Mereth in Gillith

Era noite de solstício de Verão. O ar refrescante da primavera agora tomava uma quentura agradável e as mangas longas das roupas dos elfos foram substituídas por camisas simplesmente e leves, para as elfas quase sempre sem manga. As palavras de Estel voltaram para sua boca quando viu Arwen no meio dos elfos no salão de Elrond, ela vestia um vestido leve, de cores lilás e branco, com aberturas nas mangas deixando parte de seus braços à mostra. A cor deixava seus cabelos ainda mais escuros e brilhosos sob a luz da lua e das lamparinas que as crianças élficas fizeram com vagalumes que pegaram na floresta.

Legolas passou por ele e seguiu seus olhos até Arwen.

— Precisa de um babador? — Provocou e só então ele voltou a si e o empurrou para que fossem logo.

Encontraram Daeron, Elladan e Elrohir escondidos em algum canto do salão próximos aos barris de vinho, então sentaram-se com eles, enquanto fofocavam algo a respeito de um conselho de magos, um Hobbit que havia entrado em uma montanha com um enorme dragão adormecido e fofocavam sobre a ideia de que sua avó, Galadriel possuía uma espécie de Romance com o Istari Mithrandir.

Estel não prestava atenção em absolutamente nada do que eles falavam. Estava particularmente interessado no que ocorria do outro lado do salão. Glorfindel conversava com Elrond alguma coisa que ele não conseguia ouvir já que haviam muitos elfos por lá conversando e rindo e ele viu um em particular aproximar-se de Arwen, que até então estava conversando com os menestréis. A conversa pareceu acalorada e aquilo lhe desagradou em parte, embora não imaginasse o motivo de sentir-se enciumado por ela. Antes por Glorfindel, mas aparentemente não havia nada entre eles, senão uma forte e milenar amizade. Já este outro, ele não conhecia, e aparentemente Legolas também não. Mas Elladan,pareceu deveras desgostoso ao notar a presença do sujeito, como se estivesse na presença do próprio Morgoth em pessoa.

— Não é, Calion, filho de Caranthir? — Elrohir olhou para o outro lado também.

— Quem, o menestrel?

— O próprio. — Disse — Conversando com Arwen, do outro lado. — Apontou Daeron. Ele e os primos tinham lá suas desavenças com Calion, mas aquilo não era surpresa, já que possuíam desavenças com metade dos Elfos da Terra média. Sua avó dizia que mais eram parecidos com os primos, filhos de Fëanor, embora eles não fossem cruéis nem maus como essa parte da família.

— Eu vou tirá-lo agora! — Legolas pôs o braço na frente de Elladan, impedindo que este acabasse criando alguma confusão da qual facilmente se arrependeria.

— Espere, Elladan. — O elfo parou no meio do caminho, e o alvoroço chamou a atenção de Calion, que os olhou, mas não deu a devida importância. Apontou algo a Arwen do lado de fora, e pôs a mão na cintura dela, guiando nessa direção. — O que ele faz aqui?

— A mim não interessa, desde que ele tira as mãos da minha irmã. — Levantou-se e foi na direção da saída, sendo seguido pelos outros três. Calion era um dos netos de Caranthir, filho de Feanor, quase tão antigo quanto a própria Galadriel, e tão maligno quanto qualquer um de sua linhagem. Os filhos de Elrond não confiavam nele, e imaginavam que suas reais intenções eram obscuras e perversas, como foram as de seu ancestral, Fëanor e de seus tios Curufin e Celegorn.

E talvez de fato o fosse, embora não pudessem acusá-lo de crime algum que não fosse o de estar evidentemente rondando sua irmã como uma ave de rapina perto de sua presa. Arwen, no entanto, não estava interessada nele, ao menos não como os meninos imaginavam, ela o fizera companhia por algum tempo, escutando-o falar por horas inteiras sobre a música e a maneira correta para segurar uma harpa de forma decente.

— Pois se encurvar-se demais, perderá rapidamente o fôlego e terá de pausar os dedos mais vezes do que o necessário. — Disse, enquanto lhe mostrava a forma correta, ajustando o instrumento dourado ao corpo da jovem eleth.

Elladan e Elrohir pareceram incomodados ao vê-lo perto de Arwen, mas Estel poderia arrancar-lhe as mãos se ele a tocasse mais uma vez. Dos quatro, Legolas, provavelmente era o mais sensato e precisava lembrar-lhes com frequência de que estavam em um local público.

— Em verdade, primo, você sabe como manusear uma harpa. — Ele se encheu de orgulho ao ouvi-la dizer aquilo. Pegou o instrumento e o colocou de lado, então puxando-a pelos dois braços, a colocou de pé diante de si.

— Eu sou um músico, Arwen. — Levou a mão com delicadeza ao rosto dela e afastou uma das mechas negras de seus cabelos, encurtando aos poucos a distância entre eles.— Mas não viajei de tão longe para trocar notas e acordes. Estive pensando em você nos últimos dois séculos.

Seus olhos se arregalaram e ela se afastou, espantada com suas palavras.

— Esteve?

Calion concordou.

— Espero que não tenha se esquecido. De quando juramos ficarmos juntos por toda a eternidade.

— Isso... — Arwen estava corada e não tinha respostas para dar-lhe. Na verdade, os elfo poderiam se lembrar até mesmo dos primeiros momentos de sua vida, mas ela não poderia se responsabilizar por aquilo, era uma elfing, com menos de vinte anos na contagem dos Eldar. — Foi há muitos séculos, Calion. Éramos crianças.

— Eu falei a verdade. Amava você naquela época, como amo agora. — Tentou pegar a mão de Arwen, mas Elladan se intrometeu, puxando a irmã para o seu lado.

— Fique longe dela. — Ordenou.

Elrohir e Daeron surgiram logo depois, mas Legolas impediu que Estel se metesse, dizendo que talvez fosse melhor chamarem o senhor Elrond antes que as coisas saíssem dos controle.

— Ah, e Elladan e Elrohir. — Olhou com escárnio para os gêmeos e com maior desprezo ainda para Daeron. — E esse cara.

— O que quer aqui, Calion? — Daeron não pareceu importar-se com as caras e bocas do sujeito.

— Era exatamente o que eu dizia para Arwen, quando vocês atrapalharam. — Os meninos a olharam e ela concordou, afirmando que Calion dizia a verdade, ou ao menos lhe parecia que sim. — Eu vim pedir a seu pai, a mão de Arwen em casamento.

Por alguns minutos, apenas a música e o falatório dos convidados de Elrond foram ouvidos. Os rapazes ficaram tão surpresos em ouvir o que Calion dissera quanto a própria Arwen, que até onde se lembrava não havia prometido casar-se com ele. Mas a calmaria foi interrompida quando Elladan, o gêmeo mais velho e menos sensato desembainhou uma longa espada, apontando-a na direção do pescoço de seu primo, e então lhe disse:

— Só existe um meio pelo qual poderás desposar minha irmã, Calion, filho de Caranthir. E é passando por cima do meu cadáver.

Quando ele disse isso, Elrohir, seguiu o irmão e também desembainhou a espada, apontando-a para o Elfo mais velho, que em momento algum pareceu intimidar-se pela ameaça dos dois. E embora estivesse desarmado, manteve a compostura.

— Elladan... — Arwen chamou a atenção do irmão. — Precisa se acalmar. Não queremos criar confusão logo hoje.

— Fale por você.

Ele levantou a lâmina, encostando-a no pescoço do Elfo mais velho, que sorriu cinicamente para ele e com hábeis e rápidos movimentos, chutou para longe a espada e saltou sobre Elladan, que caiu ao chão juntamente com ele, prendendo-o em uma chave de braço. Elrohir foi ao socorro do irmão gêmeo, mas também acabou sendo desarmado, então acertou o rosto de Calion com o próprio punho, fazendo-o soltar o irmão.

— Tirem Arwen daqui! — Gritou Daeron, enquanto ajudava a levantar Elladan, que já estava possesso de raiva.

Estel pegou a mão da elfa, afastando-a, a contragosto da confusão na qual ele mesmo não ousava meter-se. Não que não sentisse um incômodo ao ver Calion próximo a Arwen, mas sentia que talvez fosse enorme insensatez brigar por causa disso, além do mais, não o conhecia bem e até que ele começasse a falar bobagens sobre casamento, não havia cometido crime algum.

— Eles estão fora de si. — Observou Legolas, que também não havia tomado parte na briga. — É melhor chamarem Elrond, antes que derrubem toda a casa.

Eles assentiram a isso, então deixaram rapidamente o jardim e correram para o interior da festa. Elrond, ainda recepcionava os convidados quando os viu chegarem apressados. Imaginou logo que alguma coisa poderia estar acontecendo, então adiantou-se em sua direção e antes que abrisse a boca para dizer qualquer coisa, Arwen despejou sobre ele as notícias do que acontecia no jardim. A expressão, normalmente serena de seu pai, se fechou e tornou-se irritadiça. Ele desceu até o Jardim, onde agora estavam Elladan e Elrohir amontoados sobre um único elfo, enquanto Daeron observava e ria da cena. Legolas, não movera um músculo, exceto os de seu rosto, mostrando-se aliviado com a chegada do senhor de Valfenda.

— Eu posso saber, o que, em nome dos Valar, está havendo aqui?! — Esbravejou ele para cima dos elfos, que ficaram imóveis onde estavam. Elrond tratou de puxar os dois filhos pelas golas das camisas, cada um por uma mão, arrancando-os de cima de Calion e seu olhar furioso foi suficiente para fazer com que Daeron se afastasse.

— Ele começou! — Todos os quatro disseram juntos. Os gêmeos apontaram os dedos acusadores para Calion e Daeron fazia o mesmo, enquanto Calion acusava os primos de o terem atacado primeiro.

— A mim não interessa saber quem começou. — Olhou ao redor. Alguns dos olhares já se voltavam para fora, e logo os convidados estariam curiosos para saber o que acontecia e qual era o motivo da confusão. — Vocês todos para o meu escritório. — Ordenou o senhor Elrond e olhou para Estel, Arwen e Legolas, que não se moveram. — Eu disse todos vocês.