderia a oportunidade de jogar sujo com Felicity.

— Quando é que o meu garotão vai nos dar a honra de prestigiá-lo? — Robert está abrançando Donna pela cintura que gargalha como uma adolescente feliz. É engraçado.

— Papai... — sussurro quando o homem grisalho aperta minhas bochechas como fazia quando eu era realmente um garoto.

— Já estamos na hora da grande estreia. — Robert entrega a taça borbulhante para Donna — Vamos começar logo com isso!

— Papai, Thea e Roy ainda não chegaram! — meus braços correm pelos seus, mas ele está animado demais para dar ouvidos. É sério, Thea e Roy ligaram avisando que se atrasariam devido a um acidente que tinha acontecido na estrada principal de Central City. Mas ser um dos diretores mais importantes da Sony Music o dá certa vantagem, lê-se vantagem o poder que tem de começar o espetáculo quando bem entender e meu pai subindo os degraus que o leva ao grande palco me responde isso com clareza.

O palco está com poucas luzes sobre ele, faz parte da ideia de manter o espaço mais íntimo para os convidados até o início do musical. Afinal de contas, o fundo do mar é iluminado e nos ofusca com a delicadeza do azul marinho, os jogos de luzes iriam acabar com a ansiedade dos fã’s da animação. Então, assim que meu pai decide subir até lá, apenas um holofote corre em sua direção, ele segura com precisão o microfone dando leves toques sobre ele. Papai, o microfone está funcionando, não precisa ficar falando essas palavras com voz de desenho animado para testá-lo, por favor. Depois do coroa entender que está tudo em pleno funcionamento, a garganta é limpa com um pigarreio e um silêncio antes do som da sua voz nos prestigiar faz com que o frio no estômago volte a me atingir.

— Boa noite. Uma bela noite a todos — papai suspira para continuar. Ele quer me destruir — Por muito tempo era eu quem estava por trás dessas cortinas vermelhas, era encantadora a forma com que meu coração acelerava a cada música dirigida, a cada texto interpretado com tamanha sensibilidade. Foram anos até que eu chegasse aqui, desta vez, não mais atrás dessas cortinas vermelhas — Robert dá um passo a frente e o holofote o segue, o seu sorriso é tão claro que essa luz incidindo sobre ele não seria necessária — Há uns tempos descobri que esperava um menino, Moira, a mãe dele o deu o nome de Oliver. Vocês sabem o que significa esse nome? — a platéia responde que não, mas eu rio sozinho já esperando pela piada que está prestes a vir. Meu pai sempre a fazia quando estávamos em um encontro de família, mamãe o degolava quase todas as vezes — Esperança. Significa esperança — é possível ouvir um own vindo da platéia, mas papai cai na gargalhada logo em seguida — Na verdade, significa Árvore que produz azeitonas, só quis parecer gentil. Enfim, nesta noite, deixo clara a minha admiração mesmo todas as vezes que você pensou que ela não existia. Hoje você é o homem mais brilhante que conheço, inteligente também, porque eu nunca teria a criatividade que você deixou nesse trabalho especial que a ansiedade de todos aguardam. Esse cara de nome importante de vagar se tornou um homem de garra, tomou frente de um dos maiores desafios da sua vida, tornou-se pai, ganhou o coração de uma garota que herdou os olhos azuis mais especiais e, agora, irá me substituir. Porque não há pessoa melhor do que o meu garoto para seguir os meus passos! Oliver, nunca deixe de acreditar e você permanecerá sendo o melhor — após mais uma onda de silêncio, a voz malditamente embargada de Robert finaliza — Senhoras e senhores que essa noite possa marcar seus corações!

— Precisamos ir. — Susan puxa meu braço, mas ainda estou em transe.

— Acho que é a minha hora. — sussurro à Felicity que pega Judith nos braços. As minhas garotas estão lindas, meu peito cheio de sentimentos pipocando entre si, as pernas um pouco agitadas, mas querendo ficar abraçado aos melhores presentes que a vida poderia ter me dado.

— Boa sorte, amor. — a voz dela é rica em carinho e os seus lábios tocam os meus como se estivessem entregando um amuleto.

Caramba!

Preciso repetir.

Eu amo essa mulher.

Na próxima vez vou fazer questão de soletrar.

Sou cortejado com palmas à medida que Susan me leva para trás das cortinas, funcionários colocam com agilidade pequenas escutas no meu ouvido antes que o jogo de luzes cortem o grande palco. Assim que tenho tudo o que preciso nas mãos, a música começa, meu peito está em festa depois de tudo que meu pai disse. Agora posso enxergar o quanto cresci, escutando cada melodia que coloquei no tempo certo, nas vozes certas assim como foi ensinado por ele quando estava ao seu lado também atrás dessas cortinas. Hoje conquistei mesmo que por caminhos tortos tudo o que indiretamente não imaginava que teria, um trabalho meu, uma mulher que me detestava, mas que hoje é o meu porto seguro e, por fim, a minha pequena Judith que me escolheu para mostrar os seus primeiros passos, as primeiras tentativas de palavras e o seu sorriso angelical.

Sou um cara de sorte.

~~~

— Você disse que seria rápido.

— Para de ser ranzinza, o espetáculo foi um um sucesso! Cadê o seu bom-humor?

Susan tenta acertar a chave para abrir a porta pela quinta vez, estamos no segundo andar e os corredores estão um pouco escuros. Ela levanta o corpo o deixando ereto e com um passo para trás totalmente calculado esbarra a sua bunda no meu corpo propositalmente, a cabeça cai para trás em gargalhada.

— Espera aí Susan, a minha família está me esperando lá embaixo! — tomo o molho de chaves da sua mão conseguindo com facilidade abrir a porta. Susan me segue para dentro ainda com seu copo de uísque na mão, ela resmunga quando começo a acender as luzes, mas não perde a oportunidade sentando sobre a mesa e deixando o tecido do vestido marcar a coxa torneada, elas se cruzam querendo chamar atenção.

A história de arrancar pedaços de mim nunca pareceu tão real.

É ridículo.

— Família? Que papo chato! — Susan revira os olhos.

A ignoro.

— Onde estão os outros empresários?

— Sabia que você já foi mais divertido?

Bufo — Preciso avisar à Felicity que estou aqui.

— Vá em frente, aproveita e conte a ela sobre sobre mim.

A ironia em sua voz é nojenta.

Susan desce da mesa indo até a pequena bancada com bebidas, ela derrama sobre o copo mais dois dedos de uísque a cavalo. No primeiro gole ela faz uma careta, mas no próximo o líquido parece descer com facilidade chegando ao fim, os movimentos são rápidos para encher o copo mais uma vez enquanto eu suspiro fundo assistindo a cena decante.

— Você não existiu.

— Não? Tem certeza?

— Só foi uma vez, Susan!

— Então por que mentiu? Por que não contou para a Felicity sobre nós?

— Porque não existiu um nós. — meneio a cabeça — Você é linda Susan, uma mulher inteligente e a melhor no que faz! Aquilo que aconteceu foi um ato de desespero, eu estava bravo, com raiva, só queria aliviar. Não que eu tenha usado você, foi divertido, a tensão da primeira vez, o lugar apertado, o seu corpo, mas você consegue entender que depois daquilo a minha vida virou de cabeça para baixo? Eu era um irresponsável, errei com Felicity e com o trato que havíamos feito. Só que você merece um cara que goste de verdade de você, que te faça se sentir importante.

— Estou enjoada.

— Não vai acontecer mais. — olho o relógio no meu pulso, já faz vinte minutos que o musical aconteceu. Felicity deve estar preocupada com o meu sumisso. As minhas mãos correm pelos bolsos do blazer na tentativa de encontrar o celular, mas é claro que ele não vai estar aqui. Sempre acontece isso nas novelas, por que não iria acontecer comigo?

— Homens e a capacidade de se tornarem um pé no saco! — Susan deixa o copo sobre a mesa e a falta do protetor de copos me incomoda um pouco, talvez seja resquício das regras de Felicity, o que me faz sorrir brevemente. O fato de estarmos tão ligados um no outro faz com que as nossas manias se misturem, parecemos uma pessoa só. A mão de Susan abre uma gaveta trazendo uma pasta que é jogada encima da mesa.

— O que tem nesta pasta?

— O seu futuro.

— Como assim?

— Senta e leia, você jamais vai receber de novo uma proposta tentadora como esta.

A respiração pesada e alcóolica de Susan bate na minha nuca logo após eu me sentar, ela está atrás de mim com as duas mãos apoiadas sobre os meus ombros. De início me incomodo um pouco com a proximidade, mas os papéis que tenho nas mãos desviam o foco assim que começo a leitura. Susan não estava brincando quando disse que naquela pasta estaria o meu futuro, porque o que tenho aqui é um contrato oficial com a empresa que inclui o posto de diretor musical para os principais trabalhos que aparecerem. Mas é aí que mora um maior dos problemas, para isso preciso de doze horas por dias na Sony Music o que me obriga a ter que viver em Central City.

— Viver em Central City? — murmuro.

— Em uma das locações da empresa! Isso não é um sonho? — a voz de Susan é animada.

É um sonho.

Sempre foi.

Mas um sonho antigo onde ainda não existia Judith e muito menos Felicity, eu era um rapaz que auxiliava meu pai e vivia com a grana que dava. No entanto, ler essas palavrinhas transforma o sonho antigo em uma realidade assustadora e palpável. Ao final da leitura os três documentos me deparo com os espaços que exigem a minha assinatura, ao mesmo tempo que a sensação de nervosismo corre pela boca do estômago de novo, as palmas no final do musical e os gritos calorosos me fazem sorrir brevemente. Um sorriso que chega ao fim tão rápido quanto iniciou, pois é Felicity e Judith que aparecem para mim, ela são as raízes que me seguram em Starling City.

Felicity é diretora executiva da Smoak Technologies, ela não deixaria de comandar a empresa que controla a economia da cidade. Sem contar os projetos sociais que tem na cidade e não há possibilidade de querer migrar para Central City já que Felicity não suporta essa cidade.

Um sonho.

Uma família.

— Preciso coversar com a Felicity. — continuo o murmuro.

— Você está falando sério?

— Essa decisão muda tudo, Susan!

Ela sorri.

— Estamos te colocando no topo. A Sony Music está apostando todas as fichas no seu trabalho, é claro que muda tudo!

— Eu realmente preciso conversar com a minha família. — suspiro.

Susan meneia a cabeça — Ops! Que pena, não temos o seu tempo.

— É brincadeira?

— Vou entregar esses papéis amanhã, até abrirmos um termo de admissão e todas essas burocracias chatas é preciso saber se está dentro ou não. — Susan escorrega a mão para pegar sua caneta dourada que é colocada com pressão sobre a mesa. O barulho que o objeto faz quando bate contra a madeira me assusta, o som parece tão alto devido ao silêncio dentro do escritório que faz eco dentro do meu tímpano. O eco é breve, mas o barulho irritante leva a compressão dos meus olhos por segundos demorados e quando abro os olhos novamente eles encontram a caneta próxima da minha mão que segura o contrato. Eu quero assinar. Mas ao mesmo tempo também quero ter a minha vida junto de Felicity e Judith em Starling City.

Eu quero poder acordar ao lado de Felicity mais vezes antes que o relógio no criado mudo desperte, apenas para velar o seu sono. Observar por mais alguns minutos a forma como seus braços descançam no meu peito e a perna macia agarra meu torso para se aconchegar melhor. A brincadeira que os lençóis brancos fazem quando está cobrindo o corpo com o pijama preferido e sentir a sensação que me acerta assim que abre os olhos azuis ainda sonolentos dando bom dia.

Eu quero passar o meu dia brincando com Judith no tapete da sala enquanto quebra a cabeça com seus cálculos de arrancar os cabelos, criando projetos para mudar a vida de pessoas que necessitam de ajuda. Ouví-la falar sobre eles, ajudá-la com o que for preciso e colocar a mão na massa só para receber em troca o melhor sorriso.

Levar as garotas na sorveteria mais próxima, ouvir sermões de Felicity quando Judith me pedir com as mãozinhas mais um pouco do meu sorvete. Ah, e também ouvir broncas quando sujar o vestidinho claro com a calda de chocolate que a pequena tanto gosta.

No final da noite quero massagear os pés suaves dela até que ela pegue no sono para que depois eu a leve para nossa cama. Mesmo que ela desperte assim que eu coloque nos meus braços como faz quase todas as noites e, de novo, aqueles olhos azuis sonolentos sorrirem para mim, as mãos tocarem meu rosto para um carinho e depois os lábios cobrirem os meus para um boa noite com a certeza de que não irá precisar se preocupar, porque vai saber que assim que voltar a abrí-los eu vou estar ali mais uma vez observando cada detalhe que é estar ao seu lado.

— Não vai rolar.

— Você é louco? Caramba Oliver é a sua chance de crescer dentro da música!

— Não tem como decidir a minha vida sob pressão quando envolve outras pessoas!

— Outras pessoas? — Susan ri — Você não é pai daquela menina, Oliver! Felicity tem um império em Starling City e nunca abriria a mão do negócio por você. Abra os olhos, você está sozinho nessa.

O desdém na voz de Susan faz com que uma raiva desconhecida crie força para empurrar a papelada para o alto. O barulho que a cadeira faz quando risca os pés no chão de porcelana somado a lentidão que os papéis fazem quando tocam o chão assustam Susan que dá um passo para trás. Ela poderia tentar alguma coisa comigo novamente, poderia continuar com as investidas e o jogo sujo com Felicity, mas não insinuar que Judith não é a minha filha, porque eu a vi crescer, era eu quem acordava à noite para esquentar o leite, eram os meus ouvidos que guardavam o choro de saudade dos pais que não voltam mais. Eu vi a primeira vez que pegou a comida com o garfinho de plástico e tentou se alimentar sozinha, mesmo sujando tudo com o macarrão vegano que Felicity aprendeu a fazer nesses últimos dias – era horrível, mas eu disse que tinha um gosto maravilho. Eu a vi dando os primeiros passos, correndo pelo jardim e também vou estar ali quando decidir falar as primeiras palavras.

Sou eu quem vai levá-la à escola, falar sobre coisas importantes da vida e no que ela quiser fazer no futuro.

Portanto, eu sou o pai de Judith.

— Nunca mais fale das minhas garotas. — rosno.

— Dói ouvir a verdade?

— Já deu, Susan.

~~~

Felicity Smoak

O musical foi incrível do início ao fim, eu tinha certeza que faria sucesso pois tive o prazer de escutá-las antes que todos quando Oliver as colocava baixinho para Judith pegar no sono. Os acordes foram pensados com a delicadeza que encontrei dentro de um homem que escondia o quanto poderia ser sutil. A verdade é que nesse pouco tempo ao seu lado não encontrei apenas a delicadeza, mas também aprendi a lidar com cada pedacinho responsável por construir o homem da minha vida. É estranho pensar em Oliver como esse homem, porque eu sempre quis arrancar sua cabeça e colocá-la como comida para os porcos. Só que a convivência dia após dia mostrou o quanto eu poderia aprender com ele, o cuidado comigo e com Judith, o toque com cautela por cada parte do meu corpo em todas as situações e a preocupação em manter o sorriso nos meus lábios são as melhores coisas que já recebi.

Aplaudir seu sucesso e deixar uma lágrima discreta escorregar pelo meu rosto é natural, tão natural quanto a minha vontade de querer tê-lo do meu lado. Hoje tive o prazer de receber um presente especial que estou carregando no meu peito, quando olho o pingente de uma jóia importante de família vejo muito mais do que o meu reflexo nele, ouço a voz rouca sussurrar no pé do meu ouvido que sou merecedora de carregá-la e junto à voz sinto o ar quente fugindo dos seus lábios e batendo contra a minha nuca me trazendo arrepios gostosos.

Ser especial.

Oliver me faz ser assim.

Todos os dias.

É por isso que o amo.

— Senhorita?

Uma voz desconhecida surge por detrás de mim enquanto converso besteiras com minha mãe, ela decidiu contar aqueles detalhes sóridos sobre Robert e como Thea ainda não chegou são os meus ouvidos que sangram, pelo menos não estou sucumbindo pela ansiedade de encontrar Oliver novamente. Já faz quase trinta minutos que o musical chegou ao fim e ele ainda não apareceu, para completar ele não olhou minhas últimas mensagens.

Coisas de homens, não é mesmo meninas?

— Sim. — respondo ao rapaz simpático.

— Você é a mulher que aparece no visor desse celular, Oliver o esqueceu no camarim.

— É claro que esqueceu!

De novo, homens só não esquecem a cabeça porque existe o pescoço ali para dar um apoio.

— A senhorita poderia ficar com ele?

— Só se você me chamar de Felicity — sorrio — Felicity Smoak.

O rapaz ruboriza — Felicity, você poderia o entregar quando ele voltar?

— Quando ele voltar? — pergunto curiosa. Oliver não disse que iria para outro lugar.

— Sim, ele está em uma reunião com a chefia.

— Reunião? Com a chefia?

A porcaria da ruga entre as sobrancelhas deve está gritando.

Que reunião é essa?

E por que ele deixou a porcaria do celular?

Não me cheira bem. Aliás, isso tem um cheiro forte de vadia passando levemente pelas minhas narinas, porque Susan deve estar por trás dessa tal reuniãozinha. Eu sabia que não poderia confiar nessa mulher e, bom, preciso mostrá-la a não mexer com o homem alheio, nem que eu precise descer do salto por breves segundos.

Descer do salto?

Menos Felicity, por favor.

Aham... — o rapaz assente escabriado.

— Você pode me dizer onde está acontecendo essa reunião? — respiro fundo discretamente. Se esse rapaz sentir a tensão na minha voz ele não vai querer me dizer o caminho dos ovos de ouro ou o caminho do galinheiro, para ser mais clara.

— Moça, não quero problemas para o meu lado.

— Pode ficar tranquilo, não sou mulher que arranja problemas. — sorrio feito um anjinho.

— Segundo piso, primeiro corredor! A reunião ficou de acontecer no escritório 01. — ele engole seco. Dá vontade de rir.

— Eu não te vi aqui e muito menos tivemos essa conversa. — lanço uma piscadela.

O rapaz que não sei se quer o nome assente rápido.

As pernas enroladas dão meia volta.

Agora é comigo.

Levanto as barras do vestido para andar com mais facilidade, ainda não sei o porquê de ter escolhido esse par de saltos-alto que agora vão me dar certo trabalho. Existem grupos de pessoas comemorando o sucesso do musical com as taças cheias de champanhe como eu gostaria de estar agora com a minha família se não fosse esse pequeno problema com a chefia. Se é uma reunião, acredito que Oliver não ficaria irritado caso a sua namorada resolvesse aparecer com o celular supostamente esquecido.

Uma ótima desculpa para invadir uma reunião de negócios.

Nunca fiquei tão feliz em encontrar um elevador, dois lances de escadas iriam destruir meus dedos mindinhos que estão sendo esmagados por esses sapatos sofisticados. É rápido até ele me deixar no segundo andar, está escuro aqui, mas passando pelo corredor as luzes se acendem automaticamente e ao mesmo tempo meu coração acelera, não sei porque de estar sentindo essa sensação. É claro que esses corredores escuros parecem de um filme de terror no qual vou ser a primeira pessoa a ser levada pela alma sobrenatural ou pelo maníaco da Sony Music, mas não é por isso, talvez o meu medo seja outro.

Não, nada a ver, Oliver nunca faria uma coisa dessas.

Possivelemte o antigo Oliver fizesse.

Mas não o meu Oliver, ele não faria isso.

Hoje cedo mesmo disse que Susan não fazia o seu tipo.

Escritório ZeroUm, encontrei! Está tudo quieto, o silêncio não é algo que esperaria encontrar em uma reunião, quero dizer, as minhas reuniões de negócios não costumam ser assim. Mas tudo por aqui está estranho já que acabei de passar por corredores sinistros apagados e não é uma surpresa encontrar essas persianas abaixadas. Então, minhas mãos encostam na maçaneta para abrí-la, a tensão dentro do meu peito é ainda mais alta, eu não quero abrí-la, não quero ver com os meus próprios olhos do que se trata essa reunião da qual Oliver não me contou.

E se ele deixou o celular no camarim de propósito?

E se o rapaz ter o entregue para mim não estava nos planos?

E se essa reunião for uma mentira?

Não encontrei Susan pelo salão depois do final do musical assim como não vi Oliver.

Engulo a seco rapidamente e minhas mãos escapam da maçaneta, porque desde que decidi vir aqui atrás de Oliver meu subconciente tentava se auto convencer de que eu estaria apenas interrompendo uma reunião sobre o sucesso que havia sido o musical, mas que na real poderia ser apenas uma festinha privada do meu namorado com a vadia da Susan Williams.

Comprimo meus olhos por um tempo.

Ao respirar fundo procurando pela coragem, um vento vem com o abrir da porta em um rompante me fazendo assustar. Dou um passo a frente e trombo com o corpo pesado na minha direção, a trombada me desnorteia quando o cheiro de Oliver toma as minhas narinas.

— Felicity? — Oliver pergunta confuso.

— Você esqueceu o celular no camarim... — meus olhos se quebram quando avisto Susan sair por trás dele retocando o batom vermelho na boca. Assim que nossos olhos se cruzam, ela sorri diabolicamente e a ponta da língua molhada passa pelo batom — Então essa é a reunião?

Agora sim o meu coração está fora dos trilhos.

— Olá, querida! — Susan acena.

— Merda. — Oliver murmura.

— Estou atrapalhando a foda de vocês dois? Desculpa, mas não era a intenção!

Se fui onfensiva? Que se foda.

— É claro que não, amor. — a mão de Oliver tenta segurar meu antebraço que a dribla.

— Que pena, se chegasse mais cedo poderia ter participado. — Susan dá de ombros.

— Cala a boca, Susan! — ele revira os olhos — Você não vai acreditar nela, não é?

Rio sarcasticamente — Trinta minutos? Parabéns Oliver, você conseguiu ser melhor do que oito segundos.

Woooow! — Susan grita — Oito segundos?

Amor, isso tudo é um engano... Susan me chamou para uma reunião com empresários e me segurou aqui dentro! Não aconteceu nada. — Oliver friza. As mãos tentam me conter mais uma vez, mas o meu corpo se afasta instintivamente.

— Então você foi obrigado a ficar aqui com ela? Você é um bebê indefeso agora? — grito.

— Adorei ela, Oliver. — Susan sussurra.

— Por favor, Susan! — Oliver também grita, os olhos azuis estão arregalados e trêmulos — Não aconteceu nada aqui, Felicity!

Susan ri — Você não vai contar para ela?

Respiro fundo quando ouço a malícia na voz da vadia.

— O que você não me contou? — direciono meus olhos curiosos aos patéticos de Oliver.

Ele apenas suspira.

— Já tivemos nossos bons momentos, se é que você me entende! — a piscadela de Susan me faz querer arrancar cada fio de cabelo malditamente hidratado. Que ódio!

— O que essa mulher está dizendo, Oliver? Isso é verdade? — a minha voz é entrecortada.

— Foi só uma vez. — ele murmura baixo. Quase inaudível.

Minha mão pesada acerta em cheio à face esquerda de Oliver.

A reação que tenho me faz arregalar os olhos.

— Felicity! — Oliver responde passado com o tapa.

— Por que me fez acreditar que havia mudado se sua intenção era continuar o mesmo de sempre? — minha voz, desta vez, rende-se as lágrimas que estão sendo seguradas na garganta, saindo embargada.

— Se eu soubesse que iria ser tão divertido, tinha preparado a pipoca! — Susan gargalha.

Apenas meneio a cabeça.

— Você vai acreditar nela? — Oliver pergunta desacreditado. A face avermelhada.

— E por que eu acreditaria em você? — dou de ombros antes de dar a volta. Eu quero ir embora antes de começar a chorar pateticamente aqui — Ah! Não pense em vir atrás de mim ou eu não vou me arrepender em cobrir a sua cara com a minha outra mão!

Palavras grossas saem da minha boca.

Não que eu queira dizê-las, mas o idiota parado na minha frente sem ação é difícil demais de engolir. Olho pela última vez nos olhos castanhos de um negro intenso de Susan antes de dar as costas, ela acena novamente para mim em uma ironiza nojenta. Volto a meneiar a cabeça quando Oliver abaixa a sua sem ao menos tentar reverter a situação, ele entreabre os lábios para dizer alguma coisa, mas a primeira lágrima que escorre impulsiona minhas pernas em direção ao elevador mais próximo. Minhas mãos estão apertando os botões com força até as porta se abrirem, é rápido até chegar ao andar onde continua acontecendo a festa, eu esbarro nas pessoas para abrir caminho, a cabeça está baixa para não mostrar o meu rímel borrado pelo salgado das lágrimas. Gostaria de passar como um foguete pelas pessoas, mas sou segurada pela mãos assim que me despeço da multidão.

— Não vai falar com a sua cunhadinha? — a voz é a de Thea.

— Thea... — sussurro.

— Felicity? — ela levanta o meu rosto as pressas — O que aconteceu?

— Fica com a Judith essa noite?

— O que aconteceu? — Thea pergunta de novo.

Deixo minhas mãos correrem até o feicho do cordão que Oliver me deu mais cedo, preciso devolvê-lo, porque Oliver não merece que eu o carregue. A jóia está gelada pelo contato direto com a minha pele, mas o entrego nas mãos de Thea que continua parada sem entender nada. No primeiro momento ela não parece reconhecer a jóia de Moira, mas eu a respondo com um sorriso amarelo ao entregá-la, pois eu não queria que as minhas escolhas tomassem esse caminho, eu não queria me sentir tão traída com o que acabou de acontecer, porém, não somos capazes de mandar no coração.

— Usar esse colar hoje à noite foi especial, espero que Moira entenda. — murmuro.

— Como assim?

— Cuide de Judith essa noite.

— Mas Felicity...

É tudo o que preciso para ir.

~~~

Oliver Queen

Já perdi as contas de quantas vezes já chamei por Felicity.

Ela não abre a porta.

Alugamos essa casa para três dias, ela tem um jardim imenso e balanço na árvore, uma das únicas regiões de Central City que ainda tem alguma parte verde. Por mais que Felicity não goste daqui, consegui fazer com que ela aceitasse ficar uns dias longe de Starling City, seria bom respirar novos ares e destruir o preconceito com a cidade. No entanto, a loira só cedeu ao meu pedido depois de ela mesmo ter escolhido o lugar, do jeitinho que ela queria. Felicity disse que queria um lugar aconchegante para passar os três dias, um lugar que não a fizesse sentir tanta falta de Starling City.

Me lembro com detalhes a forma como sussurrou no meu ouvido como iriamos comemorar o sussesso da Pequena Sereia. Os olhos azuis intensos brilhavam e os lábios macios cobriam os meus com satsifação.

Destruí tudo.

— Eu não vou sair daqui! — grito.

O silêncio continua.

Não há outras casas nesse quarteirão.

O frio que corta meu corpo faz questão de não ser meu amigo, da minha boca sai fumaça quando volto a gritar por Felicity. Meu peito está apertado demais, a sensação de angústia já ocupou cada fragmento como se algo obscuro que eu nunca havia sentido tomasse conta dos meus sentidos. Na minha cabeça, omitir a Felicity o que aconteceu com Susan não a deixaria tão sentida, porque eu nunca vi seu olhar quebrar de tal maneira. Mas não contar a ela foi egoísmo, eu não queria ocupar minha cabeça com os problemas que poderiam aparecer, então eu omiti.

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Não, eu menti.

Menti como uma forma de fuga, eu tinha medo de causar o que acabou acontecendo. A minha consciência tentou alertar, os meus neurônios tentaram me impulsionar e até Dean disse que eu não saberia lidar com a situação, mas eu preferi acreditar que saberia agir com Felicity. No final, eu só fui um cretino que não foi capaz de ser sincero com a mulher que ama. Amar? Acho que no fundo eu sempre tive medo de abrigar esse sentimento dentro de mim, eu não tinha noção que poderia ser tão arrebatador. Eu queria guardar todos os sorrisos de Felicity dentro de uma caixinha, ser responsável por não deixar que nenhuma desconfiança os quebrassem, foi por isso que não contei sobre Susan, foi por isso que eu mesmo acabei os quebrando.

Encosto eu corpo na madeira da porta — Não sei porquê, mas parece que você está aí do outro lado da porta me ouvindo gritar o seu nome — faço uma pausa — Conheci Susan naquele dia em que a Judith sumiu. Eu estava com raiva de você por não ter me dado ouvidos, você era uma pedra dentro do meu sapato que incomodava. Chegando lá, Susan foi uma boa anfitriã, ela mostrou a empresa, foi simpática e não abriu a mão de mostrar interesse — suspiro por breves segundos antes de continuar — Fazia semanas que eu não conhecia alguém, Susan estava disponível como eu, simplesmente aconteceu! Mas só foi aquela vez, porque depois você se tornou a única mulher da minha vida. Susan nunca foi capaz de chegar aos seus pés, nenhuma outra mulher vai chegar. Você me mostra o que é ter alguém para esquentar os pés no final da noite, o seu sorriso abraça o meu peito quando essa angústia sisma de me acompanhar. Em noites estressantes é a sua voz que me acalma, são os seus olhos vívidos que colocam os meus pés de novo no chão. Foi por medo que eu não contei sobre Susan, por medo de você não acreditar em mim. Talvez seja eu quem não acredita na minha própria mudança, ser o cara que você me transformou não é fácil, não ir embora é um aprendizado continuo, meu amor — engulo o choro — Não desista de mim...

Ouço um trovão alto quebrando o silêncio.

As nuvens estão cinzas sobre o céu azul que têm poucas estrelas espalhadas por ele, a primeira gota fria cai no meu ombro direito, levanto ainda de frente para a porta de madeira que continua fechada guardando o silêncio de Felicity. A segunda gota molha a ponta do meu nariz, as próximas gotas gélidas vão encobrindo meu corpo molhando-o completamente, a água se mescla às lágrimas salgadas que descem pela minha boca, mas eu continuo parado em frente a porta esperando que o barulho altivo da chuva sobressaia ao silêncio macabro que continuo recebendo. As pontadas frias que acertam o meu corpo não chegam perto ao gelo que estou sentindo aqui dentro, dentro dos meus sentimentos, dentro do meu peito ainda apertado.

As luzes do jardim acendem juntamente aos cômodos de dentro da casa, livrando-me da escuridão.

— Você vai pegar uma gripe aí fora. — Felicity aparece com uma toalha nas mãos, ela está na parte de dentro da casa. Poucos centímetros nos separam, consigo assistir as pálpebras inchadas e avermelhadas de quem não esconde que chorou.

— Eu não vou sair daqui.

— O que eu disse sobre não vir atrás de mim?

— Acha mesmo que eu não iria vir? Eu sou sua cola, querida.

Felicity abaixa a cabeça.

Há um pequeno suspiro.

— Por que tudo é complicado para nós dois?

— Porque descomplicar faz parte de um relacionamento saudável — dou um passo, a sombra que meu corpo faz sobre Felicity esconde a claridade dos seus olhos azuis. Ainda consigo observar as sardinhas que, desta vez, não estão sorrindo — Não que você mereça que eu seja um cuzão.

Felicity esconde a risada.

— Você é um cuzão. — ela dá de ombros.

— O maior de todos — minhas mãos levantam o seu rosto, eu quero enxergá-la melhor, quero olhar a sua boca perfeita mais uma vez. A face de Felicity descansa na minha mão molhada quando a seguro com cuidado, lá no fundo das suas pupilas consigo resgatar a minha Felicity — Mas pode ter a certeza de que não vou mais mentir para você, nem que eu tenha que oferecer o meu outro lado do rosto para as suas mãozinhas pesadas.

Novamente Felicity segura a risada.

— Não vou me desculpar pelo tapa.

Eu amo quando sua voz sai assim, emburradinha.

— Meu amor, você não deve nenhuma desculpa.

— Eu odeio quando me chama assim. — o sussurro de Felicity é quebrado.

— De amor?

Uhum...

— Eu te amo, Felicity. Mais do que eu possa carregar.

Meus dentes estão batendo uns nos outros.

Está frio demais aqui fora.

Ela fica em silêncio — É...

— Você ouviu? Eu te amo.

De novo o silêncio, agora os olhos de Felicity se perdem dos meus, mas são as suas mãos que jogam a toalha aveludada sobre o meu corpo. Ela me leva para dentro e o calor da lareira se contrasta com o frio que transformou meus dedões do pé em puro gelo, o cheiro do café moído vem da cozinha enquanto a loira guardando as palavras no seu silêncio me traz um xícara com o café. Eu disse que a amava faz alguns minutos e ela não me disse nada, por que ela não disse nada? Será que a mentira sobre Susan destruiu tudo de verdade? Porque se esse detalhe for responsável por deixar a mulher que amo longe, não vou conseguir me perdoar.

— Beba com cuidado, você precisa se esquentar. — as mãos afastam o meu blazer para os lados passando pelos meus braços. Eu apenas continuo a olhando, não desvio os meus olhos dos seus nem se quer por um segundo, não há essa possibilidade, não a deixarei fugir de mim por mais que ela tente. Os meus dentes ainda continuam se batendo, os meus lábios estão roxos, mas não é por causa do frio, não está frio aqui dentro. Pelo contrário, o calor da lareira já deveria ter me esquentado, mas meus nervos permanecem a flor da pele assim como meu coração que está correndo contra as batidas.

— Não é o frio. Eu não sei o que é. — continuo com os tremores. Malditos.

— Oliver você está bem? — as mãos delicadas de Felicity desfazem os botões da camisa social a largando também de lado, a toalha seca cobre parte dos meus músculos. É quando Felicity se posiciona entre minhas pernas que a trago para meu colo abraçando a sua cintura pequena com força, deixando-a sentir meus tremores.

Ela não fala nada enquanto eu a abraço.

Estamos quietos.

O meu corpo já não treme mais desde que estamos aconchegados um no outro.

— Estou melhor. — sussurro.

A cabeça de Felicity que descansava nos meus ombros se levanta buscando pelos meus olhos escuros pela claridade íntima da casa, o polegar massageia a minha bochecha deslizando até o meu lábio inferior que é engolido pelo seu olhar. Os mesmos passeiam da minha boca encontrando os meus que piscam rapidamente, ela sorri. Sorri à medida que encosta a ponta dos nossos narizes por segundos apertados, sentindo as nossas respirações. O tremer dos meus músculos cessam, meus lábios não estão mais roxos, mas não há nada que diminua as batidas fortes que meu coração dá contra as paredes do meu peito. A mão dela encosta na parte do meu peito esquerdo massageando o lugar, os pelos do meu corpo arrepiam quando os lábios de Felicity encostam nos meus.

— Você iria dizer que me amava hoje mais cedo, não é? — a voz é rouca.

— Não tínhamos tempo...

— Demorou.

— Tenho problemas com o tempo.

Felicity ri baixo.

— Não precisava ter dito.

Faço um expressão de confusão.

— Sobre amar você?

— Sim...

— Por que não?

— Porque eu já sabia. Eu sempre soube — as pernas de Felicity se ajeitam sobre o meu torso, agarrando-o com as coxas. A ponta do nariz brinca com o meu mais uma vez antes da língua riscar pelos meus lábios entreabertos.

— Mas eu gosto de dizer. Se for preciso posso gritar também.

— Pode deixar para quando chegarmos em Starling City? Pelo menos lá temos vizinhos para escutar! — ela murmura.

— Anotado!

— Eu amo você. — a frase é dita com rapidez.

— Acho que eu não ouvi...

Felicity resmunga escondendo o rosto no acesso do meu pescoço.

— Você não vai mais mentir para mim, não é? Porque eu já entreguei meu coração e não aceito devoluções.

Sorrio — Amor, eu não vou esconder mais nada de você.

— Promete de dedo mindinho?

— De dedo mindinho.

Os nossos lábios roçam mais uma vez, um golpe de ar pesado foge do peito de Felicity quando a agarro pela cintura com mais pressão, a encaixando sobre minhas pernas. Estamos quentes, a língua dela encontra a minha com calma quando damos início a um beijo delicado. O gosto da sua boca é confortável, parece que estou sendo confortado pelos seus lábios macios, nós sorrimos antes do singelo beijo ser interrompido.

— Eu te amo. — ela volta a cochichar.

— Você demorou.

Felicity ri.

— Desculpa, é que eu tenho problemas com o tempo.

Ela me remenda.

Mas antes que eu derreta.

Nós voltamos a nos amar.