“Tudo o que eu sei é um simples nome / Tudo mudou”

Everything Has Changed — Taylor Swift feat. Ed Sheeran

Eram duas da tarde quando a campainha da casa dos Almeida Campos tocou. A empregada correu para atender, sendo seguida pelos olhos atentos de Beto que estava jogado no sofá vendo TV.

— Senhorita Érica Mello — anunciou Maria, trazendo-a consigo.

Ao ouvirem o nome da garota ser pronunciado pela empregada Júnior e Carol se apressaram para cumprimentá-la. Assim que Érica pôs seus olhos em Beto correu até o namorado, que se levantou vagarosamente para abraçá-la e cumprimentá-la com um rápido beijo.

— Então Érica como foi a viajem? — Carol perguntou sentando-se no sofá.

— Bem graças a Deus — ela respondeu. — Tenho novidades — ela olhou para Beto.

— Eu também — ele disse. — Mas conta aí você primeiro.

— Bem, adivinhem quem eles querem estrelando o próximo sucesso daquele diretor sueco?

— Não — Carol ficou surpresa. — Você vai gravar um filme? Érica isso é incrível.

— Eu sei, estou tão animada — ela disse sorridente.

— E sobre o que é o tal filme? — Beto perguntou tentando se mostrar interessado.

— É sobre uma garota que é garçonete, mas sonha em ser cantora. Ela passa por várias dificuldades não só financeiras, mas também emocionais enquanto luta pelo sonho dela — Érica explicou.

— Nossa que história bacana — Júnior se interessou. — Quando você vai começar a gravar?

— Daqui há uns três ou quatro meses. Primeiro o elenco tem que fazer laboratório e tal — ela contou. — Eu gostaria de colocar a mão na massa de verdade sabe, ter uma experiência real sobre o assunto para poder passar mais realidade para a personagem. O problema é só que eu não tenho um lugar para poder fazer esse laboratório.

Beto viu o rosto de Carol se iluminar como sempre acontecia quando ela tinha uma ideia, e de acordo com tudo o que estava acontecendo ele já sabia qual era.

— Bem que tal você fazer esse laboratório no Café Boutique — ela disse, para desgosto de Beto. — Não tem nenhum problema não é amor? — ela olhou para Júnior. — Nós vamos ter que voltar para São Paulo, por conta dos negócios, você poderia passar uns meses com a gente até as gravações começarem.

— Vocês vão voltar para o Brasil? — Érica olhou para Beto.

— Eu disse que tinha novidades — ele deu de ombros.

— Não sabemos ainda quanto tempo vamos ficar lá, mas acho que é o suficiente para você entrar no mundo das garçonetes — Carol respondeu.

— Bem se não for incomodar ou causar problemas eu aceito — ela respondeu sorridente.

— Imagine — Júnior disse. — Será um prazer tê-la conosco.

Nunca antes Beto tinha tido vontade de xingar ou brigar com Júnior, mas naquele instante ele desejou socá-lo com todas as suas forças. Levar Érica para o Brasil atrapalharia todos os seus planos. Ela não iria permitir que ele colocasse os pés para fora de casa sozinho, não o deixaria rever seus amigos, não o deixaria fazer amigos. Érica era controladora demais, ciumenta demais, e faria da vida dele um verdadeiro inferno.

— Quem sabe assim o Beto não se anima e vem trabalhar comigo — Júnior disse.

— Eu? — Beto riu. — Não obrigado. Não gosto de ternos.

— Mais você fica tão charmoso dentro deles — Érica disse.

— Mesmo assim, eu passo — ele respondeu.

— Beto, Beto você tem que tomar jeito na vida — Carol disse ao irmão.

— E eu vou tomar, mas não vai ser usando um terno que isso vai acontecer.

— Você quem sabe, mas o convite está feito — Júnior avisou.

Beto balançou a cabeça demonstrando que havia entendido o que o cunhado dissera, mas todos ali sabiam que ele não pretendia aceitar a proposta de Júnior. Ficar trancado em um escritório não exatamente o que ele sonhara para sua vida.

— x —

Clarita repetia a história de seu sonho para Lê pela trigésima vez desde que elas haviam se sentado perto do balcão por conta do baixo movimento.

— Nossa, mas isso é muito estranho — Lê disse.

— Eu sei, eu nem me lembro da última vez que pensei no Beto antes desse sonho — Clarita contou.

— Talvez seja um sinal — a morena disse.

— Sinal de que Lê? — ela questionou.

— Sei lá Clarita, às vezes vocês vão se reencontrar.

— Eu e o Beto? Jamais — Clarita disse convicta. - Ele nem mora mais no Brasil, da última vez que eu ouvi alguma coisa sobre a família dele eles estavam indo para o Chile.

— Mas isso não significa que ele não possa vir ao Brasil.

— Claro Lê, com certeza ele vai largar a irmã sabe-se lá aonde pra vir atrás de mim.

— Poxa Clarita não precisa ser grossa, só estou tentando ajudar.

— Eu sei Lê, mas é que essa história toda com o Beto não me faz muito bem.

— Você sente falta dele não é.

— Não. Eu já senti não nego, muita falta até. Mas hoje é como se fosse só um buraco aqui dentro — ela pôs a mão sobre o peito — mais um buraco que não vai me matar por estar ali.

— Poxa amiga nunca pensei que você se sentia desse jeito em relação ao Beto e a mudança dele — Lê ficou compadecida. — Sinto muito por não ter me importado mais com o que você sentiu quando ele foi embora.

— Não se preocupe você se importou o suficiente — Clarita garantiu forçando um sorriso.

— Hey vocês duas — Francis chamou-as. — Tem cliente chamando.

— Pode deixar que eu vou — Clarita disse ao ver Letícia se levantar.

— Tudo bem.

Clarita foi até a mesa do casal que chamara e anotou o pedido no tablet, retornou ao balcão e informou a Francis o que ele deveria fazer. Assim que se virou viu Marica Cecília entrar pela porta e se aproximar do balcão com uma cara séria.

— Boa tarde Maria Cecília — Clarita a cumprimentou.

— Boa tarde pessoal, olhe depois do expediente quero que todos fiquem aqui para uma reunião de última hora — ela avisou.

— Mas por quê? — Lê questionou.

— Digamos que eu tenho uma notícia que pode mudar a forma como nós trabalhos aqui — ela adiantou cautelosamente. — Mas depois falamos sobre isso, se precisarem de alguma coisa eu estarei na minha sala. Com licença.

Todos se olharam preocupados, o que será que iria acontecer. Será que iriam começar a cortas os gastos e mandar algumas pessoas embora?

Clarita não quis pensar nisso, precisava muito do emprego para pagar a faculdade e as contas da casa. Mesmo com a meia bolsa que conseguira na faculdade as coisas não eram exatamente fáceis para ela com o salário de garçonete, se ficasse sem ele então estaria perdida.

O tempo passou rápido demais naquele dia, as portas do Café Boutique já estavam fechadas e a lua já brilhava no céu. Maria Cecília logo se juntou aos funcionários no salão principal do Café.

— Bem, primeiramente obrigada pela presença — ela disse parando no centro para que todos pudessem vê-la. — Como vocês sabem o Café está passando por sérias dificuldades, vocês como funcionários que lidam diretamente com os clientes já perceberam que eles estão diminuindo.

— A gente percebeu mesmo — Lê disse preocupada.

— Então graças a isso do doutor José Ricardo resolveu tomar algumas medidas — ela disse cuidadosa.

— Ele vai mandar a gente embora? — Clarita não aguentou a ansiedade.

— Não Clarita, de forma alguma — Maria Cecília foi firme. — Ele resolveu mudar a administração do Café, para ver se conseguimos nos reerguer.

— E quem vai assumir a presidência então? — Francis questionou.

— O filho do doutor José Ricardo — ela respondeu. — Ele e a família estarão aqui no Café sábado de manhã, quero todos vocês aqui dez minutos antes de abrirmos e eu espero ver todo mundo uniformizado e com o melhor sorriso possível. Estamos entendidos? — Todos balançaram a cabeça afirmativamente. — Então vocês estão dispensados. Tenham uma boa noite.

Clarita saiu do Café ao lado de Lê, as duas moravam na mesma rua e sempre que podiam iam embora juntas.

— Então eu estava certa — Lê disse enquanto as duas caminhavam.

— Sobre o quê? — Clarita ficou confusa.

— Sobre você e o Beto — ela respondeu sorridente.

— Como assim Lê, do que você está falando?

— Clarita presta atenção, o filho do doutor José Ricardo é o Júnior, o mesmo Júnior com quem a Carol se casou. Carol caso você não se lembre é a irmã do Beto.

— Eu sei quem é Carol — Clarita disse brava.

— Então você também sabe que sábado seu velho amigo Beto estará de volta e vocês irão se reencontrar.

— Não pode ser Lê, é muita coincidência. O Beto de volta assim do nada.

— Não é bem do nada, você sabe.

— Mesmo assim, eu não sei se eu quero revê-lo.

— E por que não?

— Porque eu não sou mais a mesma Clarita de onze anos atrás e eu tenho certeza de que ele também não é o mesmo Beto.

— Isso é óbvio, mas não custa nada dar uma chance.

— Custa bem mais do que você pode imaginar — Clarita sussurrou para que Lê não ouvisse. — Nos vemos amanhã ok?

— Claro, tenha uma boa noite. E vê se pensa no que eu disse.

— Vou pensar Lê, prometo.

As duas se abraçaram e seguiram cada uma para sua casa. A cabeça de Clarita estava a mil, não podia acreditar no que iria acontecer, ela não queria acreditar que depois de tantos anos ela veria o rosto daquele que fora seu melhor amigo um dia. Será que ele seria capaz de reconhecê-la por trás do uniforme de garçonete? Será que ele se lembraria da infância dos dois e a trataria do mesmo modo de antes?

No fundo ela torcia para que eles se tratassem da mesma forma, ela não sabia se era capaz de conviver com ele como dois estranhos. Tomara Deus que isso nunca aconteça. Tomara que nada tenha realmente mudado.