In My Dreams

Alma de artista


Desde criança, Mina fora ensinada a dar o seu melhor em tudo o que fazia. Esse tipo de pensamento a fez se tornar uma pessoa extremamente focada no presente, seu maior raio de futuro sendo os próximos exames a serem feitos. Igualmente, de alguma maneira, ela sempre vira as pessoas ao seu redor como pessoas do presente. Em algum momento, acreditava que todo seriam substituídos por outras pessoas, e isso era o que chamava de “ciclo da vida”. Ela pensava na palavra “futuro” como algo extremamente subjetivo, e de fato era...O futuro não se resume à cinco ou cinquenta anos à frente. Cinco minutos a contar dessa hora já faz parte do futuro, certo?

Sua insegurança com o que estava por vir talvez parecesse sem sentido, mas Mina não estava preparada para grandes mudanças. Aquela poderia ser a sua chance de brilhar, mas ela não tinha certeza se era o que queria fazer para o resto de sua vida. Mina sempre fora conhecida por sua perfeita mistura de racionalidade com sensibilidade, mas o lado racional sempre se desligava quando confrontada com esse assunto. Mina só sentia... E sentia medo.

As palavras vindas de Sana a fizeram pensar pela primeira vez que ela talvez já carregasse parte de seu futuro consigo e esse pensamento foi o suficiente para aliviar seu coração. Por hora.

***

Mina estava sentada em sua escrivaninha. Batia com a ponta do lápis sobre a folha branca do caderno insistentemente, não conseguia se concentrar na matéria de química que tinha a intenção de rever. Em sua mente, passavam flashs dos últimos sonhos, da conversa com sua professora de balé e das três amigas. Sua mente, antes tão disciplinada, repentinamente parecia tomada por um turbilhão de coisas distrativas e ela suspirou.

­- Ligações de carbono, eh...? - Murmurou. - Me resolvo com vocês mais tarde.

Deixou o lápis sobre a folha de caderno cheia de pontinhos e levantou-se, saindo do quarto. Pretendia ir até a cozinha tomar água e quem sabe depois jogar uma água gelada no rosto, para retomar parte da concentração perdida há dias, quando olhou para a estante da sala. Seu console estava ali, parado há vários meses. Ponderou as opções por alguns instantes e então deu de ombros.

***

— Fazia tempo que eu não via você fazendo isso. - Sana franziu a testa logo que saiu do quarto.

Mina estava sentada de pernas cruzadas no chão da sala, jogando videogame. Não virou o rosto para a melhor amiga, mas Sana sabia que ela estava sorrindo. Sana fechou os olhos quando a cabeça de um personagem explodiu na tela.

— YAY! - Mina comemorou, soltando o controle e levantando os dois braços. - Headshot! Não perdi o jeito.

— Você deveria rever o tipo de coisa que joga. - Sana sacudiu a cabeça. - Que tal The Sims?

— Você está brincando, né? - Mina virou-se finalmente, a expressão de desgosto fez Sana rir.

— Por quê? É um jogo ótimo!

— Você precisa aprender muito sobre videogames, Minatozaki. - Mina revirou os olhos.

— Nah, eu estou muito bem assim. - Sana jogou-se no sofá.

Mina não jogava videogames desde que se tornara presidente do Conselho Estudantil, há cerca de um ano. Os jogos costumavam ser uma forma de escape para si quando mais nova, sempre que estava cansada dos compromissos que deveria cumprir ela passava horas imersa em algum novo mundo - mas todos eram agressivos demais na opinião de Sana, então aquele era um prazer que não dividiam.

— Minari...

— Hm?

Sana esperou que Mina terminasse a partida antes de se sentar corretamente no sofá e quebrar o silêncio entre as duas.

— Você já decidiu o que fazer?

Mina suspirou antes de virar-se.

— Eu vou participar da seleção. Não vai me matar, certo?

Sana sorriu.

— Eu tenho um bom pressentimento sobre isso.

— Fico feliz que você saiba classificar seus ‘pressentimentos’... E espero que esteja certa.

— Minari, eu sei que você está incerta sobre o que fazer. Você pensa demais sobre isso e esse é o maior problema... Não pensa. Faz o que você sente que deve ser feito.

Mina desligou o console e deixou o controle sobre a estante.

— Eu só sinto medo, Sana.

— O medo que você sente é de escolher um caminho e dar errado. Eu conheço você, Mina, e conheço muito bem. Sei que você pensa que deve se formar no ensino médio e ir para alguma faculdade, de preferência de prestígio, e fazer algo como medicina ou engenharia. Isso foi o que ensinaram a você que era certo, para que sua vida dê certo. Mas isso nunca foi uma opção... Minari, você tendo notado ou não, você tem alma de artista. - Esperou até que Mina se acomodasse no sofá. - Veja bem, chegou a sua hora de escolher entre o que é certo, e o que é fácil.

Mina não segurou a gargalhada, mesmo com a seriedade no tom de voz de Sana.

— Dumbledore ficaria orgulhoso de sua aprendiz.

— Sabe que eu não falei brincando.

— Eu sei, Sana-chan. - Mina apoiou sua cabeça no ombro da amiga. - Eu nunca poderia pedir por amigas melhores.

— E eu sou a melhor delas. - Sana riu por alguns segundos e então ficou séria novamente. - Existe algo te guiando ao caminho certo, Mina. Não sou eu e eu não sei o que é. Mas sei que te faz bem e mesmo não sendo algo que você ainda entende, é bom. Talvez seja tudo o que você sempre precisou.

***

O som da música clássica preenchia o ambiente. De frente à janela, a silhueta pequena e delicada tinha seu rosto completamente coberto pelo cavalete e a moldura à sua frente. Seus dedos estavam coloridos em diversos tons e a paisagem à sua frente tomava forma a cada minuto. O troco da árvore, e então suas folhas. As pétalas rosadas flutuando pelo ar, algumas já descansando sobre o chão. O pôr-do-sol começava a ser desenhado e o esboço de uma figura feminina tinha lugar de destaque sobre a tela.

***

Jeongyeon abriu a porta vagarosamente, tentando não fazer barulhos muito altos. Aquela porta rangia muito e ela sabia que fora deixada daquele jeito propositadamente, a irmã odiava quando entravam naquela sala sem avisar.

Sorriu ao vê-la adormecida sobre o piano, a proteção das teclas ainda abaixada. Aproximou-se e parou próxima ao corpo pequeno. Começou a acariciar os cabelos curtos.

— Chaeyoung-ah... Acorda. Você vai se sentir mal se dormir aí.

A menina levantou a cabeça e abriu os olhos lentamente, parecendo confusa.

— Unnie...?

— Você está se esforçando demais nos últimos dias. Dorme direito hoje à noite, sim?

Chaeyoung sorriu.

— Jeong-unnie... Eu tenho dormido melhor do que nunca.

***