Blut cravou suas unhas violentamente em seu pulso fazendo seu sangue jorrar. Ele criou uma gigantesca lâmina feita de sangue e começou a derrubar todas as árvores que apareciam em seu caminho. Ele rapidamente avançou até o centro da floresta com a ajuda das indicações de Kurokawa. Lá, eles encontraram alguns vestígios de pessoas como uma fogueira apagada e pegadas. Blut derrubou uma árvore próxima com um soco:

—Droga! -Gritou ele enervado. -Eles já partiram...

—O que faremos agora? -Perguntou Micky.

—Vamos a Kepler, eu duvido que aquele velho cabeça-dura será enganado por esses trastes. -Respondeu Blut.

O grupo apenas seguiu Blut sem fazer mais perguntas, ninguém ali se atreveria a questionar sua decisão. O caminho foi percorrido rapidamente já que com a exceção de Micky, eles todos possuíam corpos incríveis. Micky acabou por ser carregado por Blut para evitar perder tempo. Eles adentraram aquela cidade supostamente normal com pressa.

No centro daquela cidade, havia um gigantesco parque que agradava os olhos comuns. Mas que ao mesmo tempo escondia um majestoso edifício. Vários homens guardavam sua entrada durante dia e noite mas Blut aproximou-se sem sequer se importar. Um guarda correu na sua direção na intenção de impedi-lo. Blut rapidamente agarrou aquele homem por seu colarinho:

—Eu estou entrando para falar com Petrarca, e vocês não vão me impedir!

—Como...você sabe o nome dele? -Perguntou o guarda confuso.

O outro guarda imediatamente reconheceu Blut e sinalizou para permitir sua entrada. Eles passaram por centenas de guardas sem problema algum e finalmente chegaram em uma grande porta. Blut abriu a porta com força e foi recebido por um homem, sentado confortavelmente atrás de uma grande mesa. O homem era um velho de cabelos brancos que mesmo assim possuía um físico admirável. Blut caminhou em sua direção com ira em seus olhos:

—Oh, Blut, o que você veio fazer...

Antes daquele homem terminar sua frase, Blut arremessou aquela mesa para fora de seu caminho e agarrou seu pescoço:

—Você ficou louco, Petrarca? -Gritou ele.

Os homens a sua volta rapidamente apontaram suas armas para o pescoço de Blut, mas ele apenas ignorou. Petrarca abaixou a mão de Blut contra a sua vontade e sentou-se novamente em sua cadeira:

—Abaixem sua arma, ele é um velho amigo. -Disse Petrarca para seus homens. -Faz tanto tempo que não nos vemos e é assim que você me cumprimenta?

—Não mude de assunto! -Gritou Blut apenas mais estressado. Você sabe quais serão as consequências de sua ações?

—Eu tenho pleno conhecimento do que vai acontecer. -Respondeu Petrarca. -Mas eu já tomei minha decisão.

Blut fitou aquele homem com decepção:

—O que aconteceu com você, velho? Você foi alguém que eu admirei...alguém corajoso...não alguém que sacrificaria milhares de vidas por objetivos pessoais...

Petrarca sorriu levemente:

—É o que o medo faz aos homens. Você sabe mais do que ninguém que a minha força não se compara ao que era antes, que em breve tudo o que eu construí acabará. -Respondeu aquele velho homem. -Que em breve, meu reino será reduzido a pó e esquecido. Eu durmo todas as noites com medo que isso aconteça. Eu vivo todos os dias tentando ignorar isso.

Petrarca levantou-se novamente de sua cadeira e agarrou o camisa de Blut:

—Eu não quero acabar assim! -Gritou ele. -Não depois de tudo o que eu fiz! Por isso, eu vou conquistar Euler, eu vou fazer tudo o possível para estender a duração de meu reinado! Mesmo que eu tenha que sacrificar incontáveis corpos para isso!

Blut deu um passo para trás, no fundo, ele entendia como Petrarca sentia-se. Mas aquilo era simplesmente errado:

—Você me entende, eu sei disso. -Continuou Petrarca. -Todos aqueles que se sacrificaram pelo melhor desse reino, eu não poderia encara-los se simplesmente desistisse agora!

—Velho, eu te imploro, reconsidere sua decisão. -Disse Blut. -Eu sei que você não é nenhum idiota, você sabe que o que você está fazendo é errado.

Petrarca pousou sua mão na cabeça de Blut:

—Meu jovem, você cresceu muito desde a primeira vez que eu te encontrei mas sua mentalidade boba não mudou nenhum pouco. -Sorriu ele. -Para preservar certas coisas é necessário destruir outras, Euler cairá para que Kepler continue existindo. Eu os atacarei antes que eles me ataquem.

Blut tirou a mão de Petrarca de sua cabeça:

—Vocês estão condenados a falhar...

—Não com a ajuda dos Pecados Capitais.

—Eu sabia que eles estavam envolvidos nisso tudo, foram eles que mataram os Intocáveis?

—Os Intocáveis eram um obstáculo no meu caminho, eles precisavam ser eliminados. -Respondeu Petrarca.

Blut tentou pela última vez:

—Reconsidere, velho. Você ainda tem tempo.

Petrarca sorriu:

—Eu te deixarei sair vivo de minha cidade, mesmo que eu vá me arrepender disso, em honra a nossa longa amizade. Você conhece o caminho até a saída.

Blut caminhou lentamente até a saída junto de seu grupo. Todos permaneceram silenciosos até a saída daquele edifício. Blut não conseguia expressar sua raiva e frustração:

—Aquele velho maldito...

Enquanto o grupo preparava-se mentalmente para a guerra que se aproximava, Kurokawa tinha se focado em outra parte da conversa:

—Então foram os Pecados Capitais que mataram o tio...e o Takeda... -Aqueles pensamentos despertaram o mais profundo ódio em sua mente.

—Ei, você está bem, Kurokawa? -Perguntou Marwolaeth sentindo ódio exalando de seu corpo.

Ele rapidamente voltou sua atenção aos seus arredores:

—Eu estou bem...apenas estava...pensando em algumas coisas.

Kurokawa focou seus pensamentos e dirigiu-se a Blut:

—Blut, já que sabemos que o que está por vir é inevitável, qual será nosso papel nesse desastre?

—Não jogue na minha cara que é inevitável... -Reclamou Blut pensativo. -Eu não faço a mínima, os comandantes de Euler vão decidir o que faremos...

Kurokawa conseguia apenas pensar em poder ficar livre no campo de batalha e ir atrás dos Pecados. Ele faria tudo ao seu alcance para conseguir isso. Blut tomou seu rumo para casa enquanto tentava afastar sua melancolia:

—Vamos...não temos mais motivos para ficarmos aqui...

O caminho de volta foi muito mais silencioso e lento, todos apenas seguiram no mesmo ritmo de Blut. Quando lá chegaram, eles foram imediatamente dispensados e uma nova reunião foi marcada para a manhã do dia seguinte. Marwolaeth e Kurokawa caminharam juntos enquanto Micky e Blut continuarem naquele edifício:

—Blut...porque você está tão estressado? -Perguntou Micky encostada em Blut. -Você não gosta de alguma destruição e sangue?

—Todo o tempo que eu investi em Kepler será perdido nessa guerra, toda a minha influência lá será perdida... -Respondeu ele. -E além do mais, eu odeio simplesmente ser uma peça no jogo de alguém...

—Então você acha que os Pecados estão por trás disso tudo? Manipulando todos como se fossem brinquedos?

—Eu não tenho certeza, talvez sejam eles...talvez alguém esteja manipulando eles também... -Respondeu Blut. -O importante não é isso, eu poderei ganhar algum reconhecimento nos campos de batalha mas isso não se compara ao que eu ganharia evitando essa guerra. Eu poderia espalhar minha influência, eu poderia conhecer e controlar pessoas...todas essas opções serão destruídas com essa guerra estúpida...

Micky sorriu enquanto entendia cada vez a forma de pensamento de Blut:

—Entendo, você gosta de ter o controle das coisas e odeia ser controlado...Porque você quer ter tanta influência? O que te motiva a fazer isso tudo?

Blut afastou-a bruscamente com sua mão:

—Você está querendo saber demais. Irónico, não é? Justo você que nunca fala sobre si mesma.

—Não existe nada que você queira saber sobre mim. -Respondeu ela.

—Porque você sempre mente? -Perguntou Blut curioso. -Porque você sempre inventa histórias diferentes quando te perguntam sobre o seu passado? Porque você sempre dá respostas diferentes quando perguntam seu nome? O que você esconde?

Ela abaixou seu rosto e ficou pensativa por alguns segundos. Em seguida, ela abraçou o braço de Blut e deixou lágrimas escorrerem por seu rosto:

—Meu nome é Mary, meu pais foram assassinado quando era uma criança e eu também teria sido, se não fosse por uma pessoa... -Explicou ela. -Essa pessoa foi você, Blut! Você salvou minha vida e por isso eu sempre estarei do seu lado! Não importa o que aconteça!

Ela lentamente aproximou seus lábios dos lábios de Blut. Ele apenas pousou sua mão sobre o rosto dela e afastou-a mais uma vez:

—Você não precisa contar a verdade senão quiser, apenas não continue mentindo para mim, eu já estou cansado de suas atuações.

Ela limpou suas lágrimas enquanto se dirigia para a saída:

—Mentiras são parte do meu ser, não me peça tão casualmente para desistir disso.

Enquanto isso, Marwolaeh e Kurokawa finalmente puderam conversar após aquele grande intervalo de tempo. Kurokawa estava totalmente focado em conseguir vingança mas mesmo assim tentava agir normalmente:

—Como você tem passado? -Pergutou Marwolaeth puxando assunto.

—Muitas coisas aconteceram recentemente e eu acabei aprendendo várias coisas... -Respondeu ele. -Você estava certa...eu não deveria simplesmente abandonar meus amigos daquele jeito...

—Apenas não cometa o mesmo erro duas vezes. -Comentou ela. -É normal cometer erros...

Kurokawa interrompeu o fluxo da conversa subitamente:

—Bom...eu irei para casa...

—Eu poderia dormir na sua casa... -Sugeriu ela.

—Desculpa, eu estou com a cabeça cheia de pensamentos. -Recusou ele. -Eu gostaria de ficar sozinho por um tempo...

Ele virou-se e tomou seu rumo mas ela não podia deixar aquilo simplesmente acabar ali. Marwolaeth tomou a iniciativa. Ela puxou Kurokawa por seu braço e conectou seus lábios aos dele mas o que ela conseguiu foi diferente do esperado. Enquanto ela o beijava com amor e calor, o beijo de Kurokawa foi frio e desmotivado. Ela não teve palavras para expressar o que sentia e permaneceu parada.

—Até a manhã... -Despediu-se ele tomando seu caminho novamente.

Marwolaeth não conseguia tirar de sua cabeça que algo estava errado com Kurokawa. Confusa e ansiosa, ela seguiu lentamente para sua casa. Kurokawa chegou em sua casa e dirigiu-se para seu quarto, ele deitou-se em sua cama macia e desejou alguma tranquilidade. Seu corpo rapidamente encontrou o mundo dos sonhos. Mas algo estranho se sucedeu, sonhos tão reais ao ponto de parecerem memórias circularam sua mente.

Ele subitamente abriu seus olhos e viu uma figura familiar sentada em sua cama:

—Você... -Comentou Kurokawa surpreso. -Você tem aparecido com muito mais frequência ultimamente...

Aquela sombra riu:

—Aquele homem...se não me engano, seu nome era Toki, ele fez algo com você. Ele tirou aquilo que te separava de mim.

—Se você continuar falando por metáforas, eu vou simplesmente voltar a dormir. -Reclamou Kurokawa puxando seu coberto. -Eu não tenho tempo para perder com você!

Aquela figura começou a caminhar pelo quarto enquanto gargalhava:

—Então você quer saber a verdade? A verdade da qual você fugiu durante todo esse tempo? Que irónico...

—Eu tenho uma noção do que aconteceu, em todas as minhas alucinações e sonhos com você, eu acabei descobrindo algumas coisas. -Respondeu Kurokawa. -Mas existem algumas coisas que simplesmente não fazem sentido...

—Vamos voltar um pouco no tempo, alguns dias antes de você conhecer Lizzy, supostamente a primeira vez que você entrou nesse mundo bizarro. -Começou a explicar ele. -O que te fez entrar nisso tudo? Você ter ficado entediado? Mas aquela foi a primeira vez que você quase morreu de tédio? Ou aquela foi apenas uma vez de várias outras?

—Onde você está querendo chegar? -Pergutou Kurokawa.

—Aquela não foi a primeira vez, você já esteve nesse mundo várias vezes antes, é por isso que você é capaz de lidar tão bem com as coisas. -Respondeu aquilo. -Você ficava entediado, aquele menu aparecia em sua frente, você entrava nesse mundo, conhecia alguns amiguinho e quando tudo dava errado...você simplesmente esquecia...

—O que você quer dizer?

—Todas esses sonhos que você está tendo são memórias, mais especificamente, memórias minhas! Quando alguma coisa dava errado e você não era capaz de suportar, como por exemplo, a morte de seus amigos, você guardava essas memórias em mim e esqueci-as. Mas quando Toki mecheu em sua cabeça, todas essas memórias voltaram para você. Que conveniente, não é mesmo? Mesmo você tendo me usado por tanto tempo...no final...não houve diferença...

Kurokawa permaneceu calado por alguns segundos, finalmente todo o ódio que aquele ser sentia foi justificado. Ele sentiu uma culpa correr por seu corpo:

—Desculpa... -Sussurrou Kurokawa. -Você deve ter sofrido bastante...

Aquele ser gargalhou incontrolavelmente enquanto rolava no chão de forma histérica:

—Pare!!! Meus pulmões não aguentam rir tanto assim!!!

—O que é tão engraçado assim? -Perguntou Kurokawa.

Aquilo rapidamente avançou na direção de Kurokawa e ficou a centímetros de seu rosto:

—Você achar que entende minha dor. Você é apenas um moleque mimado que joga todos os seus fardos em minhas costas e agora você se desculpa achando que me entende? Eu te mataria...se pudesse...

Kurokawa tentou se afastar:

—As memórias que eu guardo podem não te afetar muito agora mas não se preocupe, no futuro, quando você estiver perdido, questionando suas decisões, elas pesarão. -Sorriu aquilo loucamente. -E eu vou estar lá, para aliviar o peso mais uma vez...só que dessa vez, eu pegarei tudo para mim. Você finalmente entenderá o que significa ficar preso na escuridão infinita apenas recebendo dor todos os dias...E você vai quebrar...assim como eu quebrei...

Aquela coisa simplesmente desapareceu e Kurokawa ficou alguns minutos pensando no significado de suas palavras. O resto da noite foi perturbada por aquelas memórias e Kurokawa quase não conseguiu dormir.