The Sword that was broken

Merry acordou no meio da noite, pensando ter ouvido passos ecoarem pelo quarto. Abriu os olhos e viu Pippin esgueirando-se na escuridão em direção à cama de Gandalf, que dormia de olhos abertos, com a Palantir entre os braços. Ele andava com ela para cima e para baixo desde que deixaram Isengard, por medo que algum desavisado fosse tentado a "espiar" por ela e chamar a indesejada atenção do inimigo. Passolargo não estava por perto, nem Legolas. Apenas Gimli roncava feito um porco em algum canto próximo a eles.

— O que está fazendo? — Sussurrou Merry para o amigo.

— Só quero dar uma olhadinha.

Com um sorriso travesso, Pippin agitou as mãos na frente do rosto do Mago para ter certeza de que este estava dormindo, o que para sua alegria, estava. Ele pegou um vaso pesado de barro e o colocou no lugar da pedra arredondada, puxando-a para a própria mão.

— Gandalf disse que não deveríamos…

— Shhh! — Ralhou. — Gandalf sempre está muito emburrado com tudo. Uma olhadinha só não nos fará mal.

Então descobriu a pedra, que estava envolta por um manto branco e no momento em que a tocou, foi como se pudesse ver todas as coisas da Terra Média. Então a visão de um grande olho sem pálpebras, envolto em chamas, preencheu todo o círculo da Palantir e as mãos de Pippin ficaram presas na mesma. A pedra ardia e queimava e ele soltou um grito agudo de dor, enquanto Meriadoc tentava libertá-lo.

— Mas o que, por todos os Valar?! — Gandalf despertou com os gritos dos pequenos e correu até eles. Aragorn, Legolas e Gimli também apareceram e observaram enquanto o Mago cobria novamente a pedra. Ele olhou com reprovação para os hobbits. — Peregrin Tuk! Posso saber por que razão infernal você inventou de mexer com isso?!

Ele ficou em silêncio, ainda sem entender a dimensão do que havia desencadeado. Um longo sermão seguiu aquelas palavras e Gandalf, após xingar a tudo e a todos, pegou Peregrin quase suspendendo-o pelo capuz e o montou sobre Scadufax, montando logo em seguida. Foi um sacrilégio separá-lo de Merry, e Aragorn precisou convencê-lo mais de uma vez que Gandalf não o jogaria no fogo montanha da Perdição. E com muito custo, despediram-se.

Depois de quase nove dias, um mensageiro chegou a Théoden avisando que os faróis estavam acesos. Gondor requisitava sua ajuda. Então novamente, eles se levantariam para partir. Merry choramingava com Gimli dizendo que não queria deixar Edoras sem seu amigo ter retornado, mas o anão insistiu que um verdadeiro guerreiro deveria ir sem medo à batalha e não abrir a boca feito "mulherzinha".

— Quase está parecendo Legolas. — Provocou o anão.

— O que tenho a ver com isso? — Indagou o príncipe elfo, que até então estava quieto afiando suas flechas e fazendo outras. — Deixe-o em paz, Gimli. Não é culpa de ninguém se você é um insensível.

— Insensível, eu?! Ora, seu…

— Bom, — Interrompeu Legolas. — Pode dizer a quem quiser que pareço uma “mulherzinha”, mas não fui eu quem começou a choramingar quando teve de se afastar de Lórien e da Senhora Galadriel. — Zombou, levantando-se e imitando os movimentos de Gimli. — “Ain, minha nobre senhora, tudo que peço é uma mecha de seu cabelo para me acompanhar na viagem!”

Merry riu. Sequer passou por seus pensamentos que essa era realmente a intenção do elfo, distraí-lo da saudade de seu amigo. E claro, também se aproveitava para poder chacotear com Gimli.

— Ora, cale-se! — Disse o anão com gravidade na voz. — E quem, eu me pergunto, foi o chorão que ficou horas e horas olhando na direção de Fangorn e riscando “Legolas e Tauriel, amor eterno” em várias árvores de lá até Isengard? — Gimli fingiu que iria vomitar. — Você consegue ser mais deprimente que Aragorn.

— Pelo menos não sou um ilibado de cento e trinta e nove anos.

— Ah, me poupe! — Bufou o anão. — Como se você, meu honrado príncipe elfo, tivesse conseguido muito mais coisa em cinco séculos de vida.

A discussão se estendeu por muito mais tempo, e Merry lembrava-se de ter adormecido ainda ouvindo-os discutir sobre coisas que ele sequer ousaria pronunciar num jantar de família. No dia seguinte, levantou antes do nascer do sol. Apenas Gimli estava com ele, limpando e polindo o machado, e resmungando que não pudera dormir, pois Legolas ficava perambulando pelo quarto feito um fantasma.

— Se aquela coisa não dorme, então porque não vai arranjar outra coisa para fazer? — Reclamou. — Mas crê-me, mestre hobbit, que a intenção daquele elfo é ver-me irritado. Ainda assim, o considero como amigo.

Os Rohirrim partiram antes do meio-dia para o Norte, na direção de Osgiliath, passando pela região das montanhas, até acamparem, ao fim do dia, no lado leste da encosta de Emyn Arnen, e do leito do rio Anduin. Merry fora com eles, embora contra a vontade de Théoden, que também havia proibido sua sobrinha, Éowyn de acompanhá-los. Ele a havia nomeado Marechal da Terra dos Cavaleiros e dito que ficasse em Edoras com o comando do povo em suas mãos. Mas Éowyn ansiava pela batalha e por vingar o sangue de Théodred e de seus pais e de todos aqueles que caíram sob a clava esmagadora do inimigo. Por essa razão, vestiu-se como um cavaleiro e montou em um cavalo para a batalha, levando Meriadoc consigo. Ambos ficaram escondidos em uma das tendas, sem levantar suspeitas, exceto por Aragorn, que quando a viu junto aos demais no acampamento, passou um longo tempo olhando diretamente para ela. Mas ele não pareceu disposto a delatá-la. Na verdade, sua atenção foi tomada por algo em uma fenda da montanha.

O ar ali era frio e encheu-os de dúvidas. Os cavalos se agitavam e se afastavam da montanha. Aragorn pensou ter visto uma forma humanoide, translúcida como uma fumaça fina esverdeada, olhando diretamente para ele. Ignorou aquilo e virou-se para ir procurar por Gimli e Legolas antes que um atirasse o outro montanha abaixo e seu corpo se chocou com o de Éowyn, que agora estava inconvenientemente perto.

— Ah, perdoe-me. Não tinha visto você aí.

— Oh, não! Perdoe-me a mim, meu senhor! — Disse ela.

— Aragorn, apenas. — Ele pediu. — Seu tio não disse que não deveria vir conosco?

— Bem, sim. Mas… Eu precisava vir. Quero dizer quem irá protegê-lo?! Éomer estará ocupado na batalha.

— É uma boa desculpa. — Riu Aragorn. E um silêncio desconfortável se fez entre eles.

— Ah, eu quase me esqueci! — Éowyn disse em um sobressalto e empurrou-lhe uma tigela quente com um ensopado. — Pensei que estivesse com fome. — Aragorn pegou nas mãos a tigela e agradeceu-lhe, com esperança de que a menina se afastasse, mas ela não o fez. — Experimente. Eu mesma o fiz. — Disse ela sorridente como uma criança orgulhosa.

Ele levou uma colherada na boca, mastigou e achou difícil engolir. A olhou em silêncio e forçou-se a digerir o ensopado. Éowyn sorriu para ele com satisfação.

— Muito bom. — Mentiu descaradamente. Talvez se a encorajasse ela se aperfeiçoaria na culinária. Ou não. Legolas lhe dizia que se alguém fazia algo de modo horrível, era melhor que lhe fosse dito logo, e assim, desistiria e procuraria outro ofício. Mas ele tinha a impressão de que aquelas eram na verdade palavras do Rei Thranduil, que seu amigo guardava e repetia.

No entanto, Éowyn ficou tão feliz e radiante com a concordância dele que quase se sentiu culpado por não lhe contar a verdade. Ele aproveitou a distração da garota e tentou se livrar do ensopado vil, mas aparentemente, a benção dos valar o haviam deixado naquela tarde, pois logo ela voltou e ele teve novamente que forçar-se a comer. Legolas surgiu minutos depois com um sorrisinho idiota nos llábios, ao menos para ele. Parou ao seu lado e suspirou com um ar zombeteiro.

— Quase senti pena de você de onde eu estava. — Riu. — Gimli e eu apostamos quantas colheradas você conseguiria enfiar na boca sem vomitar.

O anão apareceu logo depois e entregou uma bolsa com moedas ao elfo e murmurou:

— Tratante.

— Eu devia fazê-los engolir um caldeirão daquilo. — Disse Aragorn contrariado.

Os outros dois começaram a rir, mas foram interrompidos por um dos mensageiros do Rei Théoden, que chamou Aragorn em particular, dizendo-lhe que alguém viera de longe para vê-lo. Deixou seus amigos e o seguiu até a tenda do próprio rei, onde uma figura alta envolta por uma capa cinzenta e um capuz o aguardava. Elrond descobriu a cabeça e o olhou diretamente nos olhos, sua expressão era séria, mas aquilo já era comum vindo dele.

— Meu senhor…?

— Vejo que andou ocupado.

— Bem, sim, nós… Estamos em guerra. — Disse como se fosse óbvio, e de fato era.

— Eu vi navios vindo do Leste em sua direção. — Avisou Elrond. — Homens e Orcs, servos de Sauron, milhares deles. Centenas de navios. Mais deles vão em direção a Minas Tirith por terra. Vão atracar em Osgiliath pela manhã. Precisa detê-los.

— Não sei se posso. — Sua voz soou baixa e desanimada. — Nosso exército não é grande o suficiente, não temos homens.

— Ah, eu tenho certeza de que dará um jeito. — Disse Elrond com seriedade. — Há outros que podem se juntar a você. Há os que vivem na montanha.

Ele engoliu em seco e a lembrança do fantasma que o encarava na fenda passou rapidamente por sua mente.

— Eles são perjuros, mercenários. Não respondem a ninguém.

— Eles responderão ao rei de Gondor! — Então, o elfo tirou de dentro da capa uma espada embainhada e lhe entregou.

Aragorn desembainhou a espada e reconheceu o punho logo de imediato. Era Narsil, a espada de Elendil e em sua lâmina, em ambos os lados estava uma inscrição: Nányë Andúril i né Narsil i macil Elendilo. Lercuvanten i máli Mordórëo, e isso se traduz em: Eu sou Andúril, que era Narsil, a espada de Elendil.

Os lábios de Aragorn se entre abriram em um misto de assombro e contentamento. Então ele pegou Ringil, desatando-a de seu cinto e a entregou a Elrond, mas ele estendeu a mão para ele em recusa.

— Guarde-a. — Pediu. — Pois não mais precisarei dela, e nem meus filhos. — Então aproximou-se e apoiou a mão sobre o ombro do homem. — Seja o que você nasceu para ser, Estel. Dou esperança aos homens. Para mim, não guardo nenhuma.

Aragorn concordou e ficou ainda na tenda alguns instantes após sua partida.