P.O.V Nard

Por mais que eu tivesse uma quantidade absurda de adrenalina no meu corpo, eu não pude evitar de sentir um calafrio ao ver o primeiro ciclope cruzar a barreira, berrando incontrolavelmente. Ethan, o campista mais velho do Acampamento, conseguiu acertar o ciclope com uma faca que ele mantinha na cintura, enquanto usava a outra mão para perfurar a montanha de ciclopes do outro lado. Ele conseguiu matar o ciclope, mas logo depois, três ciclopes atravessaram e um deles conseguiu colocar sua espada no seu coração, o matando na hora. O resto dos Campistas de lá foram praticamente massacrados à medida que mais e mais ciclopes atravessavam a barreira. Era possível ver um ciclope ou outro levar uma flechada enquanto avançava em nossa direção, mas não o suficiente para impedir o avanço dos outros.

Minhas duas espadas já estavam desembainhadas, e minhas luvas vermelhas, que agora estavam parecendo um trapo de tão rasgadas, seguravam ambas espadas na formação de defesa. Eu estava na frente do resto dos Campistas, o que significava que eu tinha uma vista de camarote do avanço dos ciclopes, e os poucos segundos que eles demoraram para nos alcançar pareciam horas, e o som pareceu sair dos meus ouvidos, como se todo o barulho do mundo tivesse sido colocado embaixo d'água. O primeiro ciclope da coluna de invasores finalmente me alcançou, e o som pareceu voltar com tudo no segundo em que nossas lâminas se encontraram. Bloqueei a enorme espada dele com minha espada direita, e usei a pegada invertida da minha outra espada para acertá-lo nas costelas.

Mais e mais ciclopes se aproximaram, e pude ver outros Campistas lutarem com ciclopes no meu canto de olho, enquanto eu acertava dois ciclopes em rápida sucessão. Mais e mais ciclopes apareciam, e mais sangue místico era derramado à medida que suor descia de todas as partes do meu corpo. O cheiro de morangos do Acampamento foi substituído por um cheiro de morte, e um gosto forte de bile estava na minha boca. Um ciclope conseguiu acertar minha perna com sua lança pouco antes de levar uma flechada na cabeça. Praguejei em voz alta e acertei outro ciclope que estava do meu lado.

O fluxo constante de monstros só aumentava, e sem que eu mesmo percebesse, nosso grupo andava cada vez mais para trás. Barulhos de metal batendo em metal podiam ser ouvidos de todas as direções, e faíscas eram visíveis a todo momento. Eu não sabia quanto tempo havia passado, mas eventualmente todos nós acabamos quebrando a formação e ficando espalhados no espaço aberto entre construções. A batalha virou praticamente várias lutas de 1 contra 1, sem muita organização, era apenas derrubar um oponente e procurar o próximo. Ciclopes pareciam preencher o espaço como água enchendo um copo, e era quase impossível parar para recuperar o fôlego nem que por poucos segundos.

Corpos de ciclopes e Campistas cobriam o chão, enquanto enfermeiros tentavam andar em meio à carnificina para recuperar Campistas sem serem mortos. Paramos de ter o suporte dos arqueiros, já que agora corríamos o risco de acertarmos nós mesmos, e desceram dos telhados, pegando armas de corpo-a-corpo, como facões e adagas. Consegui derrubar mais dois ciclopes de uma vez, enquanto gotas de sangue voavam no meu rosto, vindos de um Campista do meu lado, acertado por um dos ciclopes. Um ciclope maior veio em minha direção, segurando um machado enorme, e um Campista de Hefesto o derrubou com um martelo. Olhei para o lado rapidamente, e pude visualizar rapidamente Sophie lutando contra um ciclope, com ajuda de um outro Campista de Hermes que eu não conhecia. Ela tinha um pedaço de pano cobrindo ambos os olhos, provavelmente pela enorme quantidade de poeira sendo levantada no chão, e que para ela não deveria fazer muita diferença.

“Você realmente deveria parar de tentar, todo mundo já sabe que você não consegue acertar nada”, ouvi alguém falar, e reconheci imediatamente de onde a voz veio. “Não, não, não, não, não, agora não é uma boa hora pra vocês ficarem falando”, pensei, notando que as vozes decidiram voltar justo no meio de uma batalha. Dei uma cambalhota para frente rapidamente para evitar um ciclope de me acertar, e golpeei a perna dele. “Não adianta em nada você ficar pulando de um lado pro outro, só desiste logo”, elas continuaram, e eu tentei ignorá-las. Percebi que minhas pílulas ainda estavam no meu bolso, e engoli logo umas 15 de uma vez, tentando focar na batalha.

Um ciclope atravessou o coração de um campista na minha frente com uma espada, e eu corri rapidamente em sua direção, acertando ele no pescoço, de forma que ambos caíssem na crescente pilha de corpos no chão. Um garoto de Hermes com uma espada flamejante conseguiu acertar um ciclope nas costelas, o que causou este a sair correndo e dar de cara em uma das armadilhas nas laterais do Acampamento. Um ciclope apareceu do meu lado, e alguém acertou uma flecha nele antes mesmo que eu pudesse me defender.

O caos dominava completamente o campo de batalha, e o número de ciclopes não parecia diminuir independente de quantos ciclopes eu matasse. Eu percebi que eles estavam conseguindo nos cercar, e que começavam a nos esmagar no centro do acampamento. Eles batiam no chão com escudos e apontavam lanças para nós, nos forçando a recuar cada vez mais. Quando estávamos quase esmagados, eu vi que vários Campistas fechavam os olhos, esperando o inevitável. Abracei a pessoa mais próxima que eu vi, que acabou sendo Sophie, e fiz o mesmo que os outros Campistas, fechando meus olhos e esperando o golpe que me finalizaria.

Houve um barulho de trovão, e um grito vindo dos ciclopes logo após. Um dos pedaços do círculo de ciclopes caiu no chão, e pequenas chamas saíam de lá, implicando que um raio havia saído dali. Logo percebi que Zeus havia decidido levantar a bunda do Olimpo e fazer algo de útil pelo menos alguma vez na vida, e nos ajudado. Saímos correndo onde o círculo havia sido aberto, e a única coisa que eu conseguia pensar era “Se for pra ser um ex machina, podia ter feito isso antes né filho da puta?”, já que muitos Campistas haviam morrido antes de Zeus decidir nos ajudar.

“Recuar!”, ouvi os ciclopes falarem, e eles saíram correndo em direção à floresta, com alguns deles caindo em armadilhas dos filhos de Hermes e Hefesto. Dos 400 Campistas de antes da batalha, pelo menos 100 estavam mortos no chão, e o dobro disso estavam feridos e sendo atendidos pelos paramédicos, que iam e voltavam tentando focar a atenção entre os vários pacientes. Nós havíamos ganhado, mas eu não me sentia triunfante. Um turbilhão de emoções passava pela minha cabeça: as vozes em meio à batalha, os corpos caídos no chão, eu ter quase morrido, o que havia sido destruído pelos ciclopes, os campos de morangos esmagados, chalés danificados, e no geral todo o dano emocional que havia sido causado a todos nós. Havíamos ganhado, sim. Mas ninguém havia saído vitorioso: os ciclopes voltariam eventualmente, e um quarto do Acampamento estava morto. Não tínhamos o que celebrar, apenas tínhamos o cheiro de morte no ar.